Pai e Mãe,
Vamos lá. Mais uma semana se passou. O Zedu continua quieto, eu não falo nada, porque reagi muito pior que ele, quando perdi vocês. Espero que o seu Ulisses esteja com vocês.
***
O sol invadiu meu quarto, não queria abrir os olhos, mas o despertador ficou me lembrando da obrigação de levantar. Sentei na cama, ainda sonolento e espreguicei. A minha tia entrou no quarto para me apressar. Sim, a titia acordou antes de mim.
Ok. Eu não tenho culpa de estar com preguiça. A preocupação com o Zedu me tirava o sono. Depois de um banho, uma bela xícara de café e três pães de queijo, desci para encontrar meus amigos na parada de ônibus.
— Gente, adivinha quem vai viajar? — perguntou Ramona, toda serelepe.
— Você. — nós respondemos juntos.
— Não. Meu pai. Achei que a gente poderia, sei lá, fazer uma festinha do pijama. — ela sugeriu.
— Eu topo, não aguento mais o Leonardo em casa. Aquele garoto é uó. — revelou Luciana, ostentando um óculos escuros estilosos.
— O que acha? — questionei para o Zedu, afinal, ele não estava no clima para celebrações.
— Por mim tudo bem. Só quero relaxar. — Zedu concordou dando com os ombros.
Sim. Zedu queria seguir. Como eu expliquei para ele, a dor passaria, mas continuaria ali. Na escola, a gente se preparava para a feira de Ciências. No fundo, eu estava animado, pois, pela primeira vez, trabalharia com o Zedu. Decidimos fazer uma análise sobre a qualidade da água de Manaus.
Parece algo difícil, né? Só que é simples. Eu já havia feito algo parecido no Rio de Janeiro. Por outro lado, os meus amigos ainda não faziam ideia de qual tema escolheriam. O professor de Ciências entrou na sala de aula e começou a confirmar as duplas para a Feira de Ciências.
— Quero todos os projetos prontos em três semanas. A Feira de Ciências valerá 40% da nota de vocês para o semestre. — explicou o professor pegando a lista com as duplas e percebendo que Lucas não estava com ninguém. — Lucas Cordeiro? Você precisa de uma equipe.
— Eu posso fazer sozinho.
— Impossível. Quero você em um grupo. — exigiu o professor. — Vou até a coordenação imprimir os documentos para aqueles que vão fazer visita técnica. — andando até Lucas. — Por favor, ache alguma equipe. — olhando para a turma. — Não quero bagunça. Volto daqui a pouco.
Silêncio mortal. Ninguém queria ajudar o Lucas. Todo mundo encontrou uma desculpa para não incluí-lo. Olhei para o Zedu, que deu com os ombros. Caramba. Eu já fui excluído e sei como é ruim.
— Amor...
— Você que sabe, bebê. — sussurrou Zedu, que brincava com uma caneta.
— Por que ninguém tá se oferecendo? — Mundico perguntou no ouvido de Juarez.
— Não soube? O Lucas foi um dos alunos que fez bullying com o Yuri. Ele não foi expulso por sorte. Eu teria expulsado ele. — Juarez contou para Mundico.
— Credo. Você nunca errou? — soltou Mundico, deixando Juarez desconcertado.
O Lucas encolheu na carteira. Ele perderia 40% da nota. Meu Deus. Eu não conseguia olhar para o meu colega com indiferença. Depois de uns minutos, o professor entrou na sala e entregou os documentos para visita técnica.
— Silêncio cabeçudos. — brincou o professor. — Então, qual grupo você está Lucas?
— Nenhum. — respondeu Lucas com a cabeça baixa.
— Você conhece as regras. Vai pra P.F, cabeçudo. — revelou o professor.
— PF? — questionaram Juarez e Mundico.
— Sim, a prova final. — sussurrou Ramona, se esticando para explicar a sigla aos colegas. — São os conteúdos de três semestres. Todo mundo que fez, ficou de recuperação.
