Além da arrogância e preconceito
Lá fora os flocos de neve, pequenos e abundantes, caíam dando a impressão de que os grandes janelões do salão principal do castelo de Beverstone tinham vida própria, pois ao despencarem diante dos vidros iluminados refletiam um movimento contínuo que se assemelhava ao dos convidados circulando entre rodinhas animadas onde a conversa versava sobre diversos assuntos. Os réveillons promovidos pelo conde e pela condessa de Buckham eram o auge dos eventos que a aristocrática sociedade rural de Gloucestershire conhecia e, um convite para participar dessa festa era o desejo contido e secreto daqueles burgueses na remota Tetbury. Este era o primeiro evento do qual Julian participava com sua mãe e irmãos desde que voltara de Londres, a cerca de quatro semanas, onde estivera nos últimos cinco anos completando seus estudos.
Ele já conhecia o castelo Beverstone onde estivera algumas vezes na adolescência por conta de sua amizade com o filho mais novo do conde e agora, tal como das vezes anteriores, ele se sentia intimidado dentro daqueles ambientes cercados de luxo. Não que ambientes refinados lhe fossem totalmente estranhos, uma vez que a casa Riley, uma mansão construída por seu bisavô dentro de uma área de trezentos acres, vizinha às terras do castelo Beverstone, no mais puro estilo elisabetano, embora mais despojada do que o castelo também fosse um tesouro encravado naquelas pradarias e colinas. Talvez o que o intimidasse fosse a postura esnobe e fria com a qual aquela família via os demais moradores de Tetbury. O conde e, principalmente a condessa, pareciam enxergar seus vizinhos como pessoas de segunda classe, como vassalos dos tempos feudais, muito embora algumas daquelas famílias tivessem um patrimônio semelhante, ou até maior, do que aquela nobreza em vias de empobrecimento, como era o caso dos próprios Riley.
Sybill, a mãe de Julian, tinha estudado no mesmo internato que a condessa quando jovem e, chegaram a ter uma amizade que, se não muito calorosa, pelo menos era verdadeira e sincera. Aos vinte anos, ambas conheceram os homens que viriam a se tornar seus maridos. Sybill apaixonara-se por Scott o único filho de um próspero e requisitado médico de Londres que constantemente atendia os membros da família real, enquanto Elizabeth tinha seu casamento arranjado com o cobiçado conde Buckham. Scott resolveu mudar-se com a esposa e o primeiro filho a caminho para a casa Riley depois que seu avô faleceu deixando a propriedade para o neto. A contragosto, Elizabeth foi arrastada pelo marido para o castelo da família na zona rural de Tetbury, deixando para trás aquela atmosfera civilizada de Londres que tanto a encantava, para viver na solidão daquelas terras distantes. A primeira década de seu casamento foi uma sucessão de gestações que a deixou com cinco filhos, uma buceta laceada e macilenta como macarrão que cozinhou demais, onde o pequeno cacete do marido entrava sem que ela notasse sua presença e, após o nascimento da última filha, com um útero que já não podia mais gestar um novo rebento, o que ela considerou um alívio para seu infortúnio. Ela foi se tornando uma mulher amarga e frustrada enquanto o conde fornicava com as criadas do castelo e com oportunistas que lhe satisfaziam as necessidades que a esposa ora grávida, ora envolvida com os cuidados de mais um bebê não tinha como aplacar. Ela que já não o amava desde o princípio, foi conhecendo naquela falha de caráter, um ser pelo qual só conseguia sentir a mais enojada repulsa. Ela apegou-se aos filhos, especialmente os dois meninos, Matt o mais velho e George e, em segundo plano as filhas Marie, a primogênita, Jessica e Maggie, respectivamente a terceira e quinta de seus filhos. Passou a desprezar tudo e todos a sua volta, o que lhe deixou com a fama pela qual todos a conheciam, uma aristocrata esnobe que desdenhava das pessoas. Enquanto isso, Sybill e Scott foram dando vida a casa Riley. O nascimento de cada um dos três filhos homens era celebrado com muita alegria. Rob, Edward e Julian também nasceram ao longo da primeira década de seu casamento, mas ao contrário de Elizabeth, Sybill era cada vez mais amada pelo esposo que a idolatrava, sem nenhuma reserva, demonstrando seu afeto abertamente para todos que o conheciam.
No entanto, uma tragédia veio abalar aquela história. Com os meninos na adolescência, Scott foi acometido de uma doença que o tirou de sua família precocemente. A notícia deixou Tetbury mergulhada em luto. Levar as condolências à amiga Sybill foi uma das poucas coisas gentis que a condessa de Buckham fez nos últimos anos. Contudo, ela não deixou de confidenciar a amiga de tantos anos, seu desejo de estar no lugar de Sybill naquele momento. Ver-se livre do compromisso com o conde significaria para ela ter alguma esperança de dias melhores. Sybill a censurou, mas percebeu que a antiga Elizabeth não existia mais, aquela mulher não passava de um espectro da amiga que convivera com ela no internato.
Foi mais ou menos nessa mesma época que Julian e George se tornaram amigos, pois frequentavam o mesmo colégio. George viu naquela amizade uma maneira de extravasar sua energia e alegria fora das paredes austeras do castelo. Parecia que na casa Riley as pessoas riam mais, se divertiam mais, se amavam mais. De fato, após a morte de Scott, Sybill e os filhos ficaram mais unidos. Ela não se deixou abalar e tocou a diante os projetos do marido que consistiam na instalação da primeira indústria têxtil daquela região. Scott tinha sido um sujeito empreendedor que logo soube como aumentar o patrimônio legado por seu avô. Rob ao concluir seus estudos em Londres voltou para ajudar a mãe nos negócios, Edward tinha o mesmo espírito empreendedor do pai e resolveu incrementar a propriedade de trezentos acres iniciando uma destilaria.
Julian ainda não havia se decidido por nada, apenas tratava de se reambientar após seu regresso. Aquela noite de réveillon de 1901 estava servindo para esse propósito. Ele reencontrou pessoas que já não via há algum tempo, travava conhecimento com outras que passaram a fazer parte dos novos moradores de Tetbury e, principalmente, tornara-se o foco das atenções das moças solteiras que poucas oportunidades tinham de conhecer rapazes por aqueles rincões, especialmente tão formosos e bem apessoados como Julian. Embora a condessa nunca tenha se esquecido de convidar sua amiga para estas ocasiões, nos últimos tempos era o conde que se mostrava interessado em colocar em contato com suas filhas aqueles três promissores rapazes da casa Riley.
Matt chegou a perguntar a um amigo quem era o rapaz que praticamente monopolizava as atenções das moças, ao vê-lo cercado por um bando falante e risonho de mulheres, entre elas duas de suas irmãs.
- É Julian, o filho mais novo de Lady Riley! Não é possível que não se lembre dele. É bem verdade que cinco anos atrás, quando se mudou para Londres a fim de cursar a universidade, ele não passava de um garoto magricela de dezessete anos. – disse o amigo.
- Vagamente. Parece-me que ele esteve algumas vezes por aqui com meu irmão George. Creio que estudavam juntos, se não me engano. – retrucou Matt, tentando fazer uma associação entre aquele garoto de suas lembranças e o rapaz esguio e portentoso que estava dentro daquela casaca de ombros largos e aquelas calças, indecentemente justas.
- Convenhamos que aquele par de calças pode fazer sucesso em Londres, mas duvido que sejam bem vistas por aqui. – observou o amigo, que também se concentrava naquelas coxas bem torneadas embaixo do tecido.
- Sem dúvida! Sem dúvida! – retrucou Matt. Aquela conversa já não o interessava mais.
Julian estava feliz por estar de volta. Nos anos de universidade lembrava-se com saudade daquela gente de hábitos simples e uma sinceridade espontânea, que nem sempre era lisonjeira, mas que traduzia a maneira de ser daquelas pessoas. Ele nunca tinha se sentido tão à vontade naquele castelo como nessa noite e, atribuiu ao conde, que estava mais eloquente que de costume por conta do interesse de ver suas filhas cortejadas pelos rapazes e do exagero com as bebidas, outro defeito de seu caráter que vinha se acentuando com a idade. O fato de já não fazer mais tanto sucesso com as mulheres e ter, inclusive, sido repelido algumas vezes, depois que sua fama de cafajeste deixou de ser um segredo. Uma governanta e duas criadas deixaram o castelo em circunstâncias bastante suspeitas. Entre a criadagem se comentava, à boca pequena, que teriam recebido uma vultosa quantia a título de indenização depois de contraírem uma misteriosa doença que o doutor Clark jamais deu a conhecer, mas que as más línguas diziam não passar de abortos regiamente pagos.
Embora vizinhos e, a despeito da tênue amizade entre a condessa e Lady Riley, os Buckham e os Riley nunca foram grandes amigos. Scott era avesso ao comportamento falastrão e exuberante do conde, e também não se sentia confortável diante do caráter duvidoso do vizinho nobre. Tratavam-se com uma cordialidade fria nas raras ocasiões em que estavam juntos, fosse em datas comemorativas, como a Páscoa ou o Natal na igreja de Tetbury, num encontro cívico da pequena comunidade local, ou ainda, nalguma recepção na casa de amigos comuns.
