Oi, meninos!
O Antoine saiu hoje do coma induzido. Já está no quarto e se Deus quiser em breve já estará em casa. Obrigado pelas orações de todos. Muito obrigado mesmo. Não tenho palavras para expressar minha gratidão.
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- Oi, meu filho! – Papa me recebeu em sua casa
- Oi, Papa! – Eu o abracei
- Eu estava com saudade de ti!
- E eu do senhor!
- Vovô Ca-ca-ca-ca-ca-lus! – Sophie desceu do carro e veio quicando chamando pelo Papa
- Oi, princesa do bôbô!
- Ela já fala vovô, Papa!
- Ah, mas era tão bonitinho ela falar bôbô... Que saudade de ti, minha princesa!
- Eu também tavo saudade do senhor!
- Jura? Aiiiiiiiiii!!!! – Ele a apertou num grande abraço de vô
- Oi, tio!
- Oi, Thi! Como estás? – Papa também abraçou o Thi
- Bem e o senhor?
- Agora com vocês aqui eu estou bem! - Papa sempre foi bobão, eu estava até estranhando ele ter ficado tanto tempo chateado conosco – Vamos para a piscina, já está quase todo mundo lá.
Nós fomos para a piscina e já estava até rolando um churrasquinho.
- Antoine, meu filho! – Jojo disse
- Jojo, minha gostosa! – Eu corri a abracei e a ergui no ar – Estava com saudade de ti, quanto tempo...
- É, o senhor sumiu, né?!...
- Pois é... – Eu não tinha sumido, meus pais é que tinham surtado
- Oi, seu Antoine!
- Oi, dona Cacilda! – Eu também abracei aquela senhorinha que tanto me ajudou na vida
Sophie foi passando de colo em colo, mas quando chegou no Gui, ela já foi logo atentando o tio. Aqueles dois passavam o dia brigando, era incrível. Mas eles se amavam muito, era coisa de criança mesmo.
- Manoooooooooooooooooooooo! – Gui veio correndo e se jogou em mim
- Ai, moleque, assim tu me jogas no chão! – Eu disse rindo
- Laaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaarga, meu Papa! – Sophie gritou e também se jogou em mim
- Larga tu o meu irmão!
- Larga meu Papa, Gui!
- Não, larga tu o meu irmão! Tu ficas no colo do meu pai e eu não reclamo, agora aguenta.
- LAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAGA!!!!! – Ela soltou um grito fininho que doeu meu ouvido.
- Filha, que é isso? Ele é meu irmão, ele só está me abraçando.
- Mas eu sô tua filha.
- Eu sei, meu amor, e tu continuarás sendo minha filha depois que teu tio me abraçar. Então, pare com isso. O amor a gente divide com todo mundo, tá bom?
- Tá! – ela disse emburrada, muito emburrada
- Besta! – Gui disse
- Ow, e tu não provocas ela! Eu dou palmada na bunda dos dois!
- Eu estava com saudade de ti, mano! Vamos jogar vídeo game?
- Eu também estava com saudade de ti! Mais tarde a gente joga, tá?
- Tá, mas não vai me enrolar, viu?
- Não vou, não. Antes de eu ir a gente joga.
Ele me largou e foi correndo para a piscina.
- Pixina, papa! Bola? – Foi o Gui me soltar que ela pulou no meu colo
- Depois, meu bem. A gente vai primeiro almoçar. Deixa eu ir ali falar com a tua tia, tu já foste lá dar um beijo nela?
- Não!
- Então vamos trocar de roupa e depois vamos lá! – Nós entramos em casa, nos trocamos e fomos até a espreguiçadeira onde a Anne estava
Sophie ficava a coisa mais fofa do mundo de biquíni.
- Oi, titia! – Sophie sentou do ladinho da Anne
- Oi, meu amor! – Ela colocou a sobrinha sentada no colo – Tu estás cada dia mais linda.
- A senhora também tá muuuuuuito bonita.
- É por isso que eu amo essa menina. – Ela disse rindo e abraçando a sobrinha
- Vem pra piscina com o Papai, Sophie. – Thi gritou da piscina
Foi ela ouvir piscina que ela largou a tia e saiu correndo para o colo do pai.
- Oi, mana! – Eu disse sentando em uma espreguiçadeira ao lado da Anne
- Oi, maninho!
- Malas prontas já?
- Já! E as tuas?
- Também!
- Nós vamos matar nossos pais de desgosto.