Uma luta interna começou entre meu coração e cérebro. O Lucas me fez mal no último semestre, porém, ele estava sendo manipulado pelo João. Um coração apaixonado pode fazer coisas ruins para ter aceitação.
Levantei a mão. Não tem mais volta. O professor estranhou o meu comportamento, afinal, ele ficou chateado com o que aprontaram comigo.
— Tem certeza? Acho que a PF está de bom tamanho para ele.
— Eu tenho. Ele faz com a gente. — respirei fundo. O Zedu pegou no meu ombro e consentiu com a cabeça.
O Lucas ficou em silêncio. Ele estava envergonhado. Para tirar o climão da sala, o professor colocou um vaso branco com um adesivo escrito: "Lágrimas do 1º ano C". Ele deu um sorriso diabólico e nos mandou estudar a página 125 do livro de Ciências.
Depois da aula, decidimos almoçar no Centro da cidade. Existem vários locais onde a comida é barata, ah, e deliciosa. Apesar dos pesares, a minha rotina estava voltando ao normal. Ainda precisava fazer o estágio com o George, e a cada dia, eu gostava ainda mais de fotografia.
Os meninos não acreditavam na minha decisão, confesso, que o Zedu me deixou seguro e livre para decidir. A minha rotina estava voltando ao normal, ainda tinha que fazer o estágio com o George, e a cada dia que passava eu gostava mais de fotografia.
Para testar os meus conhecimentos, o George chamou uns modelos e fiz os registros de uma campanha para uma loja de roupas. ISO. Foco. Enquadramento. Tudo certo. A sessão fotográfica foi um sucesso e George aprovou o resultado.
Infelizmente, a alegria dentro do meu peito se esvaiu. O Lucas entrou no estúdio segurando uma tupperware vermelha. Com um sorriso tímido, ele me cumprimentou e entregou a vasilha para George.
— Lucas, o que você está fazendo aqui? — perguntei com uma cara de %&.
— Vocês se conhecem? — George questionou, enquanto abria o recipiente.
— Sim. O Lucas estuda comigo e...
— Mentira. — soltou George rindo. — Que legal. Meu funcionário e meu sobrinho estudam juntos.
Sobrinho? Puta merda. Como assim, sobrinho? Eu não acreditava que o destino brincou comigo. Ficamos no estúdio sem assunto, então, George nos convidou para provar a lasanha que estava com um cheiro delicioso.
Enquanto isso, Letícia fazia um programa mais adulto. Ela adorava beijar Arthur, mas ele só tinha olhos para o tão sonhado curta-metragem. O namorado da minha amiga possuía muitas qualidades, porém, era obcecado pelo seu trabalho. Eles foram com Zedu até um grande terreno que ficava próximo a um bairro afastado da cidade. O local seria o cenário do filme 'Zumbis em Manaus'. Eles vasculharam toda a área até chegarem na casa.
— Cara! — exclamou Arthur. — Esse local é perfeito. Aqui vai ser onde os sobreviventes vão se esconder. E a fábrica do outro lado vai servir para o clímax do filme. — andando de um lado para o outro, anotando algumas ideias em um bloco de notas.
Realmente. O terreno da família de Zedu era grande. A área contava com uma grande fábrica, uma espécie de frigorífico, mais um dos milhares negócios que o pai dele desenvolveu. Haviam também carros quebrados por todo o lado, uma casa de dois pisos e uma piscina suja. Arthur recapitulou todo o filme naqueles lugares. A mãe de Zedu concordou em deixar o curta-metragem ser gravado lá, afinal, em algumas semanas o local seria vendido.
— Zedu, quero te agradecer pela oportunidade. — disse Luciana abraçando o Zedu.
— Eu que agradeço. Em breve, esse lugar não vai ser mais da família. Então, os registros vão me ajudar a guardar todas as boas lembranças. — afirmou Zedu sorrindo.
***
Já falei que odeio usar roupas sociais? Acho que todo gordinho não gosta, tá, não vou generalizar, porém, eu realmente não suporto. A titia queria causar uma boa impressão na família de Carlos, então, nos deixou com cara de bons meninos. Ela até convenceu a minha irmã a fazer babyliss no cabelo.
