Dia quente da porra!
Sinto-me melado de suor e a fila do elevador cresce à minha frente. O hall é pequeno. Muita gente se acotovelando e a fila não anda. E aquela bunda enorme em minha frente. Muda o pé de apoio para à esquerda, a nádega da direita sobe, a da esquerda desce. Passa um instante e, impaciente, muda o pé de apoio para a direita. Invertem-se as nádegas. E o elevador não chega, e o ventilador não ventila. Muda o pé de apoio..., joga os cabelos para o lado. Estava indócil, a moça.
Chega o elevador. Saem os que desciam. Muda o pé de apoio. Dançam as nádegas. A fila anda!
Entra um, depois outro, mais outro... Entra ela. Eu atrás. Ela chega aos fundos do elevador e gira o corpo em um movimento entre elegante e impaciente. Os cabelos voam para o lado e, de repente, vejo-me frente à frente. Os olhos dela encontram os meus e me atravessam, rumo ao nada. Giro também. O destino havia me colocado com a bunda virada para a moça!
Nada a fazer. Há os dias dá caça, também.... Mas sentia a proximidade de sua presença, quase o seu hálito em meu pescoço.
Não que fosse tocá-la, tivessem as deusas da sorte nos destinado posições opostas, um em relação ao outro, ali naquele apertado e calorento elevador. Sinto-me perfeitamente civilizado e sei muito bem a diferença entre o desejo e o ato, entre a fantasia e a realidade, entre a proximidade e o toque. Mas, temos de convir que, sobrar entre aquela bunda e o meu desejo, distância menor que aquela entre o dedo de Deus e o de Adão, na cena da Criação de Michelangelo da capela Sistina, é como tomar um Viagra para a imaginação.
O elevador enche! Sou empurrado para trás. Piso com o calcanhar sobre o pé da moça. Semi-volto-me e desculpo-me. Seus olhos me fuzilam. Entrou um sujeito gordo em minha frente. Fazer o que? O espaço não é elástico. O cara vale por dois. Expremo-me como posso, entre a bunda do gordo e a dona da bunda. Barriga para trás, bunda para frente. O elevador arranca para cima, o intestino não acompanha. A inércia é um dado da realidade! O corpo inclina-se para trás forçado pela bunda do gordo que avança em minha direção. Sinto-me encostando no colo da moça às costas.
O elevador para. Os corpos continuam a subir. Alivia-se a pressão na sola dos pés e sinto os seios da moça tocando em minhas costas. O gordo se ajeita. Sou forçado a recuar e os seios pressionam-me as costas. São pequenos. Logo me tocam também a barriga e o colo. Ela não recua. Sai um e entram dois e a lotação excede. O elevador arranca para cima. Os corpos são pressionados para baixo e uns contra os outros, por esse momentâneo excesso de gravidade.
Seu corpo segue colado ao meu. Sinto seus seios apoiados em minhas costas, logo abaixo das omoplatas. Seu queixo está a um milímetro da base de meu pescoço e sinto o calor de sua respiração em minha nuca. O movimento de respirar com a barriga colada em minhas costas acompanha o ritmo: encosta, desencosta, encosta... E, ironia máxima do destino, em um movimento, sinto seu colo encaixar em minha bunda. Afasta-se rápido. Afasto-me rápido. Encaixo na bunda do gordo. Assustado recuo. Ela lá, encaixo-me em seu colo. Antes a bunda nela do que a bunda do gordo em mim.
Sinto solidariedade no encaixe de seu colo. Não faz movimento algum de recuo ou recusa. Apenas permanece ali, acolhendo-me a bunda. O ritmo de sua respiração em minha nuca permanece inalterado. Fico imóvel. Quase não respiro. O elevador para repentinamente. Apagam-se as luzes. Ouvem-se suspiros e exclamações entre todos. Alguém pede calma e diz que curtos apagões têm ocorrido muito no bairro. Logo tudo vai voltar ao normal. Alguns suspiram, outros reclamam: -- Com esse calor! Todos ajeitam-se. O gordo está inquieto e sinto que a moça muda o pé de apoio. Lembro-me das nádegas subindo e descendo. Mas agora estou do outro lado. Mudo também o peso de meu corpo para a outra perna... Sinto que mudou o encaixe. Seu colo desceu um pouco. Acho que ela se encostou na parede aos fundos. Sinto seu colo pressionando mais de baixo para cima. Pisca a luz. O elevador parece mexer-se, mas é por um segundo. Para tudo outra vez...
