Amelie recuou até a parede, branca como cera. Seu coração parecia querer saltar do peito. Como ele podia ser o homem do retrato, se ele vivera num passado distante ?
Ou seria o fantasma dele ?
O desconhecido estava em pé de braços cruzados, observando Amelie com uma espécie de sorriso...
Era muito bonito, sedutor mesmo.
Aparentava ter vinte e poucos anos. Era moreno, olhos negros e muito brilhantes, sobrancelhas grossas, tinha uma boca semelhante à do Mick Jagger.
Seus cabelos negros estavam amarrados num rabo de cavalo. Ele usava calças pretas justas que marcavam seus músculos, botas , uma camisa com babados na gola e nos punhos, e um casaco vermelho sangue.
Aproximou -se de Amelie e beijou a mão da moça num gesto galante. Ela sentiu uma corrente elétrica percorrer seu corpo.
Não tenha medo, disse ele. Não vou lhe fazer mal...
Amelie arregalou seus límpidos olhos azuis.
Quem é você ? perguntou em tom agoniado.
Ele apontou para o retrato.
Valentim, Conde de Savoia, respondeu. Esse retrato não ficou nada mal, não acha ?
Amelie estava atordoada.
Mas como assim ? Você é um..
Fantasma?
Valentim balançou a cabeça.
Não, eu sou um vampiro, falou como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.
Amelie se encolheu contra a parede.
Não precisa ter medo de mim , disse Valentim, não vou morder você. É claro que, como todos os vampiros, eu preciso de sangue fresco para refazer minhas forças... Mas jamais beberei seu sangue contra a sua vontade, linda Amelie. - Ele contemplava com evidente apetite a artéria pulsante no alvo pescoço da garota . - Somente quando você me pedir...
Amelie puxou a gola do vestido para cima, num gesto de autodefesa.
Como sabe o meu nome, perguntou.
Estou observando você há um bom tempo, disse o conde. Há séculos procurava alguém assim... Já tinha quase desistido, quando uma noite passei voando sobre sua casa e a vi no jardim. E quase não acreditei...
Valentim a contemplava intensamente.
Você é igual a ela, falou.
Ela quem, quis saber Amelie.
Venha, quero lhe mostrar uma coisa, disse ele, e a conduziu por um vasto e sombrio corredor, até parar diante de um grande quadro numa moldura dourada, que retratava uma jovem. Dois candelabros iluminavam o quadro.
Amelie emitiu uma exclamaçao.
Mas sou eu, falou.
Valentim balançou a cabeça.
Não, essa é Gisela de Grammont, minha noiva...
Ele contemplava o retrato, parecendo contemplar um passado distante.
Nós nos conhecíamos desde crianças, disse ele, nossas famílias eram amigas. Ainda muito jovens ficamos noivos. Eu a adorava... Era o meu grande amor. Mas também era jovem, idealista , e parti com outros cavaleiros para a Sexta Cruzada.
Era emEu tinha 22 anos. Pretendia desposar Gisela assim que voltasse.
Amelie o ouvia fascinada.
E o que aconteceu, perguntou.
Valentim suspirou, sem tirar os olhos do retrato.
Quando eu estava em Jerusalém, continuou, eu fui mordido por um vampiro. - Ele olhou para Amelie. - Comecei a mudar... Não suportava mais a luz do sol, nem as cruzes dos estandartes . Tinha sede, mas uma sede que a água não podia saciar... Sede de sangue.
Amelie engoliu em seco.
Para matar essa sede, eu ataquei muitos inimigos, continuou o belo conde. De certa forma eu estava feliz por ter sido transformado em um vampiro, pois sabia que era imortal, e estava ansioso por voltar e fazer minha amada Gisela também imortal. Mas então, quando cheguei... - ele fechou os olhos . - Ela estava morta e enterrada. Morrera de peste...
Amelie balançou a cabeça.
Eu sinto muito, falou.
Valentim esboçou um sorriso amargo.
Veja que ironia, Amelie, falou , eu era imortal, mas não podia trazer minha amada de volta ! Eu a perdera para sempre, porque ela está no Céu, e vampiros não entram no Céu... Vampiros pertencem ao Inferno. Então eu percorri o mundo inteiro à procura de uma mulher que se parecesse com Gisela, que fosse capaz de me fazer esquecer dela, e essa busca demorou séculos, até o dia em que eu vi você . Ele se aproximou, Você é igual a ela !
Amelie contemplou o retrato da jovem dama vestida de branco, com flores nos cabelos, e parecia estar vendo a si própria numa outra existência.
- Parece mesmo comigo, concordou. Mas, o que você quer de mim?
O conde a tomou nos braços.
Quero fazer por você o que não pude fazer por Gisela, disse ele, colando seus lábios aos dela.
Grata pelos comentários.