Na verdade, a Giovanna parecia uma pastorinha holandesa. Eu consegui comprar um suspensório e gravata borboleta, adorei o estilo. Melhor do que usar um terno apertado. Antes de sair, a tia Olívia, nos fez ficar em um tipo de linha indiana e deu um grande sermão sobre responsabilidade.
— Isso não é um treinamento, crianças. Não quero saber de animais, bullying com os parentes do Carlos ou acidentes com bebidas. A colação de grau é um momento muito importante. — ela pediu com um tom de ameaça, olhando para o Richard, que estava lindo com uma gravata borboleta igual a minha.
— Credo, tia. Até parece que eu apronto assim. — reclamou o meu irmão.
— Você. — apontando para Giovanna. — Eu não quero ouvir a tua voz. Lembra do acordo que a gente fez? Queijo e leite de búfala durante todo o ano. Sem comentários maldosos ou impertinentes. — temendo causar uma má impressão na família de Carlos.
— Titia? — indagou a Giovanna. — A minha boca é um túmulo. — passando os dedos na boca como se estivesse fechando um zíper.
Richard: - Verdade. Quem manda não escovar os dentes?
— E você. — apontando para mim e dando com o ombro. — Seja você.
— Ah, claro. Santo, Yuri. — reclamou Giovanna. — Meu Deus. O que eu não faço para manter a minha qualidade de vida.
— Pastorinha, Lúcifer? — chamei meus irmãos. — Vamos.
Chegamos cedo no local da colação de grau, encontramos Carlos tirando fotos para o álbum de formatura. A Giovanna quase se mordeu para não fazer comentários. O Richard brincou com algumas crianças que estavam no local. Eu peguei um suco de melancia e fiquei acompanhando a movimentação.
Pensei muito na minha situação com o Zedu. Ele não havia mudado comigo, mas eu me sentia pisando em cascas de ovos. Tinha medo de fazer alguma besteira e ele cair em pedaços. Já estive naquela posição e não desejava o mesmo para o meu namorado.
A cerimônia aconteceu sem muitos acidentes. Mas confesso que demorou, a colação de grau do curso de direito é eterna. O tédio era tanto que o Richard dormiu e sobrou para mim a missão de carregar o monstrinho.
Seguimos para um restaurante, o Coqueiro Verde, eles tem a melhor batatanese da cidade. A família de Carlos era numerosa, conheci uma porção de primos e tias. No jantar, o pai dele fez um brinde e agradeceu a presença de todos.
Além das crianças (meus irmãos), conversei com o Julian, o sobrinho de Carlos. Ele estudava em uma das melhores escolas particulares de Manaus. Da minha idade, o Julian ostentava um estilo nerd. Seus cabelos eram pretos, rosto quadrado e olhos castanhos. Na verdade, ele lembrava muito o Carlos, quer dizer, tirando o fato que o tio dele era careca.
— Cara, que coisa chata. — ele soltou, sentando ao meu lado e cruzando as pernas.
— Nem me diga. — concordei sorrindo. — Mas, a titia está feliz demais, então, meio que vale a pena.
— O Carlos, também. Ele estava nervoso para o encontro da vovó com a Olivia. — revelou Julian.
Cara, me senti um pouco culpado. Afinal, eu não fazia ideia de que o Carlos vinha de uma família tão grande. Graças aos céus, a titia se deu bem com a sogra dela. As duas eram bem parecidas, inclusive na decisão de Carlos continuar na empresa.
Cheguei em casa, liguei o computador e coloquei a música "Whatever", do Oasis. Deitei na cama, peguei meu celular e observei as fotos que tiramos. Nossa, nesses últimos meses passei por cada situação, mas estava muito feliz..
Fiquei pensando nos meus pais. Imaginei um cenário em que eles estariam vivos. Eu seria feliz? O Zedu estaria comigo? Os meus irmãos teriam as mesmas personalidades? Adormeci e acordei com dores na costela, porque dormi em cima do meu carregador.
