CAPÍTULO 5
OS CASAMENTOS
2ª PARTE
CAPÍTULO 5
OS CASAMENTOSA harmonia reinava de uns tempos pra cá naquela casa, a grama parecia mai verde, o céu mais azul e a música não era só música, havia algo a mais. A rotina dos três era conjunta, eles conversavam, falavam de coias importantes e desinteressantes, nunca entravam profundamente em um assunto algum, permaneciam sempre na superfície, eram táteis, passeavam bastante, bebiam pouco, viam filmes e programações, sentiam que deixar as coisas oficiais e importantes fazia com que perdessem sua graça, enquanto houvesse diversão, não viam motivo para deixar as coisas sérias. O que estava os incomodando mesmo era o sexo. Desde de que Mike foi descoberto nenhum dos três haviam transado e isso estava sendo difícil para os três. Gabriel nunca havia ficado tanto tempo sem transar desde que havia conhecido Jorge. Mike nunca havia ficado tanto tempo sem transar. Jorge se remoía, estava entre rapazes que sentia se importava e sentia uma grande atração física. O tesão que os três sentiam um pelo outro era óbvio. Não fosse a tensão do casamento para se ocupar a situação seria outra. “Então como vai ser depois do casamento?” - Pensou Gabriel.
O fim de semana chegou rápido, a ansiedade que faz as coisas demorarem para vir, funcionou ao contrário dessa vez, em momento algum houve surpresa, pois, os dias não trapacearam. As vinte e quatro horas foram fieis a si mesmas, elas se fizeram ser sentidas, entretanto havia alguma coisa no ar ou na pilha do relógio da cozinha acima da geladeira que fazia com que o tempo passasse mais depressa. Ninguém ousaria reclamar dessa ousadia do tempo, pois querendo ou não, era uma coisa positiva. Viver intensamente faz você envelhecer mais rápido, envelhecer é uma dádiva, risos e sorrisos foram compartilhados naquela semana. Aquela casa abrigou vários sentimentos nos dias que se passaram, sentimentos que nunca foram sentidos antes, sentimentos que nunca mais seriam sentidos a partir dali, sentimentos que ninguém saberia definir e o sentimento de não saber o que fazer era recíproco naqueles cômodos, mas por algum motivo isso parou de ser sinônimo de desespero e se tornou só mais uma característica pequena em meio a várias outras.
Faltava alguns minutos para o casamento que era a 10 minutos de distância da casa de Jorge. Gabriel tinha levado as várias opções de roupas para serem testadas. Jorge já estava pronto duas horas antes. Ele possuía um terno preto, uma camisa branca e uma gravata preta que sempre usava para algumas ocasiões na delegacia. Não havia vaidade em Jorge. Achou que nunca mais usaria aquela roupa, leve engano. Sua calça, era preta como seu terno e gravata, seus sapatos também pretos. Sempre repetia o mesmo estilo para ocasiões que não pareceria bem usar só um casaco. Quem o vira há dez ou vinte anos, não notaria diferença alguma em relação às suas roupas, já ao seu corpo, obviamente sim. Jorge tinha ganhado alguns quilos, ganhou uma barriguinha discreta, seus cabelos foram aos poucos perdendo a cor, mas não a quantidade, alguns tinham se transformado completamente cinzas. Jorge não escondia, tampouco haveria motivos, já que o tempo lhe fez muito bem, era correto afirmar que ele estava bem mais charmoso agora do que antes, os anos deram a ele um charme e uma suavidade no olhar que era fácil de se distrair olhando para ele. Seu perfil de carrancudo mandão ainda intimidava qualquer um que não o conhecesse de perto, as pessoas o respeitavam muito. Parecia novo para sua idade, suas rugas na testa, no rosto e perto dos olhos o davam um ar de experiência que conduziria qualquer um, exceto agora, que estava largado no sofá, olhando para o seu relógio de trinta em trinta segundos aborrecido à espera de Gabriel.
