Escrevi essa história há muitas anos. Apesar de prometer terminá-la, acabei não publicando o final por não estar satisfeito com a qualidade so texto e me esqueci. Agora, em meio à quarentena reencontrei essa história perdidas em meus arquivos e decidi retomá-la em nome das promessas que fiz aos leitores daquela época. Decidi reescrever pequenos trechos e editar os (muitos) erros gramaticais que encontrei, embora deva ter deixado passar um ou outro. Muito do que escrevi já não faz parte do que penso, mas decidi manter a história o mais original possível em razão de tê-la escrito assim naquela época. Fica o convite para quem quiser conhecer. Postarei alguns capítulos diariamente porque ainda não editei os últimos. A maior parte já está publicada, mas peço que leiam apenas o que foi reescrito porque mudei alguns trechos com relação ao texto original e isso pode interferir na história.
Abraço e boa leitura!O Diário
Capítulo 1- Sob O Azul Do Céu
"Estou aqui olhando este meu pequeno caderno de couro negro, bem costurado, com um pequenino cadeado prateado na ponta, atado em pequenas argolas de metal presas, uma na frente e outra na contracapa (o que o torna bem inútil, já que minhas anotações ficam expostas). Nunca abri tal cadeado. As folhas desse diário já estão amareladas pelo tempo, acho que já faz uns oito anos desde o dia em que o encontrei no parapeito da minha janela com um bilhete branco escrito em letras vermelhas 'Vai ser Eterno'. O quanto já escrevi aqui! minhas tristezas e alegrias, meus fracassos e minhas conquistas, nas primeiras páginas era um garoto franzino de uns dezesseis anos, que tinha medo de lutar contra o mundo e era humilhado por tudo e por todos. Agora, sou um médico recém-formado e com uma carreira promissora, determinado a dar a volta por cima e ser um vencedor, mas nesse exato momento, contudo, meu coração está acelerado, meu corpo sem forças, não consigo pensar em uma saída para a situação em que me encontro. Se ao menos eu não aceitasse! mas está feito, meu destino está selado. Só quero fugir! Faz frio aqui!
A noite segue sombria, mesmo sob o luar, sinto a brisa do oceano vindo em minha direção, o som das ondas... ah, como queria... me lançar ao mar! Talvez, lá no fundo, não fosse necessário pensar, falar, apenas dormir... sob a água salgada... mas isso vai contra o impulso que tenho pela vida, o que eu realmente necessito é por a minha cabeça no lugar.
—Taxi — preciso sair daqui.
— Ao aeroporto, por favor.
Ainda bem que reservei essa passagem para fora do país, talvez longe daqui minha cabeça volte ao normal. Talvez no chalé, na Toscana, minha mente funcione de novo. Como sou idiota! Quebrei um juramento feito a mim mesmo, eu não tinha esse direito, que estúpido que sou!
Como demora... Enfim o aeroporto... Meu celular toca, é ele. Já deve ser a vigésima ligação, mas não irei atender. Meu coração presta apenas para bombear sangue mesmo, a razão deve prevalecer.
¬¬¬
— Obrigado moço, pode ficar com o troco.
...
Tudo pronto pra viajar. Essa poltrona do avião realmente não me agrada...
Finalmente decolamos. É hora de voar pra longe do que me mata...”
Para entender a história desse que acima escreve é preciso viajar no tempo e espaço, e voltar ao passado e a um local isolado no interior do Brasil:
Naquela pacata cidade interiorana, vivia Leonardo (Léo), filho de uma professora com um agrônomo muito conhecidos na cidade, tinha mais uma irmã. Desde criança, o garoto adorava praticar esportes de todos os tipos, principalmente artes marciais, futebol e natação. Desde muito novo cultivava uma grande amizade com Felipe e ambos cresceram e aprenderam muitas coisas juntos. Com o início da puberdade, vieram os namoricos e Léo, um garoto moreno claro de cabelos escuros e olhos verdes, além de corpo atlético, era um dos garotos mais cobiçados pelas meninas. Ele se aproveitava dessa situação ficando com todas que apareciam a ele.