- Tu sabes como eles são dramáticos, né?
- Oh se sei... – Ela riu – Mas não vai ser fácil para eles, não.
- E nem para nós, mas a vida é assim mesmo. Quem sabe um dia não voltamos todos a morar aqui?
- Acho bem difícil eu voltar, viu?!
- Nem fala uma coisa dessas perto deles, pelo amor de Deus!
- Claro que não, não sou tão louca assim.
- Juízo para lá, viu?!
- Pode deixar!
- Tu sabes que tu não terás teu irmão para limpar tua barra, então, presta bem atenção no que tu vais fazer, Anne.
- Tu não vens com esse papo de pai, não né?
- Não é papo de pai, Anne. É papo de irmão. Não estou falando para tu te privares, não estou falando para tu viveres para o estudo. O que eu estou dizendo é para tu tomares muito cuidado com tudo. Com bebida, com drogas, com amizades, com sexo... enfim, com tudo. Aqui, eu sempre te socorri. Eu sempre estive aqui para te ajudar em tudo. Agora nós estaremos bem longe um do outro. Eu já tive a tua idade, eu sei como é. Eu conheço essa euforia, esse desejo de aventura e de coisa nova. Eu aproveitei esse momento, mas tu nunca me viste fazer besteira, não é? Tu já fizeste mais besteira que eu, e olha que tu és bem mais nova que eu. Então, o que eu tô te pedindo é que antes de fazer qualquer coisa, pensa bem o que vais fazer, pesa o lado positivo e negativo. Se aquilo não for te trazer nenhum maleficio, te joga e aproveita mesmo.
- Obrigada, mano!
- De nada! E tu sabes, né? Por mais que eu esteja longe, tu sempre poderás pedir socorro. Teu irmão sempre estará aqui para te aconselhar. Eu sei que às vezes (quase sempre) tu não queres falar com nossos pais.
- Obrigada! Te confesso que eu estou com um pouquinho de medo de morar em uma cidade tão grande como o RJ, e ainda por cima sozinha.
- Tu vais te dar bem, Anne! Tu és mulher macho – Eu ri e ela me acompanhou
- Como foi quando tu saíste de casa?
- Foi muito bom, mas também foi muito doloroso. Eu tive que aprender a fazer tudo, a cuidar de casa, a fazer compras, a usar meu dinheiro e não o dos nossos pais. Tive que aprender a cuidar de mim, pois nem sempre eu tinha quem cuidasse de mim... é bem complicado. Mas, por outro lado, é muito bom ter tua casa, tuas coisas, tuas regras, teus horários. Tu não dependes de ninguém. Mas, volto a dizer, a gente precisa ter muito juízo.
- Eu pensava que tinha sido fácil pra ti.
- Claro que não foi, eu fiz parecer ser senão a Maman faria eu voltar para a casa dela em dois tempos. Pra ti será mais fácil, Anne. Tu sempre poderás contar comigo, essa é a vantagem do irmão mais novo. Eu não tinha com quem contar, eu tive que me virar muitas vezes sozinho. Tu sempre tiveste a mim para conversar, mas eu nem sempre tinha alguém e mesmo assim eu consegui me virar. Por isso que eu digo que tu conseguirás.
- Assim eu espero...
- Amor, tu não vens, não? – Thi gritou da piscina
- Já vou! Ah, mais uma coisa, Anne. Toma muito cuidado com os caras que tu fores sair. Sempre te previne, sempre anda com camisinha. Não transa no primeiro encontro, conhece primeiro o cara. Não vai engravidar pra lá, viu? Se tu fizeres isso eu venho da França só pra te dar uns tapas.
- Eu estarei grávida.
- Eu espero tu parir e aí sim encho tuas fuça de tapa.
- Ai, credo! Não quero moleque, não!
- Pois então, te cuida pra lá. E não querer não previne acidentes, então, todo cuidado é pouco.
Eu sempre fiz questão de puxar a orelha dela, ela sempre foi muito maluquinha. Meus pais sempre chamavam a atenção dela, eles sempre conversaram com ela. Mas, ela sempre foi muito rebelde, então, ela nunca os ouvia. Aí, eu entrava em ação. Eu já conhecia as manhas dela e eu sabia conversar. Ela quase sempre me ouvia. E eu estava bem preocupado com o fato dela ir morar sozinha no RJ, eu a achava jovem demais e maluquinha demais. Mas quem era eu para dizer que ela não poderia ir? Eu também saí muito cedo de casa, a diferença é que eu sempre fui muito ajuizado, sempre pareci um velhinho, ela não. O que eu podia fazer era confiar nela e rezar para que ela se saísse bem.
