Não demorou muito e eu caí no sono. Acordei pelos solavancos da estrada. Kadu estava com a cabeça apoiada em meu ombro, e João dormia na poltrona vizinha à nossa.
Fizemos uma pausa em um restaurante na estrada, onde tomamos um banho e aproveitamos para almoçar. Arthur, André, João e eu sentamos em uma mesa e ficamos batendo um papo sobre as expectativas de jogar em Brasília. Kadu e seus amigos sentaram em uma mesa um pouco mais distante. João não conseguia se concentrar e nem disfarçar seus olhos penetrados em Kadu. Eu tinha que ficar na minha e deixar João caminhar com suas próprias pernas.
- por que o Kadu ficou ao teu lado na poltrona? – perguntou João me arrastando para uma área reservada.
- eu sei lá. Vai perguntar pra ele.
- ele comentou algo sobre mim?
- não, João.
- e sobre o que vocês conversaram?
- sobre nada João. O cara dormiu a viagem inteira e ainda babou meu ombro todo.
- poxa, mas o que foi que deu errado?
- ele não estava no clima de festa, parece que tava sentindo dores na cabeça.
- ah é? Ele não me falou nada.
- acho que ele não achou necessário.
João mudou seu semblante de triste para esperançoso.
- que cara é essa? – perguntei sorrindo da feição dele.
- to pensando em uma coisa aqui. – ele esfregou as mãos.
- fala.
- você me deixa sentar no seu lugar? Ai eu cuido do meu amor e ganho pontos com ele.
- por mim, sem problemas. Eu sento lá atrás.
- obrigado, Lucas. Você é a melhor pessoa do mundo.
- a segunda, a melhor é meu pai.
João riu.
Após o almoço retornamos à van. Ao entrar, peguei minha mochila e dirigi-me a parte traseira do veículo, já João, sentou em minha poltrona e colocou seu fone no ouvido.
- ninguém mais dorme. – falei cumprimentando o Arthur.
- aí sim hen manin!? – brincou André.
Aumentamos o volume da caixinha e começamos a dançar um funk pesadão.
Tínhamos uma mania, talvez ate besta, de ficar abaixando o short dos colegas e dar fortes tapas no glúteo. Isso apenas com quem tínhamos muita intimidade. O time de futsal foi retornando aos poucos e para infelicidade do João, Kadu entrou e foi direto para o fundão. Ao passar por mim, o cara calibrou a mão e acertou em meu traseiro. Não fiquei ofendido, pois aquela brincadeira era muito comum na nossa geração.
- hey galera, eu e o Matheus compramos uma caixinha de devassa lá no restaurante, mas temos que manter isso em segredo hen!? – disse Kadu.
- eu topo. Se vazar, seremos desclassificados. – disse Doug, um jogador do nosso time.
- não é querendo ser chato não, mas você disse que estava morrendo de dor na cabeça. – falei.
- falei sim, mas já estou bem melhor. Acho que era só sono mesmo.
- to ligado.
- pois é. Alguém do teu time trouxe caixa térmica? – ele perguntou.
- não que eu saiba, mas isso é fácil de resolver, ao lado do banheiro eu vi uma espécie de freezer.
- po, então vamos estocar as cervas la dentro. – disse Kadu.
- demorô. Guarda lá que eu vou chamar o João.
- qual João?
- do nosso time. – falei.
- deixa ele dormir po.
- ele não ta dormindo não, tava só descansando.
- então deixa ele descansar.
- velho, essa caixinha e esse globo aqui são dele, e porque você ta querendo lavar o cara?
- Aquele bicho é mó bola fora.
- por que tu ta falando dele assim?
- porque é assim que ele é.
- eu discordo, cara. O João é muito gente fina, e tu deveria ser grato pelo tanto de coisa que ele faz por você.
- A é? Me diz que tanto de coisa é essa que ele faz por mim? – disse isso cruzando os braços e fazendo pose de ‘’boyzinho marrento’’.
- esquece! – falei virando as costas.
- espera, Lucas. – disse segurando meu braço. – fala pra mim. Fala o que esse cara te disse a meu respeito.
- deixa quieto.
- você é um cuzão.
- por que eu sou um cuzão? – dessa vez foi eu que cruzei os braços e fez cara de machão.
- vem defender teu amiguinho sem ao menos saber da verdadeira história.
- eu conheço o João desde moleque, e ele tem todos os defeitos do mundo, mas sei que nessa história ele é a vítima.
- então vai lá consolar ele, aproveita e dar umas lambidinhas de leve nos ovos dele também. – falou tirando sarro.
- va tomar no seu cu. – furioso, virei-me e sentei em uma poltrona da parte da frente da van.
Já era noitinha quando o motorista estacionou a Van em uma rodoviária do interior. Paramos para tomar um banho e jantar alguma coisa.
Após a refeição, João me convidou para uma conversa.
- sobre o que vocês estavam falando aquela hora na van?
- sobre nada ué. – respondi seco.
- ele comentou alguma coisa sobre mim?
- não.
- certeza?
João estava aflito, seus olhos inchados denunciavam que ele havia chorado muito durante o percurso.
- por que tu não conversa com ele?
- se ele ao menos tirasse um tempo pra mim. – ele suspirou.