Ao seu lado, na outra ponta do sofá estava Mike. Mike era o moderno que não dava muita importância para esse tipo de festividade, tinha, com certeza, mais opções que Jorge, mas não demorou tempo algum escolhendo suas roupas, porque já tinha imaginado o que vestiria assim que pensou em casamento. Seu terno não era branco, era um tom de creme, ele não sabia muito as tonalidades que um branco poderia ter, mas explicava aquele tom de bege como um “tipo de branco”, não parecia avelhantado, ofensivo, muito menos antigo. Ele parecia fora de sua época, com o suspensório de fivelas marrons à mostra, ele usava uma camisa branca e uma gravata borboleta preta, que contrastava com o resto de seu figurino. Sua calça era igualmente clara e seu sapato era um daqueles modernos que não haviam zíper, sua linda cabeleira loira, pareci estar cheirosa e jogava para trás, dando a ele a impressão mais forte ainda de estarem de volta ao século vinte. Mike tinha umas pintas perto de seu pescoço que davam a ele um ar de garoto, moleque novo. Com seus imensos olhos azuis, ele encarava uma embalagem do chiclete que estava mastigando a mais tempo que devia, tão distraído que nem percebia o incômodo de Jorge.
- Pronto! – Anunciou Gabriel, lá do fundo do corredor – Se não gostarem guardem a opinião para vocês mesmos, caso contrário eu volto para trocar de roupa novamente.
Logo a demora de Gabriel tinha sido claramente explicada quando ele apareceu na beira da sala, Jorge tinha parado de exibir sua cara mais carrancuda que o normal, Mike tinha largado a embalagem de chicletes no chão para prestar completa atenção no que estava parado a sua frente. O cabelo de Gabriel era curto, mas ninguém soube o que ele tinha feito no banheiro, que fazia parecer mais alinhado agora, ele vestia uma camisa social de manga cumprida azul turquesa, com botões que o fechavam no pulso. Como se fossem milimetricamente calculados, diferente dos outros dois, Gabriel não vestia um terno e sim um colete cinza de dez botões cinza escuros, que perceptivelmente eram feitos de um tecido mais caro, seu colete tinha falsos botões que davam uma entrada a um cinza também escuro, na mesma cor dos botões, sua gravata fina e cinza, cortava o seu peito, fazendo com que a atenção se sobrecaísse em seu peito, sua calça preta, parecia ser sido feita sobre medida, não era muito larga, tampouco muito apertada, serviam perfeitamente para perceber que ele possuía pernas torneadas sem parecer vulgar. Não daria para perceber, mas ele também usava um cinto laranja que berrava perto daquele azul de sua camisa, conforme ele andava, fazia-se notar uma fivela dourada que segurava a parte exterior a parte interior de sua gravata. Seu sapato era uma espécie de azul escuro fino, feito de um tecido absolutamente diferente de tudo que os dois já haviam visto na vida, possuía um cadarço curto e cortês, que parecia ter sido entrelaçado por um especialista naquele tipo de coisa. Seu perfume era doce, não ao ponto de ser enjoativo, mas o suficientemente bom, para se querer adormecer sobre. A vaidade que faltava em Jorge, Gabriel mostrou que tinha de sobra.
- E então? Aliás, não falem. Só vamos! – Disse Gabriel se dirigindo a porta a abrindo e passando por ela.
Jorge e Mike acompanharam Gabriel com a cabeça e observaram ele sair da casa enquanto permaneciam sentados boquiabertos.
O dia já não era dia, mas também não era noite, o vento e algumas nuvens cinzas davam a falsa impressão de que iria chover, mas só estava anoitecendo. Finalmente chegaram, o quintal era composto por um verde bonito, notava-se facilmente que a grama era cuidadosamente cortada, o salão nunca era usado para casamentos por ser pequeno, era normalmente utilizado para pequenas celebrações, reuniões, festa de despedida e outros eventos.
