Pela primeira vez desde que aquilo começara David ficou sério. Estranhamente sério, e pálido também.
Como um morto.
Letícia observava a mudança de expressão dele, que o fazia ainda mais bonito, realçando seus traços e seus lindos olhos.
Ele se arrumou e andou lentamente até o altar, o olhar fixo nas chamas das velas, enquanto Letícia o observava, ainda tremula do amor e também de emoção.
- David, você não ouviu, ela insistiu, eu te amo e quero ir embora com você !
- Você não sabe o que está dizendo, ele respondeu angustiado, eu não posso fazer isso, mas você também cometeu um errado, eu já estava morto e você me chamou de volta ...
Letícia baixou o vestido e correu até David, pousando as mãos nos ombros dele.
- David, eu te amo! Agora eu sei que me apaixonei por você desde que vi sua foto, no convite do seu enterro... Lágrimas escorreram pelas faces dela. - Tenho pensado muito sobre isso, e estou decidida. Eu não quero continuar nesse mundo, eu quero estar com você...
- E os seus pais ?
- Eles têm o meu irmão. Sei que vão sofrer, mas depois...
- Você tem a vida inteira pela frente...
- E daí ? Você também tinha toda a vida pela frente, querido...
David encostou sua fronte na dela, e choraram juntos.
- Eu fui um idiota, um irresponsável, Letícia, disse David aos prantos. - Eu tomei todas numa balada e fui dirigir...
- Isso não interessa, David... Você pagou um preço alto demais, meu amor...
Os dois ficaram chorando agarrados um bom tempo. Depois trocaram um beijo desesperado, faminto, David a derrubou no chão e se perdeu entre as pernas dela outra vez, se atolando dentro de Letícia e a levando ao orgasmo outra vez...
- David, me leva com você, ela repetiu ofegante.
Ele assentiu.
- Se é isso que você quer...
- Você duvida ? Ou você não me quer ?
- Se eu não quero você ???!! David repetiu com um amargo sorriso, e a apertou contra o peito.
A tempestade acalmara, uma chuva mansa continuava lá fora.
- Agora vai pra casa, disse ele, lá na recepção eles chamam um táxi pra você...
Letícia se levantou, passando as mãos pelo corpo e pelos cabelos, sentindo-se suada, empoeirada e confusa. Enfiou a calcinha e tornou a vestir o casaco. David sorria para ela.
- Eu vou levar você comigo, Letícia, falou.
- Quando ? perguntou Letícia ansiosa.
Ele se aproximou e beijou de leve sua boca.
- Confia em mim... Agora vem, já é tarde.
De mãos dadas fizeram o caminho de volta, pisando em poças d'água. Perto da recepção do cemitério David desapareceu...
Letícia estava estranhamente calma. Pediu um táxi e pouco tempo depois girava a chave na porta de casa.
- Letícia, é você ? - perguntou a mãe dela do quarto.
- Sim, mãe, ela respondeu.
- Tem comida no forno...
- Ok.
Ela entrou em seu quarto e tirou a roupa. Abriu o chuveiro e tomou um banho demorado, lavando os cabelos e a pele... A espuma escorria para o ralo e fazia Letícia pensar que a vida escorria da mesma forma. Saiu do banheiro enrolada na toalha macia e felpuda, secou-se, passou hidratante na pele, vestiu uma calcinha e um baby doll e foi para a cama.
Agora sentia os olhos pesados, e tão cansada...
Quando David a levaria ?
Letícia não percebeu que ele estava ali, num canto escuro, olhando para ela...
Fechou os olhos, puxou os cobertores e adormeceu.
Nunca mais acordou.
FIM