Eu e os três, A.B.O. que eu não sabia - pt12

Um conto erótico de Hubrow
Categoria: Homossexual
Contém 3570 palavras
Data: 10/08/2018 20:35:12
Última revisão: 11/08/2018 22:09:34

Eu estava paralisado, sem saber o que fazer, sem coragem de virar-me para Marcelo, com o tecido manchado nas mãos. A vergonha pela prova de meu crime tornaria insuportável aquele olhar sempre perscrutador dele. Eu tinha sido um inconsequente. Apostei, tinha certeza absoluta, que seu cochilo duraria até eu chamá-lo para o lanche da tarde. Errei feio.

Normalmente, eu só tratava das cuecas dele quando estava sozinho, ou quando sabia que quem estivesse no apê jamais apareceria ali, porque dormia, estudava, via TV, estava muito ocupado. Bom, na verdade, só mesmo eu ía com alguma frequência à área de serviço, até porque era caminho para o meu quarto. De qualquer forma, eu era muito cuidadoso. Naquele dia, não fui.

– São as minhas? Ou você usa a mesma marca?

– Uso sim – menti.

Ele se manteve imóvel. Pareceu que continuava olhando.

– Acho que você se confundiu, Zeca. Essa aqui é minha. Esse pinguinho rosa foi daquela vez que pingou vinho, lembra? Manchou a bermuda e passou para a cueca; eu vi depois.

Eu sabia da manchinha. Já havia separado aquela cueca uma vez, deixando de guardá-la no armário, pondo em cima da cama, para que ele se desfizesse dela. Mas ele a guardou de volta. Fiquei em dúvida se tinha efetivamente decidido conservá-la mesmo com aquele pingo de vinho ou se achado que estava ali por mera distração minha, ainda que improvável. A cueca era nova; a marquinha deixada pelo vinho quase não era notada. Como não falávamos a respeito das gentilezas que cada vez mais eu fazia, não tive como esclarecer.

– É. Tem razão. Me enrolei aqui – disse, abaixando-me como se fosse pôr roupas na máquina.

Queria escapar dele, e a única forma que encontrei foi me acocorar. Inclinei o cesto e peguei um chumaço de roupas usadas, que nem vi quais eram, provavelmente de Rodrigo ou de Otávio.

– Você põe as suas cuecas junto com as minhas?

Sua voz, como sempre, era calma. Parecia que ele falava de um assunto que nada tinha de constrangedor, em se tratando de um homem que lavava as cuecas de outro e que, ainda por cima, se prontificava a limpar seu esperma. Pensava em alguma resposta, mas ele completou antes:

– Como você sabe depois quais as suas e quais as minhas, se são iguais?

– Não, eu não lavo junto, não. Claro que não.

– Mas não tem das minhas aqui?

– São as suas.

– Todas são minhas?

Resumi a resposta a um rã-rã, sempre desviando do olhar dele, agora facilitado pela posição de cócoras. Tentava transmitir um tom prosaico, como se não tivesse me dado conta de que ele tinha pegado minha mentira.

O desgranido permaneceu, enquanto eu fingia lidar com a abertura inferior da máquina. Estar aos pés de Marcelo me protegia. E eu vigiava aqueles pés, só de rabo de olho, à espera que se afastassem logo. Ele ficou em silêncio por um tempo, como lhe era peculiar. Temi que estivesse pensativo. Estava.

– Você lava minhas cuecas na mão?

– Não, claro que não – disse, com voz de quem sorria, enquanto enfiava sem atenção umas roupas naquele maldito buraco da máquina.

– Mas elas estão nessa bacia. Não estão na máquina.

Sua voz era irritantemente tranquila.

– Eu vou pôr depois. Deixei só de molho.

– Por que?

Eu ía responder, mas ele completou a pergunta:

– Tem manchas pra sair?

– É.

– Na parte de trás?

– Não, não, claro que não – me apressei a responder, para afastar qualquer possibilidade de que ele pudesse se sentir constrangido. – Claro que não, Marcelo.

E era mesmo verdade. As manchas nunca eram atrás.

– Na frente, então?

– É.

