Gabriel narrando
Olhei para o lado e Vi o Gustavo nos olhando possesso. Pronto, minha vida tinha acabado. Eu não consigo descrever o grau de desespero em que eu me encontrava naquele momento. Foi como se eu tivesse parado no tempo e visse tudo em câmera lenta, por causa do meu estado de choque. O Gus andou em nossa direção e me tirou dos braços do Ricardo. Eu nem preciso dizer que aquilo ia acabar em briga né? Ate porque o meu irmão não sabe resolver nada se não for batendo nos outros. Ele deu um soco no Ric e o suspendeu pela barra do kimono, empurrando-o na parede.
- EU SABIA, SEU DESGRAÇADO!- vociferou Gustavo.- Todo aquele interesse no meu irmão, perguntando se ele era gay, ficando com ele aqui sozinho... você acha que eu sou otário? Achou mesmo que eu não iria perceber que você só queria se aproveitar da inocência dele?
- C-ca-calma Gustavo, olha eu posso explicar- Era claro o nervosismo do Ricardo- Eu não me aproveitei de ninguém, ta legal? Seu irmão quis tanto quanto eu.- Nessa hora o Gustavo olhou pra mim com uma cara assustadora. Ele largou o Ricardo e veio pra cima de mim.
- Anda, fala alguma coisa! Diz que ele ta mentindo Gabriel, diz que você não é essa aberração- falou enquanto me chaqualhava pelo kimono. Meu estado era de puro pânico.- EU MANDEI VOCÊ ME RESPONDER!
- O q-que o ric falou é v-verdade.-Senti imediatamente sua mão atingindo o meu rosto com o tapa que levei. Só então comecei a chorar. O Ricardo imediatamente deu um soco no Gustavo, tirando ele de perto de mim.
- Se você encostar mais um dedo no Gabriel, eu juro que não sei o que sou capaz de fazer com você.- Falou Ricardo entre os dentes.-Se quer bater em alguém, bata em mim que sou do teu tamanho. Agora nele eu não admito que você bata novamente.
- Você acha que o meu pai ta pagando academia pra você ficar se esfregando em outro macho, seu viado filho da puta?- Falou o Gustavo, ignorando o que o Ricardo falou e tentando vir pra cima de mim de novo, mas dessa vez o ric se meteu entre nós e não deixou com que ele chegasse perto de mim.- Pode me segurar o quanto quiser Ricardo. Nada do que eu fizer aqui vai ser pior do que o meu pai vai fazer com ele quando eu contar.- Ele falou o que eu temia.
- N-não, não, p-por favor não Gustavo.- comecei a soluçar forte- T-tudo menos isso.- Escorreguei pela parede e sentei no chão, abraçando as minhas pernas. O ar começou a faltar, respirar agora era luxo pra mim. O Ric soltou o Gustavo que por incrível que pareça não estava mais com cara de raiva e sim de... preocupação?
Gustavo narrando
Eu peguei aquele miserável se amassando com meu irmão no vestiário da academia. Eu sabia que esse puto queria algo com Ele. Ódio era a única palavra que poderia definir o que eu sentia naquele momento. Acontece que de uma hora para outra o Gabriel ficou estranho. Seu rosto foi ficando roxo, como se não conseguisse respirar e por um instante eu esqueci o real motivo de estar brigando com eles.
- Gabe, ta tudo bem?- o Ricardo se ajoelhou em frente ao meu irmão.
- O meu pai vai me matar quando souber. Pior ainda, vai me espancar, me colocar pra fora de casa e depois me matar.- Ele falava como se não estivéssemos diante dele, ele olhava para o vazio, ignorando o que o Ricardo me perguntou. O seu mal estar só piorava. Suas mãos começaram a tremer e ele começou a suar frio.
- Mano, você ta ficando roxo.- Falei, ajoelhando-me ao lado do Ricardo.
- Gustavo, ele ta tendo um ataque de pânico.- O Ricardo se desesperou.
- E agora, o que nós vamos fazer?- Eu estava perdido, nunca Vi o Gabe assim.
- Está tudo acabado, isso não podia ter acontecido...- Ele falava em meio aos soluços.
- Gabe? Gabriel?- Ricardo o Chamava, dando tapinhas em seu rosto para ver se ele conseguia voltar a si, mas não tava adiantando. Seu corpo começou a ficar mole e parecia que ele iria desmaiar a qualquer momento, porém não deixei. Segurei seus ombros e o fiz olhar para mim.
- Gabriel, se acalma por favor! Olha eu não vou contar nada para o nosso pai.-Falei tentando acalma-lo. Claro que essa historia não ficaria por ali.- Respira fundo, vai.- Falei respirando com ele para que ele voltasse ao normal. Ele conseguiu voltar a si mas seu choro não parou. Ele sem que eu esperasse se jogou em cima de mim, o que me fez cair sentado no chão. O Gabe abraçou o meu pescoço, onde também escondeu seu rosto. Ele acabou sentando no meu colo.
