Queridos Pai e Mãe,
As férias estão acabando. Consegui matricular meus irmãos em uma escola particular. Claro que conferi a grade de atividades, caso contrário, a Giovanna me mataria! Eles estarão em boas mãos. Prometo que cuidarei deles.
***
Sempre fui uma pessoa matutina. Esse hábito veio do meu pai, que acordava pontualmente às seis da manhã para trabalhar. Acho que a rotina dele acabou se enraizando em mim. Mesmo em Manaus, consegui manter esse costume e, logo ao amanhecer, já estava de pé.
Levantei disposto a começar o dia e fui direto ao quarto da minha tia. Para minha surpresa, a cama estava vazia. Onde será que ela tinha ido tão cedo?
Desci até a cozinha, peguei duas panelas pesadas e, sem piedade, comecei a bater uma na outra. O estrondo ecoou pela casa.
Por alguns minutos, me senti uma versão masculina da icônica "louca das panelas" do Big Brother Brasil, aquela que a produção adorava colocar nas edições especiais dos melhores barracos do reality. Quase me deixei levar e cantei:
— Aí, aí, aí, em cima, embaixo, puxa e vai!
Mas recuperei o juízo a tempo e mantive minha dignidade intacta, limitando-me apenas a continuar batendo as panelas.
Não demorou para a Giovanna aparecer na cozinha, bocejando e vestindo seu pijama das Meninas Superpoderosas. Seu rosto estava coberto por um creme esverdeado nada convidativo.
— Credo! O que é essa coisa verde na tua cara? — perguntei, fazendo uma careta de nojo.
— Creme de abacate com uvas verdes — respondeu ela, como se fosse óbvio. Sentou-se pesadamente em uma cadeira e cruzou os braços. — Agora, Sr. Yuri, posso saber por que me acordou tão cedo? Não dormi nem oito horas.
Antes que eu pudesse responder, senti uma presença atrás de mim. Virei devagar e, para meu susto, Richard estava ali, parado e de olhos fechados.
— Que isso, moleque?! — exclamei, assustado. — Desde quando você tá aí?!
— Estou acordado… — murmurou ele, abrindo os olhos de repente, como se tivesse despertado de um transe.
— Sei… — retruquei, desconfiado.
Sem rodeios, fui direto ao ponto:
— O aniversário da tia Olívia é nesta quinta-feira…
Antes que eu pudesse continuar, Giovanna me interrompeu com um tom de puro sarcasmo:
— Ebaaa! Que emoção… Posso voltar a dormir agora?
Suspirei, lançando-lhe um olhar de reprovação.
— Pensei que vocês fossem mais gratos. A tia Olívia é a única razão pela qual não fomos mandados para um orfanato. Ou vocês preferiam ter ficado com a nossa querida vovó?
Eles se entreolharam, e a expressão de Richard mudou instantaneamente. Ele finalmente despertou por completo.
— Não, na vovó não! — gritou desesperado, arregalando os olhos.
Nosso único parente vivo além da tia Olívia era a mãe da nossa mãe, a temida Brunete de Assis Cervatti. Mulher de militar e verdadeira dama de ferro. Criada sob uma disciplina rígida, sempre nos tratou como se fôssemos recrutas de um exército. O ponto crítico foi quando obrigou Richard a ficar ajoelhado no milho por meia hora e me enviou para um hospital psiquiátrico depois de uma briga. Foi a gota d’água para a tia Olívia, que nos proibiu de passar as férias de verão com ela.
— Não precisa pegar tão pesado, Yuri — resmungou Giovanna, massageando as têmporas. — Tá bom, vai… Qual é o plano?
Sorri, satisfeito por finalmente ter a atenção deles.
— Vamos organizar uma festa surpresa para a tia Olívia. Algo simples, com poucos amigos, mas especial. E claro, vamos comprar um presente pra ela.
O único problema?
Dinheiro.