Fechei a porta da máquina e liguei a água. Eu nem sabia que roupas havia colocado lá dentro. Temi que tivesse misturado as cores; que pudessem manchar.

– São tão difíceis assim de sair que tem de pôr de molho?

Eu sorri sem graça e finalmente o olhei, tentando demonstrar, involuntariamente, que me sentia embaraçado em responder. Quis pedir que me poupasse; que não insistisse em me deixar tão envergonhado. Mas, diante de sua espera impassível, tive que dar alguma resposta.

– É... Tem umaszinhas que são.

Fez novo silêncio, enquanto eu punha o sabão em pó. Marcelo tinha certeza de que me mantinha sob seu controle naquela situação para mim incontrolável; eu sabia disso. Era próprio dele, apesar de todas as delicadezas, de todas as gentilezas para com o mundo.

Ele estava dando as cartas daquele jogo e provavelmente percebia que me acuava. Eu me impressionava com isso; muito. Tentei me concentrar na preocupação com as roupas, em tirá-las da máquina e conferir se estavam misturadas ou não. Só podia fazer isso depois que ele fosse embora, pois a confusão era uma tremenda prova do meu nervosismo.

– Entendi – ele disse.

Aquela resposta, curta e quase categórica, me assustou. Entendeu o que? Que eu sabia exatamente que manchas eram aquelas quando me dedicava a esfregá-las com cuidado? Que as manuseava mesmo sabendo do que se tratavam? Pois bem; eu sabia. Sabia perfeitamente, quis gritar. Mas não gritei nem me rebelei. Já sentia, sem me dar conta tanto disso, que ele estava apenas no papel dele, e eu apenas no meu.

Rezei para que mudasse de assunto. Eu gostava delas; falar naquelas manchas me deixaria sem chão, justamente porque eu gostava delas. Era vergonhoso; eu sei que era. E era porque eu as adorava. Quando pegava suas cuecas, a verdade é que eu as procurava. Eu não as encontrava simplesmente: eu procurava pelo seu esperma. E fiquei satisfeito, sim, satisfeito, porque passei a sempre encontrar aquelas manchas.

Não tinha fantasias sexuais com elas, ou por causa delas. Não imaginava o cacete de Marcelo vazando-as para mim; sequer tinha ideia de como era o cacete de Marcelo, porque ele parecia não permitir que seus shorts revelassem qualquer contorno mais revelador. Para mim, seria um acinte a um homem como ele que um homem como eu pudesse vê-lo como homem do modo como eu via os homens. Ele era um homem muito acima disso. Era um homem muito acima de mim, eu admitia e não tinha problemas com isso. Eu só queria cuidar delas. Era algo que me deixava inebriado, que me seduzia por ser um privilegiado, por ser a única pessoa que cuidava delas.

– Vaza um pouco... Sabe, Zeca... Às vezes os hormônios agem além da conta, e a gente produz mais do que devia. – disse, num tom entre uma justificativa encabulada e um gracejo que tornasse o comentário mais leve. – Acho que é tanta que acaba escoando depois.

Caralho. Merda. Ele tinha que dizer aquilo? E daquele jeito, como uma desculpa estapafúrdia que ele estivesse dando ao marido da mulher que estava comendo? Precisava deixar claro que eu convivia na surdina com os restos do seu esperma? Que eu buscava as marcas porque elas me faziam sentir mais próximo dele? Que eu era um viado tarado que se fascinava com os vestígios da virilidade do macho de quem me fazia apenas amigo?

Eu não soube o que falar; não tinha o que falar. E, de quebra, aquilo também me deixava desarmado porque não era o tipo de assunto que ele costumava ter; não mesmo. Não falava das intimidades dele, como Otávio adorava fazer para se exibir.

– Deve te dar trabalho pra tirar.

– Nada.

– Tem que esfregar; eu sei. São foda pra tirar. Endurecem depois que secam. Quando era moleque, perdi dois pijamas por causa disso. Saí de casa e joguei num lixo na rua, logo depois de acordar. Não ía deixar que vissem; não era nem vergonha, mas por respeito mesmo.