- É um prazer tê-lo entre nós novamente Julian! – disse o conde, atropelando as palavras e tropeçando na própria língua.
- O prazer é todo meu, conde Buckham! – respondeu Julian com amabilidade e educação, pois ele sabia que o conde provavelmente nunca tinha notado a sua presença.
- George me disse que você pretende se dedicar a alguma coisa que venha a trazer o desenvolvimento para Tetbury, precisamos conversar a respeito. Havemos de nos encontrar em breve. Por hora não quero roubar sua atenção com a minha conversa de velho enquanto estas moças, sem dúvida, têm assuntos mais interessantes a lhe contar.
- Na verdade não tomei nenhuma decisão quanto ao meu futuro e ao que pretendo fazer, mas será um prazer ouvir seus conselhos. – revidou Julian, sabendo que tinha que inventar algumas desculpas para não comparecer a esses encontros.
É bem verdade que Julian estava apreciando aquela noite pelas três ou quatro vezes, no máximo, em que seu olhar cruzou com o de Matt. Haviam sido apenas alguns segundos, mas o brilho indecifrável que brilhava no olhar do irmão de seu amigo George, era algo que ele experimentava com inusitado prazer. Nas vezes em que estivera no castelo em sua adolescência, ou em outros encontros, Matt lhe pareceu um sujeito carrancudo e de poucos amigos. Como a mãe, a condessa de Buckham, Matt tinha aquela soberba arrogante que afastava as pessoas. Aliado a isso, ele herdara os traços dos antepassados celtas, uma estrutura óssea robusta e um corpo enorme e intimidador. Mas foi justamente isso que chamou a atenção de Julian, desde que homens com aquele porte pululavam em seus pensamentos, nem sempre muito compreendidos, mas voluptuosamente prazerosos.
Com o fim do inverno rigoroso daquele ano, Julian tentava preencher seu dia caminhando pela propriedade como que procurando inspiração para o seu futuro naquele lugar. Seu irmão Rob havia trazido dois filhotões de mastiffs de uma feira em Chippenham, pouco antes de seu regresso. Rob sabia da paixão do irmão caçula pelos cães e, a morte da velha Zoe, enquanto ele estava na universidade, deixara um vazio que entristeceu o irmão tão apegado a ela. Buster e Tucker acompanhavam cada passo de Julian desde a hora em que ele saía da cama até o anoitecer, entrelaçando-se em suas pernas como sombras do novo dono recém-chegado. Às vezes os passeios de Julian se estendiam para mais distante e ele procurava superar seus medos de montar num cavalo e se arriscava por entre a pradaria e as colinas montado em Noir, um corcel negro de quatro anos, que Edward incorporou ao plantel do haras que os Riley mantinham na propriedade. Noir logo se afeiçoou aos carinhos que recebia antes de Julian montá-lo, bem como àquele jeito suave com que as mãos de Julian conduziam as rédeas, fazendo com que ele se sentisse quase tão livre como se nem houvesse uma cela e um cavaleiro em seu lombo. Pouco ousado, Julian ficava apreensivo toda vez que sentia a potência da musculatura do garanhão entre suas pernas enroscadas com firmeza ao corpo do animal quando este resolvia apressar seu galope por conta própria. Ele sentia, simultaneamente, o potencial perigo que toda aquela energia do animal podia representar e um prazer indescritível que aquele movimento cadenciado do galope transferia para seu próprio corpo. Como ele não se mostrava firme no controle das rédeas, Noir é quem praticamente assumia o comando daqueles passeios.
Algumas vezes Matt viu aquele conjunto cavaleiro e montaria percorrendo as colinas dentro das terras do castelo. Desde a primeira visão, ele guardava uma inquietação em seus pensamentos, que chegavam a aborrecê-lo por não atinar com a razão de aquilo o perturbar. A cabeleira cor de mel, um pouco longa demais para os padrões convencionais, que emoldurava o rosto delicado de Julian e, esvoaçava com o vento cintilando quando os raios do sol a atingiam não lhe saía da cabeça. Uma camisa branca larga e quase transparente também revoava com o vento do galope enquanto as coxas grossas se salientavam ao redor do ventre do cavalo. Havia algo de forte e vigoroso naquela imagem e, ao mesmo tempo, algo de suave e harmônico. Era isso que o perturbava, a ponto de sentir raiva de si mesmo, por sentir um tesão inexplicável com aquilo. Matt jamais tinha reparado num homem antes, mas Julian parecia um paradoxo entre o que ele mais desejava numa mulher e o que abominava num homem. Quando estava na presença de Julian, cara a cara, não sabia como se portar. As palavras pareciam desaparecer de sua boca, sua mente se esvaziava e ele não sabia o que dizer. Suas mãos suavam e ele não sabia o que fazer com elas. Qualquer coisa que dissesse lhe parecia tolo e descabido. Que poder era esse, contido no olhar sereno de Julian, que o desarmava daquele jeito, fazendo-o sentir-se debilitável? Tudo o que ele, de fato, não era. Mesmo assim, um impulso parecia estar sempre querendo movê-lo na direção de Julian. Ao descobrir que este passara a fazer caminhadas vespertinas quando o sol inclemente do verão já perdia sua energia, ou cavalgava pelos arredores, ele próprio mudou sua rotina apenas para acompanhar, ao longe, aquele rapaz de beleza ímpar.
Numa tarde particularmente quente e abafada Julian havia postergado seu passeio. Os ponteiros do relógio em seu pulso indicavam que passava um pouco das cinco horas. Buster e Tucker rodopiavam a sua volta ansiando pelo tão desejado passeio, mas era tarde para aventurar-se a pé, por isso resolveu buscar Noir nas cocheiras. Benson, o cavalariço, tirou Noir da cocheira e o selou. Antes de entrega-lo a Julian levantou a cabeça em direção ao céu e advertiu-o das nuvens escuras que estavam se acumulando rapidamente.
- Creio que seu passeio não vai durar muito. Tome cuidado para a chuva não apanhá-lo no caminho. – aconselhou, esquecendo-se que aquele homem já não precisava de seus conselhos como quando era um menino travesso circulando pela propriedade.
- Não se preocupe Benson! Logo estarei de volta. – respondeu Julian, enquanto Noir, sentindo-se livre, embrenhou um galope entre a fileira de faias que ladeava o acesso da entrada da propriedade até o pátio diante da casa.
Logo que ganhou a estrada municipal que levava até o centro de Tetbury, Julian encontrou um antigo colega do colégio que também montava um belo animal e estava se dirigindo ao centro da cidade. Os dois foram conversando enquanto os cavalos emparelhados trotavam num compasso lento. Enquanto isso, o vento foi ganhando intensidade e, algumas folhas arrancadas das árvores sob as quais passavam chegaram a se emaranhar nos cabelos de Julian. Os dois se separaram pouco antes das primeiras casas da cidade começarem a aparecer na última curva da estrada, com a promessa de continuarem a conversa durante um jantar naquela mesma semana na casa do colega. Consultando seu relógio, Julian percebeu que passava das seis e meia. Demorara-se demais no passeio e, ao longe, podia-se ouvir os trovões e ver os clarões dos raios contra um céu negro e carregado. Certamente não chegarei em casa antes de a chuva começar a cair se optar por voltar pelo mesmo caminho, matutou Julian com seus botões. Decidiu que cortaria caminho assim que a estrada chegasse onde começavam as terras do castelo, vencidas algumas colinas e, atravessando a ponte sobre o rio que separava a propriedade do conde das suas estaria em casa são e salvo. No entanto, gotas do tamanho e peso de um farthing começaram a atingir Julian cada vez com mais intensidade, antes mesmo de ele chegar às terras do castelo. O rio Wells na maioria do tempo não passava de um curso d’água transparente que formava marolas de espuma branca enquanto ia se chocando com as pedras do leito. A profundidade era de pouco mais de um metro e meio, em média, e suas margens inclinadas ora eram revestidas de uma relva rala no verão, ora eram cobertas por fileiras de árvores cujos troncos e galhos se inclinavam ligeiramente sobre a água. Contudo, quando as tempestades de verão atingiam a cabeceira do rio, em pouco tempo, o topo das pedras desaparecia debaixo de uma torrente que passava arrastando tudo o que encontrava pelo caminho num rugir estrondoso que podia ser ouvido ao longe. Uma ponte com aproximadamente sessenta metros de comprimento fazia a passagem entre as terras do castelo e as da casa Riley. A ponte era toda estruturada em grossas vigas de madeira apoiadas em pilares de pedra fincados no leito do rio e tinha um assoalho de tábuas, que rangiam quando algo mais pesado passava sobre ela além de um telhado de quatro águas construído com taubilhas de ardósia.