Como éramos adolescentes sem fonte de renda fixa, tive que ser criativo. Vasculhei minhas coisas e separei alguns itens que poderiam render uma grana: um MP4 antigo, alguns objetos de decoração e um celular quebrado. Como Brutus sempre conhecia alguém que “resolvia qualquer coisa”, pedi sua ajuda para vender os itens.
Mas não bastava só dinheiro. Precisávamos garantir que os amigos e colegas de trabalho da titia comparecessem à surpresa.
Foi então que fiz algo inédito na minha vida: baixei um aplicativo de mensagens e, pela primeira vez, entrei no grupo “Top Four” — que agora, com minha inclusão, havia se tornado “Top Five”. O grupo tinha sido criado pela Ramona, que me convenceu a participar. Confesso que não lia muitas mensagens, mas gostava de ficar ali admirando discretamente as fotos do José Eduardo.
Mandei um áudio explicando a ideia da festa, e, para minha felicidade, todo mundo topou ajudar.
Nosso primeiro passo foi ir até o local de trabalho da tia Olívia para convidar seus colegas. Como eu já sabia o nome da empresa, peguei um Uber com Zedu e Giovanna e seguimos para lá.
Chegando ao prédio, impressionei-me com a estrutura do lugar. A empresa era grande, mas não demoramos a encontrar o setor jurídico. Depois de uma rápida conversa com a coordenadora, ela nos encaminhou ao Carlos, o estagiário da titia.
Na porta de uma das salas, uma placa indicava:
Olívia de Assis Cervatti
Respirei fundo e entramos.
Carlos nos recebeu com um sorriso simpático. Mas antes que eu pudesse explicar o motivo da nossa visita, Giovanna, sem qualquer filtro, soltou a pergunta mais inconveniente possível:
— Você não é muito velho para ser estagiário? Pensei que os estagiários fossem mais novos.
Revirei os olhos e apertei o braço dela discretamente.
— Giovanna! — ralhei, baixinho.
— Desculpa, Carlos. Ela bateu a cabeça quando era pequena — justifiquei, tentando remediar a situação.
Felizmente, Carlos levou na esportiva.
— Tudo bem. Crianças são crianças, né? — disse, bagunçando o cabelo dela de brincadeira. Giovanna fez uma careta engraçada e se afastou.
Depois do momento constrangedor, finalmente expliquei nosso plano:
— Então, Carlos… Sei que minha tia trabalha aqui há pouco tempo, mas gostaríamos de convidar algumas pessoas da empresa para celebrar o aniversário dela.
Ele pareceu genuinamente surpreso e animado com a ideia.
— Puxa, que legal! A Olívia é muito querida aqui. Vou observar com quem ela tem mais contato e te aviso. Me passa teu número?
Pegou o celular e aguardou enquanto eu ditava meu contato.
O primeiro passo estava dado. Agora, era só garantir que o resto do plano desse certo.
Enquanto estávamos ocupados tramando uma bela festa para a tia Olívia, ela, sem imaginar nada, estava diante de um juiz, defendendo a empresa em um processo trabalhista. Era uma audiência importante, e sua argumentação afiada conseguiu livrar seu chefe de pagar uma bela quantia em indenização.
Após o encerramento da sessão, enquanto organizava seus papéis, ela foi surpreendida por uma abordagem inesperada. O próprio juiz do caso, Orlando Ventura, veio até ela com um sorriso discreto e um olhar interessado.
Nunca vi minha tia apaixonada. Imagino que, se um dia isso aconteceu, ela tenha sido do tipo que sofre calada — ou seja, é algo de família. Mas, naquela terça-feira, algo mudou. Orlando conseguiu chamar sua atenção de uma maneira diferente. Talvez fosse a postura confiante, o olhar firme ou, quem sabe, o terno impecável que parecia ter sido feito sob medida.
A conversa entre eles fluiu naturalmente. Nada forçado, nada exagerado. Apenas um diálogo entre duas pessoas que se respeitavam e se admiravam. No final, Orlando, com a tranquilidade de quem sabe o que quer, pediu o contato dela para um café.
E para a surpresa geral da nação?
Ela deu.