- Por favor Gustavo, eu faço o que você quiser, só não acaba com a minha vida, você sabe o que o papai pensa disso.- Fiquei sem reação. No fundo eu sabia que o meu irmão só era um garoto carente e que se apegava a qualquer resquício de carinho, eu sabia que Ele só queria ser amado. Acabei retribuindo o abraço e apertando-o mais ao meu corpo.
- Depois nós conversamos sobre isso. Acho que agora é melhor irmos embora. E quanto a você- Me dirigi ao Ricardo.- Nossa conversa ainda não acabou.- Me levantei e saí arrastando o Gabriel comigo. Entramos no carro e dei a partida. Chegando em frente a nossa casa, não deixei que ele saísse do carro. Nossa conversa seria agora.- Então, pode começar a falar.
- O que você quer que eu fale?- Disse cauteloso olhando para as próprias mãos em seu colo.
- Não se faça de idiota Gabriel. Quando foi que essa palhaçada entre vocês começou?
- foi quando eu fui dormir na casa dele e isso não é nenhuma palhaçada.
-Droga garoto, eu não falei pra você se afastar dele?
- Gustavo acontece que eu também quis! Ou você acha que eu fui forçado a alguma coisa?- Ele me respondeu e eu bufei.
- Cara isso que vocês estão fazendo não é certo. Isso é sujo, da nojo só de ver.- Falei e ele me encarou com lágrimas nos olhos.
- Eu disse que era só uma questão de tempo para você e o max começarem a me tratar mal de novo. Eu acho que no fundo você nunca gostou de mim não é? Pela primeira vez na vida eu encontro alguem que gosta de mim de verdade e não posso ter nada com essa pessoa porque a minha família acha errado.-Ele olhou bem dentro dos meus olhos e continuou.- Agora fala olhando na minha cara que você quer que o meu pai me dê uma surra igual ou até pior que a que ele deu em você. Porque é isso que vai acontecer se você contar. Fala se você quer que eu sinta a mesma dor que você sentiu. Anda, fala!- Fiquei calado encarando-o. Ele apenas desceu do carro e entrou em casa. O segui.
Não tinha ninguém em casa, chegando no seu quarto, Vi ele deitado de bruços na cama.
- Ei a nossa conversa ainda não acabou.- Falei enquanto ele se virava de frente para mim.
- Acabou sim. Esse sou eu, eu sou gay e você aceitando ou não, isso não vai mudar. Eu vou continuar me encontrando com o Ricardo você querendo ou não e se quiser contar para o nosso pai, fique a vontade. Ah e quanto a você ter nojo de mim, a recíproca é verdadeira. Porque eu também tenho nojo de gente preconceituosa e que em um minuto diz que me ama e em outro, diz que me quer longe por um detalhe que absolutamente não define o meu caráter nem a minha personalidade. Se você diz que me ama, mas não me aceita como eu sou, então não, você não me ama.
- Você é o que?- Ouvi uma voz surgir atrás de mim e o rosto do Gabriel se transformar em puro medo.
- É isso mesmo que você ouviu Max.- A voz do Gabriel passava firmeza, mas seu olhar passava medo.
- Eu não acredito nisso. Mas você vai aprender a virar homem é agora.- Max tentou ir para cima dele, mas eu não deixei. Segurei ele pela cintura.- ME LARGA GUSTAVO, EU NÃO TENHO IRMÃO VIADO.
- VOCÊS SÃO BURROS ASSIM OU FIZERAM ALGUM CURSO?- O Gabe se revoltou nessa hora e começou a gritar pra quem quisesse ouvir.- POR ACASO VOCÊS ACHAM MESMO QUE EU ESCOLHI SER ASSIM? VOCÊS ACHAM QUE EU PODENDO SENTIR ATRAÇÃO POR MENINAS FAZENDO EXATAMENTE A VONTADE DE VOCÊS, PODENDO NÃO TER QUE APANHAR E RECEBER A REPULSA DA MINHA PRÓPRIA FAMÍLIA, EU ESCOLHERIA POR LIVRE E ESPONTÂNEA VONTADE IR CONTRA TUDO O QUE ME FOI ENSINADO, SÓ PELO SIMPLES PRAZER DE DESOBEDECER VOCÊS, DE APANHAR NA RUA, DE SER CHAMADO DE ABERRAÇÃO E DE SER TRATADO COMO LIXO DENTRO DA MINHA CASA?- Ele já respirava pesado quando terminou de falar. Diminuiu seu tom de voz.- Parem e pensem. Quem em sã consciência escolheria um destino em que fosse discriminado pelas pessoas? Vocês acham que pra mim é fácil aceitar isso também? eu lutei contra isso dentro de mim todos esses anos. Travei uma batalha interna contra a minha própria natureza, por sempre ouvir das pessoas que isso era errado.-A essa altura eu já tinha largado o Max, nós dois estávamos mais calmos. Eu já não o julgava, apenas tentava entender o seu lado. Eu nunca tinha parado para pensar por esse lado. Estava mais do que claro que ninguém sofre com essa situação. Era algo mais forte que ele. Aquilo era quem ele era.