Dava para ver de longe que já havia gente dentro, as luzes acesas eram facilmente notadas pelos vãos da porta principal que ficava logo de frente para o portão. Não havia outra entrada se não a da frente, o salão por não ser grande, tinha poucas janelas, mas uma porta enorme, era possível passar um carro e uma moto por ali. O seu interior também era grama, o que dava um toque natural ao local.
Gabriel não conseguia correr normalmente sem tirar a gravata do lugar ou desabotoar dois ou três botões, Jorge ainda andava estranho por causa de seu acidente a uns dias atrás, apesar de ter se recuperado rápido, Mike que era o mais rápido, forçou seu braço contra a grande porta pesada e a empurrou com força a abrindo lentamente.
Os três ficaram extasiados ao ver o local pelo seu interior.
É claro que pelo fato do casamento ter sido planejado para antes do tempo, era esperado que alguns detalhes seriam simples, e de fato eram, mas era uma simplicidade bela que ficava harmonizava com tudo que estava ali dentro, o detalhe do casamento ter sido pequeno, também ajudou, cerca de vinte e poucas pessoas tinham sido convidadas, fazendo com que o evento fosse mais pessoal e especial a todos que estavam ali presentes.
O chão ali dentro, era mais elevado que na parte de fora, mas também era gramado, as mesas eram de madeiras e pequenas, estavam detalhadamente espalhadas nos lugares onde vários convidados se encontravam. As cadeiras eram dobráveis, e estavam decoradas com flores brancas, assim como todo o salão.
O ar era bom ali dentro, as janelas grandes e altas, estavam abertas e faziam com que ninguém suasse ou sentisse frio. Os convidados estavam muito bem vestidos, era possível ver todas as cores espalhadas nos mais diversos tipos de vestidos na festa. Notava-se que as poucas mulheres haviam dado uma boa atenção ao cabelo, que não repetiam nenhum penteado, cabelos longos, soltos, curtos, compridos, presos, soltos, loiros, morenos, ruivos, castanho, as mulheres eram muito diferentes de Débora, um mistério como ela conseguiu amigas tão femininas. Já os homens estavam todos no mesmo estilo, preto e branco, exceto Gabriel que se destacava entre os homens e também as mulheres. Era possível contar cerca de cinquenta pessoas ali.
Quando se aproximaram de uma das mesas vazias, eles notaram que perto do vidro de flores brancas, havia um adesivo com seus nomes.
- É aqui – Disse Jorge, sentindo um alívio enorme por finalmente sentar.
Mike e Gabriel, afastaram a mesa um de cada lado de Jorge e se sentaram.
- Essa gente é da delegacia? – Perguntou Gabriel.
- A maioria dos homens sim, já as mulheres... não, nenhuma. – Respondeu Jorge olhando para os lados verificando se conheceria alguém ali. De minuto a minuto Jorge acenava para alguém que de longe o levantava uma taça de vinho branco.
- Todo mundo olhando para mim... tem algo no meu rosto – E se virou para Gabriel.
Mike riu baixinho colocando o cotovelo sobre a mesa e escondendo o riso com a palma da mão disfarçadamente.
- Que foi? – Perguntou Jorge.
- Isso é ridículo – Disse Mike.
- O quê? – Perguntou Gabriel se inclinando para Mike, que falava baixinho como se estivesse prestes a contar um segredo.
- Para a gente, isso aqui que está rolando é normal – E se referiu a eles três com o dedo – mas para os outros... é putaria! – E riu menos disfarçadamente agora
Gabriel deu um riso nervoso e Jorge permaneceu sério, tomando mais de seu vinho.
- Isso é ridículo! – Esbravejou Gabriel, mais sério que Mike.
Jorge notou que as pessoas ali tentavam disfarçar, mas que sim, estavam olhando em direção à mesa deles, não com caras preconceituosas ou enojadas, mas sim curiosas, os amigos de Jorge já estavam acostumados com a presença de Mike, mas Gabriel era novidade. Gabriel não se camuflava fácil.