Sim, minha tia, sempre tão reservada e cautelosa, decidiu dar uma chance ao juiz. E, convenhamos, não é todo dia que uma autoridade convida alguém para sair.
Enquanto a titia vivia seu momento de possível romance, Brutus estava empenhado na missão de vender alguns dos nossos pertences. Ele era um verdadeiro mestre da negociação, e, no final do dia, conseguiu arrecadar a impressionante quantia de R$ 550.
Dinheiro suficiente para pagar tanto o presente quanto a festa.
Eu quase pulei no pescoço dele e dei um beijo na boca de tanta alegria, mas me contive. A demonstração de gratidão ficou apenas no campo das ideias.
***
Na manhã do aniversário da tia Olívia, acordei cedo, como de costume, e preparei um café da manhã caprichado para ela. Queria que o dia começasse especial.
A mesa ficou impecável: bolo de fubá fofinho, pão doce de goiaba recém-saído da padaria, suco de laranja natural, café fresco e leite de búfala. Tudo disposto de maneira elegante, quase como um banquete matinal digno de um hotel cinco estrelas.
Quando a titia apareceu na cozinha e viu aquilo, seus olhos brilharam.
— Puxa... Está tudo tão bonito! Você realmente caprichou, hein?
Sorri, satisfeito.
— A senhora merece, tia.
Ela se sentou e começou a servir-se. Enquanto cortava um pedaço do bolo de fubá, comentou:
— Por falar em merecer, vou comprar um bolo mais tarde, quando estiver voltando, e...
Eu precisava impedir isso sem levantar suspeitas.
Hora de ativar o Yuri Ator, aquele que existia dentro de mim apenas para momentos críticos como este.
Adotei uma expressão de leve desconforto e comecei a improvisar:
— Então... Sobre isso... Tipo, a gente combinou de assistir a um filme na casa da Letícia. Os pais dela convidaram a Giovanna e o Richard também. Eu... Eu acabei esquecendo do seu aniversário e...
Atuação digna de um Oscar!
Ela riu e balançou a cabeça.
— Ah, tudo bem. Um amigo me convidou para um café. Prometo que chego antes das dez da noite. Mas vocês, por favor, estejam em casa às nove, ok?
— Pode deixar, tia.
Mal sabia ela o que a aguardava.
Durante a tarde, começamos os preparativos.
Fomos até a loja de festas comprar balões e materiais para a decoração. Ramona e Letícia foram indispensáveis nessa missão e, de quebra, tiveram que aguentar a Giovanna, que virava uma verdadeira ditadora quando se tratava de decoração.
Enquanto isso, Zedu e Brutus foram até um SPA no bairro vizinho. Queríamos garantir que a tia tivesse um dia relaxante antes da festa.
Quando chegaram ao local, Brutus não perdeu tempo e, como sempre, fez o possível para impressionar a atendente.
— Oi, gatinha! Tudo bem? — perguntou ele, encostando-se à mesa de atendimento e piscando para a moça.
Zedu revirou os olhos e o empurrou sem cerimônia, quase derrubando o amigo.
— Boa tarde — disse Zedu, ignorando a cena. — Queremos fazer uma reserva.
A atendente, profissional, abriu um caderno e perguntou:
— Em nome de quem?
Zedu conferiu o celular antes de responder:
— Olívia Gusmão Cervatti. Queremos o pacote completo, incluindo esfoliação de pele.
A reserva foi feita com sucesso.
Enquanto isso, em casa, a organização continuava. Giovanna ficou responsável por arrumar a mesa dos doces. Richard… bem, Richard foi convenientemente deixado no quarto para evitar confusões. Claro que deixamos água e uns pedaços de pão (brincadeira... ou talvez não).
Mais tarde, os garotos voltaram para casa carregando as últimas compras: bolo, salgadinhos e a torta salgada favorita da tia Olívia.
A lista de convidados era reduzida, então, a quantidade de comida parecia suficiente.