Matt percorria os campos em direção ao castelo também montado num cavalo quando avistou Julian, já tão encharcado quanto ele próprio, com a camisa branca folgada aderida ao corpo, entrando debaixo da ponte. Quase simultaneamente, um raio atingiu uma árvore no topo da colina próxima. O estrondo fez tremer a estrutura da ponte e a água barrenta descendo num turbilhão agitado vista por entre as frestas do assoalho de madeira fizeram com que Noir se assustasse empinando as patas dianteiras no ar para em seguida, disparar num galope. Ao ressurgir do outro lado da ponte, Julian ainda estava sobre a sela, mas já não tinha mais o controle do animal. Sem hesitar, Matt disparou seu cavalo na direção em que Noir levava Julian, agarrado à sela e sem saber como parar o cavalo, pois as rédeas haviam lhe escapado das mãos durante o pinote quando tentou se segurar no pescoço do animal. Alcançou-o cerca de oitocentos metros depois, interpondo-se na frente de Noir e agarrando as rédeas. Julian tinha a face lívida e o olhar arregalado, parecia estar em choque. Tão logo Noir parou por completo, seu corpo deslizou para baixo do cavalo e ele teve que se apoiar nele para não cair, uma vez que suas pernas pareciam não querer suster seu peso.
- Você está bem? – perguntou Matt, também apeando do cavalo e procurando dar apoio a Julian.
- Acho que estou. Estou. – balbuciou Julian, procurando abrigo naqueles braços vigorosos que o sustinham.
- Que imprudência infantil ficar cavalgando debaixo de uma tempestade dessas! – censurou Matt, pois não sabia mais o que dizer.
- E você faz o que sob esse aguaceiro? Não me parece que você seja tão adulto assim ou muito mais responsável do que eu! – revidou Julian, exasperado com aquela crítica infundada.
- Tem razão! Então somos dois irresponsáveis. – retrucou Matt, abrindo um raro sorriso e não querendo criar um conflito desnecessário.
- Desculpe! Não quis ser rude ou parecer ingrato. Obrigado por ter me salvo de um desastre. – disse Julian, soltando lentamente aqueles braços onde estava embaraçosamente aconchegado.
- Venha comigo! O castelo está mais próximo do que a sua casa. Temos que sair dessa chuva antes de contrairmos uma pneumonia. – determinou Matt. – Acha que consegue subir no cavalo? Deixe que eu seguro as rédeas. – acrescentou um pouco contrariado, por se afastar daquele torso quente que estava em seus braços.
Quando entregaram os cavalos ao cocheiro Julian tinha os lábios arroxeados e tremia. Ele não sabia se do frio que o anoitecer e a chuva trouxeram consigo, ou se de nervosismo por ter quase se arrebentado todo. Eles entraram por uma porta lateral no castelo, a que estava mais próxima e que os fez percorrer o caminho mais curto debaixo da chuva torrencial que continuava caindo. As salas e corredores pelos quais passaram estavam mergulhados na penumbra e num silêncio sepulcral. Subiram a escadaria até o terceiro andar e, no fim de um largo corredor repleto de quadros pendurados na parede e alguns móveis encaixados nas reentrâncias, onde Julian nunca estivera antes, entraram num quarto amplo cujos janelões davam para o pátio fronteiriço do castelo e que estavam sendo fustigados pela chuva. Julian nem reparou direito na decoração do aposento, apenas seguiu na direção em que Matt apontava indicando-lhe um banheiro anexo.
- Tire essas roupas encharcadas! Há toalhas nas prateleiras próximas da banheira. – disse calmamente, ele mesmo começando a se livrar ali mesmo de suas roupas encharcadas pingando sobre o piso de madeira envernizada.
Julian despiu-se constatando que até suas ceroulas estavam molhadas e meteu-se rapidamente debaixo do chuveiro. A água morna que descia pelo seu corpo foi, aos poucos, fazendo cessar a tremedeira e, uma sensação de conforto o envolveu completamente. Matt entrou nu em pelo no banheiro tirando-o de seu devaneio. Embora Matt não tenha olhado em sua direção, ele se encolheu pudicamente tentando cobrir sua nudez.
- O que faz aqui? Você podia ter esperado eu sair! – ralhou Julian, encabulado por ter a imagem daquele macho enorme e caralhudo a tão pouca distância de si.
- Ora, eu estou tentando me secar! Que pergunta mais descabida! – retrucou Matt, lançando pela primeira vez seu olhar cobiçoso sobre aquele corpo languido, sem nenhum pelo, à exceção de uns poucos pubianos distribuídos num triangulo pequeno e perfeito. – Separei umas roupas, estão sobre a cama, mas acho que vão ficar folgadas em você. Em todo caso é só o tempo de mandar secar as suas. – acrescentou, disfarçando para tentar tirar seus olhos daquele corpo sedutor.
Julian passou por ele enrolado numa toalha em direção ao quarto. Antes que pudesse vestir as calças, sentiu que Matt estava colado atrás dele e passando os braços ao redor de seu tronco puxava-o para junto de si. Suas nádegas se encaixaram na virilha dele e um gingado fez com que a rola descomunal de Matt roçasse seu rego apertado.
- O que você pensa que está fazendo? Solte-me imediatamente! – protestou Julian, procurando se desvencilhar do abraço constritivo que o cerceava.
Matt ignorou deliberadamente a queixa de Julian. Ao contrário, intensificou a força para contê-lo junto a si, pois aquela pele branquinha e lisa tinha um perfume que se assemelhava ao feromônio de uma fêmea no cio, convidando os machos para a cópula. A agitação de Julian serviu apenas para lhe provocar uma ereção consistente e vigorosa. Possuído por uma sanha desesperada, ele beijou e lambeu o pescoço de Julian que tentava a todo custo se desvencilhar dele. Sem poder controlar aquele comportamento animalesco, ele se atirou sobre Julian derrubando-o em cima da cama e esfregando todo seu peso naquele corpo deliciosamente arrebatador. Subjugado e a mercê de Matt, Julian sentiu a rigidez de uma tora entrando brutalmente em seu cu em direção ao íntimo de suas entranhas, rasgando tudo o que encontrava pela frente. Ele soltou um grito pungente que reverberou pelo aposento ao se sentir empalado por aquele cacetão. Foi a mais inverossímil e ambígua sensação que já experimentara. Se a entrada de algo tão calibroso por aquela via lhe provocava uma dor aguda quase insuportável, por outro lado, o latejar daquela carne quente entre suas nádegas contraídas por um reflexo involuntário, provocava o mesmo prazer que sentia quando toda a energia e potência dos músculos de Noir eram transmitidos para o seu corpo. O que Matt introduzira nele era tão potente e vibrava retesado no seu cu que ele podia sentir toda a agitação de que Matt estava possuído. A partir daí, ele apenas gemeu. Capitulou e deixou-se possuir, entregando-se incondicionalmente.
Matt não acreditava no prazer que aquela posse estava lhe proporcionando, nunca um coito tinha lhe dado tanta satisfação. No momento em que sentiu aquele cuzinho se fechando ao redor de seu membro numa contração pujante, seu caralho parecia querer explodir. Julian não era como qualquer mulher com quem ele já estivera, que deliberadamente se deixava penetrar, arregaçando sua pelve e abrindo sua vagina para alojar uma pica. Ele tinha a energia de um homem e uma vontade férrea de não deixar que nada lhe embrenhasse pelo cu. Foi preciso dominá-lo, subjuga-lo, antes de sentir aquela entrega que foi a mais sublime que já havia sentido. Nada lhe deu tanta certeza de sua masculinidade, e ele foi percebendo que Julian não o rechaçava, mas que ia agasalhando sua rola intrépida e deslizando carinhosamente suas mãos, cujos dedos, longos e delicados mostravam uma fragilidade aparente, em seus braços peludos sobre os quais ele se apoiava na cama, enquanto sua pelve se movimentava cadenciadamente num vaivém socando prazerosamente a rola naquele cuzinho.
- Você é muito gostoso! Essa bunda carnuda e lisinha está me deixando louco! – rosnou Matt no cangote de Julian.
- Eu estou confuso, Matt. Você é um bruto, é o que sinto. – balbuciou Julian, aplacando toda aquela impetuosidade que latejava dentro dele.
- E o que mais você sente Julian? – instigou Matt.
- Você. E todo o seu furor. – respondeu Julian.
- Está gostando? – inquiriu Matt, ao mesmo tempo em que metia lenta e progressivamente todo seu cacete naquela maciez receptiva, fazendo suas bolas ingurgitadas baterem contra as nádegas apartadas.
- Estou! – sussurrou Julian.
Essa concordância era mais do que seu autocontrole podia suportar e Matt sentiu sua pelve se retesando, seu caralho engrossando e uma contração levando a uma explosão de energia acumulada se transformar em jatos de porra que ele despejava naquele cuzinho satisfazendo seus mais primitivos desejos. Julian soltou um ganido quando aquela pica, num impulso potente, atingiu sua próstata, antes de inundá-lo com um líquido benfazejo, morno e pegajoso, que ia se aderindo a sua mucosa esfolada. Esgotados, ambos se deixaram ficar ali deitados, um sobre o outro, enquanto seus corpos unidos pulsavam no mesmo ritmo. Nem um dois sabia o que fazer com tanta felicidade, talvez palavras não pudessem exprimir todo aquele sentimento. Lá fora, a chuva havia cessado, ouviam-se as últimas gotas percorrendo as calhas e descendo pelos dutos do telhado. Havia anoitecido. Os dois se ajeitaram melhor entre os travesseiros e Julian apoiou a cabeça no peito de Matt, brincando com os densos pelos que o cobriam, e percebeu que Matt estava adormecendo. Pouco depois, ele mesmo caía no sono embalado por aquele tronco largo que subia e descia a cada vez que Matt respirava. A última coisa de que se lembrou de sentir, é que seu cuzinho ardia e em suas entranhas parecia haver um vazio gigantesco.