Felipe era filho de um importante comerciante divorciado e vivia com o pai, sua mãe trabalhava como contadora em uma empresa de contabilidade. Felipe cresceu muito amado pelos pais e se tornou uma pessoa muito honesta e humilde. Gostava de música, de ler e desde cedo estudou idiomas e música instrumental. Adorava andar de bicicleta, mas nunca foi fã de outros esportes, apesar de frequentar a escolinha de vôlei. Com a chegada da puberdade, Felipe, mais intelectual do que o amigo Léo, começou a namorar, mas fazia questão de não se envolver em relacionamentos sérios. Considerava Léo como o irmão que não tinha e compartilhava seus medos e alegrias com ele.
Alguns anos depois, Léo e Felipe estavam cursando o último ano do ensino médio. Léo tinha agora 16 anos e Felipe 15 (começara a estudar um anos antes). Devido aos esportes o mais velho possuía um corpo de dar inveja a qualquer rapaz da cidade: moreno claro, cabelo preto estilo militar, um sorriso lindo e claro, os belos olhos esverdeados. Os seus 66 kg distribuídos em 1,80 metros de altura chamavam a atenção de todos, onde quer que ele andasse. Já o mais novo era loiro, com cabelos lisos e mais longos, olhos castanhos claros, lábios rosados e carnudos, pele branca dourada, pesava 63 kg e era um pouco mais baixo que o amigo com cerca de 1,75 metros de altura. Tinha um corpo legal, mas nada comparado ao de Léo.
Nesse ponto, no auge da adolescência, Leonardo adorava passear com o carro do pai e se interessou bastante por cavalos, obrigando o pai a comprar um para ele. Léo adorava festas e, ao contrário de seus doze anos, agora namorava sério havia um ano. Quando anoitecia, pegava o carro do pai e ia para o centro da cidade “ver a galera”, era um dos garotos mais populares de lá. Felipe era o “nerd” da escola. Usava óculos de grau e adorava passear de bicicleta nos fins de tarde em uma estrada de chão, pouco movimentada, que ia de seu bairro a uma pequena reserva florestal do município em que viviam. Costumava ajudar o pai na sua loja e estudava bastante, pois sonhava em ser médico. Por isso abdicou de relacionamentos sérios e em algumas festas que ia, ficava com alguma garota, nada muito compromissado. Seu pai tinha problemas com a pressão arterial e Felipe desde muito cedo assumiu uma responsabilidade rara para pessoas de sua idade. Apesar de diferentes interesses, Felipe e Leonardo possuíam uma afinidade cada vez maior e ambos aconselhavam um ao outro. Certo dia na escola, Leonardo ao sentir dificuldade com uns cálculos de física pediu ajuda a Felipe:
— Lipe, não consigo entender nada disso aqui, cara.
— Também, você passa mais tempo vendo TV do que estudando... — Respondeu o amigo.
— É sério, mano! Preciso que você me ajude com esses exercícios, se não vou me ferrar na prova— e completou — Por favor?
—Ok, hoje à tarde na sua casa e sem cara feia!— Felipe falou.
— Mas logo hoje que tem uma pelada com os caras lá na pracinha? Além de que depois tenho que ir ver a Manu (a namorada dele) — Léo falou em tom de desgosto.
—SEM OBJEÇÕES, além do mais o futebol pode ficar para outro dia... Você pode se encontrar com a Manuela depois...
—Mas, Lipe...
—Poxa, Leonardo, o que custa um dia sem futebol? Hein? — sorriu — Na sua casa às 14 horas.
—OK!! — Respondeu Leonardo indignado — Te vejo à tarde então...