A dinâmica na escola mudou. O Lucas estava se integrando no nosso grupo, principalmente, agora que trabalhávamos juntos no projeto para a Feira de Ciências. Naquela tarde, fomos para a Feira da Manaus Moderna. O lugar era uma confusão. Pessoas, carros e animais, compartilhando o mesmo espaço.
Achei aquela região maltratada, sem o Zedu e Lucas, eu estaria perdido. Atravessamos dois espaços conflitantes. O primeiro era o Mercado Adolpho Lisboa, também conhecido como Mercadão, a feira mostrava toda a riqueza do Amazonas na época do ciclo da borracha. A estrutura do mercado foi importada da Europa. Tirei muitas fotos bonitas.
Ao lado, uma extensão da feira, conhecida popularmente como Manaus Moderna, um local destinado para venda de peixes e verduras, sem o glamour do Mercadão. Porém, consegui comprar vários produtos bacanas para testar em novas receitas regionais. Será que encontrei um novo lugar para o rancho (compra do mês)?
— Esse lugar está cada dia pior. — reclamou Zedu, ficando assustado com um vendedor que apareceu do nada lhe oferecendo algumas ervas medicinais. — Não, senhor. Obrigado.
— Vamos colher a amostra de água só daqui? — questionou Lucas, fazendo uma careta quando passamos por um box de peixes. Spoiler: o cheiro não é nada agradável.
— A ideia é pegar amostra de água de lugares importantes. — expliquei.
— Entendi. Vamos cruzar as informações?
— Isso, Lucas. — falei sorrindo. — Dessa forma, podemos traçar um...
— Plano de ação para sugerir ideias de conservação. Você é um gênio. — ele completou a minha frase.
— Pelo menos, outra pessoa entende as coisas que o Yuri fala. — brincou Zedu.
Até que a tarde foi agradável. O Lucas tinha um lado doce e engraçado. O João deve tê-lo influenciado negativamente. Depois de horas coletando água dos mais diversos lugares do Centro de Manaus, decidimos tomar um sorvete para espantar o calor. O chato que estávamos do lado da escola.
Nos despedimos do Lucas e seguimos para casa. Por sorte, a titia levou os meus irmãos para o cinema. Nem preciso dizer que o hormônio adolescente nos controlou. O Zedu conhece cada parte do meu corpo.
Sua mão desliza sem uma direção correta. A sensação era deliciosa. Beijo o maxilar dele, com a ação, o Zedu solta um gemido baixinho. Eu o amo. Coloco o corpo dele contra a parede e continuamos nos beijando.
Depois de um momento para nós, deitamos na cama. Estava cansado e suado, porém, o meu coração se apaixonava cada dia mais pelo José Eduardo.
— Você tem medo do futuro? — ele perguntou olhando para o teto.
— Como assim?
— Não sei. — virando na minha direção. — Você pensa no futuro?
— Engraçado você perguntar. — respondi sorrindo e tirando o cabelo grudado na testa do Zedu. — Ontem, antes de dormir, fiquei pensando em como seria a minha vida se os meus pais continuassem vivos.
— Provavelmente, Manaus não estaria nela ou eu. — disse Zedu acariciando o meu rosto. — Talvez, eu ainda fosse "hetéro". — usando aspas com os dedos.
— Gosto de imaginar os caminhos da vida. — afirmei.
— Se você tivesse oportunidade, tipo, para salvar os seus pais, mesmo que isso significasse me perder. O que você faria?
— Eu. Eu.
— Tudo bem. Eu entenderia se quisesse ter sua família de volta.
— Eu te amo, bebê. — declarei, o beijando.
***
A relação de Mundico e Juarez estava crescendo. Eles andavam para todos os lados, apesar de Mundico não precisar de auxílio para se locomover. Naquela tarde, os dois abriram uma garrafa de vodka e começaram a beber.
— Dane-se. Amanhã podemos faltar aula. A tua família não está na cidade, né? — perguntou Juarez abrindo o vinho e servindo em dois copos.
