Não acho que minha vida seja sofrida ou toda errada, eu acho que o amor tem dessas coisas, amar alguém significa se doar inteiramente a esse amor e não se importar com as ações ou consequências resultantes dele.
A gente não precisa procurar entender nada, apenas deixar acontecer.
Três dias se passaram, e eu tive alta do hospital.
Nesse dia eu achei que ele fosse estar me esperando na recepção com um buquê de flores ou algo parecido, tentando disfarçar aquela cara de moleque triste que fez cagada em cima de cagada, mas para minha surpresa ele não veio, nem mesmo minha mãe e filhos apareceram pra me buscar.
Tentei ligar pra todos que lembrei e nenhum se ofereceu ou pode me buscar por conta de trabalho ou outros compromissos, eu saí e me sentei um pouco do lado de fora da recepção que dava de frente ao estacionamento e também a uma praça com algumas pessoas sentadas e outras interagindo com seus animais, me lembrei do meu Marley e senti um aperto no peito por sua morte, ainda fiquei esperando que o Rick, o Jorge, Raul, Iago ou uma alma caridosa surgisse para me resgatar. (Podia ser o meu filho Igor com sua bicicleta com as rodinhas de apoio rs).
De repente eu vejo uma caminhonete conhecida chegando no estacionamento.
Eu nunca iria imaginar que ele soubesse ou que fosse me buscar no hospital, não me recordo de ouvir alguém falar que comentou com ele, que eu estava internado.
Pois bem, eu fiquei feliz, ainda tinha alguém que se importava comigo e com minhas burradas (que agora eu via que eram muitas rs).
Ele desceu da caminhonete com seu jeans apertado, camiseta branca básica da Hering, suas texanas, e parecendo um cão farejador, veio direto a meu encontro com um sorriso branco como a parte interna de um coco, seus olhos ainda mais claros com a luz do sol, mesclando o azul com um verde bem claro.
- Você!? O que faz aqui?
- Eu? Vim marcar uma consulta médica e você?
Ele me respondeu sorrindo com cara debochada de quem tinha aprontado ou iria aprontar.
- Mentiroso! O que faz aqui Renato?
Então ele respondeu;
- Eu estou bem também Fabiano, e pelo visto, você está melhor do que nunca né? Murcha esse peitinho aí rapaz. Eu encontrei com sua mãe no mercado, ela me disse que você saia hoje e eu me ofereci para vir te buscar, tudo bem pra você rapazinho? O Ricardo e o Jorge estão em São Paulo e sua mãe tinha que levar a Laurinha numa prova do balé, por isso eu vim!
Realmente; a Laurinha tinha prova e eu não estaria lá para apoia-la.
- Ok! Tudo bem Renato, eu já estava ficando agoniado aqui, graças a Deus que estou indo embora.
Ele me deu um tapa no ombro, agaixou recolhendo minha mala do chão, jogou nas costas e andou a minha frente, me deixando resmungando sozinho pra trás.
Ele não falou muita coisa, perguntou pouco e nada sobre William ou o pai, quis saber das crianças, da minha mãe e se limitou a ouvir minhas respostas, achei estranho o jeito distraido dele quase me ignorando, eu também me limitei a responder apenas o que ele perguntava.
O som do carro só tinha sertanejo raiz e cações estilo country do Allan Jackson, Shania, Faith Hill entre outros que não conheço.
Eramos dois estranhos naquele espaço, apesar de conhecer o Renato muito bem, eu me senti um pouco sem jeito e envergonhado por estar na companhia dele.
Parece que sempre que brigo com o William, ele aparece pra me amparar e criar expectativas de algo que não vai rolar.
O caminho de 15 km do hospital até minha casa é coisa de 20 minutos de carro, que pareceram ser 20 dias dentro da caminhonete, nunca que chegava e eu não sabia como puxar assunto com o rapaz, se fosse o Renan eu tinha certeza de que o percurso seria de risada e muita conversa do estilo piadinha tosca, mas com o Renato não consegui.(será que chove hoje)
Quando cheguei em casa, não vi nenhum alma viva, ele ficou dentro do carro, enviando mensagens pra alguém que parecia ser importante.