Matt acordou no dia seguinte assim que os tênues raios de sol entraram pelas janelas e atingiram seu rosto. Ele esfregou os olhos e sentou-se na cama. Julian estava virado para o outro lado, seus cabelos espalhados sobre o travesseiro brilhavam sob os raios do sol, o lençol o cobria apenas da cintura para baixo, sua respiração tranquila indicava que ainda dormia. Matt acariciou aqueles cabelos com cuidado para não acordá-lo. Sentiu uma vontade irresistível de tocar a pele de suas costas expostas, mas preferiu ficar observando-as deleitado. Só não se furtou a levantar cuidadosamente o lençol e lançar um olhar sobre aquela bunda carnuda na qual sua rola havia encontrado a satisfação na noite anterior. A benga já estava à meia bomba como todas as manhãs ao acordar, no entanto, o vislumbre daquelas nádegas acendeu-lhe o desejo e a ereção se completou. Ele deu uma coçada no saco e tentou refrear a pica. Conteve-se e ficou admirando a beleza de Julian em silêncio.
Julian acordou perdido tentando se situar no ambiente estranho que estava a sua volta. Assim que percebeu que não estava em sua cama, virou-se abruptamente e deu de cara com o sorriso de Matt o encarando. Aquilo o tranquilizou e ele retribuiu o sorriso.
- Achei que fosse dormir a manhã toda! – disse Matt, agora encorajado, puxou o corpo de Julian para junto de si e acariciou seu rosto.
- Você devia ter me acordado! Que horas são? – balbuciou Julian, ainda sonolento, mas feliz por poder abraçar aquele tronco musculoso.
- Ainda é cedo. Passa um pouco das sete. – respondeu Matt. Beijando em seguida aqueles lábios de um vermelho vivo e úmido.
- Então é para cá que você traz as suas vítimas! – observou Julian, depois do longo beijo que trocaram e, de ele dar uma olhada por todo o aposento que, sob a luz do sol, podia ser contemplado por inteiro.
- Nunca trouxe ninguém para cá. Você foi o primeiro e o único. E, eu não diria que você é uma vítima, mas sim um resgatado, uma vez que o livrei de um apuro. – retrucou Matt, esboçando um risinho de vitória, e tomando um dos mamilos de Julian entre seus dedos.
- É verdade! Tenho que admitir que tive muita sorte de você estar por perto. – concordou Julian.
- Sorte tive eu em te descobrir! Nunca senti algo tão gostoso quanto você. – disse Matt.
- Nem eu. – admitiu Julian, passando a deslizar as mãos sobre o peito de Matt em direção a seu rosto e beijando-o novamente. Instantes depois, ele sentiu Matt entrando em seu cuzinho com a mesma intensidade e volúpia da noite anterior. Ele gemeu e ganiu até sua ampola retal estar repleta de porra. Desta vez ele também gozou, sem mesmo ter tocado em seu pau.
Julian só percebeu que suas roupas estavam secas e passadas quando voltou ao quarto depois de ter tomado uma bucha rápida com Matt. Ao lado estavam as botas de montaria igualmente secas e brilhando como se tivessem acabado de sair da loja. De repente, ele sentiu um temor se apossando dele. A essas alturas, no mínimo o valete de Matt já sabia que ele havia dormido com Julian. Ele ficou se perguntando que desculpa Matt teria dado ao empregado para justificar aquelas roupas, e pior, o que estaria pensando o criado ao constatar que elas haviam passado a noite toda ali.
- Como vou explicar a sua família a minha presença tão cedo no castelo? O que você disse ao seu valete para justificar as minhas roupas em seu quarto? – perguntou Julian, com uma ansiedade angustiante na voz.
- Ei, acalme-se! Vamos por partes. Para a primeira pergunta, dizendo a verdade, ora essa! E, para a segunda, nada. Pearce é um sujeito discreto, você não precisa se preocupar. – respondeu Matt calmamente, investindo mais uma vez sobre o corpo parcialmente vestido de Julian. Mas este se esquivou antes que ele pudesse lhe dar uma encoxada.
- Pare! Ele pode ser discreto, mas não é nenhum tolo. Ele sabe muito bem o que aconteceu neste quarto. Que droga! – ralhou Julian contrariado.
Apenas o conde e a condessa estavam à mesa do café. Não se falavam, como de costume. As poucas frases que trocavam entre si geralmente eram ditas apenas diante de estranhos ou quando estritamente necessário. Ambos cumprimentaram Julian com entusiasmo, e ouviram a história da tarde anterior fazendo comentários sem a maior importância. Ao final da narração, Julian percebeu que tinha sido mais fácil encará-los do que ele havia imaginado.
- Você vai precisar do automóvel, papai? Vou levar Julian para casa, pois acho que ele ainda está traumatizado com o comportamento de seu cavalo. – questionou Matt, dando uma piscadela na direção de Julian quando mencionou a palavra ‘traumatizado’.
- Não, não! Faça isso! E dê minhas recomendações a Lady Riley. – respondeu o conde, levantando-se ao colocar o guardanapo sobre a mesa e dirigindo sua última frase a Julian.
- Grato conde Buckham, serão dadas, obrigado! – respondeu Julian, fazendo menção de se levantar ao mesmo tempo em que o conde gesticulava para que permanecesse sentado.
- Que indiscrição foi aquela de ficar piscando para mim na presença de seus pais? Quer que todos saibam o que aconteceu? – disse Julian zangado, quando entraram no automóvel.
- Falei alguma mentira? Eu sei que você está traumatizado, sem condições de subir numa sela e enfrentar o caminho até sua casa, o sangue nos lençóis é a mais contundente prova do que estou falando. – respondeu Matt, com aquele mesmo risinho sarcástico que tinha o poder de irritar Julian ainda mais.
- Santo Deus! Os lençóis! Havia me esquecido deles. É mais uma evidência do que aconteceu naquele quarto. – Penitenciou-se Julian, enquanto suas faces se coravam. – E você está aí todo cheio de si, convencido e se gabando do que fez ao meu ..., bem, você sabe! – continuou, dando um leve soco no braço de Matt.
- Ao seu cuzinho, você quer dizer! Não vou negar que senti meus brios aflorarem e me convencer da minha virilidade, quando vi aquelas gotas de sangue. Eu já te disse que você me fez experimentar uma satisfação que jamais eu sonhara pudesse existir. Não sei por que está tão chateado? – retrucou Matt.
- Engraçadinho! – Julian percebeu que não adiantaria levar adiante aquela discussão. Depois, ele próprio, apesar de estar com o cu ardendo, tinha vivido a mais fascinante experiência de sua vida.
Na casa Riley todos estavam alvoroçados com o que tinha acontecido. Embora o senhor Bates, o mordomo, já tivesse feito uma ligação na noite anterior, comunicando que Julian passaria a noite no castelo devido a chuva, foi apenas quando tiveram certeza de que ele estava ileso que os ânimos se acalmaram. Então vieram as reprimendas. Julian e Matt se entreolharam enquanto Lady Riley descarregava toda sua angustia acumulada desde a véspera.
Embora não tenham se visto nos dias que se seguiram, Julian não conseguia tirar Matt de seus pensamentos. Em sonho, chegou a acordar assustado sentindo o caralhão de Matt latejando dentro dele. Voltava a adormecer, convencido de que aquele homem, que a princípio lhe pareceu tão preconceituoso com aqueles que não tinham a mesma origem nobre dele, e arrogante frente a outro homem que não tinha o mesmo aspecto viril que ele, havia capitulado diante do prazer que ele tinha lhe proporcionado. Um prazer inusitado que, no entanto, ele não sabia se Matt voltaria a procurar.
A destilaria estava demandando muita atenção por parte de Edward assoberbando-o de trabalho e Julian resolveu que se associaria ao irmão para tocar o negócio adiante. Mesmo empenhado no trabalho, Julian manteve a rotina dos passeios só para ter um pretexto para encontrar-se com Matt. Este, menos avesso a um compromisso que o prendesse a uma rotina, vagava inquieto pelos cômodos do castelo esperando a hora de se encontrar com Julian. Amavam-se ora debaixo de algum frondoso carvalho, ora numa antiga cabana abandonada que servira de apoio quando naquelas terras se promovia a caça a raposas e, ora naquele mesmo quarto onde se amaram da primeira vez, e que Julian veio a descobrir que não era o aposento onde Matt dormia regularmente, confirmando que aquele quarto, isolado dos demais, servia como uma espécie de garçonnière. Aquilo deixou de ter importância quando sentiu que estava cada vez mais envolvido emocionalmente com Matt e, que aquele amor proibido que se apossara de ambos se intensificava a cada encontro.