Quando vi o resultado da decoração, tive que admitir: Giovanna realmente fez um ótimo trabalho. Claro que eu jamais inflaria o ego dela. Desde que, há quatro anos, ela tirou nota baixa em um projeto de ciências, tem sido difícil lidar com o orgulho ferido dela.
A cena ainda estava viva na minha memória: um vulcão feito de papel machê, cuidadosamente montado para simular uma erupção perfeita. No grande dia, a lava improvisada borbulhou conforme o esperado, mas, por algum motivo, a professora não se impressionou e deu a Giovanna um 6.
Nem preciso dizer que foi um caos total, né?
Agora, restava apenas uma coisa: esperar a tia Olívia voltar para casa e ver sua reação.
Afinal, fazia anos que não comemorávamos seu aniversário direito. Ela merecia algo especial.
E, desta vez, tínhamos certeza de que seria inesquecível.
No escritório, minha tia revisou os últimos documentos do dia, garantindo que tudo estivesse em ordem antes de sair para encontrar Orlando. Apesar da seriedade da sua rotina, naquela noite, algo estava diferente. Havia um brilho sutil em seu olhar, uma leveza incomum.
Enquanto isso, do outro lado da cidade, Carlos me ligou.
— A andorinha está de saída.
Fiquei um instante sem entender.
— O quê?
— A andorinha, cara. A tia Olívia já saiu!
Ah, certo! O código.
Imediatamente, avisei aos meus amigos que já estavam posicionados. Agora, era apenas uma questão de esperar os cinco colegas dela do escritório chegarem, e pronto. O plano estava montado.
Surpresa garantida.
No estacionamento, minha tia teve dificuldades para abrir o carro. Praguejou baixinho, mexeu na chave, tentou de novo. Sorte dela que Orlando apareceu nesse momento e, com um sorriso charmoso, ofereceu ajuda.
— Parece que seu carro está te testando hoje. — comentou ele, segurando a chave com firmeza e destravando a porta.
Ela riu.
— Acho que ele sabe que estou atrasada.
— Então, melhor não perder mais tempo. Vamos?
E assim, seguiram juntos no carro da minha tia até um café elegante, do tipo que tem música ambiente e garçons que parecem modelos de revista.
Lá, entre uma conversa e outra, ela mencionou, casualmente, que era seu aniversário. Orlando, sem hesitar, chamou o garçom e pediu um bolo. Um gesto simples, mas que fez minha tia sorrir de verdade.
Após o café, decidiram passar em um mercado. Titia queria comprar um bolo maior para comemorar com os sobrinhos. Mas, ao invés de voltar para casa imediatamente, ficaram no estacionamento bebendo algo em copos plásticos, rindo como dois adolescentes que acabaram de matar aula.
— Passar o aniversário bebendo em um estacionamento de supermercado, com um copinho de plástico... — Orlando ergueu o copo, divertido. — Aposto que essa é a melhor festa que você já teve.
Minha tia sorriu, balançando a cabeça.
— Confesso que já tive outras mais badaladas... Mas a companhia está boa.
— Pontos para mim, então.
E, num gesto ousado, Orlando a puxou suavemente e a beijou.
Ela não hesitou. Retribuiu na mesma intensidade.
Depois do beijo, ajeitou o cabelo e olhou para o relógio.
— Meus sobrinhos ainda não estão em casa. Eles devem chegar só umas nove da noite.
Orlando arqueou a sobrancelha, satisfeito.
— É mesmo?
Enquanto isso, em casa, eu já estava ficando nervoso com a demora da titia.
— E se ela não aparecer? — resmunguei para Giovanna.
Antes que ela respondesse, ouviu-se um barulho do lado de fora. Giovanna saltitou até a janela, espiou e virou-se com um sorriso travesso.
— O carro dela acabou de estacionar.
Num piscar de olhos, apagamos todas as luzes. Todos ficaram em silêncio absoluto.
A porta se abriu.
— Hmm... Tá escuro. — a voz da titia ecoou pelo ambiente.
O que veio a seguir foi um choque coletivo.
Ela e Orlando entraram na casa... aos beijos.