Minutos depois, um dos novos policias, chamado Jeferson, passou pela mesa para cumprimenta-lo.
- Joorge! – Gritou de longe com os braços estendidos.
Jeferson era extrovertido e muito eficiente, qualidades que o destacavam dentro da delegacia, seu humor inteligente seria muito apreciado se suas piadas não fossem feitas nos momentos mais inoportunos. Era descendente de italianos, alto e gordo, o que o dava a ela uma impressão forte. Jorge não trabalhou com ele por muito tempo, pois já estava saindo quando ele entrou, porém, o respeito era mútuo, em todas as oportunidades os dois conversavam, dividiam umas histórias e se despediam, hoje não seria diferente.
- Jeferson! – Disse Jorge um pouco mais baixo do grito de Jeferson – Agora sim, não restava dúvida que todos estavam olhando para aquela mesa. Mike e Gabriel se encolhiam na mesa enquanto Jorge conversava com Jeferson.
Os dois se abraçavam cuidadosamente para não derrubar o vinho que estava na taça.
- Então, como tem passado? Aproveitando a aposentadoria? – Jeferson carregava um sorriso enorme e forçado no rosto, como se fosse obrigado a pedir algo que não queria.
- Bem, vou bem. – Respondeu Jorge olhando para as outras pessoas o olhando – Sabe, fazendo meus hobbies, minhas palavras cruzadas...
Ouviu-se uma risada escandalosa daquela conversa no salão.
- Radicalizando! Não é mesmo!? – Disse socando Jorge no ombro, quase derrubando o vinho da sua taça.
- Sabe como é né? Uma hora a gente tem que descansar... - Disse Jorge recebendo olhares de cumplicidade.
- Sim, sim, antes em casa que num caixão! – E outra risada menos escandalosa foi ouvida ali. Jorge deu um sorriso amarelo e resolveu abordar assuntos que não envolvesse ser alvo de tanta atenção.
- E você? Me diga, o que tem feito? – Jorge retribuiu o soco no braço do amigo, curto e forte – fazendo com que ele derrubasse metade do vinho para fora da taça.
- Opa! Vou bem também... quero dizer, delegacia, você sabe como é! Tiro aqui, tiro ali, mata alguém aqui, prende alguém lá! Nada muito diferente, rotina normal, quanto mais estressante melhor, se é que você me entende... – Jeferson lançou um olhar a Jorge misterioso, que Jorge não entendeu, poderia ser só coisa de sua cabeça, e esperava que fosse.
Jorge entendia, ele se lembrou dos dias que mesmo depois de sair do trabalho ainda procurava algo para se fazer nas ruas, porém Jorge não tinha muito o que fazer em casa, diferente de Jeferson que tinha mulher e filhos, notou então que poderia haver alguma coisa que ele não estava contando, mas aquela situação não era para ser investigada, Jorge então resolveu não fazer mais perguntas a respeito disso.
- Sim... sim... entendo. – Houve um silêncio no ar em que nenhum dos dois sabia exatamente o que fazer, até Jorge perceber que Jeferson encarava a mesa que Jorge estava sentada. – Como eu pude esquecer – Disse Jorge rindo de sua falta de memória, dando dois passos para trás e entendendo a mão em direção à Mike - Jeferson, por favor esse aqui é o Mike, meu... meu... – de repente faltava vocabulário para Jorge, coisa que ele tentou ignorar, - enfim... que você já conhece...
- De vista, aham! – Completou Jeferson sorrindo e apertando a mão de Mike!
- E esse aqui é o Gabriel, meu... – agora não lhe faltava vocabulário algum, Jorge não tinha percebido antes, a quão bizarra era a situação que estava, como ele apresentaria Gabriel? Caso? Amigo? Namorado? Amante? Colega? Jorge queria fazer Gabriel se sentir bem, mas sentiu que qualquer coisa que fosse dita, o faria se sentir ofendido. Por um milésimo de segundo ele considerou fingir um ataque do coração para sair daquela situação onde estava.