- Mas mano você pode lutar contra isso, tenta lutar, por favor.- O Max falou com ele, agora bem mais calmo.
- Eu até poderia lutar Max, mas eu não vou não. Eu cansei de ser alguém infeliz só pra agradar os outros. Eu quero ser feliz sendo quem eu sou, com alguem que me ame. Pra vocês é fácil falar para eu lutar. Não seriam vocês a passar o resto da vida sozinhos não é? Por que que você Gustavo, pode ser feliz com a paty e você Max, pode ser feliz com a Bianca e eu tenho que me privar de um amor?- Eu ouvia tudo calado.
- Mas vai ver é porque você nunca ficou com uma garota. Talvez quando isso acontecer, você mude de ideia.- Max continuou insistindo.
- É? E como você sabe que não gosta de homens se nunca ficou com nenhum? O que me torna gay não é o fato de nunca ter ficado com mulheres e sim o fato de me sentir atraido por homens.- Max finalmente se calou, derrotado. Passamos algum tempo calados, encarando uns aos outros.
- E como você pretende esconder isso do papai por todos esses anos?- Perguntei.
- Nisso eu ainda não pensei, mas eu não vou abrir mão da minha felicidade.
- Bom, se é assim que você quer, eu não vou mais me meter. Mas que fique bem claro que eu não aceito isso.
- Eu também não.-Max concordou comigo. Ele parecia mais chateado com isso tudo do que eu.
- O que é que eu posso fazer não é mesmo? Não posso obrigar vocês a me aceitarem- Ele estava bem triste.- Agora se me dão licença, vou tomar banho, porque ainda tô suado da academia.- Falando isso ele pegou sua toalha e saiu. O Max, que estava ao meu lado, andou e sentou-se em sua cama.
- E agora mano, como vai ser? Que droga, por que ele tinha que ser assim?- Ele estava visivelmente decepcionado.
- Cara eu também estou triste com isso.- Falei sentando ao seu lado e pondo a mão em seu ombro.- Mas não há nada que possamos fazer, pelo visto ele não vai mudar.
- Logo agora que nós estávamos nos dando tão bem, que estávamos tão unidos...- Ele bufou e deitou a cabeça em meu peito. Era raro esses momentos com o Max. Nós sempre fomos muito companheiros, muito amigos, mas nunca fomos de demonstrar afeto um com o outro. Talvez o nosso jeito de ser tenha nos tornado assim. Passei meu braço em volta do seu corpo.
- Mano mas nada entre vocês tem que mudar. Claro que eu continuo não aceitando direito essa relação dele com o Ricardo, eu sei que as coisas não vão se normalizar de uma hora para outra, mas vamos tentar entender o lado dele, ta bom? Também sei que eu me comporto da pior forma possível nessas situações. Hoje mesmo, no calor da raiva acabei batendo nele, mas eu to tentando mudar por ele. Aquilo que aconteceu com ele em frente a escola sempre me traz e sempre me trará de volta à realidade. Sempre me fará lembrar de todo mal que eu lhe causei e de tudo o que ele já passou. Sem contar quando ele me salvou do papai. Eu não posso simplesmente esquecer tudo o que se passou e despreza-lo assim dessa forma agora. Sua mente deve estar um turbilhão de pensamentos, o Gabe precisa de nós mais do que nunca.- Falei e ele se levantou.
- Desculpa mano, mas comigo ele não vai poder contar, eu não tenho estômago para aguentar tudo isso.-Falando isso, saiu do quarto. Bufei e esfreguei as mãos no rosto.
Por incrível que pareça eu já não estava com tanta raiva do Gabriel. Tudo o que ele me falou começou a fazer um pouco de sentido na minha cabeça. Realmente ninguém escolheria ser discriminado por pura vontade de não seguir as regras da sociedade. Comecei a pensar em como seria daqui pra frente. Eu tendo que acobertar o meu irmão para o meu pai, tendo que aguentar ele e o Ricardo juntos e ainda por cima tendo que aguentar o Max e Ele vivendo no mesmo ambiente. Só espero que o Maxwell não fique tao indiferente ao Gabriel. Eles se apegaram tanto esses últimos dias... Tenho certeza que o Gabe vai se sentir mal com isso.
Sai do quarto dos meninos e fui para o meu. La fiquei pensando em tudo o que o Gabriel me disse. Só que ainda faltava eu tirar algumas coisas a limpo dessa historia com o segundo elemento: O Ricardo. Mas ele que me aguarde amanhã. Nossa conversa será longa e talvez dolorosa, pra ele.