E assim foi feito. Terminando a aula Felipe foi para casa, almoçou, tomou banho, pegou o material e foi para a casa do amigo. Chegando lá, encontra o amigo apenas de samba-canção devido ao enorme calor que fazia na cidade. Aquela cena não era incomum, pois devido à grande intimidade de ambos os amigos eles já haviam se visto nus, mas naquela tarde algo diferente aconteceu com Felipe. Ele sentiu-se atraído pelo amigo e sentiu nojo de si mesmo naquele momento, pois possuía preconceito contra gays. Além de que também via Leonardo como um irmão. Despertou daquele pequeno transe dos pensamentos com Léo o chamando:
— Fê, tá tudo bem?
— Está sim! É o calor... Vai pegando seu material que eu vou beber um pouco d’água e já subo — Respondeu Felipe, rapidamente (ele era ótimo em fugir de situações embaraçosas).
Devido aos vários anos de amizade, cada um transitava livremente na casa do outro. Felipe foi para a cozinha, bebeu sua água e subiu para o quarto do amigo, onde iriam estudar. Ele ainda estava pensando no que lhe acontecera momentos antes. Logo, começaram a estudar e, ao notar a inquietação do amigo, Leonardo indagou se o amigo tinha algum problema. Mesmo que Felipe tentasse, o mais velho conhecia Felipe demais para que ele pudesse enganá-lo.
— Seu Felipe Dias, você realmente está me escondendo algo! Eu te conheço! Vai, desembucha!
— Nossa, Leonardo, não é nada! É só o calor, já te disse! — Esbraveja o amigo
— Eu te conheço, Lipe, e você não precisa esconder nada de mim, tá? Mas não vou continuar insistindo... Depois vai sobrar pra mim, sabemos que você tem problemas em controlar sua raiva. Kkkkkkkkkkkkkk
— kkkkkkkk Ok Léo, melhor mesmo.
E assim continuaram a estudar até o fim da tarde. Felipe, sempre paciente ao ensinar Leonardo, conseguiu com que o amigo entendesse o assunto e Leonardo agradeceu-o e lhe ofereceu uma carona até sua casa. Felipe recusou, pois ele estava de bicicleta. Os dois desceram para cozinha, lancharam e Felipe foi embora pensando no que havia acontecido naquela tarde. À noite, ele não conseguia dormir preocupado com a estranha sensação que teve horas antes. “Droga, porque eu fiquei daquele jeito hoje? Meu Deus! senti vontade de beijar o Léo, meu melhor amigo! Que porcaria de pessoa eu sou! Querendo beijar outro homem... E ainda por cima o Léo, cara! Não acredito nisso! Eu devo estar muito carente mesmo, bem que ele fala!” o garoto continuou inquieto, até que o sono falou mais alto e ele adormeceu.
Sonhou que estava andando a cavalo com Léo e que ele sorria amorosamente. Era um dia ensolarado, com nuvens bem brancas no céu e com uma brisa bem intensa, a preferida de Felipe. Ambos pararam seus cavalos e desmontaram... Léo vinha em direção a ele, parecia que ia beijá-lo!
—
Felipe acorda!
— B-bom dia, pai — disse meio zonzo, ainda assustado com o sonho.
— Bom dia, filho! É melhor se apressar, você já está atrasado.
— O senhor já tomou seu remédio? Sexta-feira passada você se esqueceu!
— Oh, Senhor! Quarenta anos apenas e já sou tratado como um idoso esquecido! Sim, meu filho. Já tomei meu remédio hoje!- Respondeu o pai.
— Ótimo! Vozão... kkkkk
— Ah, moleque... kkkkkk
Felipe tomou seu café da manhã e foi para escola, sem saber como encarar Leonardo e não demonstrar suas preocupações. Chegando lá, ele tem uma surpresa... Leonardo estava totalmente abatido e com os olhos avermelhados.
— Léo! O que houve?
— QUE PORRA! NÃO TE INTERRESSA, FELIPE! SAI DAQUI! — Gritou o amigo
Felipe encarou o amigo sem saber como reagir. Em toda sua vida, Leonardo nunca havia gritado com ele daquela maneira. A única reação de Felipe foi correr, ele estava muito assustado com o que ocorrera, aquele grito o machucou bastante e ele foi para o único lugar do colégio que o acalmava, o jardim.