Decorrido quase um ano daquela cumplicidade amorosa, foi com estranheza que Julian percebeu que o comportamento de Matt tinha se modificado nas últimas semanas, quando um vento glacial que soprava do norte indicando que um inverno rigoroso estava se aproximando, e os obrigava a restringir seus encontros ao quarto do terceiro andar do castelo. Ele não tocou no assunto nos primeiros dias. Julgou que Matt devia estar amuado com alguma das corriqueiras desavenças com o pai, e resolveu não trazer esses problemas para o leito onde se redobrava em carinhos pelo amado.
- O que está acontecendo com você? Está tão calado e um pouco distante ultimamente. – arriscou quando ficaram a sós, num anoitecer em que tinha jantado no castelo em companhia de toda a família e depois, ficado para pernoitar uma vez que uma bruma espessa tornava perigosa a volta para casa já tarde da noite.
- Nada! – devolveu Matt, sem encará-lo.
- Já o conheço o suficiente para saber que algo o está apoquentando. Não acha que mereço compartilhar suas angústias? – retrucou Julian, entristecido por não ter a confiança do amado.
- Você está procurando pelo em ovo! Não há nada me incomodando. – respondeu Matt, sem muita convicção.
- Se você prefere assim, tudo bem. Quem sabe você não me ame tanto assim, a ponto de confiar em mim. – sentenciou Julian, levantando-se do colo de Matt onde estava sentado já sentindo a ereção do cacete melado se insinuando em seu rego, e caminhando nu até uma das janelas onde era impossível de se distinguir o que havia do lado de fora, exceto o denso nevoeiro.
- Jamais diga isso novamente! Eu o amo tanto que seria capaz de morrer por você! Nunca duvide disso! – zangou-se Matt, vindo atrás de Julian e o envolvendo em seus braços e numa encoxada que acomodou aquelas nádegas quentes em sua virilha.
- Não é o que parece! – retorquiu Julian, amuado.
- Não te aborrecer com meus problemas, só isso. – revidou Matt, admitindo finalmente que algo não ia bem.
- Você é tudo para mim! Não consigo vê-lo angustiado e não me incomodar com isso. – afirmou Julian.
- Vem cá! Temos tão pouco tempo só para nós que não quero desperdiça-lo com bobagens. – declarou Matt, arrastando-o para a beirada da cama onde mal Julian havia subido de joelhos quando a pica sedenta de Matt distendeu suas pregas apertadas, fazendo com que um ganido aflorasse em seus lábios e o enchesse de tesão.
- Bruto! – gemeu Julian, quando Matt ejaculava no fundo de seu cuzinho e estocava suas entranhas com selvageria.
- Devo me casar com Juliet Stuart! – sentenciou Matt, enquanto Julian brincava com a ponta dos dedos no redemoinho de pelos negros de seu peito, depois de terem se amado.
- O que? – perguntou Julian, incrédulo com o que tinha acabado de ouvir.
- Você sabe que este castelo e o título honorífico do meu pai são mera fachada. Há tempos que a fortuna dos Buckham não é mais a mesma. O casamento do filho mais velho com uma Stuart seria a solução para essa questão. – Matt falava sem nenhuma emoção na voz, como se seu destino estivesse traçado e, a ele só coubesse segui-lo.
- E você vai concordar com isso! – exclamou Julian, sentando-se na cama e encarando Matt desafiadoramente.
- Você sabe que não é isso que eu quero para a minha vida. Mas, há muita coisa em jogo, e eu não sou um irresponsável. – proferiu Matt, como se aquelas palavras justificassem aquilo em que nem ele acreditava.
- Se não quer, não faça! – retrucou Julian.
- E o que quer que eu faça? Que diga a todos que eu amo outro homem? Que futuro acha que teremos juntos? Ou você acha que a sociedade vai nos aplaudir por vivermos fornicando em ilicitude? – Matt elevou o tom da voz, como para censurar os pensamentos de Julian.
- Seja macho! É isso que espero de você! – revidou Julian, quase chorando.
- Você não sabe o que está dizendo! É por conta disso que não queria falar sobre isso com você. – disse Matt.
- Prefere me deixar alienado de seus problemas, não é? Quem sabe também não prefere me deixar fora da sua vida? – Julian não se importava em esconder seu choro, tinha muito medo de perder Matt para sempre. E, essa possibilidade estava tomando forma.
- Você é mesmo um crianção! Nem por um segundo isso me passou pela cabeça. Eu te amo! Você precisa acreditar nisso. – retrucou Matt, voltando a abraçar Julian cheio de carinho.
Os acontecimentos dos meses seguintes infelizmente não confirmaram as afirmações de Matt. Um convite de casamento chegou à mansão Riley, trazida pelo valete magricelo de Matt, no final de uma manhã de primavera quando todos estavam prestes a se sentar à mesa do almoço. Lady Riley abriu o envelope de papel alvíssimo e encorpado onde se destacavam letras azuis numa caligrafia rebuscada, e leu em voz alta o que estava escrito na folha encimada pelo brasão dos Buckham. Julian sentiu as lágrimas descerem por suas faces e tentou disfarçar seu desespero alegando que perdera a fome.
Julian partiu para Londres na manhã seguinte alegando o desejo de rever uns amigos da universidade e aproveitando sua estada na cidade para providenciar questões pendentes da destilaria e, que estavam mesmo precisando ser resolvidos há algum tempo. Ninguém desconfiou de seus reais motivos. Matt o esperou em vão naquela tarde embaixo da sombra do carvalho onde costumavam se encontrar, bem como nos dias que se seguiram. Só soube da partida de Julian alguns dias depois quando, já desalentado, apareceu na casa dos Riley como quem fazia uma visita despretensiosa. Desde então, não teve um minuto de sossego, achando que tinha perdido Julian para sempre.
Julian só retornou a Tetbury depois do casamento consumado. Parecia que em Londres haviam lhe roubado aquela jovialidade que o caracterizava. O Julian que voltou era um homem acabrunhado e de poucas palavras que, ou estava mergulhado no trabalho da destilaria, ou estava recluso em seu quarto como um monge no claustro. Todos acharam que talvez ele estivesse doente. A mãe chegou a convidar o doutor Larson, velho amigo de Scott, para um chá, mas a finalidade verdadeira era que ele visse e conversasse com Julian para dar um diagnóstico.
- Não o examinei, mas posso garantir que Julian está bem Sybill. Não se preocupe! Ele me parece apenas um pouco tristonho, houve algo que pudesse tê-lo deixado assim? – disse o médico quando se despediu dela.
- Não que saibamos, Larson. De qualquer forma, muito obrigada meu amigo pela visita. – respondeu Sybill, mais preocupada do que antes.
Matt não demonstrou um mínimo de afeto por Juliet desde o primeiro dia de casados. Ela sabia que aquele enlace não passava de um acordo financeiro entre suas famílias. Sua irmã mais velha vivia uma situação semelhante, o que as aproximou muito mais do que nos tempos em que eram crianças. Ela estava disposta a manter as aparências de um casamento feliz conquanto Matt a tratasse civilizadamente. A irmã a estava ensinando a obter os prazeres carnais de uma maneira muito mais instigante e aventureira.
Julian e Matt quase não se viram depois do casamento, fosse porque Julian se esquivava dessas ocasiões, fosse porque Matt sentisse que a esposa vigiava seus passos. Acostumado a uma liberdade que lhe permitia tudo, Matt sentia-se como que enjaulado.
- Esteja na cabana de caça amanhã no início da tarde! – ordenou Matt num sussurro nos ouvidos de Julian, quando ele e o pai o encontraram casualmente diante do posto do correio de Tetbury. – Se você não aparecer juro que vou busca-lo onde quer que esteja! – emendou ríspido.
Julian aprendera a não contrariar Matt quando ele usava aquele tom de voz. Pouco depois das duas da tarde ele chegava à cabana, acompanhado de Buster e Tucker, onde Matt o esperava do lado de fora chutando o chão numa clara demonstração de impaciência. Julian veio disposto a falar poucas e boas para Matt e, a por um fim no relacionamento deles. No entanto, ao vê-lo ali tão inquieto, toda a coragem da qual havia se armado desapareceu. Mesmo assim caminhou a passos firmes na direção dele.
- Por que você está fazendo isso conosco? Onde está aquele amor que você disse sentir por mim? – foram as palavras irrompidas desenfreadamente da boca de Matt.
- Eu? O que foi que você fez ao nosso amor? – retrucou Julian, devolvendo a culpa para Matt. – Não fui eu quem me casei sabendo que isso seria o nosso fim. – emendou corajoso.
- Você sabe que isso não é um casamento e sim um negócio. Eu te expliquei isso mil vezes. – devolveu Matt exasperado.
- E você acha que só por isso eu tenho que aceitar esses termos? – questionou Julian.
- Eu achei que nosso amor fosse maior do que esses entraves! – exclamou Matt
- Você chama isso de entraves? Há pessoas e sentimentos em jogo, você não se importa com isso? – quis saber Julian.