Ele já tinha tirado o terno, enquanto ela desabotoava a blusa.
No mesmo instante, Zedu ligou as luzes.
— SURPRESA!
Mas as palavras morreram em nossas bocas assim que compreendemos o que realmente estava acontecendo.
O silêncio foi sepulcral.
Minha tia e Orlando congelaram no meio da sala, a expressão de choque estampada nos rostos. Orlando, num reflexo automático, deu um sorriso amarelo e se afastou minimamente dela.
Giovanna, que estava com um punhado de confetes na mão, encarou a cena e, sem saber o que fazer, simplesmente soltou um hesitante:
— Surpresa...
Os confetes caíram sobre minha tia como se estivessem zombando da situação.
Meu cérebro gritava para que um meteoro atingisse a Terra naquele exato momento.
— Surpresa, tia... Feliz aniversário. — murmurei, torcendo para evaporar no ar.
A vergonha queimava cada célula do meu corpo.
E se eu estava me sentindo assim, nem queria imaginar o que se passava na cabeça da minha tia.
Depois de um longo e constrangedor silêncio, alguém puxou novamente os parabéns. Afinal, como disse Brutus em outra ocasião: o que é um pouco de merda para quem já está todo cagado, né?
Quem claramente não gostou nada do que viu foi Carlos.
Ele se aproximou da minha tia, desejou um curto feliz aniversário e se afastou. Passou o resto da noite interagindo apenas com os colegas do escritório.
Na hora de servir o bolo, peguei uma fatia e fui até minha tia.
— Dá essa para o Carlos.
Ela assentiu, caminhou até ele.
— Carlos, aqui.
Ele aceitou, sem muito entusiasmo.
— Obrigado. Estou indo.
Minha tia hesitou.
— Olha, sobre o que aconteceu, eu...
— Tudo bem. — Ele deu um sorriso educado, mas distante. — Sou apenas um estagiário. Sei como essas coisas funcionam. Obrigado pelo convite.
E saiu.
Aos poucos, os convidados começaram a ir embora.
No final da noite, a bagunça sobrou para mim — quer dizer, meus amigos ajudaram também. Ainda era estranho para mim usar essa palavra: amigos.
Depois de arrumar quase tudo, ficamos jogando conversa fora na calçada.
— Gente... Obrigado. Vocês me ajudaram muito hoje.
Brutus riu e me deu um tapa no ombro.
— Para com isso, grandão. Foi uma festa chibata que só! Aliás... — ele inclinou a cabeça e ergueu uma sobrancelha. — Sua tia curte novinhos?
— Cala a boca, abestado! — Zedu deu um tapa certeiro na cabeça dele.
Entrei em casa no modo furtivo.
Nada de sinais da titia.
Encontrei meus irmãos limpando a cozinha, e nos apressamos para terminar logo, evitando qualquer conversa vergonhosa.
De acordo com Giovanna e Richard, a culpa de toda a confusão era minha.
— Ok, em parte foi, mas não fui eu que comecei a me agarrar com um homem na frente de estranhos! — defendi-me.
— Agora você tem que ter uma bola de cristal? — retrucou Giovanna, cruzando os braços.
Ela parou de varrer e fez uma pose tão dramática que me deu vontade de rir.
— Gente, como eu ia imaginar que a tia Olívia entraria em casa se agarrando com um boy magia daqueles?
Antes que eu respondesse, a própria tia apareceu.
— Estou vendo pouca arrumação e muita conversa.
Mais tarde, quando a casa finalmente estava em ordem, fiquei sozinho com minha tia.
Ela suspirou, servindo-se de um whisky.
— Quero morrer. Envergonhei vocês na frente de todo mundo. A gente acabou de se mudar, eu cuido de vocês… O que as pessoas vão pensar?
Dei de ombros.
— Eles não vão pensar nada. A senhora é adulta. Tem sua vida. Quando eu chegava em casa chorando porque me chamavam de baleia, orca ou rolha de poço, o que a senhora dizia?
Ela tomou um gole, sem fazer careta.
