Quem não gosta de uma coca geladinha e ultra-cancerígena? Do cheiro tóxico da gasolina? Da lasanha nas sextas e sabados que um dia vai te matar de colesterol? Eu tenho tudo isso. É tudo que um cara como eu precisa. E sabe o que mais eu tenho? O chato do Alex!
Alex era a praga da sociedade, o trazeiro da imundície decadente, um desprovido de massa encefálica, um canalha mulherengo, um covarde... E o meu melhor amigo. O conheço desde que nasci - literalmente. Nascemos no mesmo dia, hospital e hora.
O que me diferencia de Alex:
✳Eu me chamo Rafael;
✳Sou meio bixa quando se trata de esportes;
✳Não tenho pais legais;
✳Não tenho uma coleção de tênis descolados (meu primeiro ato desonesto na vida foi furtar um de seus tênis. Não faz diferença pra ele);
✳Não tenho sonhos eróticos com Alice Sabatini(a líder das piranhas da minha escola)
✳Tenho manias malucas no grau "como cachorro-quente com garfo e faca";
✳Não sou um bombadão convencido;
✳Sou um nerd magricela;
✳Odeio o Capitão América;
✳Sou um merda de um virgem. E do pior tipo. O que nem nunca pôs a boca no meio das pernas de uma garota. Nem nunca pôs a boca em lugar nenhum.
Para Alex ele é BV, pois BV, para ele, significa que você não pôs sua boca no P. de um cara ou na V. de uma mina, palavras dele próprio. Ele não diria isso, usaria palavras como p****a e b****a. Tais termos lhe caiam bem na boca. Mas seus pais não eram fãs de palavrões e paradoxalmente eram fãs de educação sexual, porque, vamos combinar, educação sexual sem palavrão é a coisa mais sem graça do mundo, fora o constrangimento de ter que falar sobre isso com os pais. Ninguém quer falar sobre isso com os pais. Para evitar os palavrões era usado o antigo código/truque de falar com as iniciais. Você deve estar se perguntando como um marmanjo encrenqueiro julgado um pegador nato pode molhar a calça de medo dos pais. Isso é porque você não o viu se deparando com criaturas rastejantes.
Agora a pergunta que não quer calar: se Alex é tão idiota assim, por que ainda continuo o seguindo por aí como uma sombra? A explicação para essa questão se divide em quatro etapas: conhecidos, amigos, melhores amigos e o que eu chamo de meu brother.
CONHECIDOS
Nossas mães se conheceram no hospital em que nascemos. Quando fiz dois meses, sem ter conhecimento, mudamos para o mesmo bairro onde viviam Alex e seus pais, Nicolau e Margarida. Eles disseram que foi todo esse lance de destino, forças além da compreensão etc. Passamos por uma fase de "não vamos ser amigos só de birra por nossas mães".
O que o destino quis nos dizer. Essa parte é hilária. O destino não quis nos dizer porra nenhuma, ele quis bancar o Robin Hood. Deixe que eu explique. Minha família era sustentada por meu avô, um ricasso só. Meu pai não passava de um sonhador. Acontece que meu avô morreu e o seu dinheiro foi dividido entre seus três filhos. Meus pais torraram todo o dinheiro da parte da minha mãe com viagens ao exterior. Ao contrário, a família de Allex ficou rica através do investimento em um novo produto revolucionário no mercado dos cosméticos. Com o dinheiro Nicolau criou uma nova empresa, uma transportadora, uma prestadora de serviços que oferece transporte de mercadorias à outras empresas.
Mais tarde, não agüentando a pressão da vida de classe média baixa beirando à pobreza, papai e mamãe fizeram sua última viagem de que temos notícia. Eu e minha irmã mais velha (Andressa) ficamos com nossa tia, irmã de nosso pai.