- Aí é que está, não há sentimentos em jogo, exceto os nossos. O resto é puro negócio. – afirmou Matt.
Por mais de meia hora os dois ficaram trocando farpas, até que Matt, saturado daquela discussão infrutífera, partiu para cima de Julian, derrubando-o na relva fofa e arrancando suas vestes sem nenhum cuidado. Beijava-o louca e saudosamente, até sentir a pele morna das nádegas de Julian em suas mãos afoitas. Penetrou-o a princípio com selvageria, depois de ouvir os gemidos agoniados de Julian, foi imprimindo um vaivém mais cadenciado e carinhoso naquele cuzinho que o acolhia cheio de brandura. Amaram-se até gozarem. Ambos estavam molhados de suor quando terminaram e ficaram estendidos, exangues, um ao lado do outro, apenas de mãos dadas. O entardecer ia avançando sem que eles se dessem conta. Parecia que a paixão havia voltado mais forte do que antes e, que nenhum problema podia se interpor naquele amor.
Matt entrou na sala de música do castelo, todo amarfanhado, muito depois de findo o jantar. Juliet estava sentada num dos sofás cercada pelas irmãs e da condessa, que a consolavam de um pranto quase sem lágrimas. O conde caminhava impaciente de um lado para o outro.
- Por onde você andou? Não se esqueça de que você tem uma esposa e uma família contando com você à hora das refeições. – ralhou o conde em voz alta.
- Não sou nenhuma criança para ouvir seus sermões! Eu apenas me demorei na cavalgada um pouco além da hora. – retrucou Matt.
- Mentira! – gritou Juliet, encarando-o com os olhos injetados de raiva. – Você foi visto se esbaldando numa fornicação feito um animal com outro homem nos arredores do castelo. Confesse. Não adianta inventar desculpas. Você é o ser mais abjeto que já conheci. – despejou encolerizada.
- Cale-se! Deixe de histeria! Quem quer que tenha inventado um absurdo desses está mentindo. – afirmou Matt, tentando esconder sua surpresa.
- Vou hoje mesmo comunicar aos meus pais que não fico mais um dia nessa casa, conde Buckham. – asseverou Juliet, cheia de soberba.
- Acalme-se minha filha! Não vamos nos precipitar e tornar as coisas mais difíceis. Você sabe que não se pode confiar cegamente nos criados. Pode estar havendo algum mal entendido nessa história. – disse o conde, preocupado com o escândalo iminente e com a repercussão financeira que podia advir dessa situação. A condessa fez coro às palavras do marido, pois sabia que um escândalo de tais proporções seria a ruína definitiva de sua posição.
- Não me peçam o impossível! Não posso conviver com um pederasta e fingir que não sei de nada. – Juliet tinha plena consciência da importância de sua fortuna para aquela família, e tripudiaria sobre todos por conta disso para se vingar do destino que a vida lhe reservou.
- Pois que vá! Vá para os infernos! Seu pai não vai hesitar em trocá-la por outra chance de associar seu sobrenome insignificante a outro nobre falido qualquer. Seu pai não está nenhum um pouco preocupado com você, mas com a oportunidade de ser reconhecido e aceito socialmente. – afirmou Matt, arrependido de aceitar aquele contrato aviltante.
Juliet sabia que o que ele estava afirmando era verdade, e tratou de retomar a compostura.
O acontecido se espalhou por Tetbury como rastilho de pólvora, ganhando a cada replicação mais detalhes picantes, que eram para dar verossimilidade a quem contava. Quando chegou a casa dos Riley o caos se instalou. Sybill acusou o filho de desonrar a memória digna do pai. Rob, o irmão mais velho de Julian, estava tão afinado com o papel de guardião daquela família que numa breve interpelação do irmão resolveu dar-lhe uma surra como Julian jamais havia levado. Ninguém interveio em seu socorro e a tênue intenção de revidar a agressão do irmão apenas serviu para aumentar a ferocidade de seu algoz. Execraram-no como se fosse possuidor de uma pestilência.
- Sodomita, pederasta! Você lançou o nome do nosso pai na lama! – berrava Rob, enquanto um arreio de couro tirado do estábulo marcava a pele alva de Julian. – Como vamos ser apontados na rua? Como os irmãos do afeminado em cujo cu o sucessor de Beverstone se esbalda? Sem-vergonha pervertido! – vociferava Rob, possuído por um misto de raiva e humilhação.
Julian mal conseguiu subir as escadas em direção a seu quarto depois da surra do irmão. Encaracolou-se sobre os cobertores e, a cada soluço de um pranto engolido, seu corpo sacudia fazendo com que a dor se espalhasse por suas carnes feridas. Estava perdido, pensou consigo mesmo. Naquele lugar distante, longe que qualquer traço de modernidade, habitado por uma aristocracia que vivia de aparências e de uma polidez afetada, jamais o aceitariam como um igual. Seria apontado como um ser que apenas merece o desprezo por seu comportamento obsceno. Ele passou a noite em claro. Vinham-lhe à mente imagens confusas. Estava com a cabeça entre as coxas grossas e peludas de Matt sorvendo, deliciado, cada gota de porra que ele ejaculava em sua boca quando um aglomerado de rostos conhecidos de Tetbury os flagrava com olhar de repúdio. Era interceptado por um bando de aldeões durante sua cavalgada vespertina, que o obrigavam a apear de Noir e, munidos de paus e cassetetes, moíam seus ossos debaixo de uma pancadaria desenfreada. No auge dos pesadelos, chegou a ver Matt e a si próprio sendo levados dentro de caixões ao cemitério que ficava na colina atrás da igreja. Nenhum parente ou conhecido acompanhava o féretro. Quando o sol começou a entrar através do cortinado das janelas, ele mal podia mover um músculo sem que uma dor lancinante o desestimulasse a se mexer. Ao despir-se para entrar no chuveiro, quase entrou em choque ao ver seu corpo coberto pelos hematomas deixados pelo arreio. Chorou copiosamente enquanto suas lágrimas se fundiam com a água tépida que caía sobre sua cabeça. Ninguém estava sentado à mesa do café da manhã quando ele desceu. Gracie trouxe-lhe o café num bule de prata por cujo bico saía um vapor que ia se retorcendo no ar até desaparecer. Ela o cumprimentou laconicamente e, algo em seu olhar denunciava que ela estava ciente de tudo. Enquanto tomava seu desjejum, ouviu a presença da mãe na sala principal. Foi para lá que se dirigiu quando terminou. Ele não conseguiu ler o que estava camuflado por trás daquela expressão indefinida do rosto materno, mas aquele brilho frio nos olhos de Sybill o assustou.
- Estivemos conversando e chegamos à conclusão de que você não pode continuar morando aqui. Pegue suas coisas e deixe esta casa ainda hoje. - ela falava sem nenhuma emoção na voz firme e decidida. – Teremos que conviver com a nuvem da vergonha pairando sobre nós, mas não temos que ter sua presença ao nosso lado nos lembrando, a cada instante, das coisas nojentas que você e aquele desocupado faziam por aí, às vistas de quem quisesse ver.
- Mãe, eu nunca quis envergonhar vocês! – Sybill deixou de encará-lo quando ouviu a palavra mãe. – Eu não sei explicar como isso aconteceu. De um momento para o outro, eu percebi que sentia um amor profundo pelo Matt. Foi algo que eu não procurei deliberadamente, mas que aconteceu sem eu me dar conta. Com ele as coisas também aconteceram mais ou menos assim, de um dia para o outro ele sentiu que estava apaixonado por mim. A princípio nem soubemos como lidar com esse sentimento. Com o tempo decidimos não lutar contra ele, apenas deixamos que ele acontecesse. – as palavras pareciam estar brotando diretamente de seu coração, enquanto ecoavam pela sala ele se deu conta de que nunca tinha visto o relacionamento com Matt com tamanha clareza.
- Ora deixe de falar absurdos! Onde já se viu dois homens falarem de amor entre si? O que se passa entre vocês dois não passa de safadeza e prostituição! – ela se recusava a ver as coisas com o olhar apaixonado do filho. – Procure outro lugar para perpetrar sua libertinagem com aquele pervertido. – emendou, deixando a sala sem olhar para trás.
Julian quis ligar para o castelo a procura de Matt, mas desistiu, pois isso poderia acirrar ainda mais os ânimos já exaltados. Também não tinha como procura-lo, seria ainda pior ser visto procurando por ele. Acabou tomando o trem das dezesseis e quinze para Londres com um punhado de malas que se empilhavam sobre os carrinhos de dois carregadores. Num trecho da linha férrea que corria paralelo ao rio Wells, Julian avistou o castelo Beverstone, imponente no cume da colina, antes do comboio contornar a última curva que separava os arredores de Tetbury da zona rural. O que estaria acontecendo com Matt entre aquelas paredes de pedra? Seu peito se comprimiu numa solidão dolorosa.