— Para você não ligar e nem revidar.
— Então.
Ela sorriu e me puxou para um abraço.
— O que eu faria sem você?
E, para minha surpresa, ofereceu um copo.
— Aceita um whisky?
Ri.
— Não, obrigado. Vou jogar o lixo.
Saí para fora.
E foi então que Leonardo, irmão da Letícia, apareceu.
— Ei. Posso entrar?
Fiquei extremamente nervoso. Nunca antes tinha ficado nu na frente de alguém, e a ideia me deixava em puro estado de pânico. Meu coração acelerou, e senti um frio na barriga tão intenso que parecia que eu ia desmaiar. Respirei fundo e, silenciosamente, rezei para que aquilo terminasse rápido. E não é que minhas preces foram atendidas?
De repente, o som de batidas firmes na porta ecoou pelo quarto.
— Preciso falar com você agora. — anunciou Giovanna, minha irmã, do outro lado da porta.
Lascou-se. Meu estômago deu um nó.
O Leo, num reflexo rápido, pegou suas roupas espalhadas pelo chão e vestiu a cueca com agilidade. Meu olhar percorreu o quarto em busca de um esconderijo viável, e então, encontrei a solução perfeita: o armário. Era espaçoso o suficiente e, como o irmão da Letícia era magro, ele coube perfeitamente ali dentro.
Respirei fundo, ajustei minha expressão para parecer o mais entediado possível e abri a porta.
— O que foi? — perguntei, fingindo desinteresse, mas sentindo meu coração martelando contra o peito.
— Vamos fofocar. — disse Giovanna, com os olhos brilhando de empolgação. — O que a titia falou?!
— Que ficou arrependida. — respondi de maneira vaga, tentando encurtar a conversa.
— E quem era aquele gato? — ela arqueou a sobrancelha, ansiosa.
Ótimo. Exatamente o que eu não precisava naquele momento: minha irmã atrás de fofoca, enquanto um homem completamente gostoso estava escondido dentro do meu armário.
— Giovanna, eu estou exausto. Meu dia foi péssimo e só quero dormir. Amanhã conversamos. — retruquei, fechando a porta na cara dela antes que ela pudesse argumentar.
— Grosso. — resmungou do outro lado antes de voltar para o quarto.
Soltei um longo suspiro de alívio e, só para garantir, esperei alguns segundos antes de abrir o armário. Leo saiu de lá com um sorrisinho malicioso.
— Achei que ia ter que passar a noite aí dentro. — brincou.
Não tive tempo de responder. Ele me puxou para perto, e logo retomamos os beijos ardentes. Meu corpo estava pegando fogo, e qualquer vestígio de nervosismo foi desaparecendo aos poucos. Então, ele tirou uma camisinha do bolso e balançou na minha direção, um brilho divertido nos olhos.
Minha respiração travou.
Nossa. Ia acontecer. Eu ia perder minha virgindade com um cara maravilhoso. Fiquei tão nervoso que minhas pernas começaram a tremer.
Doeu.
Mas, ao mesmo tempo, meu corpo experimentava sensações novas e intensas. Meu coração batia acelerado, cada toque despertava algo desconhecido dentro de mim. Nunca tinha suado tanto na vida. Quando tudo terminou, Leo se recostou na cama ao meu lado e soltou um satisfeito:
— Valeu, foi bom pra caramba.
Segurei o riso. Aquela frase me fez sentir como se tivéssemos acabado de concluir um jogo de futebol. Mas mantive a compostura. Por volta das duas da manhã, ele se vestiu e saiu de casa, de maneira tão furtiva quanto tinha entrado. A tensão daquele momento foi maior do que a do próprio ato.
Deitei na cama, um sorriso bobo se formando em meus lábios.
Manaus, sem dúvidas, era o melhor lugar do mundo.
No dia seguinte, acordei tarde e fui direto para a cozinha preparar um café básico para meus irmãos. Enquanto eu tomava um gole da minha xícara, Giovanna me chamou, animada:
— Olha isso! — disse, mostrando o celular. Era o Facebook. Ramona tinha postado algumas fotos da festa de aniversário. Me aproximei para ver melhor e, sim, estava confirmado: o namorado da titia Olívia era realmente um gato.