Respeito que por mim parecia não achar necessário ter. E entendi que, menos do que uma ofensa, ele me dizia nas entrelinhas que adquirira uma intimidade comigo que não tivera com mais ninguém – muito menos com seus pais, dos quais era tão distante quanto minha família se tornara de mim. Parecia até acanhado por estar revelando coisas tão íntimas, mas não mostrou em sílaba alguma qualquer estranhamento por aquela situação comigo.

Fiquei em silêncio, inventando o que fazer com as mãos. Ensaiou um sorriso, talvez para me acalmar:

– Vou ver se consigo conter o instinto masculino, pra ficar mais fácil pra você.

Eu sorri em resposta, sem saber se era assim que eu deveria reagir. Voltei o rosto para minha tarefa imaginária com as roupas.

– Desculpe aí pelo trabalho.

– Que isso... É um prazer – respondi, obviamente sem pensar no que acabara de dizer.

Eu estava completamente aparvalhado. Ele não se mostrava surpreendido nem chocado, e menos ainda ofendido. Toda aquela sua serenidade me fazia sentir cada vez mais febril, em vez de me acalmar. Queria sumir dali, numa sensação bem mais forte do que sentira no apartamento de Rômulo.

Mas ainda não saiu. Devia estar me encarando, estudando a situação. Deve ter franzido as sobrancelhas, como costumava fazer quando concluía alguma coisa. Não me virei para conferir.

– Bom, tinha vindo te avisar que hoje eu que vou à padaria. Vou comprar pão doce pra nós. Vê se termina antes de eu voltar, pra gente lanchar.

Foi saindo.

– Zeca.

Voltei os olhos para ele, finalmente.

– Você sem querer pôs a roupa limpa na máquina, pra lavar de novo. Acho que misturou com as sujas – e saiu para a cozinha.

Tentei agir naturalmente durante o lanche; não sei se consegui. Mas tenho certeza de que não o fiz nos dias subsequentes. Aquele vexame me deixara profundamente envergonhado. Não conseguia encarar Marcelo. Ficava cabisbaixo pela casa; evitava estar no mesmo cômodo que ele. No outro dia, sufocado, passei a tarde toda perambulando pela rua, deixando de lado um fichamento que não podia ter adiado, porque sabia que ele voltaria do campus após o almoço.

Na sexta pela manhã, depois que Rodrigo e Otávio saíram, nos deixando na cozinha e eu me preparando para também sair dela, ele me surpreendeu:

– Janta comigo hoje? – fez uma pausa. – Se não tiver programa melhor, claro.

Ele sabia que não. Cada vez mais era raro eu ter algum programa, ao contrário de Otávio e Rodrigo, que não dispensavam as noites de sexta e sábado por nada. E mesmo ele costumava sair também.

– Não, não tenho não. Mas como assim?

– Vamos jantar juntos. Não quer?

Não tinha entendido.

– Mas é pra eu fazer alguma coisa diferente? Você está com vontade de que? Você sabe que eu não...

Ele sorriu, dessa vez num sorriso um pouco mais aberto do que o habitual.

– Não, burrinho. Estou te convidando pra jantar.

Não gostei muito de ouvir pela sua voz aquele termo que vi Rômulo usar tantas vezes com Rai. Mas era Marcelo.

– Nós dois. Escolhi um restaurante; sei que você vai gostar. Janta comigo.

Que porra era aquela? Estava flertando comigo? Simulava fazer a corte como um homem faz a uma mulher? Tinha entendido tudo e estava me sacaneando? Eu fiquei tão estarrecido com a situação que respondi sem entusiasmo, quase apático; aparvalhado mesmo:

– Tá.

Ele não pareceu surpreso com a minha aparente falta de entusiasmo. Na verdade, a ignorou totalmente. Reagiu estampando de novo seu semi-sorriso, como se tivesse absoluta certeza de que me deixaria daquele jeito. E tinha mesmo.

– Queria te levar de carro, talvez fosse mais confortável, mas marquei um taxi pras oito. Não é bom eu voltar dirigindo; esse restaurante tem uma carta de vinhos muito boa.

– Deve ser caro...

