O ano de 2005 foi uma época muito agitada um minha vida. Um ritmo frenético. Tinha acabado de me formar em economia e trabalhava em um banco de investimentos no Catete,. Na mesma época, comecei uma pós em educação financeira semi presencial, e, como sempre gostava de manter um hobby, fazia em paralelo um curso de teatro em Laranjeiras. Para manter o ritmo da melhor forma possível, vi que precisava otimizar meu tempo e me mudar para próximo de tudo isso. Como os aluguéis no centro eram absurdos, a melhor solução foi dividir um apartamento. E foi assim que, após ler um anúncio, conheci Carlos.
Carlos era massoterapeuta, tinha um amplo apartamento na Glória com três quartos, herança de família. Um quarto ele usava de estudio, enquanto outro acabou ficando vago e ele resolveu alugar. Na entrevista, nos demos muito bem. Era um homem de trinta anos, olhar sereno, calmo. Cabelos e barbas castanhas claras, olhos azuis e um corpo bem feito. Naquela época eu ja tinha a mente bem aberta e era muito fácil pra mim reconhecer a beleza de Carlos sem que isso colocasse em xeque minha sexualidade. Não era de relacionamento, até por que minha vida agitada não permitia, mas também conseguia aprontar das minhas, em especial com colegas de trabalho cujas vidas eram tão agitadas quanto as minhas. Algumas eram até casadas, mas não vamos entrar nesse mérito.
Voltando a Carlos. Nosso acordo era bem simples. Eu pagava um valor bastante razoável de aluguel desde ajudasse nas contas de luz, água e internet. Como ele atendia em casa, seria possível eu esbarrar com desconhecidos, o que pra mim nao seria problema, já que passava a maior parte do meu dia na rua.
Com certo tempo, acabei por acaso encontrando o perfil dele como massoterapeuta e desconbri que entre as modalidades de massagem que ele oferece, as com "final feliz" são algumas delas.
Como falei, mente sempre aberta e isso nunca alterou minha imagem de Carlos, que era um cara maravilhoso e, podia dizer, um de meus melhores amigos naqueles período.
Não falávamos sobre a profissão de Carlos, apenas uma vez em que ele, muito sem graça, veio me pedir uma coisa.
"Fabio... Assim... Desculpa estar pedindo isso, mas..."
"O que foi cara?" respondi com a boca cheia de pizza caseira que eu tinha feito para nós dois numa noite de domingo. "deu pra ticar gago agora?"
Ele sorriu e continuou
"Então... Não sei se você sabe... Mas alguns de meus clientes... Eles..."
"Curtem uma finalização especial após a massagem" eu mesmo completei para ele, de forma direta e limpando a boca com guardanapo após. Seus olhos arregalaram e depois sorriu, rindo sem jeito " ah qual é. Achou mesmo que eu não descobriria sozinho?" E ri e ele me acompanhou.
"Bem... Você, resumiu bem... Rs a questão é. Alguns são mais... Exigentes que outros. Outros tem umas taras loucas e... Enfim. Quando um de meus clientes soube que estou dividindo apartamento... Ele..."
Ao ver minha cara de espanto, ele se apressou em terminar de explicar.
"Não é o que você ta pensando não. Relaxa rs. Só... Que ele pediu para que a próxima consulta fosse no seu quarto "
"Na minha cama?"
Ele apenas concordou com a cabeça, com um meio sorriso.
"E você...?" O incentivei a contínuar.
"Não respondi nada, lógico. Disse que antes ia falar contigo... Olha. Ele é bem generoso e ... Podemos negociar. Eu posso abater parte do aluguel... E vai ser no horário da tarde de segunda. Você vai estar fora. E eu posso garantir que o cara é de bem. Honesto. Além do que, é casado, então não vai arriscar mexer em nada e se expor."
Apesar de surpreso com o pedido, não estava chocado. Por um lado até tinha gostado da sinceridade dele. Afinal, ele podia muito bem fazer e tentar esconder de mim já que eu ficava fora o dia todo e a porta de meu quarto destravada.
Ao fim, dei de ombros e concordei.
"Tranquilo. Se você garante que não vai mexer nas minhas coisas. E, por favor, troca a roupa de cama quando acabar, sim?"
Ele riu e me agradeceu
"Te devo essa"
Realmente, se ele não tivesse me dito nada, eu talvez sequer perceberia que meu quarto havia sido violado. Na noite de segunda, quando cheguei do trabalho, meu quarto estava como deixei, com exceção da roupa de cama que foi trocada e tambem um pedaço de papel que encontrei debaixo de um porta retrato com a foto minha com minha irmã. Nele, um bilhete:
"Obrigado, Fabio, por deixar o Carlos usar seu quarto. Desculpe a intromissão, mas não pude deixar de ver essa sua foto. E devo dizer que você é um cara muito bonito. Se um dia tiver curiosidade, me liga. Rogério."
