- Precisa mesmo, Mônica? - perguntou Gabriel, com voz chorosa.
- Claro que sim, né, amiga? Por acaso vai sair com essas pernas peludas?
Mônica seguiu passando a lâmina de barbear nas pernas do amigo, que estavam macias e cheirosas, besuntadas de creme.
- Eu podia sair com uma calça de brim sua.
- Ah, não, nem pensar. E eu lá vou sair com amiga que sai de calça jeans pra balada? Vai sair de perna de fora sim. De saia ou de vestido, vamos ver ainda o que lhe cai melhor.
- Saia? Vestido?
- Sim, senhorita. Mas calma lá, vamos terminar a produção antes.
Terminou a depilação. Gabriel passou a mão pela perna e achou estranhíssimo:
- Nossa, que lisinho.
- Sim. Gostoso, né?
- É, não é ruim...
- Tá, vem aqui, vamos coloca os pés nessa bacia aqui.
- Pra que isso?
- Vamos fazer os pés, bem.
- Mônica, fazer os pés? Você diz pintar as unhas dos pés?
- Exatamente.
- Mas pra que? Eu posso muito bem ir com um sapato que não apareça.
- Negativo. Vai de sapatinho que aparece os pezinhos feitos. Desculpe, amiga, preciso que você vá gata...
- Para o Erick ficar em cima de mim e deixar você e o Marino a sós? - falou, com ironia levemente raivosa ele.
- Acertou! - riu triunfante ela.
Enquanto a produção acontecia, eles bebiam mais um vinho. 'Pra ajudar a se soltar na personagem', falou ela.
- Unhas vermelhas... claro que você ia pintar minhas unhas de vermelho.
- Amiga... você é ruiva. Não tenho culpa se combina com esse cabelo em fogo lindo.
Pintou então as unhas dos pés do amigo de vermelho.
- Não vai pintar as mãos também?
- Vou sim, mas não ainda. Calma.
Mônica levantou-se, abriu o armário e de lá veio com uma cartela de unhas postiças.
- O que é isso?
- Unhas postiças, bem.
- Meu Deus... e precisa, Mônica?!
- Claro que sim! Você está com essas unhas curtas, roídas. Não tem como.
Nisso Gabriel havia de concordar: suas unhas estavam vexaminosas.
- É... tens razão.
- E pensa comigo: e estando na rua como mulher, melhor ter mãos de mulher ou de homem...
- De mulher - respondeu ele, num muxoxo.
- E tendo mãos de mulher, melhor mãos lindas ou nem tão lindas...
- Tanto faz.
- Não, não mente. Você prefere mãos lindas! Todos preferem estar bonitos, não vem com essa.
Gabriel nada respondeu.
Mônica então colou com zelo unha a unha, terminando o serviço pintando e lixando direitinho cada uma:
- E aí, que tal?
Gabriel estendeu os dedos e olhou. Fez cara de nada mal e deixou escapar.
- Amei. Digo... ficou bom.
Mônica bateu palminhas entusiasmada: o amigo aos poucos ia se entregando à personagem. Aproveitou antes que o amigo desanimasse e partiu pra maquiagem. Dessa vez um olho bem preto, esfumado com prata no cantinho; iluminador na pontinha do nariz pra arrebitar, um blush mais escuro e um batom líquido, vermelho escuro, para mostrar que Pâmela estava indo para a noite não apenas para passear, mas para arrasar.
- Posso olhar? - perguntou ele, levemente entusiasmado.
- Ainda não. Só com produção completa.
- Aff... tá... e aí, já escolheu minha roupa?
- Ainda não, amiga, mas antes precisamos fazer alguns ajustes nesse seu shape.
Mônica foi até o armário e trouxe consigo um espartilho. Pediu para o amigo se levantar, envolveu a peça nele e apertou com força:
- Mônica!!! Não aperta tanto.
- Aperto sim. Precisamos afinar essa cinturinha ao máximo.
Gabriel tinha o corpo magro, porém lhe faltavam curvas para que seu corpo parecesse o de uma mulher. Faltavam antes de ela apertar e amarrar o espartilho: quando ela acabou ele estava com uma silhueta de matar muita mulher de inveja.
- Nossa, amiga, que corpão.
- Menos, Mônica... menos - falou ele, ainda tentando respirar normalmente apesar do aperto da peça.
Mônica então pegou algumas meias e preencheu os bojos onde ficavam os peitos. Não encheu demais para não ficar vulgar, mas também não o de menos para passar que não tinha peitos: preencheu o suficiente para ficar adequado ao seu corpo agora feminino.
- Queria menos peito, Mônica.
- Não, não. E se reclamar eu deixo eles ainda maiores.