Como na anterior, Matt dormiu naquela noite no quarto do terceiro andar. O perfume dos cabelos de Julian estava nos travesseiros e ele se deu conta de que aquele aroma, o calor da pele e o sabor da boca de Julian transcendiam a qualquer outra coisa nesse mundo. Ele também passara as duas noites sem conciliar o sono. Se perdesse Julian sua vida, já tão sem propósito, perderia todo o sentido. O clima no castelo não diferia muito do da mansão Riley. Rostos acusatórios o encaravam em todo canto.
- Parto esta tarde para Southampton e, de lá, para a Índia, no primeiro navio que zarpar. – comunicou Matt aos pais e a esposa pouco depois do almoço. – A partir de hoje tomo as rédeas da minha vida e, isso não pode ser feito aqui. – acrescentou.
- Mais uma de suas loucuras! Eu estou farto desses arroubos! Você tem uma esposa, trate de dar-lhe filhos e viver como um homem normal. – o pai quase se engasgou com o licor que acabara de colocar na boca, em resposta ao comunicado do filho. A condessa e Juliet se entreolharam apreensivas, pois sabiam que aquilo não era simplesmente um arroubo. No olhar de Matt não havia hesitação.
- Até agora o negócio com os Stuart trouxe benefícios apenas a vocês. Como ninguém se importou comigo, não vejo porque não fazer o mesmo com vocês. Eu nunca quis esse casamento e, nem você Juliet. Portanto, não sejamos hipócritas. O melhor que temos a fazer é seguir nossos rumos. – emendou, encarando Juliet com severidade e fazendo com que ela, a todo custo, tentasse verter uma única lágrima que não veio.
- E que rumo seria esse? O de se satisfazer na lascívia daquele pederasta, copulando entre as colinas desta herdade? Ora, assuma sua condição de herdeiro de nossa tradição. Você será o futuro conde Beverstone. – vociferou o conde com o rosto vermelho e irritado.
- Herdeiro de tradição? Ora, que herança é essa? Acabamos de entrar no século XX, veja o que está acontecendo com essa aristocracia falida. Não existe mais lugar nesse mundo para pessoas que parasitam nas costas de outros. Quanto tempo vocês acham que vai durar a fortuna de Juliet bancando a opulência dessa vida fútil? – Matt enxergava a vida depois da perda de Julian sob outro prisma.
- Essas são ideias revolucionárias que aquele sujeito pervertido deve ter enfiado na sua cabeça. Você não é nenhum plebeu! Portanto, comporte-se como alguém de sua estirpe! – interveio a condessa, passando por cima do fato de sua nora, sentada a seu lado, ser uma plebeia que injetou recursos naquele castelo com sua vinda.
- Pensem como quiser! Parto esta tarde, e ponto final! – sentenciou Matt, deixando-os sob a perplexidade da decisão.
Os mesmos pensamentos aflitivos que atormentaram Julian se apoderaram de Matt. Ele quis procura-lo, mas sabia que não seria benvindo na casa dos Riley. E, nem sabia que Julian não estava mais lá. Haveria de arranjar um jeito de fazer contato com Julian depois que a poeira abaixasse. Fora da Inglaterra teriam uma vida diferente, pensou. Agora era preciso construir algo por si próprio, depois teria algo a oferecer a Julian, e não só o desprezo da sociedade.
Uma semana depois que chegou a Southampton Matt embarcou no navio que o levou a Mumbai na Índia. De lá, seguiu para Darjeeling, no nordeste do país, numa viagem de trem que julgou jamais teria fim. Fora lá, que seu avô paterno abandonara, a própria sorte e a de uns poucos empregados de confiança, terras onde se cultivava chá. Com a morte do avô, que só estivera uma vez naquele lugar durante sua juventude, os recursos financeiros que chegaram à Inglaterra foram escasseando, a ponto de ninguém se interessar por aquela imensidão perdida nas montanhas da cadeia inferior do Himalaia. Em sua bagagem ele trazia a documentação que comprovava a posse de uma imensidão de terras, mas que nem ele mesmo sabia se ainda podiam ser pleiteadas. Um frio percorreu seu estômago diante da possibilidade daquelas terras terem sido ocupadas e ele jamais consegui-las de volta.
Julian, assim que chegara a Londres, tratou de procurar um amigo dos tempos da universidade. Sebastian não tinha muita intimidade com Julian, que desde aquele tempo sempre se mostrara muito reservado e de poucos amigos. Mas, depois de uma bebedeira num pub perto de Trafalgar Square, quando o álcool já tinha lhe tirado o senso da precaução, Sebastian confessou-lhe sua predileção pela companhia de homens na cama ao invés do que ele chamou de vaginas usurpadoras. Na época, Julian ficou feliz por saber que não era apenas ele no mundo a se sentir atraído por homens. Não fez nenhum comentário enquanto levava Sebastian para casa, uma vez que este mal podia se manter em pé. Nunca mais tocaram no assunto, e Sebastian tornou-se um bom amigo até o final de seus estudos. Trocaram uma ou outra correspondência depois disso, quase sempre em datas comemorativas. Embora não fossem amigos com muita intimidade, Julian acreditou que ele seria o único a compreender a sua história com Matt e, talvez não lhe negasse abrigo. E, assim foi. Sebastian ouviu-o atentamente, não fez julgamentos e, logo lhe ofereceu um quarto na confortável residência em West Brompton, que ocupava sozinho, depois dos pais se mudarem para o interior a procura de ares mais sossegados. Foi lá que Edward procurou pelo irmão cerca de três meses depois que Julian havia deixado Tetbury.
- Não consigo entender as razões que o levaram a se envolver com o Matt, mas acredito que você as tenha tido. Foi um choque a maneira pela qual ficamos sabendo, especialmente frente ao relato dos detalhes nos quais vocês foram flagrados. No entanto, analisando a questão mais friamente e, passado o impacto da surpresa, você sempre foi um irmão muito carinhoso e disponível. Sua ajuda quando passou a trabalhar comigo na destilaria foi fundamental para que meu insignificante projeto tomasse as proporções de hoje. Tetbury certamente ficou pequena para você depois do que aconteceu. Não haveria como continuar ali sem ser discriminado e apontado na rua. Eu quero que você volte a trabalhar comigo na destilaria. Sempre nos demos muito bem e o que sinto por você não mudou. Acho que está na hora de termos um escritório aqui em Londres capaz de comercializar nossos produtos em novos mercados, quem sabe até nos Estados Unidos da América. Eu não vejo ninguém melhor do que você para cuidar dessa expansão. Julian, eu preciso de você e, queria que você me perdoasse por não ter assumido sua defesa lá em casa. – Edward estava emocionado e precisou respirar mais profundamente, uma ou duas vezes, para não chorar, enquanto falava com o irmão. Estava sinceramente arrependido e quando Julian se lançou em seus braços foi inevitável que os olhos de ambos ficassem marejados. Reconciliados, foram expandindo seus negócios, Julian em Londres e Edward em Tetbury.
Impossível descrever o alívio que Julian sentiu quando o irmão embarcou no último trem daquela noite de volta para casa. Tinha voltado às boas com pelo um membro de sua família e, tinha como se sustentar em Londres sem depender de ninguém. Já na manhã seguinte começou a procurar um local para instalar o escritório de representação da destilaria. Ao final de 1903 compradores americanos fecharam o primeiro contrato com aquele país. Embora a assinatura do contrato tenha se dado alguns dias antes, Julian comemorava o réveillon daquele ano com os compradores num clube privado.
Dez anos se passaram.
- Senhor Riley! Há um homem querendo falar com o senhor, mas não está em sua agenda. – disse a senhorita Ashley, enquanto deixava uma pilha de papéis a serem assinados, pouco antes do final do expediente de uma quinta-feira chuvosa de outono.
- De quem se trata, Miss Ashley? – perguntou Julian, sem desviar o olhar das provas de um novo catálogo de produtos que havia chegado da gráfica naquela manhã.
- Ele não mencionou o nome. Disse apenas que era seu amigo. – sentenciou a secretária.
Nos primeiros anos em Londres, Julian era tomado de esperanças quando lhe comunicavam que alguém queria falar com ele. Ele alimentara por muito tempo o sonho de que um dia Matt entraria por aquela porta de seu escritório, ou de sua casa, com um sorriso nos lábios e os braços estendidos em sua direção. Mas, os anos foram passando e, sem nunca mais ter tido notícias de Matt, aquela esperança foi se apagando como o pavio de uma vela depois que toda a cera se consumiu.
- Simon não tinha ficado de apanhá-la esta tarde? Ou será que ele arranjou uma desculpa para não tratar dos trâmites do casamento de vocês? – brincou Julian, deixando a secretária levemente ruborizada.
- Ele já está na antessala a minha espera. – respondeu Ashley.
- Então não se atrase! Homens não têm muita paciência. Não lhe dê tempo para desistir do casamento. – a secretária gostava do bom humor do patrão, embora tivesse a nítida sensação de que por trás daquele sorriso havia muita dor escondida. - Ah! E faça entrar o tal de meu amigo. Boa noite, Ashley! – acrescentou.
- Boa noite, senhor Riley!