O escuro, o calor, a proximidade, o toque, a respiração em minha nuca... Tudo parece adquirir uma intensidade mais forte. Sinto a humidade de seu hálito mais próxima, parece acelerar-se suavemente. Sua barriga parece encolher-se e, em um muito leve e discreto movimento de ondulação, sinto-a pressionar minha bunda com seu púbis, o seu ponto de vênus. Fico inquieto! Ajeito-me. Tento afastar-me, mas ela acompanha. Nem parece acontecer. Nem sei se acontece, mas ela está ali, em mim, exatamente como seria a dádiva máxima dos deuses estivesse eu nela.
Tudo escuro. O calor aumenta. O suor escorre. Um calafrio sobe-me a espinha. Sinto seu suor gotejar sobre meu pescoço, meu ombro... ouço a respiração mais forte, dela e minha. O ritmo cardíaco se acelera. Sinto-a pulsar em mim. Um arrepio me atravessa. Sinto sua mão pela primeira vez. Toca-me suavemente a cintura. Parece acidental, mas toca-me e, junto com o toque da mão, sinto seu púbis mover-se, um pouco para o lado, como se buscasse o vazio entre minhas nádegas. Fico imóvel, mas arrepio-me novamente. Os músculos da nuca se retesam como em um susto. Ela percebe.
Percebo que ela percebeu meu arrepio e que ela está percebendo minha percepção de sua percepção. Já sabemos, os dois, sem mais muitas dúvidas, que estamos ambos ligados no acontecimento desse toque, dessa proximidade, desse calor, dessa mistura de suores. Estou tenso. Não sei o que fazer. Tento relaxar, pensar, parar de pensar, sentir, aceitar, recusar, disfarçar, ter vergonha, não ter vergonha... Fico suspenso, entre o ser e o existir! Entro o que sou e o que sinto!
Sua mão direita toca meu quadril. Muito levemente, conduz minha cintura em um leve e pequeno giro. Como se estivesse me ajeitando. Deixo-me conduzir. Sinto seu púbis primeiro descer levemente, depois escorregar sob minha nádega esquerda, em direção ao centro e, ao chegar entre as pernas, subir suavemente por entre as nádegas. Em um movimento reflexo, impensado, empino a bunda e ergo-a levemente, como se, subitamente, tivesse sido acometido por uma lordose.
Ela sente meu movimento e, com ele, sente-se autorizada. Sua mão aperta minha cintura, puxando-me para trás e para baixo, enquanto pressiona seu púbis para frente e para cima. Sinto-me virtualmente penetrado, estocado, perfurado. Mas é tudo tão, tão leve e discreto. Tão é e não é. Tão poderia ser como não ser, que nem sei se é ou se estou inventando em algum delírio, provocado pelo calor, pelo cansaço, pelo aperto....
E estamos ali, quietos, imóveis. A mão dela em minha cintura, seu púbis entre minhas nádegas. Ninguém se mexe. Tudo fica em suspenso, no escuro. Sinto o suor escorrer, sinto a humidade de seu corpo empapado e colado no meu. Acima de tudo, sua respiração em minha nuca, o ritmo se acelerando, uma brisa quente que sopra, agora um pouco ao lado de meu pescoço, alcançado a base de minha orelha. Quase um sussurro, que fala sem palavras e geme sem vogais.
