Eu sabia que estava sendo extremamente egoísta mas eu não tinha ao que mais recorrer. Eu já havia fumado, bebido, já havia batido o carro propositalmente – afinal, eu queria estar junto dele, como deveria ser – e muito mais coisas que me embrulham o estômago só de lembrar.
Conheci ele há uns 4 ou 5 anos. Eu estava com meus amigos, ele estava com os dele. Foi tudo muito clichê. E olhei pra ele, ele olhou pra mim, ficamos nos encarando, e nos minutos seguintes já estávamos sentados lado a lado conversando animadamente e enchendo a cara. Trocamos telefones e nunca mais perdemos o contato. Até hoje.
2 anos depois, fui a um bar e enchi a cara por não admitir que era gay, por estar apaixonado por ele, e por saber que nunca esse sentimento seria correspondido.
Ele, era hétero, tinha namorada, e estava perdidamente apaixonado por ela. Eu, recém descoberto homossexual.
- Flashback –
- VOCÊ NÃO PERCEBE QUE ELA SÓ ESTÁ TE USANDO PRA CONSEGUIR DAR O GOLPE DO BAÚ? – gritava em plenos pulmões. Meu rosto já estava vermelho, estava suando e minhas veias do pescoço provavelmente saltadas.
- CARALHO! QUANTAS VEZES EU VOU TER QUE REPETIR QUE ISSO É UM ABSURDO, ZACK? EU AMO ELA, PORRA! – ele já estava muito exaltado, passava as mãos freneticamente pelos cabelos, demonstrando que logo-logo estaria me esmurrando.
- MAS ELA NÃO TE AMA! COMO DIABOS TU NÃO VÊ ISSO? – fui andando até a porta e a bati com força. Isso teria que ter um final, bom ou ruim.
- SE ELA NÃO ME AMA, QUEM É QUE ME AMA ENTÃO? PORRA, SE ELA NÃO GOSTASSE DE MIM, NÃO ESTARIA DO MEU LADO! – disse se aproximando de mim já com os punhos fechados.
- EU TE AMO, EU TO DO TEU LADO, SEU MERDA! – gritei o mais claro possível, me sentei na poltrona e afundei o rosto em minhas mãos, deixando as lágrimas e os soluços altos me consumirem.
- Como é? Você só pode estar de brincadeira comigo Zack. É algum tipo de pegadinha? – proferiu com um riso nervoso, começando a vasculhar o quarto.
- Não Andrew, não é nenhum tipo de pegadinha. O seu “amigão” aqui, é apaixonado por você.- sorri sarcástico e fui andando até a porta. Não queria encarar seus olhos e ver o desprezo neles. Encostei a mão na maçaneta, quando ouvi sua voz calma, me fazendo congelar.
- Desde quando? – ouvi um suspiro e logo o som dele se sentando na cama.
- Uns 3 anos e meio. – senti-o suspirar mais alto, e quis sair correndo de lá. Mas algo me impedia.
- Por que nunca me contou?
- Pra você se afastar de mim, me olhar com nojo, e eu perder você de vez pra aquela vadia? Nem pensar. Eu não podia te ter do jeito que sonhava, mas já ter você como amigo, bastava. – enquanto falava me virava para ele, mas preferia ter ficado olhando pra porta, pra não ter a visão dele pressionando as têmporas e negando com a cabeça, como se não quisesse acreditar no que ouvia. Abaixei a cabeça esperando ele começar a falar o quão nojento eu era.
- Zack, por favor, me diz que é mentira – ouvi uma fungada, levantei a cabeça e vi tudo o que eu menos queria presenciar, ainda mais que por minha causa. Ele estava chorando.
- Eu bem que queria dizer que é. – me virei para a porta quando ouvi um soluço. Encostei a cabeça na madeira, sentindo as lágrimas continuarem a escorrer.
Sai correndo porta á fora, ouvindo vários “ZACK! VOLTA AQUI! ZACK!”. Desci as escadas, passei por nossos amigos, vendo-os me olhar confusos, e logo olhando para o alto da escada, onde creio que Andrew estaria. Cheguei à entrada da casa, abri a porta e fui correndo o máximo que podia, atravessando a rua sem olhar para nada, e indo para qualquer lugar. Logo que atravessei a rua, ouvi um último “ZACK”, um estrondo, uma buzina constante e um grito de agonia. Me virei e fiquei estático. NÃO! NÃO! NÃO! NÃO! NÃO! NÃO! NÃO!