– Quem está convidando sou eu, não é isso?

Eu sorri.

– Mas não vou beber muito, por tua causa. Alguém tem que cuidar de ti quando bebe – fez uma pausa, muito rápida. – Mais ainda quando bebe.

Não era um restaurante tão chique, mas também não devia ser muito barato. Quando saí do taxi e me juntei a ele, olhou-me de cima a baixo e sorriu, sem que eu entendesse bem o porquê. Deu-me a vez para passar e, ao entrarmos, perguntou qual mesa eu preferia. O maître nos encaminhou e ele pediu a carta de vinhos. Depois, foi quem tratou com o garçom, fazendo todos os pedidos por mim. Claro, nada com carne vermelha, mesmo que ele observasse que eu gostava e se eu não preferia outro prato, em vez do que sugeria. Aceitei o que me recomendava; parecia muito bom e ele conhecia o restaurante.

A ele o garçom se dirigia, e em nenhum momento a mim, exceto para me servir como indicava Marcelo. Pagou a conta com naturalidade, depois da sobremesa que, por sugestão dele, dividimos na mesma taça, pois ambos estavam já bem satisfeitos. E, depois que levantamos, me deu passagem para que fosse à frente.

Era tudo estranho, porque ele agia como quem está com um amigo, realmente agia assim, mas com todo o ritual de quem está saindo pela primeira vez com uma garota. Eu estava confuso; até gostando, mas confuso. Tive medo que todo aquele clima na verdade fosse uma comprovação de que nossa cumplicidade se tivesse encerrado após o flagrante das cuecas. Por mais que fosse absurdamente cruel, que tudo não passasse de uma armação para que, ao fim, ele risse de mim e me humilhasse. Talvez até ali, em público mesmo. Quando pensei nessa hipótese maluca, mas não impossível, fiquei tenso.

Não, Marcelo não faria isso. Há quem faça, mas não ele. De qualquer forma, tive medo que ele estivesse me ludibriando, debochando da bichinha que ele tinha acabado de descobrir que o enganara usando o próprio jeito de macho para fazer-se de amigo inocente. Mas nada fiz para esclarecer o que realmente estava acontecendo. Se, no fundo, tudo fosse falso, eu não queria comprovar, não queria falar a respeito; não naquela noite. Mas ele não teve o mesmo escrúpulo, e tocou no assunto que mais poderia me constranger:

– Você está retraído comigo desde aquele dia na área de serviço.

– Não...

– Olha... – semicerrou os olhos.

Caramba, como aquele cara era charmoso! Por que não era gay, caralho?

– ...eu não achei que você mentiu pra mim. Sei que você não mente pra mim.

Corei por dentro. E então completou, para meu espanto:

– Eu acredito em você. Sei que você não mistura minhas cuecas com as suas; com as de ninguém. Não faz sentido você se sentir envergonhado diante de mim por uma coisa que você não faz, e que eu sei que você não faz. Eu acredito em você. Então, não precisa ficar sem graça comigo só porque você acha que eu não acredito, porque acha que eu estaria pensando que você não cuida direito das minhas coisas. Eu sei que você cuida bem. Sou eu quem usa, não é? Então, eu sei. Eu confio em você.

Ele me deixava pasmo. Atribuía meu constrangimento não ao que realmente era sua razão, mas àquele detalhe da conversa. E ainda me elogiava. Tudo sem que eu tivesse de inventar nada para me sair da situação, e muito menos que eu tivesse de falar claramente sobre ela. Resolvia tudo por mim, antes mesmo que eu me desse conta do que ele fazia.

Sorri, mais uma vez sem saber o que dizer. Ele correspondeu, com seu semi-sorriso. Deu aquela inclinadinha na cabeça:

– Então vai desfazer essa carinha de cachorrinho que leva bronca depois que fez xixi no tapete?

Sorri de novo, agora menos constrangido.

– Você é realmente muito cuidadoso; acho isso legal. Quando a gente se propõe a fazer algo, deve fazer bem feito. Mesmo que leve um pouco mais de tempo, que tenha de ter um pouco mais de jeito; do jeito certo. Eficaz, entende? E quando a gente consegue, não tem saída, não tem como escapar. É pra sempre, porque foi bem feito. A gente se torna dono daquilo.