- Amigo! – Completou Gabriel para o alívio de Jorge, levantando e apertando a mão de Jeferson.
- Amigo? – Jeferson levantou as sobrancelhas e aumentando o sorriso, interessante, olhou para trás acenando a cabeça e voltou a encarar Gabriel apreciando seu figurino – Muito bem vestido Gabriel! Parabéns!
- Essa coisa velha aqui...? Aah... obrigado! Peguei a primeira coisa que vi e vesti. - Disse Gabriel, fingindo modéstia.
Os dois riram, Jorge apreciava os dois conversando com graça, enquanto Mike olhava para Jorge com um tom de desaprovação.
- Mora por aqui? – Perguntou Jeferson bebendo mais um pouco de vinho.
- Não... – Respondeu automaticamente – Quer dizer, sim, sim... Moro a 10 minutos daqui...
- Aah, 10 minutos, é? - Se interessou Jeferson.
Nesse momento, algo chamou a atenção de Jorge na porta principal do salão, alguém estava acenando para ele, chamando a atenção, ele demorou para perceber quem era, então depositou a taça de vinho na mesa e foi em direção à porta.
- Aconteceu alguma coisa? – Perguntou Jorge para Aurélio que parecia assustado.
- Sim! – Disse Aurélio acenando com a cabeça! – Eu estou entrando em pânico!
Aurélio não tinha mudado muito nos anos que se passaram, ele ainda parecia muito jovem para a idade que tinha, pelos pedidos de Débora ele tinha deixado crescer a barba e o bigode, o que não era esforço nenhum manter do jeito que estava. Aurélio levou Jorge até uma pequena peça que ficava ali perto. Ao abrir a porta, Jorge viu algumas roupas por cima de mesas e cadeiras, um espelho grande e uma garrafa com água.
- Calma Aurélio! Respira! Respira! - Disse Jorge percebendo a Euforia do noivo.
Suas palavras notoriamente não surgiam efeito algum, pois Aurélio ainda suava demais, respirando fora de controle. Jorge agiu de maneira óbvia, oferecendo a ele um copo de água, quando observou a lata de lixo no canto daquela sala, transbordado de copos plásticos. Jorge abandonou o copo de água, pegou nos ombros de Aurélio e tentou encontrar entre seu rosto desesperados, seus olhos.
- Me diz, o que aconteceu – Com uma voz rouca e calma.
Aurélio tentou desviar o olhar ali, mas de alguma maneira só a presença de Jorge ali dentro, já tinha o deixado melhor.
- Débora... A gente... A gente...
- Vocês brigaram? – Disse Jorge se afastando e se apoiando na mesa trás.
Aurélio balançou a cabeça, acenando que sim para Jorge.
- Olha... eu não... eu não sei se sou a melhor pessoa para te dar conselhos sobre casamento... inclusive eu não sei se esse é o caso, mas...
Aurélio riu, olhando para Jorge, que ria também.
- Bom, Jorge, você teve dois... eu acho que você é a pessoa perfeita para me dar conselhos sobre casamento.
Já com a respiração mais tranquila, Aurélio colocou as mãos na cintura e se mostrou atento para qualquer coisa que Jorge poderia vir a dizer.
- Bom... Aurélio... – Disse Jorge também colocando as mãos na cintura, imitando Aurélio inconscientemente. – Casamentos são... uma merda!
Aurélio arregalou os olhos espantados com aquela palavra saindo de Jorge.
- Merda? – Repetiu ele, para ter certeza que essa era exatamente a palavra que ouvira.
- Isso! - Disse Jorge, insistindo com mais vigor na sua afirmação de anteriormente.
- Mas... - Começou Aurélio desentendido.