Antes de encostar na maçaneta da porta, ouvi o início de uma discussão entre o Igor e a Laurinha, logo em seguida minha mãe chamou a atenção dos dois.
Era uma surpresa pra mim?
Abri a porta e fingi estar surpreso, mesmo depois da briga dos dois.
Eu não tava com ânimo pra festa, pra música alta e pra ouvir bobagens sobre o William, e realmente não precisei fingir.
Não tinha festa nenhuma e nem ninguém escondido, apenas minhas crianças com as briguinhas cotidianas.
- Papai, papai, o senhor voltou?
O Igor veio correndo ao meu encontro e se jogou pra cima de mim. Logo a Laurinha também se atirou em meus braços e me encheu de beijos.
Eu perguntei da prova do balé e ela abriu um sorriso tão alegre, que me convenci que ela tinha feito a melhor apresentação.
Os dois sentaram em meu colo e me fizeram um milhão de perguntas.
- Tomou injeção? Doeu?
- A comida era sopa? Ruim?
- Tomou muito soro?
- A enfermeira era boazinha? Brava?
- O pai foi te visitar? Ele ainda não voltou de viagem? To com saudades dele também.
Essa última pergunta me deixou preocupado!
Pedi que fossem brincar no quarto que eu queria conversar com a avó deles.
Foi então que minha mãe me contou que desde o acontecido, o William não tinha mais voltado em casa.
Na mesma hora, me levantei do sofá e fui até o telefone, liguei várias vezes pra ele, mas não atendeu, só caia na caixa postal.
Fiquei furioso, andei de um lado pro outro da sala tentando entender o que estava acontecendo com ele. Até sentir a mão da minha mãe me puxar pra junto dela.
- Tudo bem filho, não é a primeira e nem será a última briga de vocês, ele vai voltar, só deve estar envergonhado e precisa colocar a cabeça no lugar.
Colo de mãe é poderoso né? Eu não segurei o choro e coloquei tudo pra fora! Toda raiva, toda frustração, toda tristeza que sentia até aquele momento.
O pai dele me espancou e ele sequer perguntou como eu estava e agora isso afetaria o Igor e a Laurinha também.
- Dessa vez eu não quero mais mãe, não vou me sujeitar a esse tipo de situação novamente, ele fez a escolha dele e isso não pode mais interferir na minha vida e na dos dois pequenos. Ele não tem que excluir as crianças da vida dele por causa das escolhas erradas que ele fez. Ele vai ter que assumir essa responsabilidade ou ele pode esquecer que um dia eles o enxergaram como uma figura paterna.
Peguei minhas coisas para subir para meu quarto e antes que me desse conta, lembrei que o Renato tinha ficado do lado de fora, rapidamente abri a porta, mas ele já tinha ido embora.
Naquele dia liguei várias vezes pra o William, todas as vezes falhas.
Os dias foram passando, ele não retornava, não voltou pegar suas coisas e nem sinal de vida deu.
A Laura também estava evitando de ir em casa, mas minha mãe levava os pequenos para visita la.
Dois meses depois ele resolveu aparecer para ver o Igor e a Laurinha, nesse dia eu peguei as chaves do carro e sumi por algumas horas, evitei ele, apesar de ele ir apenas para visitar os dois.
Não levou nem uma cueca embora, ficou tudo aqui!
Era um sofrimento diário tentar saber oque ele estava fazendo e oque ele sentia
Decidi tirar as crianças da escolar e dar um tempo do Brasil, mas não sabia se seria uma boa escolha viajar a essa altura do campeonato, comprometer os estudos das crianças.
O Igor perguntava dele todo santo dia e as vezes a Laurinha tinha crises de ansiedade.
- Será que o pai vem hoje? Ele ligou, ele vem? Porque ele não responde?
Ela sempre questionava.
Mas ele devia estar envergonhado como minha mãe mesmo disse (eu gostaria de acreditar nisso).
Eu nunca estava em casa, nas raras visitas que ele fazia, todas de 30 ou 40 minutos a cada 10/15 dias.
Minha vida estava complicada novamente e dessa vez eu não o queria de volta nela.