- Vem, Antoine!
- Já vou!
Eu me levantei para ir lá com o Thi, mas a Maman me interceptou no meio do caminho.
- Antoine, me ajuda aqui.
- Em que Maman?
- Eu fui fazer esse molho e não deu certo. – Ela queria fazer um molhinho de queijo para acompanhar a carne
- O que a senhora fez aqui? Isso meio que tá fedendo, Maman – Eu ri
- Eu segui essa receita – Ela me mostrou
- Ai, ai, ai... isso aqui só poderia dar errado. A gente não mistura essas ervas, fica amargo.
- E como eu ia saber disso?
- Bom, agora a senhora já sabe.
- Tu estudaste mesmo, né?
- Claro, né Maman? O que a senhora acha que eu estava fazendo na França esse tempo todo? Me dê aqui, deixa eu refazer.
Eu refiz o molho bem rapidinho.
- Prove! – Eu coloquei um pouquinho numa colher e levei até a boca da Maman
- Agora sim, era assim que eu queria esse molho.
- RÉLOU TODO MUNDO! – Dudu já chegou fazendo barulho
- Oi, primo! Oi, tata!
- Oi, meu filho! – Maman abraçou e beijou o Pi
- O que tu estás fazendo aí? – Ele colocou o dedo dentro do molho que a Maman havia feito e provou – Eca, que coisa ruim! O que tu colocaste aqui?
- Foi a Maman quem fez isso, ela misturou uma dúzia de ervas e deu nisso aí. – Eu ri
- Uuiiiii que bundinha! – Dudu deu um tapa na minha bunda
- Ei, tô vendo essa palhaçada aí! Que negócio é esse aí com meu marido? – Thi disse saindo da piscina
- Olha como ele é machão... – Dudu disse
- Vou apertar a bunda do Pi, quero ver o que tu vais fazer.
- Experimenta...
- Ah, já?
- Vocês não vão começar, não né? – Pi disse
- Nem te estressa com esses dois, tu sabes que eles se mordem e depois se amam.
- Cadê a Jujuba? – Pi perguntou
- Atrasada como sempre...
- Vamos para a piscina? – Thi me abraçou por trás
- Vamos!
Nós fomos para a piscina e a Sophie estava só com o Gui.
- Tu deixaste ela com o Gui?
- Foi, qual o problema?
- Thi, é o Gui! ELE precisa de alguém para cuidar dele...
- Ele cuidou dela direitinho.
- Nunca mais faz isso, Thi. Tu sabes como ela é com ele, ele pode até tentar cuidar dela, mas ela é uma pimenta com ele e ela nunca escuta o que ele fala.
- Ué, eu vi o Dudu bater na tua bunda... só quem pode fazer isso sou eu! – Ele apertou minha bunda descaradamente
- Aaaaaah tá com ciúmes?
- Talvez um pouquinho...
- Era o Dudu, amor.
- Poderia ser até teu pai... – Ele falava brincando
- Vem ciumento! Vamos para a piscina.
Nós entramos na piscina e meu peixinho já veio nadando em nossa direção. Ela estava aprendendo a nadar, já conseguia um pouquinho, e eu morria de medo disso. Nós ficamos na piscina até a Maman nos chamar para almoçar. Jujuba, Jean e Bruninha chegaram bem na hora do almoço.
- Chegamos estrategicamente! – Jujuba disse
- Atrasados como sempre.
- Dessa vez a culpa não foi minha, o bonitão ali não descolava do computador.
- Trabalho, trabalho... Desculpem-me! – Jean disse
- Vamos comer! – Maman chamou todos para a mesa que estava farta
Fazia bastante tempo que eu não via toda a minha família reunida. Nós almoçamos como sempre fazíamos, todos falando ao mesmo tempo, se divertindo, brincando. Passamos o dia inteiro com meus pais, no final do dia Maman sentou ao meu lado para conversar.
- Meu filho?
- Oi, Maman!
- Tu vais mesmo para a França?
- Vou sim, Maman.
- Meu filho, meu coração diz para tu não ires para lá.
- Maman, já conversamos sobre isso.