- Flashback off –
Andrew morreu em meus braços. Ouvi seu último suspiro, e pude dizer um “Desculpa, eu te amo. Logo eu vou estar junto de ti, meu amor”. Eu queria morrer ali, queria que alguém me espancasse até a morte, até encontrar meu anjo. Passaram-se 3 meses desde o acontecido, e acabei de sair de mais uma tentativa frustrada de me juntar a ele.
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Tentei me levantar, mas como as outras tentativas, foi em vão. Então isso é a morte? E cadê o Drew? Meus pensamentos foram interrompidos por um grande ruído e com um moço alto, loiro, e aparentemente velho, se aproximando de mim.
- Zack Werold, certo? – notei que segurava uma prancheta e uma caneta que chegava a me fazer querer fechar os olhos, de tão luminosa. O olhei com atenção, franzi a testa, e o respondi.
- Sim... – o vi anotando algo e quando ia virar-se para ir, pra não sei aonde, o chamei – ér, senhor? – virou-se pra mim, deu um sorriso gentil e cansado, mostrando ainda mais seu rosto amadurecido.
- Sim, meu jovem?
- Que lugar é esse?
- Bem, aqui é o pós “purgatório”, como na terra é chamado. Logo virão lhe chamar para verificar se está apto a partir, ou se voltará para a terra.
- Mas, eu ainda não morri? – perguntei confuso. Afinal, quando diabos eu realmente vou morrer? To começando a me estressar com isso.
- Não, meu jovem. Levaram-lhe ao hospital ainda com vida, e agora seu corpo está sendo mantido funcionando por aparelhos. Afinal, acho que nem todo mundo te deu as costas, hum? – deu um sorriso tímido e “passou” a mão por um dos vários lados do espaço preto, que logo foi preenchido pela imagem de Ryan segurando minha mão e chorando, enquanto médicos entravam e lhe diziam para sair. Queria ir até lá, o abraçar e dizer que deveria mesmo ir, por que eu deveria morrer. Deveria cumprir com o destino que impus a mim mesmo. Tentei levantar novamente, mas novamente a tentativa foi falha. Sentia-me cansado.
- Moço, por que eu não consigo levantar?
- Por que aqui, enquanto o julgamento não acontece, é um lugar de reflexão, de pensar. Não é exercido esforço. Apenas relaxe meu jovem. Mais alguma pergunta?
- Sim. Onde esta meu Drew?
- Bem. Isso você terá que ver com os próprios olhos, mas não nesse momento. Você só saberá se entrar no mundo de Deus. Ao contrário, voltará a terra e se quiser, continuará com as tentativas de suicídio. – der repente, como mágica, tudo ficou preto de novo. O homem foi embora, me deixando mais confuso do que já estava. Então, é capaz de eu ter feito isso tudo, pra no final nem morrer? Fiz como dito, e relaxei. Ou pelo menos tentei.
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Se eu tivesse um relógio aqui, acho que teriam se passado várias horas.
- Zack?
- Andrew? – olhei para os lados, e nada. “Isso só pode ser coisa da minha cabeça”
- Zack? É você? – a voz dele continuava, mas eu procurava, procurava, e nada. Era pra eu relaxar, não ficar me estressando com a minha possível loucura pós quase-morte – Aqui na tua frente.
Olhei para onde indicava e o encontrei. Meu coração se apertou, meus olhos encheram-se de água e meu corpo paralisou. Era ele. Realmente era ele. Estava com as roupas com que... Fechei os olhos ao pensar nisso e senti lágrimas invadindo meus olhos.
- Andrew... – abri os olhos e o vi perto de mim. Queria levantar e me jogar em seus braços. Do jeito que fazíamos quando nos encontrávamos. Queria lhe pedir desculpas, e dizer que nada era pra ter acabado assim. Mas antes que pudesse fazer ou dizer qualquer coisa, senti um estralo no lado direito do meu rosto, e logo uma pancada de dor. Jura que ele tinha me dado um tapa? – por que você fez isso?
- O que tu ta fazendo aqui? Tem merda na cabeça por acaso? Quando eu te disse que a gente ia ser amigos pra sempre, não importava o lugar, eu não estava querendo dizer que era pra eu morrer e tu me seguir, seu idiota! – ele passava a mão freneticamente nos cabelos, que agora já não estavam arrumados como era de costume. Ele franzia a testa, passava a as mãos em uma sincronia perfeita. Sempre fora assim. Quando ficava nervoso passava as mãos uma vez pra frente, depois pra trás, pra frente de novo, depois bagunçava tudo e arrumava a franja com as pontas dos dedos. Sempre apreciei isso, admirava toda vez que o fazia e sempre me encantava. Tentei me levantar novamente, e por um baita de um milagre, consegui. Andei até ele, peguei suas mãos e as pus para baixo, segurei seus ombros, olhei em seus olhos, e o abracei mais forte do que me lembro de já ter feito.