– É.

– A gente vai cercando, fechando as saídas, encurralando. E então, zap, toma posse; se torna dono daquilo que parecia não ter solução. E que não tem mesmo, exceto aquela que cabe à gente dar. A de se tornar dono; tomar pra gente o que, na verdade, nos pertence por direito.

– É – respondi, sem entender porque tanta seriedade para falar apenas de meu cuidado com suas roupas.

De qualquer forma, quis ser simpático. Estava agradecido por sua ingenuidade diante do que flagra que tinha me dado.

– Não sou tão cuidadoso assim, mas é que suas cuecas são maneiras. Por isso que não ponho na máquina; nunca.

– Então você lava na mão? – perguntou, como quem não dá importância à questão, enquanto me servia o vinho.

Eu me xinguei por dentro, por mais uma vez cair em contradição.

– Que bom – completou.

– Pra que não fiquem feias. Elas são bonitas e me dá pena – emendei, mais uma fez disfarçando saber que ele tinha me pegado em mais uma mentira.

– Não são bonitas assim... São simples, normais. Nem de marca são – completou, com a voz de quem não se surpreendera com minha mentira.

– Mas são boas. De boa qualidade.

– Claro.

– Eu acho bonitas. E é porque são simples mesmo.

– Uso dessas há muito tempo. Anos. Ficam bem em mim.

– Só parecem meio pequenas, sei lá – ri. – Mas são maneiras.

– É que são tamanho P.

– Eu sei.

– Não são puro algodão, apesar de parecer. Esticam no corpo. Quer dizer, não tanto, porque também não precisaria; não tenho o corpo largo assim. Mas se amoldam, se ajustam.

– Mesmo assim, acho que pra mim eu compraria M.

– Não, não me incomodam não. Se não fossem confortáveis, eu não usaria. É que você não precisa. Pra mim, é melhor que seja P.

Eu ía perguntar o porquê, mas achei que não devia. Já estava sendo invasivo demais conversando sobre as cuecas que ele usava.

Mas o silêncio em que fiquei fez o papel da pergunta. Olhares silenciosos eram habituais nele, mas não tanto em mim.

– É que... Bom, eu prefiro roupas mais largas. As calças também.

– Eu sei.

– É mais confortável. Não gosto de nada me prendendo. Mas a cueca tem que ser mais justa mesmo – fez uma pausa. – Tem que prender melhor.

– Prender como? – perguntou o mané aqui, como se não estivesse suficientemente claro o que ele queria dizer.

Pareceu um pouco incomodado, mas não se negou a me explicar:

– Eu me excito com muita facilidade, Zeca – disse, visivelmente desconfortável.

Fiz cara de imbecil, percebendo minha rata.

– Fico sem graça; as pessoas notam. Eu procuro me distrair, mas não resolve fácil. É constrangedor. Passei algumas vergonhas na adolescência. Mas não sou mais um adolescente. E a gente vai aprendendo a lidar com as próprias particularidades.

– É. Dependendo do lugar onde a gente está...

Tentei completar com mais alguma coisa, dar-lhe razão para que o assunto se encerrasse ali. Eu sabia do que ele estava falando e ele sabia que eu sabia. Pior: ele mesmo sabia do que estava falando! Era difícil de acreditar, porque ele parecia todo o tempo muito sincero, mas eu estava me convencendo de que aquele jantar era uma forma de ele zoar de mim. Entristeci-me um pouco ao me dar conta novamente disso.

– É complicado. Tem situações que não dá problema. Em aula, por exemplo, porque estou sentado. Mas...

Em aula? Não conseguia imaginar Marcelo pensando em sacanagem em vez de prestar atenção ao professor.

– ...o problema é que em aula quase nunca acontece – completou, sorrindo.

Quando quase terminávamos a refeição, encarou-me com muita seriedade.

– Não quero estragar o clima. Mas quero falar de uma coisa.

Aguardei.

– Você pensou sobre o que nós falamos? Sobre o que conversei com você?