Apesar de toda aquela produção, com chapinha e unhas feitas e de estar com boa parte da indumentária feminina, Gabriel ainda estava, absurdamente, de cueca.
- Ok, amiga, hora de trocar a cueca pela calcinha.
- Sério? Que vergonha.
- Ah, sim, porque estar assim montada não é vergonha. Botar calcinha que é.
- É que calcinha é tão estranho... a vida toda tirando as calcinhas das meninas. E agora eu usando uma...
- E com alguém louco para tirar ela de você!
- Tá, não vou mais! - rosnou ele.
- Tá, brincadeira... desculpe. - Não faço mais. - riu-se ela. - Toma aqui, essa aqui não é muito ousada. Talvez deixe você mais à vontade.
Era uma calcinha preta, sem rendinhas, suficientemente larga, apenas com um laçarote de cetim na parte da frente como adorno. Gabriel achou menos ruim do que imaginara.
Foi até o banheiro e a vestiu. Não ficou ruim, mas o volume na região deixou estranha no corpo:
- Tá, e como eu faço para esconder... meu material?
- Então! Acabei de ver aqui no Youtube um tutorial explicando como fazer isso. É uma técnica chamada 'tucking'.
- Tucking?
- Isso. Vê aí como faz. Pelo que eu entendi, empurra tudo pra trás e coloca uma fita.
- Como isso?
- Vê aí. Tem fita aqui. Vou sair pra você tentar pois infelizmente não tenho como te ajudar nisso, amiga.
Gabriel então, estupefato, viu o vídeo e não pôde deixar de achar engraçado. Viu as instruções e, mesmo sem jeito, fez conforme a instrução e o resultado era incrível.
- Gente... eu tenho um capô de fusca... - disse se olhando no espelho e contendo o riso. Cuidou para olhar só da cintura para baixo, pois só queria ver o rosto quando estivesse completamente transformada.
- Deu? - perguntou Mônica, entrando no quarto. - Meu Deus!!! Ficou perfeito!
Ambos riram. Aquilo definitivamente era engraçado demais.
- Ok, que mais? - perguntou já demonstrando alguma ansiedade ele.
- Nossa... tá ansiosa pra terminar a produção?! - estranhou ela.
- Curiosa... digo... curioso.
- Olha ela...
- Hahahaha... então, cadê meu vestido?
- Vestido? Decidiu sozinha?
- Sim. Quem sai na chuva é pra se molhar. Já que estou aqui, poderosa, nada melhor que um vestido para completar o visual.
- Nossa! Poderosa! Isso aí, amiga.
Mônica então foi correndo até seu closet e voltou saltitando com um vestido num cabide.
- Olha esse aqui, amiga!
- Nossa... que lindo!!!
Era um vestido tubinho preto, de alcinhas finas, curto, curtíssimo, todo cheio de lantejoulas brilhantes espalhadas por ele.
- Vai, experimenta!
- Só se for agora!
Gabriel pegou o vestido e foi até o closet.
- Amiga! Já vem usando eles com os sapatos pra ver como ficou o look completo. Tem um scarpin com peep toe aí perto da porta.
- Peep toe?
- Sim. Esses com dedinho de fora na parte da frente.
- Ah, sim... achei. Mas...
- Mas o que?
- Esses saltos! São enormes! Não vou dar conta.
- Afff... vai sim! É só treinar. Cadê a gata aquela que vai sair na chuva pra se molhar? Vai querer arrasar usando rasteirinha? Não, né?
Gabriel deu de ombros e foi obrigado a concordar. Vestiu então o vestido, calçou os sapatos - com um tanto de dificuldade - e parou antes da entrada do quarto:
- Amiga... posso ir?
- Pode! Vem, amiga! Arrasa na passarela.
Gabriel então adentou o quarto, uma mão na cintura, desfilando pelo quarto como uma verdadeira miss.
- E então? Arrasei?
Mônica arregalou os olhos e colocou ambas as mãos em frente à boca.
- Amiga? Que tal estou?
Mônica não conseguiu falar. Lentamente, esticou um dos braços e gesticulou para que Gabriel girasse e visse por si só no espelho que estava atrás dele.
- Meu... Deus... do... céu!
Do alto daquele scrapin preto, trajando aquele vestido coladinho e curtinho, com as pernas maravilhosamente torneadas devido o salto; com as unhas das mãos enormes e de um vermelho vivo, com um corpo absurdamente curvilíneo e feminino, completando com seus cabelos lisíssimos e ruivos, com uma maquiagem maravilhosa, com direito a cílios postiços enormes, não havia como alguém dizer que aquela gata que se olhava em frente ao espelho não era uma mulher. Uma mulher linda. Uma mulher gostosa. Uma mulher que qualquer homem desejaria.
CONTINUA...