- talvez você consiga pela insistência. – falei voltando à van.
Sentei na parte do meio da van, onde estava tudo escuro. Meus pensamentos me levavam até o Kadu.
- que diacho está acontecendo comigo? – eu pensava.
Cobri meu rosto com uma pequena toalha e tentei dormir. Aos poucos, a van foi sendo tomada pelo retorno dos jogadores que ainda estavam jantando.
Kadu tirou a toalha do meu rosto e, com as mãos, apertou fortemente meus lábios.
- o nenezinho ainda está zangado? – disse rindo.
Kadu estava completamente bêbado e ainda trazia mais cerveja na mochila.
Ao invés de ficar zangado, sorri. Que mãos macias ele tinha.
- afasta pra lá. – disse Arthur sentando ao meu lado e me entregando uma latinha de cerveja.
- ta doidão também? – perguntei.
- não, estou suave. E você por que não ta bebendo com a gente?
- to querendo chegar sóbrio la em Brasília.
- e eu to querendo chegar doidão, tomar um banho e tirar um cochilo no hotel. Como será o hotel que vamos ficar lá?
- não sei óh, mas espero que seja cinco estrelas com uma piscina para cada quarto.
Arthur sorriu.
- porra! Aí, sim. – disse levando a mão esquerda ate a nuca. – e qual é a do João que ta afastado da gente?
- acho que ele ta com dor na cabeça. – menti.
- hum. Bora la pra onde esta o frevo.
- bora! – confirmei.
Kadu dançava apenas de bermuda girando a camiseta no alto.
- apareceu? – ele foi sarcástico.
- só pra pegar uma cerva. – falei.
- me trata como vagabundo, mas toma da minha cerveja?
- beleza. Então enfia essa porra aí no cu.
- hey. – mais uma vez ele segurou meu braço e sorriu. – não sabe quando alguém fala contigo na brincadeira não?
Respirei fundo.
- eu não to muito pra brincadeira não.
Ele levantou as mãos para o alto em forma de redenção.
- parei de brincar com você então.
- vlw. – disse abrindo uma latinha.
Kadu voltou a dançar. O cara tinha carisma e sabia marcar sua presença. Minha cabeça, mesmo confusa, pensava muito naquele cara. Seus olhos, sorriso, corpo... Tudo nele me chamava atenção.
Ficamos curtindo ate altas horas. Naquela mesma noite chegamos a Brasília. No hotel, outras delegações nos esperavam. Para cada quarto ficavam 3 atletas. Fizemos a identificação na recepção e subimos. Arthur, João e eu dividimos o mesmo cômodo.
- vocês vão tomar banho agora? – perguntei ficando só de cueca dentro do quarto.
- eu vou dar uma ligada pro meu pai. – disse Arthur.
- e eu vou desfazer minha bagagem. – falou João.
- beleza, então o banheiro é todo meu.
Saí do banho e já passavam das 22h. Arthur e João já não estavam mais no quarto. Coloquei um short de jogar, joguei uma regata no ombro, passei um malbec e desci pra ver o que estava rolando. Ao sair do quarto topei com o Kadu se equilibrando nas paredes para não cair.
-tu ta ai bravinho? – disse ele com os olhos vermelhos de tanta cachaça.
- cara, tu ta louco? Se teu professor te pegar assim, você vai ser desclassificado do campeonato.
- relaxa bravinho, ta tudo sobre controle. – ao dizer isso, Kadu não conseguiu se manter em pé e caiu.
- deixa eu te ajudar. – falei tentando o reerguer. – qual é teu quarto?
- caralho, o cartão do meu quarto ta com o Matheus e o Yuri lá embaixo.
Kadu apoiou-se em mim e consegui coloca-lo de pé.
- espera aqui que eu vou atrás deles.
- espera. – ele segurou-me pelo braço mais uma vez.
- aqui é perigoso demais e alguém da organização dos jogos pode me ver.
- quer ficar no meu quarto enquanto desço pra ver se encontro os caras?
- quero. – disse ele seguido de um arroto.
Procurei os outros jogadores por todos os lados, mas não encontrei ninguém. Retornei ao quarto, e Kadu estava apenas com uma cueca box toda suada e molhada de cerveja.
- velho, tu ta todo imundo.
- vou dormir sozinho mesmo. – disse ele se jogando em uma das camas.
- hey, hey, hey, ai não po. – tentei evitar, mas já era tarde.
Kadu, atravessado, deitou na cama. Com muita dificuldade, consegui vira-lo e deixa-lo numa posição mais confortável. Seu pênis estava meia bomba e era possível ver resquícios de sêmen.
- esse bicho tava batendo punheta dentro da van? – pensei e sorri ao imaginar a cena.
João entrou no quarto com algumas sacolas e me olhou com desconfiança ao ver seu grande amor ali.
- o que o Kadu ta fazendo aqui? – perguntou ele jogando as sacolas no chão.
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Quando for beijar alguém
testa esse beijo em mim
Antes de amar meu bem
Testa esse amor em mim.
Me prenda, me abraça e não saia
Aceito esse emprego de cobaia.
Me prenda, me abraça e não saia
Aceito esse emprego de cobaia.
****
Continua...