Pegamos a estrada por volta das 9h da manhã. Enquanto eu dirigia, dessa vez, Nicolas e eu conversávamos e fazíamos uma análise do que tinha acontecido há alguns dias no galpão, como aqueles homens escondiam algo, que aparentemente não conseguimos descobrir nada satisfatório. Talvez Nicolas pudesse ter ouvido alguma coisa, foi quando então perguntei.
- Nic, vem cá. Você que tava lá dentro não ouviu nada? Nenhuma conversa suspeita daqueles caras, não? - esperei a resposta.
- Então, na verdade não escutei muita coisa. - disse simplista. - Logo quando me pegaram na floresta eles me desacordaram. Tudo que escutei foram algumas instruções para vigiarem o portão. - disse fazendo força pra tentar lembrar de mais alguma coisa.
- Daí logo depois eu cheguei com o Branco, provavelmente. - completei. - Bom se eles montaram vigia, sabiam que eu iria atrás de você. - disse.
- Espera, acho que lembrei de algo. Eles estavam falando de uma mulher, que ela precisava ser levada pra outro lugar, um negócio desses. – falou ele meio incerto.
- Você ouviu um nome ou alguma coisa sobre ela, além disso? - de repente me vi interrogando Nic como se ele fosse uma testemunha de um crime. Cuidei pra não continuar nesse tom.
- Na verdade não. - ele disse meio frustrado. - De qualquer forma já passou e nossa viagem pelo menos valeu a pena. - concluiu.
- De fato valeu mesmo. - acrescentei.
Passaram se algumas horas e chegamos a nossa querida cidade, estar em casa é bom. Parei na minha casa, me despedi de Nicolas que seguiu com o carro, enquanto o acompanhei com o olhar até virar a esquina, Vanessa saiu porta a fora animada puxando minha mala e tagarelando perguntas sobre a viagem, como se eu tivesse alternativa de não contar para ela.
- VAMOS QUE EU QUERO SABER DE TUDO. - falou alto pra mim.
- Vai ter primeiro que me fazer um agrado, e aí depois eu falo tudo. - falei com cara fome.
Entramos e cumprimentei meus pais que estavam na sala, e Alex que estava na cozinha pra onde eu estava indo. Eram 13h e todos já tinham comido, e como não paramos na estrada pra comer, estava realmente com fome. Enquanto preparava algo pra comer eu ia falando para Nessa, que ia acompanhando com cara de interesse, tudo que tinha acontecido, inclusive a situação do galpão.
- Nossa que estranho essa situação da floresta. - disse com ar de desconfiança. - Ainda mais que reconheceram ele como um caçador... - disse por fim, me lembrando dessa parte importante.
- VANESSA! - falei alto assustando-a. - Eles reconheceram ele sim, mas não como um caçador de lobisomens, pelo menos não lá... quer dizer, eles falaram “Nicolas Bragança” e algo sobre valer um bom dinheiro. - terminei.
- Assim, valer um bom dinheiro pode significar diversas coisas, mas ainda acho que talvez possam ter reconhecido ele como caçador sim. - falou.
Enquanto eu terminava de comer conversamos sobre essa possibilidade daqueles homens saberem que a família Bragança caçava lobisomens, pois reconhecer o Nicolas indicava algo oculto. Mas também não podia deixar de levar em conta que o Nic morou anos naquela cidade e que bem ou mal, a família dele tem recursos, então isso levava a uma dualidade de possibilidades.
Logo após desfazer a mala, tomar um banho, e arrumar minhas roupas que estavam jogadas na cama, pois só fiz mesmo tirar todas elas das malas, recebi uma mensagem do Nic avisando que estava tudo bem, que a vovó mandou lembranças, mesmo a gente tendo chegando há algumas horas, e que talvez a gente pudesse se encontrar no final de semana próximo.
Pensando sobre o encontro, acho que poderíamos nos ver sim, o problema é que agora tínhamos duas famílias rivais na cola uma da outra, e que talvez poderia ser um empecilho pra nossa amizade, bem... preferi rotular amizade mesmo. De repente sou surpreendido por meu telefone tocando freneticamente as mil mensagens que Lola e André disparavam no whatsapp.