– O que?

– Antes da viagem, nas férias. Do teu futuro. Teu jeito de ser.

– Um pouco – respondi, cabisbaixo.

Quando voltei a ele, me olhava com aquele sorriso discreto.

– Eu tomei uma decisão – disse, sem desfazer o sorriso.

– Decisão?

– Fica tranquilo. Vou ajudar você.

– Como?

– Ficando do teu lado. No momento certo, você vai ver. Vou te ajudar; sou seu amigo.

– Você fala de mim como se eu fosse um idiota – quase resmunguei.

– Você não é nem eu acho que você seja um idiota. Se eu pensasse assim, nós íamos estar aqui?

Ele abriu a porta do elevador para mim; apertou o botão do andar e, ao chegarmos à porta do apê, posicionou-se à minha frente, para que ele a abrisse, e eu não.

Não vou disfarçar. Não vou. Eu queria que, agora a sós, ele me abraçasse e beijasse – nem sei como, visto os quase vinte centímetros de altura que seus 1,92m nos distanciava. Mas fantasias são fantasias. Então, ele se declararia para mim, me levaria para seu quarto, transaria comigo e dormiríamos de conchinha. Era tudo que eu precisava para que aquela se tornasse provavelmente a melhor noite da minha vida.

Mas ele apenas disse que me ofereceria um café, já que dispensara o do restaurante porque sabia que não era bom. Conversamos um pouco mais na cozinha, com ele continuando a agir como um gentleman comigo, agora me fazendo uma gentileza que eu devia receber lisonjeado, já que em nossa rotina era eu quem fazia o café para ele. Quando terminamos, os dois de pé, ele apoiado na bancada da pia e eu na mesa, fomos cada um para o seu quarto.

Otávio e Rodrigo só chegariam bem mais tarde. Torci para que não me procurassem, mesmo sabendo que as chances que tal ocorresse fossem mínimas. Fora as duas vezes e meia com Otávio, nunca me pegavam após as baladas, ou porque já tinham se saciado com o que mais gostavam ou porque chegavam exaustos, prontos para despencar na cama. Não foi uma exceção, e pude dormir sozinho, encantado, apenas com Marcelo junto a mim. Na minha imaginação, mas estava junto a mim.

...

[continua]

[PS: Como de costume, pus abaixo umas respostas aos comentários que os leitores fizeram à parte anterior da história]

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 3 estrelas.
Incentive hubrow a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.

Comentários

Foto de perfil genérica

Cara.... Show de bola.... Quem sabe agora esse Marcelo desencanta!!!!!!

Continua... Show de bola o conto!

0 0
Este comentário não está disponível
Foto de perfil genérica

Hubrow, pode me mandar as continuações pelo whats? 092994626789 Irei ficar sem Internet pra ler, sou muito fã de seus contos pfv não quero perder um capítulo se quer rsrs Serio te imploro

0 0
Foto de perfil genérica

Posta logo o próximo, se quiser me mandar por e-mail a próxima parte tai Hubrow dougcorreaforever@Gmail.com

0 0
Foto de perfil genérica

Ansioso pro próximo capítulo e ninguém post a nada :(

0 0
Foto de perfil genérica

Segue a saga! Fantástico como Marcelo finalmente declara sua determinação ao Zeca: "A gente vai cercando, fechando as saídas, encurralando. E então, zap, toma posse; se torna dono daquilo que parecia não ter solução. E que não tem mesmo, exceto aquela que cabe à gente dar. A de se tornar dono; tomar pra gente o que, na verdade, nos pertence por direito." Muito bom! E o Zeca meio sem acreditar. Estou gostando muito desse jogo psicológico em que você desenhou o relacionamento dos dois. Bem apropriado, porque é o único que envolve emoçoes, propriamente ditas. O relacionamento com Rodrigo e com Otávio é físico, com pouquíssimas chances de passar disso. A menos que você queira nos passar a perna, hehehe (o conto é seu, fique à vontade para isso).

