Vamos Nós Três - Parte 10

Um conto erótico de calango86
Categoria: Homossexual
Contém 1584 palavras
Data: 04/03/2016 02:02:57

PARTECom a porta da sala aberta, eu esperava a Alexia chegar. Vi o visor do elevador mudando de “T” para 1... depois para 2... Ao mesmo tempo, escutava a torneira do banheiro esguichando água, o Leandro provavelmente na frente da pia lavando o rosto e arrumando os cabelos. Éramos cúmplices de um crime tentando limpar as evidências do delito. Evidências essas que, diga-se de passagem, eram nossas caras de quase-fizemos-sexo. “Seja o que Deus quiser!”, pensei, quando o elevador finalmente chegou ao meu andar trazendo uma Alexia bem animada:

- Amor! – e abriu os braços de maneira teatral para me abraçar, após depositar no chão algumas sacolas plásticas que trazia consigo.

Demos um beijo demorado e um abraço apertado. Meu nariz contra seus cabelos castanho-avermelhados e ondulados captava um cheiro doce, de perfume floral, contraste enorme com o odor intensamente amadeirado do Leandro. Seus dedos nas minhas costas batucavam rapidamente, como ela sempre fazia quando estava muito feliz em me ver.

- Meu bem! Olha aquelas sacolas ali no chão. Tá vendo? – ela perguntou, soando marota.

- Uhum, o que é?

- É a minha maneira de compensar aquele lanche que o Lê comprou pra gente no dia do clube, lembra? E como eu sou rica, fina e poderosa, adivinha o que eu trouxe? Heim, heim?

Só podia ser uma coisa. Eu não pude acreditar que ela tinha se dado ao trabalho de comprar aquilo. Talvez ela continuasse se sentindo culpada por ter achado que o Leandro havia dado em cima de mim.

- Cacete... Eu não to acreditando que você trouxe comida japonesa pro lanche da tarde! – eu disse, sem conseguir evitar o riso.

Ela virou o rosto pro lado, jogou um beijo na direção do próprio ombro e falou, se divertindo:

- Só porque eu posso! Aquele pão de queijo e suco de caixinha batem na minha finesse e voltam como sushi e sashimi. Beijos!

Nesse momento, enquanto ríamos, o Leandro havia saído do banheiro e chegava na sala. Assim que o viu, a Alexia foi correndo ao seu encontro e deu um pulo, subindo no colo dele. Abraçada a ele, ela não reparou no olhar que trocamos. Nosso medo de sermos descobertos e o peso na consciência eram evidentes.

- Cheguei, professor Leandro! E ao invés de trazer uma maçã pro senhor... Venha ver se a aluna aqui não merece um dez! – ela disse piscando o olho, assim que saiu de seus braços e foi em direção às sacolas.

A Alexia sempre merecia um dez. E esse era o maior problema em magoá-la.

***

Na cozinha, enquanto comíamos os sushis, sashimis e outras coisas que nem sei o nome, a conversa rolava animada. O Leandro e a Alexia se alternavam (e eventualmente se interrompiam) para falar sobre um professor do antigo colégio que tinha um terceiro mamilo e ficava alardeando o fato para quem quisesse saber e ver, já que ele o mostrava no final da aula para os alunos.

- O pior é que o cara achava que tava abafando! E a parada era tão acima do peito que chegava quase no ombro dele, e daí... – O Leandro contava, mas sendo atropelado pelas palavras da Alexia.

- Sim, sim, mas peraí rapidinho. E quando rolou aquela teoria de que o mamilo mutante era na verdade um conjunto de pintas que cresceram uma do lado da outra? – a Alexia o cortou rindo – e então...

- É, pois é, pois é, e aquela vez que a Dayane levantou a hipótese de que era uma tatuagem que ele fez só pra chamar a atenção, por que... – ele a interrompeu em resposta, fazendo-a franzir o cenho.

- Isso também, claro, mas eu nunca esqueço aquele dia em que... – ela contra-atacou.

Eu me divertia mais com os dois disputando o monopólio da conversa do que com a história em si. Estava até me sentindo mais leve e menos culpado durante esse momento dos três, entre risadas e histórias de professores com três mamilos. Era inegável que tínhamos química como trio, em termos de amizade e bom clima.

Mas então a Alexia reparou. Enquanto estendia seus palitinhos para o outro lado da mesa, tentando pegar uma peça de salmão distante do seu braço, ela virou para mim, olhou em meu rosto e perguntou:

- Meu bem, hoje você está tão mais vermelho do que o normal... E tava ainda mais na hora em que eu cheguei. Aliás... O que é essa marquinha no seu pescoço? – ela perguntou, desistindo de tentar pegar o sashimi e voltando sua atenção para o que quer que tenha visto na minha cara.