Fiquei embasbacado. Abaixo tinha um número de telefone. Eu achei graça e fui zombar de Carlos.
"Abre teu olho, colega. Se não daqui a pouco eu roubo tua clientela. "
Ele gargalhou ao ler o hilhete.
"Caralho. Que cara maluco. Pior que ele me falou que ia fazer isso, mas não levei fé".
Rimos bastante juntos, foi então que me deu curiosidade e perguntei-lhe:
"Cara, a título de curiosidade, você curte transar com homens?"
Ele balançou a cabeça, com a feição franzida, como quem avalia seriamente uma questão, antes de responder.
"Sinceramente. Não muito. Mais pelo dinheiro mesmo. A verdade é que eu sou massoterapeuta mesmo. Só, que nesse ramo as pessoas confundem muito. Recebi um monte de propostas antes de aceitar a primeira."
Eu sentei, verdadeiramente interessado em ouvir sua historia. Vendo minha atenção, continuou:
" Primeiro, abria exceção só para mulheres, então comecei a atender casais. Agora a maioria sao so homens" resumiu
"Entendi. Homens devem procurar mais, ne?"
"Aham. E também são mais generosos, diga-se de passagem. Acabou que agora aqui estou"
"Sei como é." Concordei. "confesso que também não curto meu trabalho. Mas infelizmente sou muito bom e o retorno é ótimo"
"Acho você um excelente ator" falou pra mim com toda a naturalidade. Fiquei lisonjeado. Carlos já tinha assistido a duas peças minhas. Pequenas. Papeis secundários.
"Você tem pretensão de seguir a carreira?"
"Não sei", respondi pensativo
Continuamos conversando sobre vários assuntos naquele dia. Nada envolvendo nossos trabalhos.
A verdade é que a ideia de seguir com o teatro era tentadora, mas eu morria de medo. Adorava os palcos, amava ser outras pessoas, mas largar tudo e entrar de cabeça... Caramba..
Mas a coisa ganhou um rumo acelerado em julho daquele ano. Fomos informados na companhia de teatro que receberiamos a visita de Arlete Bueno, uma grande teatróloga, que, por coincidência, era amiga de nosso professor. E melhor, ela também era roteirista e estava com um projeto e iria trazer para o Rio. Para a peça, ela precisaria de 4 atores masculinos. Eu conhecia seu trabalho, era fabuloso. Alguém acostumada a romper preconceitos da sociedade, com textos densos e personagens marcantes. Fiquei interessado e me inscrevi. Quando li sobre a peça, fiquei encantado.
Ela tratava a historia de Ivan, um homem de meia idade que mantinha um albergue para jovens no centro de uma grande cidade. Ele acolhia jovens por um preço barato, mas o que parecia fruto de caridade, era uma estratégia para conseguir sexo fácil. Acontece que como os jovens selecionados eram normalmente pessoas sem condições de auto suficiência, ele se aproveitava disso para conseguir seus favores, as vezes em troca do aluguel, de um empréstimo, ou mesmo de drogas. O ator para Ivan ja havia sido previamente escolhido. Agora dos demais, eu havia me encantado com Cláudio. Jovem do interior, que largou a família para seguir o sonho de ser ator na cidade. Lá não deu muito certo, acabou se envolvendo com drogas e indo parar no albergues de Ivan. A cena teste de Claudio seria também a cena que abriria a peça. Nela, estaria o cenário todo escuro, Claudio estaria no centro, apenas uma luz sobre ele. Ele estaria preparando uma seringa que injetaria no braço. Aplicaria, e depois de um tempo, cairia desacordado. Ivan surgiria do escuro, o chamaria, vendo não ser respondido, resolve então tirar as roupas do jovem e estuprar ele enquanto desacordado. As luzes iriam se apagando até ficar escuro. Só se ouviria Ivan gemer, enquanto penetrava Cláudio. Claudio entao sairia nas sombras e iria para o canto do teatro, onde uma luz se acenderia sobre ele e entao, nu, ele começaria a narrar sua trajetória de vida. Eu simplesmente amei o personagem. Era um jovem imaturo, mas cheio de sonhos. Tinha tudo em casa, em sua vida no interior, mas deslumbrado, acabou entrando por aquele caminho. Tinha vergonha de voltar para casa como derrotado. Ele escrevia cartas para os pais, dizendo estar vivendo uma vida ótima, enquanto se vendia para sobreviver. Ele reconhecia que tinha feito todas as escolhas erradas, mas não era um vitimista. Pelo contrário. Eu precisava daquele papel. Sentia que de alguma forma Cláudio havia sido escrito para mim
Carlos me deu todo o apoio e disse que estaria na primeira fileira quando a peça estreiasse. Os dias para o teste passaram lentamente. Como se cada um tivesse entre 48 e 72 horas ao invés de 24.
Mas o dia enfim chegou
Continua...