AMIGO
Era um sábado quente, dia de churrasco perto da piscina. Meus pais ainda não haviam gastado todo nosso dinheiro. Eles nunca foram muito atentos. Lembro direitinho. Eu tinha oito anos, brincava com um dos meus falsos amigos.Sabe quando você tem um "amigo" que só apronta com você e ainda fala mal? Não, não é amigo falso, é falso-amigo mesmo, pois até ele acredita que é seu amigo de verdade. Ele se chamava Arthur. Athur resolveu testar minhas habilidades com a natação, sabendo que eu não tinha habilidade nenhuma com esporte algum, vejam só. O incrível foi que Alex foi o único que viu um garotinho sendo jogado na piscina quando não sabia nem o básico para nadar. Ele foi meu herói pela primeira vez. Também distaco a inveja e a vergonha que senti dele por saber nadar e eu não.
MELHOR AMIGO
Eu brincava meio que forçado com Alex, pois não havia nada para fazer mesmo, além de que ele era bastante popular e poderia me ajudar nesse quesito, porque eu já era considerado o mais tímido entre os tímidos do bairro, quando a vi desfilando pela calçada. Ela não desfilava de fato, mas na minha cabeça, era uma super modelo. Pode parecer meio racista a comparação, mas sua pele era tão sedutora quanto chocolate, lembrava muito.
- Olha lá que morenaça essa Carol - disse Alex, que já dava sinais de prodígio no ramo da paquera - Por que você não fala com ela, Rafa? Você sempre fica aí olhando e não faz nada.
- Eca! Garotas são nojentas - falou um tal de Gustavo. Ou será Guilherme? É Guilherme.
- Você é um viado, Guilherme - disse o outro garoto. Samuel.
- Não sou viado não senhor. Você é que fica de conversa com o Dudu.
- O que tem o Duzinho?
- Hummm Duzinho, hein Samuel - provoca Paulo.
- Todo mundo sabe que o Dudu é bixa, Samuel. O meu pai me disse. Ele é maior e sabe dessas coisas.
- Se ele sabe tanto dessas coisas, como você nasceu? - Alex zombava em vão, só ele entendia aquilo. Ele era o mais esperto quando se tratava de sacanagem. Não contrate babás ou empregadas bonitas em uma casa onde mora alguém como esse garoto, não importa a idade - Parem de brigar! Eu quero ouvir a resposta do Rafa. Fala aí, Rafa. Vai ou não?
Me senti um lobo marcando sua presa. Ela era mais alta que eu, era magra, tinha volumosos cabelos cacheados, longos cilios naturalmente escuros em um par de olhos verdes e lábios carnudos de dar água na boca.
Carol (Ana Carolina) sempre soube bem o que queria. Mas me diga como um garoto tolo como eu adivinharia? Tudo que eu queria era conversar um pouco, poxa! Ela me mandou cair fora porque estava assustando as meninas? Nisso eu concordo, não estava falando coisa com coisa, o que me fez parecer um louco. Eu fiquei sem reação, forçando-a a ter que me tirar a força. Apanhei de uma garota de dez anos.
- Não chora, Rafa. Você não é homem não?
- Alex - chamei entre soluços.
- Fala, Rafa.
- Não conta. Não conta que eu tô chorando, por favor.
- Não vou contar, Rafael. Não chora não, tá? Você é meu melhor amigo. Não vou contar.
MEU BROTHER
O nome dele - um garoto com um jeito esquisito - era Carlos Eduardo, vulgo Dudu, Edie ou Duzinho. Nunca Edu. Seria hetero demais para ele. Pois bem. Carlos Eduardo tinha cabelos longos e lisos à altura do meio das costas, o deixando uma mocinha, atraindo a atenção de alguns garotos. Não os julgue, eles eram muito jovens e burros. Agora continuam sendo jovens e burros, só que maiores. O caso é que a mocinha se sentiu confiante o suficiente para fletar com todos os JOVENS BURROS que encontrasse pela frente.