Leonardo nunca agira daquela forma com Felipe e nunca vira o amigo reagir daquela maneira em situações como aquela. Ele estava profundamente arrependido e precisava se desculpar o quanto antes. Por sorte ele conhecia o amigo, sabia que o encontraria no jardim. Chegando lá, encontrou o amigo sentado em um banco e ainda por cima, ele estava chorando! Foi então que Leonardo percebeu o quanto foi grosso com o amigo. Nunca tinha visto Felipe chorar, desde quando os dois eram crianças.
— Lipe, perdão, foi sem querer... Apenas saiu, sei lá... Você sabe como eu sou impulsivo, me desculpa vai!
— Agora sai daqui você, Leonardo Ferreira! Eu não te desculpo, seu louco ignorante!- Disse Felipe imediatamente.
— Por favor, Lipe, eu não posso passar por isso duas vezes no mesmo dia! Me perdoa, eu não quis te magoar! — Disse Leonardo e desabou desolado no mesmo banco...
— Poxa, Léo, precisava dessa ignorância toda? Eu só estava preocupado contigo! Nunca te vi naquele estado! Não precisava de tudo isso, cara! Agora fala o que aconteceu...
— A Manu me traiu e terminei com ela, eu não sei o que fazer... Eu, eu AMO ELA.
— Poxa, Leonardo, por que você não me disse logo? Essa confusão não era necessária, vem cá —
Dizendo isso Felipe puxou Léo e o abraçou ternamente.
— Calma, eu tô aqui. Eu te perdoo.
— Lipe, obrigado mesmo, cara, eu tô tão triste...
— Eu vou te ajudar, eu prometo! Agora vamos pra sala que a aula já deve ter começado.
— Lipe...
— Diga
— Eu te amo, cara.
— E-eu... Eu tam-b-bém... Eu te amo. Agora chega de tristeza, vamos estudar!
— Bela maneira de me alegrar...
— Como?
— Esquece...
E assim a aula passou. Alguns alunos comentaram a discussão dos amigos, mas logo o incidente foi esquecido. Ao fim da aula Léo chamou Felipe.
— Fê! Posso andar de bike contigo hoje?
— Claro! Passa lá na loja umas 16 horas e nós vamos. Ok?
— Ótimo — Léo o abraçou — Não vou me atrasar :)
Felipe foi para casa muito confuso com tudo o que havia acontecido, pensou muito em seus sentimentos e decidiu que não forçaria a barra. Decidiu que não se proibiria de nada, seu coração falava mais alto de que sua consciência. Leonardo sentiu uma alegria estranha naquele dia, sentia-se um bobo ao lembrar-se do abraço do amigo ”como é bom ter amigos de verdade, principalmente sendo o Fê”, pensava ele.
Chegando às 16 horas Leonardo já aguardava pelo amigo na frente da loja, então viu Felipe vir em sua direção todo desengonçado com a bicicleta na mão.
— Você tá parecendo um pato, andando desse jeito, kkkkkk — Zombou Leonardo.
— Olha quem fala, só porque é o gatinho da escola... kkkkk
—Vamos, pato
—Humpf...Vamos.
Ambos riram, montaram em suas bicicletas e foram passear pela estrada de chão. O passeio foi muito agradável para os dois e naquele momento todas suas inquietações foram esquecidas. Após um longo percurso, decidiram parar para descansar sob a sombra de uma quaresma florida com pequenas flores púrpuras.
— A gente podia ir à reserva qualquer dia desses, Lipe — Sugeriu Léo.
— Pode ser... Só me avisa três dias antes, pra eu reservar energia.
Os dois riram e, ao olhar o lindo sorriso do amigo, naquele instante, sob o azul do céu, Felipe percebeu que havia se apaixonado por Leonardo.
Continua...