— Sim. Eu ia dormir sozinho. — afirmou Mundico pegando um dos copos e tomando vinho.
— Eu só queria provar uma coisa. — Juarez anunciou se aproximando e beijando Mundico.
— Eu quero você, aqui e agora. — pediu Mundico, praticamente, atacando Juarez, que adorou a atitude.
Outra casal aproveitava o momento para fortalecer os laços. A pegação no quarto de Ramona estava a todo vapor. Porém, eles não passavam da primeira base. A história ficou complicada. A minha amiga temia que Brutus soubesse do seu segredo e terminasse o namoro.
Por outro lado, Brutus beijava a namorada com muita vontade. Ele acariciou seus seios e apertou sua nuca. Ramona gemia de prazer, Brutus pegou a calcinha de Ramona e começou a baixar devagar.
— Eu quero você agora. — disse Brutus tirando a calcinha de Ramona.
— Eu não quero. Me solta!!! Me solta!!! — protestou Ramona chorando.
— Você é anormal? — questionou Brutus fazendo uma expressão séria e segurando os braços de Ramona com força.
— Não. Socorro. Brutus, não faça isso, por favor. — implorou Ramona chorando.
Ramona acordou gritando. Tudo não passava de um pesadelo. Ela se levantou da cama com dificuldade. As pernas trêmulas não escondiam o nervosismo. A minha amiga ficou olhando no espelho e começou a chorar.
Enquanto isso, Brutus tentava ligar para ela, sem sucesso. Ramona viu a tela do celular, mas não queria atender. Ela se fechou em seu próprio mundo. Qual seria o segredo dela?
***
No dia seguinte, Mundico acordou com uma dor de cabeça desgraçada. Ele levantou, muito zonzo e desceu para tomar água. Como qualquer adolescente, Mundico pegou o celular e leu várias mensagens de Hélida, uma produtora de Parintins. Na mesma hora, o ex-dançarino ligou para saber as novidades sobre a investigação.
Do outro lado da linha, Hélida explicou que a polícia encontrou vestígios do culpado pelo o acidente. A cada nova palavra de Hélida, o coração de Mundico murchava.
— Não, Hélida. Não. Ele não faria isso comigo. Eu preciso. Eu preciso. — desligando o celular e chorando. — O Juarez....
Na escola, encontrei a Ramona um pouco abatida. Os seus cabelos cacheados cobriam o seu rosto, mas eu conseguia identificar o humor dela. Sentei ao seu lado, sem falar nada. Acariciei o seu cabelo e puxei assunto.
— Eu não sei o que fazer, Yuri. — soltou Ramona.
— Que tal pelo início? — perguntei. — Você sabe que pode confiar em mim, né? Eu te senti triste, ainda mais depois da viagem para Parintins. — o meu comentário fez Ramona chorar, o que me despertou uma atenção redobrada.
Ainda encucado, Brutus procurava por Ramona. Ele queria tirar dúvidas sobre o projeto de ciências. O meu amigo procurou em todos os lugares e estranhou o sumiço da namorada.
— Oi, Brutus. — Kellen o cumprimentou, aparecendo do nada e assustando o Brutus.
— Oi, K.
— Estão falando de você. Vem. — pegando na mão de Brutus e o levando para o outro lado do corredor. — Faz silêncio. — se aproximando de mim e da Ramona.
— Yuri. Eu sou hermafrodita. — revelou Ramona chorando.
— Uau... bem... ok... eu... er... tudo bem. — nunca gaguejei tanto na vida e não soube como confortá-la.
— Bem, basicamente, nasci com uma má formação. Tenho os dois órgãos genitais, lá embaixo. — olhando para a saia. — É uma verdadeira bagunça. Não tem como esconder isso do Brutus.
— O teu pai sabe?
— Claro. A gente já foi em vários especialistas, mas a cirurgia é muito delicada, então, preciso esperar completar os meus 18 anos. — explicou a minha amiga com a voz embargada. — Eu não sei o que fazer com o Brutus.