- Eu te amo tanto – choraminguei enquanto colocava a cabeça na curva de seu pescoço, que agora já não tinha mais o perfume que se impregnava em qualquer lugar que ele passasse.
- Eu também Z. Eu tambémPassaram-se horas, dias, semanas, meses e talvez até anos, desde a última vez que vi Drew. Meu julgamento ainda não aconteceu e eu to começando a me arrepender de ter feito essa escolha. Mas se no final for para eu ficar ao lado de Andrew, tudo valeria a pena.
- Zack? Por favor, me acompanhe. Seu julgamento acontecerá em pouco tempo. – um carinha loiro, simpático e de branco veio me chamar. Lembrava-me muito Chris, mas tinha o rosto muito mais delicado que ele.
Levantei-me e o segui até onde julgava ser uma porta, mas bem mais bonita e “celestial”, do que qualquer outra. Atravessamos aquele monumento e logo dei de cara com uma mesa aparentemente feita de mármore, com seis lugares ocupados por anjos – acho eu – e do lado um banquinho com Andrew sentado. Ele esta de branco e com uma expressão de paz tão serena, que parecia que logo ele levitaria.
- Olá Zack – o loirinho, e um dos supostos anjos se dirigiu a mim, e seu sorriso reconfortante me fez sorrir automaticamente. Até aqui tudo bem.
- Hm, Oi?
- Sou Nick, eu vou conduzir aqui hoje – sorriu mais aberto ainda, e no exato momento, relaxei.
- Ah, ok – soltei um sorrisinho tímido e fui conduzido até um banquinho, perto de onde Andrew estava. Ele olhava fixamente pra mim, e naquela hora, naquele olhar, eu realmente decidi que meu lugar é ao lado dele.
- Bem, então começaremos aqui. Zack, é de sua vontade continuar aqui, ou desejas voltar ao plano terreno? – um dos anjos sentados, se pronunciou. Tinha um rosto delicado, olhos azuis, cabelos negros e ralos, sua boca era uma linha fina o que o deixava ainda mais angelical.
- Bem, Drew está aqui, então quero ficar. – o olhei e vi um sorrisinho surgir em seu rosto, e logo sendo olhado por um deles. Olhou de volta para mim, e depois para Drew. Cochichou algo no ouvido de outro anjo, e se voltou para mim novamente.
- Antes de você decidir realmente ficar aqui, temos que lhe dar um aviso. Andrew está em um estado mais avançado aqui, ele já está se preparando para voltar a Terra, mas no corpo de outra pessoa. Como você só chegou há pouco tempo, provavelmente ele já terá saído daqui quando você entrar no plano que ele está no momento. Ou seja, vocês não se encontrarão mais daqui em diante. Só em outras vidas, se Deus assim decidir.
Como assim? Eu me mato pra ficar com ele pro resto de nossas “vidas” e agora ele me diz que eu não vou ficar com ele? . Olhei pra Drew, que agora me olhava como se estivesse me pedindo para não fazer isso, para não morrer de verdade.
- Mas, eu quero ficar com Andrew, eu não vou conseguir suportar uma vida sem ele – olhei para toda a bancada de anjos, com os olhos marejados, enquanto todos me olhavam serenos, como se isso tudo fosse normal.
- Ele poderá cruzar o caminho dele com o seu, mas nada está definido. Quando uma pessoa, ou no caso duas, morrem por amor, Deus lhes dá o direito de que o indivíduo que volta ao plano terreno possa carregar um “presente” do amado que ficou ao lado do Pai celestial. Mas se os dois ficarem aqui, nada acontece, e o destino de cada um é traçado individualmente, até eles se cruzarem. – um deles se pronunciou, e com isso uma dúvida ficou em minha cabeça. Fico ou não fico? Uma batalha entre minha mente e meu coração estava travada em meu interior, e só se acalmou quando o seu toque a interrompeu. Ele estava parado atrás de mim. A calmaria que ele emanava me envolveu e me deixou leve como uma pena sendo carregada pelo vento. Respirei fundo e o olhei. Ele fez um gesto para que me levantasse e o seguisse. O fiz, indo para um cantinho isolado daquela sala.