Sobre suas respostas, obrigado pela consideração aos comentários. Você deu um plus na relação com os leitores, porque suas respostas nos provocam e nos prendem. Além de ler a continuação da história ficamos á espera de sua interação, de sua participação em nossa participação. Creio que isso explica a perenidade e extensão dos comentários. Legal. Está sendo prazeroso fazer esta jornada contigo. Sobre me surpreender, por favor, faça isso!

0 0
Foto de perfil genérica

Não estou entendo o que esse Marcelo quer

Não vejo a hora da continuação

0 0
Foto de perfil genérica

cara, essa série é muito boa. Você escreve muito bem, eu sou deficiente visual total, e pra mim as palavras, o conjunto do vocabulário tem um significado maior. Me chama no meu e-mail, vamos conversar:tallesdireito93@gmail.com

0 0
Foto de perfil genérica

NÃO VEJO UM DRAMA ENORME EM SE LAVAR CUECAS DE OUTRO HOMEM. ZECA TÁ PIRANDO POR CAUSA DISSO. MARCAS NA CUECA É NORMAL SEJA NA FRENTE OU ATRÁS. QUE BOM SERIA SE AMBOS FALASSEM MAIS ABERTAMENTE SOBRE O QUE SENTEMM AO INVÉS DE FICAREM SE UTILIZANDO DE SUBTERFÚGIOS. ISSO É DESGASTANTE DEMAIS, UM SOFRIMENTO MUITO GRANDE.

0 0
Foto de perfil genérica

desculpe... não sabia que era um mistério para todos... tava me achando o burro por fora de tudo

0 0
Foto de perfil genérica

Eu achava que vc usava trema por causa do corretor mesmo haha ou então que vc era mais velho do que eu imaginava kkkkkkkkk sobre gordura vegetal, estou louco pra experimentar algum dia kkkkk Quanto ao desodorante, parei com praticas do tipo, melhor ficar no dedo ou no consolo depois do susto que levei. Quanto ao capítulo de hoje, Marcelo está muito perfeito. Estou com medo de acontece algo ruim com/sobre ele. Sabe, às vezes estou no meio do meu dia e paro pra pensar no significado de ABO, haha hoje mesmo eu parei enquanto limpava a casa e pensei se o A era de ativo ou... MEU DEUS, acabei de pesquisar e vi um significado que combina com a história... A de Alfa?

0 0
Foto de perfil genérica

Leio varias vezes para eu tentar entender todas as nuances que as vezes ficam escondidas,despercebidas. Marcelo esta sendo muito verdadeiro com seu jeito de agir,acho que possa vir um romance adulto homo mais adiante.