— Verdade que o Brutus não é o poço da delicadeza, mas você é namorada dele e... — olhei para o lado e vi o Brutus de pé. — Oh, Deus. — soltei.
—O que foi? — questionou Ramona virando e ficando horrorizada. — Brutus. — levantando e indo até o namorado.
— Quem diria, Ramona. Toda trabalhada no segredo. — comentou Kellen com um sorriso malicioso.
— Kellen, querida. — a chamei me aproximando. — Vamos deixá-los sozinhos. — a levando embora.
— Você está deformada? Você possui um pênis? Por isso... por isso, nunca deixou eu te tocar....
— Sim, mas... — Ramona não conseguia falar, então se aproximou de Brutus, que esquivou.
— Eu... preciso... preciso pensar.... — disparou Brutus, deixando Ramona sozinho no corredor.
O coração pode sofrer quando se apaixona no momento errado. Mundico ficou chocado quando viu imagens de Juarez danificando o guindaste que o ergueria na Arena de Parintins. Lágrimas escorriam de seus olhos. Enquanto isso, Juarez ainda dormia tranquilamente.
***
Hélida:
Devemos ir à polícia!
Mundico:
Não. Ainda não. Eu só preciso de um tempo. Eu te procuro. Estou em aula.
***
De repente, um flash de lembranças fez Mundico desabar em choro. Como o Juarez foi capaz de enganá-lo? Cego pela raiva. Mundico pegou um copo de água e jogou no rosto de Juarez, que acordou assustado.
— Foi você? — perguntou Mundico. Juarez reagiu de forma confusa. — Eu perguntei se foi você? — mostrando o vídeo para Juarez.
— Mundico... eu... eu... — os olhos de Juarez ficaram vermelhos e o seu coração disparado.
— Você? Você? Você é um canalha. — esbravejou Mundico, pegando todas as roupas de Juarez e jogando pela janela. — Eu quero você fora! Fora da minha casa! Fora da minha vida! — indo em direção a Juarez e o pegando pelo braço.
— Para. — pediu Juarez sendo arrastado e jogado para fora. — Você está me machucando.
— Eu? Eu te machucando? — questionou, dessa vez, pegando Juarez pelo cabelo, forçando a cabeça dele para baixo. — Isso é um machucado. Está vendo a minha perna cheia de marcas? Isso é um machucado!
— Deixa eu te explicar.
— É por isso, por isso que você se aproximou de mim. Queria saber quando eu descobriria. Você é um monstro. — usando as últimas forças para jogar Juarez na sarjeta.
— Não. — respondeu Juarez pegando a cueca e vestindo, porque estava pelado no meio da rua. — Isso não é verdade, eu te amo. Eu aprendi a te amar. Não faz isso com a gente. Eu era um babaca, você me mudou. Eu te peço perdão.
— Apenas sai daqui. Eu ainda não falei com a polícia. Não precisa se preocupar. — fechando a porta e, em seguida, a janela.
O ódio pode nos cegar e se tornar um veneno poderoso. Mundico queria matar Juarez, mas sabia que a ideia era uma loucura. Desesperado, Mundico deitou na cama e gritou de dor.
Que semana cansativa. Cheguei em casa e encontrei o Zedu chorando. O meu namorado resolveu assistir alguns vídeos do pai. Cada lembrança socava o estômago do Zedu. A saudade é poderosa e pode ser assustadora.
— Eu não consigo ser forte. — ele lamentou me abraçando.
— Você não precisa ser. — garanti. — Vou ser por nós dois.
Outra que passou a noite chorando foi Ramona. Ela sempre lutou contra a sua biologia. A minha amiga não fez nada de errado, mas sabia que a reação das pessoas poderia ser assustadora.
— Ele descobriu papai. Ele descobriu que eu sou uma aberração.
— Você não é uma aberração, meu amor. Você é perfeita. — abraçando a filha. — Você é perfeita.
— Ele me odeia, pai. Ele me odeia. — afirmou Ramona aos prantos.