O gordo à minha frente se inquieta. Outros passageiros tentam puxar alguma conversa. Ascende uma luz de emergência, muito fraca. Sua mão solta minha cintura e sinto seu colo se afastar levemente. Sinto um suspiro, quase de alívio. Respiro também. Uma senhora tenta se abanar ao lado. Todos se mexem, o gordo também. Recuo um centímetro e ela está lá. Sinto-a novamente. Ela se ajeita. Muda o pé de apoio, sinto seu quadril mexendo-se durante o movimento. Instintivamente, movo-me junto. Percebo que ela pendura no ombro uma bolsa que levava com a outra mão. Quando desce a mão, esta percorre-me a lateral do corpo, para por um momento à altura de minha cintura, como que indecisa, mas logo desce mais, até a altura de minha nádega. Primeiro com o dorso voltada para mim e a palma para fora.
Sinto sua respiração acelerar-se novamente. A luz de emergência é fraca e o gordo deixa-nos na sombra. Sinto o dorso de sua mão escorregar sobre minha nádega, como o pêndulo de um sino, como que acompanhando o balanço do braço. Movo-me discretamente para o lado e sinto virar-se a mão, que fica agora com a palma voltada para mim, quase a apalpar-me. Sinto descer a outra mão que estava na altura da cintura. Agora tenho ambas as mãos, cada uma roçando-me discretamente uma nádega. Tocam-nas por baixo e, novamente, instintivamente ergo-as, empinando a bunda e, como fogo queimando, sinto suas duas mão apertarem-me, discretamente e suavemente, mas, ainda assim, tão firmemente que não poderia haver mais dúvidas.
Quando eu empino a bunda, as mãos apertam e... o sopro da respiração repentinamente transforma-se em uma palavra. Uma única palavra, soprada quase dentro de meu ouvido: “assim”! Mais um sopro no ouvido e sinto suas mãos afastando suavemente minhas nádegas e mais duas palavras: “empina mais”! “Vem”!
Fiquei hipnotizado. Era uma voz um pouco rouca, um pouco grave, um sussurro de vento que penetrou fundo minha alma e, num arrepio, obedeci. Cedi e relaxadamente pressionei minha bunda para trás, contra suas duas mãos. Senti sua perna direita rodar enquanto seu joelho avançava lentamente para a esquerda, alojando-se entre os meus. Ela estava um pouco de lado, agora. Suas duas pernas quase abraçavam minha perna esquerda e sua direita ficava entre as minhas. Enquanto fazia esse movimento, sua mão esquerda voltou a subir para minha cintura. Mas a direita se deslocou exatamente para entre minhas nádegas, com dois ou três dedos subindo por entre elas até chegar à base de meu escroto e o espaço entre ele e o anus. Parou os dedos ali num suave toque, enquanto o polegar em um movimento de pinça, descia.
Mais uma vez, e junto com o movimento dos dedos, sua boca aproxima-se de meu ouvido e ouço, num sussurro, ela dizer: “relaxa, abre, empina e abre”... Não consigo resistir. Cedo e sinto seus dedos subirem até o meu anus. Ela os pressiona de baixo para cima com firmeza. Não sei o que fazer. Ela move circularmente os dedos e quase empurra o tecido de minha calça para dentro de mim. Reajo, apertando tudo, fechando o caminho. Mas ela continua ali, as mãos em mim, a perna entre minhas pernas, o dedo circulando o anel de meu anus, o suor escorrendo, a respiração agora quase dentro de meu ouvido, a me dizer: “vem, não resiste, abre...”
Ascende a luz. O elevador se move. Todos se ajeitam, o gordo suspira e ela se afasta de mim. Passaram-se poucos minutos e muitas vidas. E eu só vi seu rosto e olhos por um segundo, quando nos confrontamos na entrada do elevador.
O elevador para. Estou morrendo de vergonha. Não sei o que fazer. Descem duas pessoas Ela continua atrás de mim, mas agora distante. O elevador para novamente, e novamente, e novamente, e eu nem recordo mais para qual andar ia. Para mais uma vez. Agora, só restamos ela e eu. Ela já está ao meu lado. Não nos olhamos. Para novamente. Ela vira apenas o rosto, olha-me fixamente por um segundo. Sorri brevemente, levanta a mão, pega-me o braço e diz: “vem”!