Pessoal, passado bastante tempo estou de volta! O retorno de outro escritor aqui da casa me fez voltar também. Sei que o perfil de histórias aqui mudou muito e espero continuar agradando. Peço desculpas pela demora e espero de verdade que consiga não só terminar essa como escrever outras. Lembrem-se que é uma história real e os impasses na escrita têm muita relação com isso. Enfim, sigo nessa missão! Estou relendo todos os comentários e me deliciando com as opiniões. Obrigado por tudo, inclusive pela acolhida nesse retorno.
Aguardo os comentários! Abraço
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Os gritos eram altos.
Era Ricardo!
André me olhava sem entender nada e eu me segurava para não ir até ele.
Os acompanhantes do Ricardo tentavam acalmá-lo, mas nada adiantava. Uma garçonete foi se aproximando e não
aguentei de curiosidade:
- Moça, o que houve com aquele rapaz? Parece bem transtornado.
- Ele recebeu uma ligação. Parece que a mãe foi vítima de um roubo seguido de morte.
Nossa! Que situação. Eu e André ficamos estarrecidos enquanto Ricardo chorava escorado ao carro, o mesmo que eu havia batido naquela época. Os colegas dele insistiam que ele não dirigisse daquele jeito, até que chamaram um taxi. Meu coração foi junto quanto ele entrou no carro branco e não havia mais nenhum clima para mim naquela noite. Só conseguia pensar na situação de Ricardo e na criança que eu atendia. Como eles fariam sem Marisa? O que havia acontecido nesse assalto? Muitas questões.
Quanto minha cabeça ficava pensando mil coisas, André me olhava sem saber o que dizer, mas com certeza pensando no impacto que essas informações tiveram no momento que a gente estava tendo.
Passada a confusão, ele pediu a conta, pagou e fomos embora, sem eu dizer nada. Foi ótimo ele ter respeitado meu momento, mas qualquer coisa que ele dissesse, eu não conseguiria prestar atenção. Chegamos no apartamento e ele foi para o banho. Peguei meu celular e decidi ligar para Ricardo. Foi um ato apaziguador diante de tanta angústia:
- Alô
- Ricardo. É o Daniel. Como está tudo?
- Tudo uma merda. Não sei o que fazer agora.
Ele chorava muito.
- Me ajuda, Daniel. Eu estou sozinho, cara.
- Eu... Eu vou até você. Onde está?
Perdi completamente a noção e fui atrás do que me acalmaria. Saí rápido do apartamento, peguei um taxi e em dez minutos estava na casa dele, que estava cheia de policiais, enquanto ele respondia perguntas. Quando cheguei, senti seu abraço. Um abraço ainda mais forte que o do hospital.
Perguntei sobre Davi e Ricardo, sem soltar meu corpo, disse que o garoto estava com o irmão, que veio de outra cidade após saber da história. Ao nos soltarmos, limpei suas lágrimas com os dedos, enquanto os policiais retomaram algumas perguntas. O corpo não estava mais ali, porém dava para perceber que a casa havia sido roubada, faltando vários eletrônicos e muita bagunça espalhada, além de cacos de vidro por toda a sala.
Assim que os policiais foram embora, Ricardo ainda chorando começou a agradecer:
- Obrigado por ter vindo. Eu tô sem saber o que fazer.
- Eu entendo sua dor, Ricardo. É muito triste ver tudo que temos ruir de uma hora pra outra assim. Mas você não está sozinho.
- Claro que estou. Minha mãe era tudo pra mim. Sempre foi!
- Eu tô aqui. Você pode contar comigo.
Fomos nos aproximando e nos beijamos! Sim. Um beijo calmo, quase sem língua, que exprimia bem o que nós dois sentimos naquela hora. Apesar de uma urgência (queria muito beija-lo), existia um clima de compaixão, que fazia tudo ficar mais calmo. Após o beijo, Ricardo ia falar algo.
- Não fala nada, Ricardo. Não precisa.
Na verdade, fomos interrompidos pelo meu celular tocando insistentemente. Já havia tocado antes, mas estava ignorando. Ricardo saiu para pegar uma água enquanto eu atendia o celular.
- Oi Dé.
- Onde você tá, Daniel?
- Eu precisei sair.
- Imagino o motivo da sua saída. Você tá me achando com cara de idiota?
- Eu não quero brigar, Dé. Já vou pra casa.
- Eu devo ser muito otário mesmo.
- Conversamos em casa. Já chego.
Desliguei o telefone para evitar confusão. Sabia que teria que dar explicações, mas queria enrolar pra fazer isso, afinal tem coisas que não são fáceis de explicar. Essa era uma delas.
- Mais uma vez, obrigado por ter vindo. Eu preciso fazer umas ligações para agilizar as partes burocráticas dessa história toda.
- Não precisa agradecer. Qualquer coisa, me ligue.
- Obrigado. Por tudo. E por tudo que ainda virá.
Não entendi bem essa fala, mas decidi me retirar. A dor dele estava me matando. E cada dia eu tinha mais certeza que estava apaixonado por ele. Só quem gosta muito de alguém é capaz de arriscar tanta coisa, se disponibilizar tanto e superar o mal que a pessoa já fez. Mas seria amor ou pura idiotice? Até porque algumas coisas estão fadadas a dar errado e não vê os sinais quem não quer.