Diferente do Leandro, eu não tive tempo de ir ao banheiro para ver em que estado estava meu rosto depois de beijá-lo tanto. “Que não seja um chupão, Deus, por favor! Que não seja um chupão, que não seja um chupão...” eu repetia mentalmente, como um mantra, tenso para ouvir a conclusão dela. E foi nessa hora que o Leandro me salvou:

- O Edu é tão branquinho que qualquer inseto que pica ele deixa umas manchas sinistras, né? Mas fica tranquila, Alê, que eu mesmo matei com uma cadernada o bicho que fez isso, enquanto a gente tava estudando. O maldito chupou sangue, mas não saiu impune, não!

Eu era capaz de dar um beijo nele ali mesmo, por ter falado isso. Mas não, era melhor não.

- Hummm... Realmente, faz sentido. Até lembrei daquela noite do ataque dos pernilongos no acampamento da escola. Coitado, você ficou todo empolado, meu bem, lembra? – Ela disse, parecendo convencida. E depois completou rindo, virando-se para o Leandro – mas se por acaso você viu a vagaranha da vizinha brincando de “Crepúsculo” e mordendo o pescoço do Du quando chegou aqui, sabe que precisa me falar, né? É seu dever de melhor amigo!

Rimos. Essa tinha sido por pouco. O mais triste e irônico era pensar que a vagaranha da piada era o Leandro, e que isso não tinha a menor graça. Tá, talvez tivesse se ocorresse com alguém que não conheço e me contassem, mas viver a situação com sua namorada e o amigo dela era uma tragédia grega.

Pouco depois de iniciarmos um novo assunto, sobre o que iríamos fazer de nossas vidas depois do ensino médio, o celular do Leandro tocou. Ele pediu licença apontando para a área de serviço, contígua à cozinha onde estávamos. Assenti com a cabeça e ele foi lá para que não escutássemos o papo, o telefone já no ouvido.

Apesar de ter se retirado, ou o celular dele estava configurado com o som muito alto ou a pessoa do outro lado da linha gritava, pois eu consegui distinguir algumas frases como “volta aqui agora!”, “não ouse me desobedecer” e “não vou repetir”. O Leandro apenas concordava de maneira monossilábica, o tom de voz baixo e apaziguador, como se estivesse pedindo desculpas. Isso durou mais ou menos uns cinco minutos, tempo em que meu papo com a Alexia ficou reduzido a algumas frases apenas. Ela também reparou na tensão da outra conversa.

Quando ele voltou para a cozinha, parecia cabisbaixo, mas tentava disfarçar seu incômodo com uma expressão jovial no rosto. Sem se sentar à mesa, tentando parecer o mais impessoal possível, disse:

- Gente, tenho que ir, infelizmente... Aconteceu uma coisa aí, enfim. – e continuou, ao ver os ombros caídos e a cara de decepção da Alexia. – O Edu te passa as coisas que eu expliquei pra ele, relaxa! Qualquer dúvida você me manda mensagem... Ou joga no “google”, sei lá.

Ele tentou descontrair, mas nosso desânimo ficou evidente.

- Não é pela aula particular de português, Lê... Queria ficar mais tempo com você mesmo.

- É, eu sei... - Ele disse dando um beijo na testa dela. – Eu também queria.

Levantei-me da cadeira para levá-lo à porta da sala, enquanto a Alexia permaneceu na mesa matando os sushis restantes. Só de sair da cozinha para andarmos sozinhos até a entrada de casa já me deixou novamente com o coração palpitando, acelerado.

Ao abrir a porta, olhei pra ele sem saber como me despedir. Dava a mão? Abraçava? ... Beijava? Fiquei um tempo olhando para seu rosto, apreensivo. Nunca tinha estado naquela situação antes. Ele acabou tomando a iniciativa de me abraçar e beijar minha bochecha, ao mesmo tempo em que sussurrava “a gente conversa depois, né?”. Fiz que sim com a cabeça, tentei sorrir sem parecer um idiota e o vi desaparecer quando a porta do elevador fechou.

Não precisei voltar à cozinha para ver a Alexia, pois em poucos segundos ela apareceu ali, me abraçando por trás. Beijando meu pescoço de forma carinhosa, ela disse após um suspiro:

- O pai dele, com certeza... A relação deles é... Ahnn... Digamos assim, meio problemática.

Assim que ela disse isso, juntando com as frases agressivas que escutei ao longe enquanto ele falava no celular, me veio um clique à cabeça. No dia do clube ele não havia almoçado, pouco antes dos estudos também não. Tinha dito que chegou mais cedo por conta de contratempos familiares. Além disso, havia aquele curativo perto da orelha que tanto o incomodou quando eu reparei e tentei ajeitar. A morte da mãe. Seria possível que... Será que o pai do Leandro...? Consegui dizer, após um instante:

- Meu bem... Como assim problemática? Como é o pai dele?

Meu peito subia e descia, a respiração acelerada. Era possível que eu já me preocupasse tanto com o Leandro, a ponto de sentir fisicamente os efeitos dessa apreensão? Conhecendo-o a apenas três dias?

Lembrei-me do momento na cama, e de todos os que antecederam a esse. Sim, era possível.

(FIM DA PARTE 10)

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