Estava lá eu, na agonia dos tempos sem fim (vontade de fazer xixi), tentando encontrar um banheiro para descarregar meu reservatório de dez carros-pipa, culpa da - desculpe todos os educadores de todas as eras - professora mais escrota que o mundo já viu, que não nos deixava sair durante duas aulas, quando meus olhos alcançam seu objetivo, e não só ele. Vamos dizer que o banheiro estava um tanto cheio demais.
Já ouviu falar na expressão"três é demais"?
Talvez essa tenha sido a coisa mais traumática que já me aconteceu na infância, incluindo as férias prolongadas dos meus pais, durando até hoje. Entrei no banheiro, me deparando com... Homofobicamente falando, a coisa mais nojenta que um homem ou garoto poderia ver: um pirralhão gigante de treze anos agarrando um travesti mirim franzino de Onze. Onze! Isso mesmo, Onze anos de idade. Onze e TREZE anos!
- Eu não queria... - tentei.
- Não vai querer apanhar também, não é? - pergunta retoricamente o garoto mais velho.
•••
A sala parecia vazia. A olhava do lado de fora. De jeito nenhum ousaria entrar depois do que vi. Não conseguiria olhar na cara de Carlos Eduardo sem sentir repulsa. Visto que estava vazia - assim pensei -, entrei. Me enganei feio. Justo quem eu não queria encontrar. Eduardo andava agarrado aos livros, com seu trazeiro rebolante, na direção da porta. Ao me ver, para.
- Oi - ele falou primeiro.
- Oi.
- Estava te esperando. Pensei que fosse embora sem a mochila.
- Obrigado - disse rápido, dando a volta na mesa da professora, mantendo distancia. Peguei a mochila e caminhei o mais rápido que pude, quase correndo - até mais.
- Espera um pouco - gritou -tenho que falar com você.
- Eu... Eu não quero.
- Não conta, por favor.
- Não contar o que? - me fiz de desentendido.
- Por favor - insiste - meu pai vai me bater - já chorava à tal altura em tal grau.
- Eu não sei - não pude evitar um breve riso debochado ao ver aquela bixinha implorando de joelhos.
Não me leve a mal. Eu só era muito JOVEM e BURRO.
- Não faz isso comigo. Não quero a.... Ahh... apanhar - gagueja, soluça.
- Homem não pode beijar homem, Dudu.
- Mas eu... gosto - ele fez uma cara que eu até me comoveria, se não fosse tão JOVEM e BURRO.
- Você quer ser chamado de baitola?
- Não me importo - deu-me os ombros - E isso não é da sua conta.
- Eu não vou contar, tá legal?! - disse, perdendo a paciência, em um tom por pouco não exagerado.
- Promete? - um sorriso de alívio começa a estampar seu rosto, pintando-se aos poucos - Promete? - repetiu a pergunta, não obtendo resposta - Está me ouvindo? Você promete? - torna a perguntar. Seu dedo mindinho estava dobrado, esperando oficializar o juramento.
- Não vou fazer isso?
- Por que não?
- É coisa de piralho e...
- E o que?
- Não quero que me toque.
- Ah - ele se encolhe e volta a me dar as costas - Desculpa.
- Você entende, não é? Eu sou homem - concluo.
•••
Pulando as bobagens de uma tarde e noite nada comuns com minha tia e irmã, na escola corria o boato de Carlos Eduardo e o outro garoto no banheiro. A primeira coisa que fiz, tirando a ideia de um episódio de castores pirados, foi tomar uma decisão séria, sericima: eu iria me mudar para o Canadá no mesmo dia se tivesse chance. Não pude evitá-los por muito tempo. O garoto surge como um relâmpago, do nada, e pula em cima de mim.
Nariz sangrando, os dois olhos roxos, corte no rosto, dor de barriga devido aos socos nesta região. Isso tudo teria acontecido comigo se Alex não tivesse se metido e apanhado por mim. Ele foi meu herói pela segunda vez. O garoto mais velho foi expulso e os pais de Carlos Eduardo ficaram sabendo do banheiro. Ele praticamente foi exilado do estado pelos pais do garoto, que ameaçaram seus pais. Dudu não disse uma palavra para defendê-lo, pelo contrário. Eu, sabendo que Carlos Eduardo não era tão vítima assim, também não ajudei, um golpe na minha consciência.