- Zack, promete que vai me escutar com atenção? – perguntou parando na minha frente, e segurando minhas mãos. Estremeci com o toque.
- Prometo. – sussurrei e apertei sua mão de leve.
- Vai pra casa, tem muita gente que te ama, que está lá, agoniados, esperando você voltar. Não pense em mim, pense neles. Nossas almas vão estar unidas eternamente, não importa se estarei vivo ou morto, eu vou estar do seu lado, te olhando, te guardando. Não faz essa besteira, Z. – foi falando enquanto acariciava o meu rosto e colava sua testa na minha.
- Mas Dr...- fui interrompido por ele colocando seu dedo sobre meus lábios, me calando.
- Mas nada, Zack. Sua família, seus amigos, todos estão lamentando em como você está. Eles podem ter se afastado por um tempo, mas continuam te amando. Volta pra eles, Z. - e tudo o que consegui fazer foi assentir veemente e chorar. Eu não sabia qual era o poder dele, mas tudo o que me pedisse, eu iria concordar.
- Eu vou sentir tanto a sua falta, Drew. – o abracei com força e com todo o carinho que consegui colocar.
- Eu também Z, eu também. Quando você menos esperar, nós estaremos juntos de novo, de um jeito, ou de outro. – assenti novamente. Ele me soltou e se pôs a andar, me puxando junto dele para frente da bancada, de novo.
- E então, Zack? Decidiu-se? – perguntou o anjo que parecia ser o líder ali, sua voz lenta me fez olhar atenciosamente para ele.
- Sim. Eu quero voltar – suspirei e olhei para Andrew, que continha um sorriso em seus lábios, um sorriso carinhoso, que me fez ter orgulho de mim mesmo, por ser o motivo dele.
- Se assim deseja, então que o faça – se pronunciou um deles e logo um clarão se veio, seguido de um baque, e tudo se escureceu.
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A consciência veio em minha mente. Abri meus olhos, me arrependendo logo em seguida de tê-lo feito. Um clarão branco me pegou, forçando-me a fechá-los logo em seguida. Os barulhos continuavam. Tentei colocar as mãos em meus ouvidos, mas uma dor lacerante me atingiu. De vagar fui abrindo os olhos, e consegui mantê-los abertos. Tudo o que vi foi um quarto branco, com pessoas vestidas com jalecos, minha mãe, meu pai, minhas irmãs e meus amigos. Quis levantar, correr e abraçar todos eles. Fazia tanto tempo que não os via. Tanto tempo que eles não deram as caras pra mim. Logo que abri os olhos, mamãe veio até mim me abraçando, e quando o fez, eu realmente vi quanta falta isso me fez. A apertei contra mim o máximo que pude, já que a dor me impedia. Logo vieram vários médicos e enfermeiros me olharem, fazendo perguntas o tempo todo e colocando agulhas em meus braços.
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Normalmente quando acordo, vou tomar café, faço minha higiene, vou até o jardim pegar o jornal, leio-o com calma e depois vou praticar alguns exercícios. Mas algo me impediu de fazê-los nesta manhã. Uma batida na porta, exatamente quando descia as escadas, me pegou desprevenido. Terminei de amarrar o roupão, peguei as chaves da casa e me dirigi à porta, deschaveando e logo a abrindo. Olhei por tudo e não vi nada, quando ouço um pequeno bocejo vindo de baixo. Olho para onde o som vinha e meu coração amoleceu. Dentro de uma cestinha, envolvido em uma manta azul-claro, tinha um bebezinho, sonolento e pequenino. Abaixei para olhá-lo melhor e um déjà vu me pegou. Era igualzinho a ele. Os olhinhos castanhos espremidos pelo sono, o cabelo castanho-escuro, levemente arrepiado que fazia um contraste lindo com a pele já não tão branca. Varri-o com os olhos e notei um pequeno bilhete colocado sobre o manto. O peguei e li. Meus olhos arregalaram-se e começaram a marejar. Li e re-li várias vezes, sentindo as lágrimas caírem sobre meu rosto, alternando o olhar do bilhete para o pequeno ser em minha frente. Peguei o menininho em meus braços e levei-o para dentro de casa, logo subindo para meu quarto, longe do frio. Coloquei-o em minha cama, e li de novo o bilhete, dessa vez em voz alta.
- “Nunca se esqueça de mim” – passei os dedos sobre o papel, olhei para o pequeno e suspirei vendo os olhos negros agora me fitando, da mesma intensidade que Andrew fazia. – Nunca, meu amor. Nunca.
;)
bY: Zacry and ~resum