Era pra ser só uma ultrassonografia transvaginal. Exame de rotina, geralmente anual, nunca tinha dado problema antes. A novidade apareceu na sala de espera, quando a recepcionista anunciou meu nome e o da médica que me atenderia.
— Desculpa, mas meu exame estava agendado com o doutor Maurício.
— Ele não pôde vir. Quem está atendendo no lugar dele é a doutora Alessandra.
Respirei fundo e me levantei do sofá lentamente, tentando imaginar um jeito de contornar a situação sem ter que explicar minha resistência em fazer aquele exame com uma mulher. Sempre fui pegadora, fêmea pra caralho. Com exceção de uma ou outra noite pouco inspirada, afirmava minha feminilidade comme il faut com namorados, peguetes ou amantes, mas ultimamente andava às voltas com desejos homoeróticos, a maioria no auge do tesão ou da bebedeira. Altinha numa balada ou a segundos de um orgasmo, só conseguia pensar em mulher; sempre me vinha a imagem de alguma amiga, conhecida, atriz ou simplesmente uma vendedora ou balconista gostosa, e depois aquela sensação de momento de descontrole e as promessas íntimas de não mais deixar aqueles rompantes de sapatagem me desviarem do caminho hétero. E agora lá estava eu, prestes a me sentar só de bata numa maca de consultório, muda de medo de ser tocada por uma médica. Já passei por esse exame algumas vezes e te digo: só sendo muito fêmea pra não querer outra mulher mexendo pra lá e pra cá dentro de você um objeto fálico encapado com camisinha e generosamente lubrificado com KY. A combinação da manipulação prazerosa com o clima impessoal da sala de ultrassom é explosiva. Uma situação ambígua, de contornos indefinidos, que pode levar a tensão sexual e os nervos ao limite, dependendo da inclinação e do poder de sedução de quem realiza o exame.
Era nesse senão que morava minha esperança. Troquei de roupa e me sentei na maca torcendo pra tal doutora Alessandra ser uma senhora gorda, vesga e de boca torta, mas quem vi entrar pela porta não poderia ser mais diferente: uma bela loira de cerca de 1,70m vestida num jaleco branco que lhe dava um ar sexy de mulher inteligente e madura, embora aparentasse menos de trinta anos. Me cumprimentou em tom cordial e pediu que eu abrisse a parte de cima da bata e me deitasse com a cabeça sobre as mãos. As dela eram delicadas, de dedos longos e finos e unhas curtas, sem esmalte, com grandes meias-luas que refletiam naturalmente a luz fria à medida que ela espalhava o lubrificante, operava botões e teclado e circulava os mamilos intumescidos de frio e excitação. Quando introduziu a coisa entre minhas pernas, meu corpo estremeceu por um motivo que não tinha nada a ver com a temperatura do objeto ou da sala.
— Frio, né? — Me olhou por dois segundos com um sorriso de dentes brancos e perfeitamente alinhados que me deixou sem palavras.
— Uhum.
— Quer que diminua o ar?
— Um pouco, por favor.
Sua mão direita pegou o controle enquanto a esquerda mantinha o objeto dentro. Na esperança de abstrair a situação, engoli em seco e fechei os olhos, mas a escuridão se instalou como uma tela vazia pronta pra ser preenchida pela minha imaginação fértil com imagens de tirar a razão. Unhas de esmalte vermelho arranhando meus flancos, uma trilha de marcas de batom descendo pelo meu abdômen, cabelos longos fazendo cócegas nas minhas coxas, aquela boca de fêmea sorvendo o gosto de outra talvez pela primeira vez, e a língua, ah, a língua mergulhando fundo, mexendo lá dentro. Dedos, bolinhas tailandesas, dildos de ponta dupla, todo o tesão da quebra do tabu aflorado em pelo menos uma hora de sexo intenso, pegado, suado... Calma, Lê. Não pode ficar excitada aqui, senão coisas vão se contrair e ela vai perceber.
Abri os olhos e vi seu rosto virado meio de lado, cabelos louro-acinzentados enrodilhados num coque frouxo cujas voltas no topo e curva na nuca deixavam adivinhar o comprimento, alguns fios soltos atrás e dos lados. Aquela seriedade era um tesão. Todo o meu lado gay aflorava por aquela mulher que mal conhecia e que agora me penetrava com absoluto profissionalismo, sem dar sinais de encontrar resistência acima do comum. Pelo contrário, olhava atentamente o monitor, lábios curvados num sorriso quase imperceptível, ou quem sabe imaginado. Como se adivinhasse meus pensamentos, umedeceu o inferior com uma lambida lânguida que me fez salivar de fome daquela boca proibida. Como seria seu beijo? E sua chupada? E se a gente se acabasse num 69 ali? Maridinho sentiria nos meus lábios o gosto da infidelidade com o sexo proibido? Era inevitável fantasiar aquela boca linda no meu grelo enquanto a mão continuava o exame que, impressão ou não, já parecia durar bem mais que o normal. Como se não bastasse, a palma girou pra parede superior da buceta e o polegar resvalou justo no grelo, uma mexidinha despretensiosa que me jogou além do ponto de retorno. Definitivamente não dava mais pra segurar. Agora a torcida era pra que ela não parasse antes da hora, o que eu na verdade duvidava que fizesse. Por menos que aparentasse, já devia ter notado a bata que escorregou aberta sem nenhuma de nós mover um dedo pra fechá-la, minha perna direita procurando espaço entre a maca e a cadeira e minha tentativas vãs de não curvar os dedos dos pés. A certeza veio com seu sorriso travesso, acompanhado de um leve vaivém. Eu estava praticamente nua, grelo rijo, lábios vaginais túrgidos, mamilos intumescidos, não estava? Faria muita diferença se descesse a mão pra uma siririca? Arrisquei e ela respondeu com o segundo vaivém, esse mais longo e fundo. Quando dei por mim, fodia discretamente o objeto lubrificado com os quadris, rezando por uma roçadinha no ponto G. Minhas preces foram atendidas e a tão desejada roçadinha veio com a pressão ideal. Com autocontrole até então desconhecido, fui e voltei do nirvana sem gemidos ou espasmos, abri os olhos que nem me lembrava de ter fechado e pousei no travesseiro a nuca úmida de suor.
— Terminamos — anunciou sorridente.
Tirou com delicadeza o aparelho e me entregou duas folhas de papel com as quais me enxuguei apenas superficialmente, receosa de deixar algum cheiro sexual no papel. Depois que me troquei em silêncio, me desejou boa tarde e encostou a porta com um sorriso que eu juraria ser de cumplicidade.
Obrigada, doutora Alessandra. Até daqui a seis meses.