Peguei um taxi para voltar e ao chegar no prédio vi André na área de lazer. Sozinho, no escuro, fumando. Reconheci pela silhueta e logo vi um olhar de raiva que nunca tinha presenciado. Ele se levantou firme na minha direção:
- Quem você pensa que é, Daniel?
- Como assim, Dé. Calma.
- Não me chama por apelido. Você é um idiota, cara.
- Calma. Vamos conversar. Eu errei com você, mas precisa entender que...
- Não tenho que entender porra nenhuma. É isso que eu ganho depois de tudo que fiz por você? É ter que saber que eu viro as costas e você corre pra outra cara?
- Você tá distorcendo as coisas. A mãe dele morreu.
- Fodas! Eu não tenho nada com isso. Aliás, você também não.
- Eu não sou assim, André. Eu tenho compaixão pelas pessoas.
- Ele teve compaixão quando jogou seu nome na lama? Quando acabou com a sua carreira?
Fiquei pensativo e abaixei a cabeça, mas me assustei muito com o que veio em seguida.
- Vai ver essa morte foi um castigo, depois de tudo o que ele fez.
- Não acredito que você tá dizendo isso.
Virei as costas e fui para o elevador. O André era um cara fantástico, mas quando estava nervoso, se transformava em alguém desesperado por atacar as pessoas. Entrei no apartamento e ele veio atrás.
- Na verdade, o castigo deve ser pra mim. Passei tanto tempo esperando o cara certo e quando me entrego pra alguém sou feito de idiota.
- Eu nunca quis te fazer de idiota, André. Você sabe o quanto gosto de você.
- Não sei não. Sei o quanto eu gosto de você, mas agora só fico imaginando você fudendo com aquele cara com a desculpa dele estar triste com a morte da mãe.
- Eu não sou desse tipo.
- Ah, não é? Quanto tempo eu precisei levar te cantando pra te comer mesmo? Três dias? Aposto que o Ricardo conseguiu fácil também.
Um soco! Reagi assim depois dessa fala e sabia que ali havia quebrado algo (e não era no rosto dele). Ele não reagiu, mas me olhou com ódio e foi pro quarto. Busquei algumas coisas no outro quarto e dormi no sofá depois de ter tomado um banho.
Sim, eu errei com o André. Enquanto ele estava todo disposto, eu pensava no cara que destruiu minha carreira e namorou minha amiga (ainda precisava esclarecer essa história). Mas esse cara despertava em mim tanta coisa. Sua história triste me fazia lembrar da minha. Da dificuldade em me aceitar, da cobrança interna de ser melhor em tudo e de nunca ter conseguido amar ninguém de verdade. Se eu amei o André? Não sei. Sempre senti coisas boas por ele, mas nada que chegasse aos pés do que eu sentia pelo Ricardo. Peguei no sono enquanto esperava o dia seguinte chegar para eu ir trabalhar.
Acordei com André se arrumando pra ir trabalhar. Olhei pra ele pelo reflexo do espelho e vi a marca que ficou no canto de sua boca, pelo soco que eu dei. Ele também me olhou, mas não disse nada. Fui arrumar as minhas coisas para trabalhar, mas na verdade queria sair daquele apartamento. Seria o dia de decidir a minha vida, colocar as coisas em seu devido lugar.
- Não vai me pedir desculpas?
- Sim, preciso te pedir desculpas. Você tem razão.
- Você nunca tinha me batido, cara. Olha o que o Ricardo tá fazendo com a gente.
- Não foi o Ricardo. Foi o que você disse, André. Você fez eu me sentir a pior pessoa do mundo. Como se eu transasse com qualquer um. Eu não sou assim, cara.
- Vamos esquecer isso. Eu peço desculpas pelo que disse e te desculpo pelo soco. Espero que não aconteça de novo.
- Não vai. Preciso tomar umas decisões na vida mesmo.
- Sim, precisa. Seu lugar é do meu lado, Daniel. Eu amo você. Eu tô lutando por você. Lute pela gente também.
- Eu tô lutando contra mim mesmo, André. Mas isso tem hora pra acabar. Hoje mesmo!
- Espero que seja a meu favor. Vou te esperar pra ir pro trabalho. Quero levar você no primeiro dia.
Fui tomar banho e pensar, mais uma vez. Talvez o mal do psicólogo é pensar demais, calcular muito. E a gente acaba aparecendo de verdade nos atos inesperados. Enfim. Fui pro trabalho com Daniel.
- E esse emprego, como tá sua expectativa?
- Ah, parece legal, apesar de não ser minha área. Hoje tenho contato com o presidente da empresa, pra gente elaborar uma intervenção com os funcionários. Vamos ver no que dá.
- Ok. Boa sorte no primeiro dia. Lembra que eu te amo.
- Ok. Obrigado, André.
Claro que não o amava também. Não do mesmo jeito que ele. Guardei um sentimento por André por tanto tempo que agora ele parecia menor do que sempre foi. Estranho isso!
Cheguei na empresa e já recebi minha identificação. Mesmo tendo ido lá na entrevista, tive contato apenas com uma gestora. Então seria definitivamente a minha primeira vez lá.
Conheci a minha sala, que dividiria com uma colega, também psicóloga. Até que fui chamado pela secretária do presidente. Era a hora de conhece-lo. Entrei na sala e me encontrei com ele. Tudo ficou estranho e nada mais fazia sentido.
- Você é o presidente dessa empresa?
Continua...