- Eu sei, eu só estou te dizendo o que eu sinto como mãe. Meu coração diz para tu não ires. Mas, se é o que tu queres fazer, eu não vou tentar impedir.
- Obrigado, Maman!
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- Antoine, vamos logo, que demora! – Thi gritava lá da sala
- Já vou, calma aí! Pra quê tanta agonia, senhor?
- Eu já estou atrasado! – Ele ia encontrar alguns amigos retardados que ele tinha
- Tô indo, tô indo! – Eu disse descendo as escadas
- Que demora! Tu és muito lento!
- Tu que és agoniado demais! – Eu tive vontade de esmurra-lo.
Ele foi reclamando de casa até o carro e depois que demos partida ele continuou reclamando.
- Jesus! Hoje tu estás pior do que aquelas velhinhas, misericórdia. Quando a gente ficar velho, eu vou te jogar num asilo, não vou te aguentar, não. – Ele ficou puto comigo
- Antoine, tu tens que saber que nós temos horários, eu tenho horários, não posso ficar esperando uma vida toda...
- Ai, meu senhor! – Eu revirei os olhos
Enquanto ele reclamava de tudo, eu me concentrei na paisagem. Eu ia até contando os postes.
- Para o carro!
- O quê? Tá maluco?
- Para o carro, Thi!
- Antoine, deixa de maluquice.
- THIAGO, PARA O CARRO, AGORA! – Eu gritei feio com ele e ele parou o carro, ainda reclamando
Eu desci do carro e fui correndo. Ele tinha parado um pouco longe do que eu tinha visto. Eu corri até um banco de uma praça no centro da cidade e confirmei o que eu suspeitava ter visto. Ele estava todo encolhidinho naquele banco.
- Luiz? Luiz? – Eu chacoalhava o menino – Acorda, Luiz! Luiz? Luiz? – Eu comecei a ficar ainda mais preocupado
- Posso saber o que tu estás fazendo aqui?
- Para de reclamar e me ajuda!
- Espera, esse é o menino que roubou o restau?
- Ele mesmo! Me ajuda!
Ele prontamente parou de reclamar e resolveu me ajudar. Nós chamamos o Luiz várias vezes, e graças a Deus depois de um tempo ele acordou ainda meio inconsciente. Ele estava sujo e ainda mais magrinho. Que dó me deu de ver aquela criança ali.
- Vamos para o hospital, Thi. Traz o carro mais pra cá.
Ele não falou nada e fez o que eu pedi. Nós colocamos o Luiz no carro e o levamos para o hospital. Chegando lá, graças a Deus vários funcionários me conheciam e sempre me atendiam bem. Eles prontamente cuidaram do Luiz. Ele estava desnutrido e desidratado, fizeram uma bateria de exames e o deixaram internado tomando soro.
- Quem é esse menino, Antoine? – Henrique, médico amigo do Bruno, me perguntou
- Pra te falar bem a verdade Henrique, eu não sei. Ele apareceu no meu restaurante e eu o trouxe aqui, lembra?
- Lembro, sim!
- Hoje, eu o encontrei num banco de uma praça.
- Meu Deus, um menino tão novinho.
- Pois é... Ele vai ficar aqui quanto tempo?
- Ele vai está tomando um soro e ainda vai tomar um multivitamínico, em algumas horas, dependendo do resultado dos exames dele, ele será liberado.
- Ah, então, eu vou esperar.
- Tu não tinhas que ir para o restaurante? – Thi me perguntou
- Tinha! Vou ligar para o Pi me substituir. Não vou deixar essa criança aqui sozinha.
- Eu fico contigo!
- Tu não estavas super atrasado?
- Sim, mas não vou te deixar sozinho aqui.
- Pode ir, não tem problema.
- Eu fico! – Ele sabia como aquele hospital me trazia péssimas lembranças
Nós esperamos por longas horas, mas graças a Deus o Luiz só estava com uma anemia severa. Isso seria tratado com medicação e alimentação. Eu decidi leva-lo para a minha casa. Ele não falava nada, tadinho, deveria estar morrendo de vergonha.
- Meu amor, tu vais leva-lo lá para casa?
- Vou, Thi. Não posso deixar essa criança na rua, não posso.
- Tudo bem! Mas nós precisamos saber se ele tem pais, qual o nome dele, quem são os responsáveis. Hoje em dia, os responsáveis dele podem nos acusar de várias coisas.
- Eu sei, vamos leva-lo para nossa casa, e lá eu pergunto essas coisas para ele.