0 0
Foto de perfil genérica

Hehehe... :) ► ► ► tiopassivo: acho que você vai ter uma surpresa enorme com as reações de Marcelo... Mas o diabinho aqui não vai adiantar mais nada não. ► ► ► VALTERSÓ: Sei não, mas acho que Rodrigo pegou teu coração, hein... Vc não sabe se ele é um idiota e vc o detesta, ou se acha fofinho nosso touro por parecer estar se afeiçoando a Zeca. Quanto a Otávio, em breve vai virar, como dirá Zeca, uma “máquina de fuder”, tentando resolver o problema que o atormenta. Pobre Otávio, vcs nem sabem... ► ► ► Bryan Smith: fiquei horas aqui tentando imaginar quais as funções sexuais que poderiam estar por trás de um trema, porque vc falou sobre suposições sobre isso e já percebi que o senhor tem uma mente maligna, hehehehe... Na verdade, é coisa do Word. Ok, ok, o Word que uso é a singela versão 2007, e em 2007 o Acordo Ortográfico não havia sido aplicado plenamente ainda: apesar de ninguém mais usar, o trema ainda existia. Então, o corretor ortográfico corrige, pondo trema. Daí, digito “tranquilo” e ele põe “tranqüilo”. Só que, inexplicavelmente, não faz isso em tudo, e daí acabo não conferindo tudo. Existe uma atualização do dicionário do Word desta versão, e é gratuita. Já tentei instalá-la, mas não aceitou, e tb não sei a razão, pois antes de formatar o HD eu tinha este mesmo Word 97 e havia feito a atualização do dicionário sem qq problema. Mas tudo bem: nesta parte já estou dando uma revisada mais arguta nos tremas que ele tinha posto, ok? Continuando nos seus pontos: esse lance do frasco de desodorante é prática mais ou menos comum, e é também comum nos pronto-socorros neguinho aparecer atolado com um... imagina a vergonha! Da próxima vez, vê se põe do lado oposto da tampa, hehehe. E, olha, posso te garantir, com todo o entusiasmo, que, depois do fósforo, gordura vegetal é a melhor invenção do mundo para uma boa trepada – e não só para o passivo, que é o ponto de vista do Zeca. ► ► ► Alex curte peludo: tb já tive experiência com fisting; duas, na verdade. Assisti uma sessão uma vez (e é nela que me baseei para a descrição que fiz, principalmente sobre as reações do passivo), a convite de um amigo que, depois de tanto falar a respeito, não resistiu e quis porque quis que eu visse como era. Rolou um sexo, mas do fisting mesmo só fiquei como espectador. Achei impressionante, inclusive a expressão de prazer do que foi fistado, mas não me deu propriamente tesão, não. Tempos depois, nas preliminares de uma foda, o cara simplesmente foi fazendo com que eu dedasse, dedasse e, pimba, entrou tudo. Sério. Não me lembro bem, mas acho que passou do punho. Muito impressionante, e ele ficou doido, doido mesmo. Bom, devia ser doido de pedra, porque ninguém em sã consciência aceita ser fistado sem combinar antes e, menos ainda, assim sem preparação por alguém que nunca tinha feito. Claro, ele já estava bem lubrificado (não sei com o que, mas não era com a gordura não, porque era um bagulho meio grudento). Não sei se gostei ou se não gostei. Foi num clima legal, e a sensação pra quem está entrando é gostosa; é macio mesmo. Mas não me deu vontade de que se repetisse. O cara era do interior de São Paulo, e desde então, kkkkk, toda vez que falam em interior de São Paulo imagino todo mundo metendo a mão dentro de todo mundo a toda hora. Kkkkk, não consigo evitar a associação, todas as vezes. Não se ofendam os paulistas do interior, por favor; é que foi uma experiência marcante. ► ► ► Geomateus: eu imagino que vc leia uma vez e depois volte pra reler, não? É que seus comentários são em horários espaçados. Se for isso mesmo, fico muito honrado. Creio que seja raro alguém voltar e reler algo na CDC. Obrigado! ► ► ► VictorNerd: huahuahuahua, te vi mordendo as unhas todas de uma vez, que nem em desenho, ansioso. Caaaalma, eu avisei que só postaria nesta sexta à noite, mesmo... Obrigado por estar acompanhando a história assim, tão interessado no desenrolar da trama. ► ► ► Peludodf: entrei na sua página muito rapidamente, mas vou voltar lá. Li trechos de seu último conto (o da Marinete) e vi que é uma comédia. Raro isso aqui. Acho que foi a primeira vez que vi um conto cômico na CDC. Legal! ► ► ► gabriel.floripa: aaêêêêêêêêêê, finalmente apareceu o homem que entra em tudo que é conto, menos no meuzinho aqui! Bacana ter entrado e comentado. Mas... você entra agora e já quer lugar na janela? Calma, parceiro, todo mundo quer saber o que é A.B.O, hehehe, não é só vc não. Acho que tem gente que já sacou, ou está sacando, mas de qualquer forma só vai se tornar claro, explícito e explicado, mesmo bem pro fim, lá pela parte 16 talvez. Mistério... :0 ► ► ► Vitor1021: vc é daqueles que vai logo direto ao ponto, né? Ok, ok, ok, no fundo acho que Zeca quer é isso mesmo e vê Marcelo é desse jeito; Marcelo é que não sei bem... ► ► ► Gostaram dos trianglinhos? Descobri hoje que o site da CDC aceita. Legal, não? ► ► ► Próxima postagem na noite de segunda, tá bom? Estamos perto, bem perto, da grande virada. ► ► ► Brigadão a todos que estão acompanhando e, como sempre, sem me esquecer dos tímidos. Até segunda!

0 0