- Pera, deixa eu concluir... Bom, claro que meus dois casamentos foram completamente diferentes um do outro... Da última vez, a pessoa com quem eu casei tinha um pênis... não é o seu caso, você não deveria se preocupar! – Jorge percebeu que Aurélio já não suava tanto – Casamentos, Aurélio, eles são fedidos, sujos, baixos... é como se fosse uma briga, que você pagasse para entrar... porque vocês... vocês se amam. Não tem outra saída, eu não vou dizer para você que é um mar de rosas porque não é! Mas é algo que você quer fazer, entende? Você quer se sujar, você quer se machucar... Casamentos são masoquistas, sim... eles nos matam aos poucos, mas a gente quer morrer todos os dias... no bom sentido é claro. A partir de hoje, você não vai mais estar sozinho para nada Aurélio e e isso vai te deixar horrivelmente bem!
- De todas as brigas que eu tive com Elaine, teve uma que eu bebi um pouco e comecei a considerar divórcio... Eu não lembro o motivo direito, mas devia ser uma coisa boba... Então eu comecei a considerar a vida sem aquela mulher do meu lado e um vazio me veio à cabeça... Aurélio, ah Aurélio, tem uma mulher vestida de noiva prestes a entrar naquele salão que você vai amar e odiar ao mesmo tempo, você vai odiar amar ou amar odiar, não sei... Mas tudo que vocês fizerem a partir de hoje vai envolver amor, aliás... Aí vem uma demonstração, não é? Daqui uns meses você vai compreender e se lembrar dessas coisas que eu estou falando e rir dessa situação em que estamos agora. A vida não vai ser simples Aurélio, mas ela é tão boa difícil.
Aurélio olhou pra Jorge emocionado.
- Uau! Eu tô...
- Confuso? – Interrompeu Jorge!
- Demais – riu Aurélio – Eu nunca quis casar tanto com aquela mulher como eu quero agora!
- Case logo, se não eu caso com ela!
Os dois riram emocionados ali, a atmosfera se carregou de silêncio e os dois olharam sérios um para o outro. Com as mãos na cintura novamente, Jorge olhou para Aurélio sério:
- Eu estou muito orgulhoso de você, sabe? Eu acho que se seu pai estivesse aqui...
Não! Não complete essa frase Jorge... -Jorge ficou em silêncio olhando para ele sem entender o que ele queria dizer com aquilo – Se meu pai estivesse aqui, provavelmente você não estaria... E eu não consigo me ver em uma situação mais feliz que essa em que eu estou com você agora!
Jorge não esperava ouvir isso, foi como se ele tivesse sido golpeado com emoções que encheram seus olhos de lágrimas, ele tentou falar alguma coisa, mas sentiu como se de repente tivesse perdido a habilidade de falar, seu queixo tremeu e seus braços se abriram, os dois deram um longo abraço ali, digno de um longo silêncio e daquele jeito permaneceram, até Jorge se desprender:
-Ok, chega... eu não posso aparecer assim lá e você definitivamente precisa trocar essa camisa!
- Ah sim, sim... eu suei em quase todas elas. - Aurélio então tirou a camisa úmida dando as costas para Aurélio e ficando de frente para o espelho. Jorge nunca tinha visto a beleza que Mike via em Aurélio e se sentia melhor assim. – Eu quero te perguntar uma coisa Jorge... mas eu não sei se é ofensivo... ou.... Enfim, eu vou perguntar
- Claro... - Disse Jorge curioso.
Se Elaine ainda estivesse viva... você acha que...
Jorge sabia onde Mike estava querendo ir com essa frase mal formulada.
- Eu estaria com um homem agora? – Completou Jorge.
- Isso – Continuou Aurélio, olhando a afeição de Jorge pelo reflexo no espelho enquanto abotoava os botões da camisa que estava colocando.