- Tudo bem!
Nós fomos para casa e o Thi teve que me deixar sozinho, a contragosto, com o Luiz, pois ele tinha que ir buscar a Sophie na casa da Maman. Eu aproveitei aquela oportunidade para saber mais sobre o menino.
- Tá tudo bem, Luiz?
- Tá sim, senhor! – Foi ele falar e começar a chorar copiosamente – Por que o senhor está me ajudando? – Ele me perguntou entre lágrimas
Me apertou o coração, ali eu pude ver e sentir toda a fragilidade e dor daquela criança.
- Por que eu não te ajudaria?
- Por que eu não mereço!
- E por que tu não mereces?
- Por que eu sou filho do demônio!
- Oh, meu filho, não fale uma coisa dessas. Eu não vejo isso em ti.
- Mas eu sou, moço. Eu sou! – Ele chorava demais
- Olha, eu não sinto nada disso. Para mim, tu és uma criança que está sofrendo. E eu quero saber o porquê desse sofrimento, por que assim eu te ajudo mais. Cadê teus pais?
- Devem estar na casa deles.
- Tu não moras com eles?
- Não, senhor. Não mais. – Ele chorou ainda mais, aquilo doía nele
- E por que tu não moras mais com eles?
- Por que eles me expulsaram de casa.
- Mas tu és tão novinho, por que eles fizeram isso? - Ele ficou em silêncio, sem responder minha pergunta – Por que eles fizeram isso? Tu podes me falar, Luiz...
- O senhor não vai me expulsar?
- Claro que não! Pode confiar em mim!
- É por que eu não sou um menino normal, pelo menos é o que eles falavam.
- E por que tu não és normal?
- Meu pai me viu abraçar um amigo meu e esse meu amigo me deu um beijo surpresa.
Ali eu comecei a entender tudo. A velha história que se repete em vários lares mundo afora.
- Tu és gay, Luiz?
- Não, senhor! Não sei nem o que é isso. Meus pais falaram que eu era filho do demônio e por isso me expulsaram de casa.
- Que crueldade! Tu tens quantos anos? E não adianta me falar que tu tens 19 anos.
- 9!
- Tu tens 9 anos? – eu quase caio do banco que eu estava sentado
Como alguém expulsa uma criança? Uma criança! Que ser faria isso, meu Deus!
- Sim, senhor!
Ele aparentava ser um menino tão dócil, tão frágil, tão educado. Eu não conseguia entender e muito menos aceitar uma crueldade daquelas.
- Tu estas há quanto tempo na rua, Luiz?
- Desde o ano passado.
- Teus pais te expulsaram com 8 anos? Isso é crime! Eles deveriam estar na cadeia! – Eu falei com tanto ódio, acho que eu nunca tinha sentido tanta raiva em toda a minha vida
- Foi, sim!
- E tu tens vivido esse tempo todo na rua?
- É!
- E tu comes o que?
- O que eu acho por aí... Da vez que eu tentei roubar alguma coisa, o seu amigo me pegou.
- Deixa eu te perguntar uma coisa... Tu gostavas do teu amiguinho é isso?
- É!
- E por isso teus pais te expulsaram?
- Sim, senhor!
- Sabe aquele meu amigo, Luiz?
- O que me bateu?
- É, ele se chama Thiago. Ele não é meu amigo, ele é meu marido.
- O senhor é casado com um homem? O papai dizia que isso era do demônio.
- Mas não é, viu? Nunca mais, mas nunca mais mesmo fala que tu és filho do demônio (depois eu vim descobri que ele realmente era filho de um demônio em forma de gente). Tu és uma criança especial, só isso. Tu só és um pouco diferente dos outros meninos, SÓ ISSO! Tu ainda estas muito frágil, tu vais ficar aqui em casa, eu vou cuidar de ti, viu? E não te preocupas, eu não te expulsarei por tu gostares de um menino. Aqui em casa, tu podes gostar de quem tu quiseres. De menino, de menina... não me importa, ta bom?
Acho que ouvir aquilo foi um alivio tão grande para aquela criança que ele desatou a chorar, mas a chorar muito, de soluçar e quase não conseguir respirar. Eu fiquei imaginando tudo o que ele já tinha passado, a quantidade de dor que ele teve que suportar desde tão pequenino. Algo dentro de mim me dizia que eu tinha que ajuda-lo. Ele não cruzaria meu caminho se não fosse para pedir ajuda.