Vamos contar. Eu tinha onze anos quando minha amizade se firmou de verdade com Alex. Agora tenho meus quinze anos (quase dezesseis) no ensino médio. O pior é que está sendo divertido. Só tenho um amigo, porém um certo alguém insistiu tanto que estou pensando mesmo em adcioná-lo à minha humilde lista de uma pessoa, seriam duas. Thiago Leandro pode não ter uma combinação de primeiro e segundo nome muito legal, entretanto, ele... Ah, ele... Ele era o cara mais legal que conheço. Meu melhor amigo não podia nem sonhar em competir com ele. Sabe aquele cara generoso, parceiro, derretedor de corações? TL era o cara! Há quem diga que ele faria um ótimo par com Alice. Nem pensar! Alice era... Deixa pra lá. TL tinha músculos para dar e vender, Alice tinha... O que ela tinha mesmo? Ele não nasceu assim, se quer saber, ninguém nasce. Foi no nono ano do fundamental. Eu e Alice estavamos no oitavo. Todos eram loucos por Alice. Infelizmente, Thiago estava entre os loucos. Foi preciso apenas que Alice trouxesse uma revista com um cara sarado e falasse que esse era seu tipo de homem. Uma pirralha de treze anos. Por sua própria sorte, Thiago Leandro se curou da doença de querer flertar com Alice.
Alice era rica e gostava de pessoas igualmente ricas. Seu passatempo favorito era correr atrás de TL e dar foras em Alex. Thiago tinha mais dinheiro e músculos. Ela achava que tinha sua própria bixa particular (Carlos Eduardo). Carlos Eduardo era a falsidade em pessoa, só tinha uma amiga, minha paixonite de infância (Carol).
•••
Alex segurava uma das minhas mãos e Andressa a outra para atravessar a rua. Um carro de cor preta, não lembro o modelo, parou no cinal, ao nosso lado. Os vidros da janela abaixaram-se. No banco de trás sentava uma garota loira com vestido rosa e óculos escuros . Ela estava vestida como uma pequena adulta. Seus lábios eram vermelhos e bem desenhados. Ela riu ao perceber que eu estava babando.
- Oi, Alex - ela disse e o carro partiu.
- Oi e até mais, Licinha!
- Quem era aquela garota?
- Nem vem, eu vi primeiro. Aquela é minha namorada, tá ouvindo Rafael?
- É sério?
- É claro que sim - empina o nariz todo convencido.
- Não liga pra ele, Faelzinho. Já disse que esse menino é um mentiroso. Não acredite em nada do que ele diz.
- Tá, mana.
- Deixa de ser viadinho, Rafa.
- Onde você aprende essas coisas, garoto? Vou contar pra sua mãe.
•••
No meio de tudo isso eu era a vítima de um amigo - com tênis legais que eu não resisti em pegar quando davam sopa debaixo da cama - que me colocava em situações constrangedoras para me conseguir uma namorada antes da formatura. Suas regras consistiam em seguir cinco níveis misteriosos que ele um dia anotou em seu caderno, depois passou para o celular, com gráfico e tudo. Pelo que entendi, cada garota tinha uma certa quantidade de algo que iria ser usado como critério a ser medido em cinco níveis, contendo normas diferentes para cada nível: o que se pode fazer, o que é necessário fazer e o que não fazer em hipótese alguma. Não preciso dizer que acho tudo isso uma palhaçada.
•••
- Ok Rodrigo, você foi muito bom. Por hoje é só.
- Já disse que meu nome é Rafael.
- É? Você tem cara de Rodrigo, talvez até de Matheus.
- Posso ir agora?
- Não, espere.
- O que é agora?
- Você tem mais cara de Arthur, é isso.
- Isso não vai prestar, Otávio.
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