Antes que eu pudesse comentar qualquer coisa, Richard apareceu na porta.
— A Letícia tá lá fora. — avisou.
Meu coração parou por um segundo.
Puta merda. Puta merda. O Léo contou para a Letícia. Ela vai me matar. Droga, e agora? Nunca vivi uma situação parecida. Será que ela veio me esfolar vivo? O mais estranho era que ela usava um biquíni absurdamente provocativo. Ok. Letícia ia me matar... usando um biquíni.
Respirei fundo e fui até a sala.
— Vamos para a piscina. Quer ir? Meu irmão Léo vai nos levar. — disse ela, casualmente.
Travei.
O quê?!
— Hum. — soltei, ainda processando a informação.
— Terra para Yuri! — Letícia estralou os dedos na minha frente.
— Posso levar os meus irmãos? — perguntei, tentando disfarçar minha confusão.
— Claro. A turma já está lá. — respondeu ela, despreocupada.
Não perdi tempo.
— Crianças! Dois minutos para pegarem sunga e biquíni. Vamos para a piscina! Não é um treinamento. — gritei o mais alto que pude. — Volto em um minuto!
— Dois minutos? Dois minutos? Preciso ver a cor do biquíni para combinar com a canga e a minha… — Giovanna começou a reclamar.
— Falta um minuto e meio! Rápido! — cortei antes que ela continuasse.
Tudo bem, no final demoramos um pouco mais que dois minutos. Mas nunca vi minha irmã escolher um óculos de sol tão rápido.
Chegamos à casa da tia de Letícia antes do meio-dia. O sol estava impiedoso, brilhando com toda a força. Passei protetor nos meus irmãos e fui até o banheiro trocar de roupa. Escolhi minha bermuda azul estilo surfista, aquela que cobria bem o meu cofrinho. Voltei para a piscina e o pessoal já estava animado.
— Vai lá, grandão! Pula com tudo! — gritou Brutus, jogando água na minha direção.
— Vem, cara! — Zedu chamou.
Ah, Zedu... Podia passar o dia inteiro te beijando. Mas naquele momento, meu foco era outro. Leonardo estava uma delícia. A sunga vermelha destacava sua pele bronzeada e, meu Deus, que peitoral incrível. Mergulhei na piscina e me aproximei dele para bater um papo.
As meninas tomavam sol, enquanto Richard e Brutus tentavam se equilibrar no slackline. Então, Zedu nadou até nós.
E foi aí que minha mente divagou para um pensamento perigoso.
Já imaginou uma transa entre nós três? Seria um novo presente do universo.
— Segura, Yuri! — alertou Zedu, jogando água no meu rosto.
— Bobo. — resmunguei, rindo.
— E aí, Zedu? Ainda está namorando a Alicia? — perguntou Leo.
Travei.
— Você tem namorada?! — minha voz saiu mais surpresa do que eu gostaria. — Que bom. Legal. — ativei meu modo Yuri Ator para disfarçar.
Leo se virou para mim, um olhar intenso.
— Ei, Yuri. Vou pegar algo para beber. Me acompanha? — perguntou, saindo da piscina.
— Claro. — falei, tentando esconder o nervosismo. Olhei uma última vez para Zedu e saí.
Fomos até um quarto vazio.
Leonardo pegou uma camisinha na mochila. Meu corpo incendiou. Ele me puxou com força, e nos beijamos com intensidade. Estávamos suados, o que deixava tudo ainda mais quente. Então, ele sussurrou algo que me fez estremecer.
— Quero te sentir de novo, gostoso.
Meu corpo inteiro arrepiou.
— Eu... Eu... — foi tudo que consegui dizer.
E então, me entreguei completamente.
Email: escrevoamor@gmail.com
O próximo capítulo saíra na sexta-feira, dia12 de agosto. Um super abraço!