- Sabe... eu já parei para pensar nisso... E, me desculpa não te dar uma resposta mais clara, mas eu não sei Aurélio.... Eu não sei... Parte de mim, acha que eu viveria para sempre com ela, morreria com ela, sabe? Sem nunca tentar outros... Enfim... Parte de mim se pergunta, se caso eu tivesse morrido antes, ela tentaria relação com outra cara, ou mulher, por que não? Elaine me surpreendia todo dia, mas... O negócio é que.... Eu não consigo ver Mike sem mim.... Eu não acho que ele ainda estaria vivo se Elaine não morresse. Talvez eu esteja equivocado... Mas... é isso.
Aurélio pensou naquelas palavras enquanto colocava a gravata agora e satisfeito, de repente se lembrou de Mike
- Mike! Bom garoto o Mike! Como ele vai?
- Bem... Ele vai bem... muito bem, na verdade!
Aurélio virou para Jorge como se pedisse ajuda com a gravata que estava ridiculamente desorganizada embaixo do seu queixo. Jorge se aproximou para arrumar aquela bagunça, enquanto ouvia de Jorge.
- Débora me contou mais ou menos sobre a nova situação com o...
- Gabriel! – Completou Jorge.
- Isso Gabriel... O que que está acontecendo Jorge? – Perguntou Aurélio sério.
- Eu...
- Também não sabe? – Completou Aurélio sorrindo.
- Acho que você deveria me perguntar coisas que eu sei, por exemplo, me pergunta se você está pronto.
Aurélio virou novamente para o espelho e viu que a gravata estava perfeita. Seu terno era parecido com o de Jorge, porém mais fino e novoEu vi você conversando com o Jeferson...
Sim, ele estava puxando papo comigo... Ele é uma figura!
Eu tenho lá minhas dúvidas... - Disse Aurélio olhando no espelho.
Sobre? - Perguntou Jorge, curioso.
- Você não sabe? – Perguntou Aurélio virando para Jorge.
- O quê? – Jorge levantava as sobrancelhas.
- Bom, a mulher dele pegou ele transando no carro... com outro garoto.
- O quê? – Perguntou Jorge assustado esperando ver em Aurélio um sorriso dizendo que era brincadeira.
- Aham, até agora parece que a mulher dele não sabe bem o que fazer e eles estão vivendo na mesma casa como se nada tivesse acontecido, mas parece que ele não aguenta olhar na cara dela de vergonha, tanto é que ela ligou dizendo que não viria, deve ter inventado alguma gripe ou coisa assim - disse Aurélio com naturalidade.
Jorge de repente lembrou da frase que Jeferson lhe dissera no salão mais cedo “ ..se é que você me entende...” E se lembrou também dele introduzindo Gabriel antes de sair. Jorge de repente sentiu uma ânsia misturada com desespero, ele só queria sair daquele local que de repente estava quente demais e disse à Aurélio que estava saindo:
- Eu... Tenho que checar uma coisa, é importante.
- Eu já vou entrar! – Disse Aurélio em voz alta, percebendo que Jorge já estava lá fora.
Lá fora o campo estava escuro, pouca coisa era realmente visível, era impossível enxergar alguma coisa sem forçar os olhos, Jorge estava com pressa, ignorou o que havia em seu caminho e entrou rapidamente no salão tentando visualizar Gabriel ou Mike, mas para o seu horror não achou nenhum dos dois, e o que o deixava ainda mais apavorado foi o fato de não estar achando Jeferson também. Em questão de segundos seus olhos percorreram cada canto do salão, sem encontra-los Jorge apressadamente começou a procurar pelo lado de fora, de repente, de longe ele conseguiu visualizar uma cabeça amarela e um terno quase branco próximo a parede de uma outra sala escura, só podia ser Mike, conforme ele foi se aproximando, viu que era mesmo Mike, mas agora percebia que ele não estava sozinho, e sim beijando outra pessoa que era impossível saber quem era pela posição que estava.