Quando a porta se fechou, Julian não demorou nem uma fração de segundos para identificar o homem musculoso e de pele levemente mais bronzeada do que aquela que estava em suas lembranças. Matt Buckham. Suas pernas não obedeceram ao seu desejo de se levantar da cadeira por detrás de sua mesa. O coração parecia querer sair-lhe pela boca, por isso nenhuma palavra pode ser articulada. Matt abriu um sorriso largo, estendeu os braços em sua direção e isso fez com que Julian conseguisse finalmente se atirar em seus braços. Enquanto se beijavam, e ambos desatavam num choro saudoso, Julian achou que podia estar delirando. Mas, aqueles músculos, o toque ligeiramente bruto e quente daquela boca, um quê de testosterona emanando daquele corpo hígido não deixavam a menor dúvida. Aquele era o seu Matt. Ele estava de volta.
Matt não conseguia largar o corpo de Julian. Apertava-o contra seu peito com tanta intensidade que este mal podia respirar. Nada parecia haver mudado naquele corpo esguio e sedutor. A pele mais alva do que nunca a transpirar um cheiro que se assemelhava ao alecrim balançando ao vento nas colinas perto do castelo. Os lábios de um rubro vivo e úmido que tantas vezes tinham lhe dado os mais doces e carinhosos beijos, ou aplacado o ímpeto de sua rola, sorvendo e chupando o néctar que aflorava em sua cabeçorra. Sua mão deslizou pelas costas de Julian e agarrou aquela bunda carnuda, entre cujas nádegas seu caralho rígido se perdera inúmeras vezes numa volúpia deliciosa.
Eles se entreolharam em silêncio por diversas vezes. Voltavam a se beijar como que testando para ver se não estavam diante de uma miragem e, ao mesmo tempo, procurando saber se aquele que estava diante de si ainda era o mesmo amado de tempos atrás.
- Você está ainda mais lindo e gostoso do que antes! – exclamou Matt, quebrando o silêncio.
- Por onde andou? Meu irmão Edward me disse que você nunca mais foi visto em Tetbury após o escândalo. Eu pensava que você tinha me abandonado para sempre. – retorquiu Julian. Não havia censura em seu tom de voz.
- Fui me transformar naquele macho que você pediu para eu ser. – respondeu Matt, com um sorriso de vitória na expressão de seu rosto.
- Não entendi! Você sempre foi meu homem, meu primeiro e único homem! – devolveu Julian.
- No entanto, naquela época, fui capaz de me deixar conduzir para um casamento arranjado. Fui incapaz de te dar apoio quando fomos descobertos. Fui incapaz de te tirar de lá e te dar uma vida feliz. Que macho eu era naquele tempo que não conseguia me fazer digno de você? – Matt fazia um mea culpa sincero, pois sabia que agora era um homem com suas próprias convicções.
- Não o culpo de nada! Você é o homem que eu amo. Lutar contra uma sociedade como a nossa, particularmente a conservadora e obtusa aristocracia de Tetbury, é um esforço inglório, uma formiga enfrentando um elefante. Não há como não sucumbir ou ser massacrado. Éramos garotos cheios de ilusões. Nunca haverá espaço para um amor como o nosso nesse mundo onde todos acham que são donos da verdade. – conjecturou Julian.
- De qualquer forma eu falhei com você. Precisei antes me encontrar comigo mesmo. – revidou Matt
Eles continuaram a conversa durante o trajeto até um restaurante que não distava muito do escritório de Julian e também, durante o jantar quando se inteiraram dos fatos ocorridos com cada um ao longo daquela década de ausência. Matt tinha retornado da Índia há pouco mais de um mês. A primeira providência que tomou foi se divorciar de Juliet, que já não vivia em Beverstone e era vista frequentemente circulando com um ex-empregado de seu pai. Até ela havia se rebelado contra as imposições do pai, para o qual as filhas não passavam de uma mercadoria a ser negociada segundo seus interesses. Tão logo descobriu que Julian estava em Londres veio ao seu encontro. Estava livre e em condições de viver sua paixão por ele. Matt contou-lhe como recuperou as terras deixadas pelo avô e como deu o impulso que as fez voltarem a ser produtivas e lucrativas. Tinha conseguido organizar tudo a ponto de sua presença constante não ser mais necessária. Dera ao filho de um dos empregados de seu avô, que durante muitos anos manteve o cultivo de chá, o cargo de administrador, visto que tinha sido fiel e capaz de ajuda-lo a incrementar o negócio. Matt deixou Darjeeling com o propósito de fundar uma empresa de importação e exportação em Londres para negociar o chá que produzia em suas terras, bem como outros produtos que alguns britânicos instalados entre aquelas montanhas produziam.
- Tenho como te dar uma vida confortável e, gostaria que você fosse meu sócio nessa empreitada. – sentenciou Matt, depois de seu longo relato.
- Estou envolvido com a destilaria e compromissado com meu irmão. Estamos indo muito bem. Os negócios estão se expandindo. – retrucou Julian.
- Talvez possamos trabalhar juntos. Fale com Edward, ele sempre me pareceu muito sensato. – ponderou Matt
- Vou falar. – concordou Julian. – Se Juliet deixou Beverstone, quem está provendo sua família? – questionou curioso.
- Adivinhe! George. Aliás, ele tem se mostrado muito competente nessa tarefa. Colocou todos a viverem de acordo com a realidade desses tempos. Tanto que abdiquei do título de meu pai. George será o futuro conde Beverstone.
- Gosto muito dele. Fomos amigos no colégio e, mesmo antes, você deve se lembrar. – afirmou Julian.
- Serei eternamente grato a ele por ter levado você a nossa casa. Se não fosse ele talvez nunca teria conhecido meu grande amor. – sentenciou Matt. – Ele também gosta muito de você. Nem o que aconteceu modificou isso. Foi ele quem me disse que você estava em Londres, e quando soube que eu estava vindo atrás de você, me pediu para lhe dizer que sua amizade continua sendo muito importante para ele. – acrescentou.
- George é um fofo! Incrível, como acontecimentos podem afastar pessoas que se gostam. – constatou Julian.
- Hummm! Pensei que eu fosse o único fofo de sua vida. – gracejou Matt.
- Não seja tolo! Você sabe muito bem o que você significa para mim. – devolveu Julian, com o olhar mais doce e terno que Matt conhecia.
- Preciso de você agora! Se eu não te tiver todinho para mim agora, acho que meu coração é capaz de explodir em meu peito. Outra certeza que tenho, é que se isso não acontecer, o que vai explodir é o meu cacete dentro dessas calças, pois ele está duro feito um tronco há mais de uma hora. – motejou Matt, dando uma ajeitada na rola babada por debaixo da mesa. Julian sorriu e eles pediram a conta. Meia hora depois, estavam nus na cama no apartamento de Julian.
O corpo pesado de Matt estava debruçado sobre o de Julian. Eles se encaravam com desvelo e aquele desejo atiçado por uma década de esperança. Julian abriu as coxas lentamente e elevou os joelhos até quase a altura dos ombros de Matt, que abriu um sorriso cheio de tesão. Embora soubesse exatamente o que havia no fundo daquele rego desabrochado como uma flor, Matt não se conteve e, mordiscando as coxas bem torneadas de Julian, foi se aproximando voluptuosamente daquele cuzinho rosado que Julian lhe oferecia. Lambeu as pregas quase imaculadas que não viam uma rola há tempos. Julian gemeu ao toque úmido e áspero da língua afoita de Matt. Contorcia-se enquanto Matt exacerbava o cunete e, por pouco não gozou sobre o próprio ventre, tomado de um tesão saudoso.
- Meu doce Julian! Isso tudo é saudade do seu macho? – sussurrou Matt
- Sim. – balbuciou Julian, beijando o rosto de Matt que segurava entre as mãos.
Matt enfiou o caralhão naquelas preguinhas e, num deleite ímpar, ouviu o ganido aflito de Julian. A penetração foi vigorosa e decidida. Julian sentiu toda sanha de Matt em devorá-lo, mas algo era muito diferente daqueles tempos em Tetbury. Lá, Matt era afoito, bruto e até selvagem. Agora seu ímpeto era aguerrido e determinado. Era o ímpeto de um macho ciente de seu vigor que sabe não apenas tomar a força o que deseja, mas conseguir o que quer por uma doma serena e gentil. Julian entregou-se de corpo e alma, agasalhando o cacetão que ia devassando suas entranhas profundamente. Os sublimes gemidos de Julian estavam deixando Matt louco de tesão. Ele atolava a pica naquela maciez receptiva num vaivém frenético e cadenciado. Os esfíncteres anais de Julian apertavam sua rola, desejosos daquele membro viril. Mais um beijo longo e carinhoso de Julian fez sua pelve se contrair, uma dor prazerosa se espalhar sobre a cabeçorra de sua rola e, uma eclosão abundante de porra jorrar naquele cuzinho acalentador. Julian trocou os gemidos que permearam toda a foda, mesmo quando gozou ao ajeitar o próprio pau, por ganidos pungentes quando as últimas estocadas de Matt, antes de gozar, atingiram sua próstata e os mais íntimos recônditos de sua ampola retal.
Discretos, Matt e Julian viveram aquele amor com toda a intensidade. Nunca mais se deixaram.