- INHAIR! - falei através da vídeo chamada para os dois. - Como vocês estão? Aproveitaram muito essa semana sem mim? Já podem falar que estavam com saudades, porque eu sou maravilhoso. - falei gargalhando.
- AH NÃO, VOCÊ NÃO. - exclamaram ao mesmo tempo.
- Como é que é?! - falei em tom de ameaça.
- Brincadeirinha, Eric. A gente tava com saudades sim. - disse André.
- Eu já acho que você poderia ter ficado mais tempo lá. - gargalhou Lola. - Na verdade não, a gente tava sentindo sua falta menine! - falou por fim. - Inclusive a gente tem uma bomba pra te contar.
- Pois eu já quero vocês aqui em casa pra ontem. Dou 30min pra chegarem aqui. Tchau. - falei e desliguei antes que eles dissessem alguma coisa, ou inventassem uma desculpa pra não vir pra minha casa.
Passados 15min surpreendentemente vejo entrando pela porta do meu quarto Lola e André. Ambos com caras de aflição pra me contar o que quer que fosse, enquanto faziam expressões de ultraje por conta da minha cara de espanto em vê-los chegando praticamente na metade do tempo que havia estipulado. Eles estavam espionando minha casa? Esperando eu chegar?
- Vem aqui, como vocês chegaram tão rápido? Não esperava menos. - disse me empertigando na cama.
- Tem um aplicativo mágico que se chama UBER, recomendo. - disse Lola. - Ué, só respondi sua pergunta. - falou enquanto eu tacava a almofada.
- Tá, mas a gente veio aqui pra te contar uma coisa que descobrimos quando estava fora. - falou André já se jogando na cama. - Prepara.
- Bom, vou começar então. - Lola se ajeitou para começar o relato. - Desde o dia que você saiu, André e eu decidimos procurar mais coisas relacionadas a Roboalda, até que ligamos pra você e contamos do tal do tio do Nicolas, o Rodolfo. - falou ela.
- Isso, aí decidimos procurar pelo nome Rodolfo Bragança, porque já não achávamos mais nada relacionado a Roboalda. - completou André.
- Com isso a gente descobriu umas coisas. Penamos um pouco pra tentar entender e unir tudo, mas conseguimos. - disse Lola com cara de cansada. – Tudo começa com o marido da Roboalda e sua morte, pelo que descobrimos ele era policial investigativo federal, e estava cuidando do caso de uma menina que desapareceu naquela cidade, naquele tempo. - falou Lola.
- E então após o caso estar caminhando pra conclusão, ele foi morto. - falou André. - Nos autos que a gente viu, ele tinha morrido por conta de um corte bem perto da clavícula, o que contradiz com a versão do acidente de carro, lembra? - perguntou André. - Porém, digamos que o trabalho foi “terminado”, porque apesar do acidente do carro, ele poderia ter saído vivo. - concluiu André.
- Exatamente! - concordou Lola. - Isso leva a gente a inferir que quem matou ele queria, na verdade, executá-lo por conta da investigação dessa garota misteriosa. Claro que isso eu tô falando que foi mais por intuição mesmo. - completou Lola.
- Sim, eu entendi toda essa história, mas ainda assim, não tá encaixando a parte em que o tio do Nicolas é envolvido nessa história toda, e como ele foi parar na cadeia por um crime que, aparentemente, ele não cometeu. Entende? - falei pra ambos com expressão de confusão.
- A gente compreende, na verdade, porque mesmo que a gente tenha fuçado em diversos lugares, essa parte ainda não descobrimos. - falou André.
- Então, pensa comigo. - chamei ambos. - Se quem quer que tenha matado o marido da Roboalda... inclusive alguém descobriu o nome dele? - perguntei curioso.
- Ah sim, ele se chama Getúlio Marques da Costa. - disse Lola.
- Okay, mas quem quer que tenha matado o Getúlio, fez isso porque sabia que ele tava investigando essa garota desaparecida. Faz sentido? – perguntei.
- Olha, a gente tinha pensado nessa possibilidade sim, porque se ele investigou por tanto tempo essa menina desaparecida, e pelos documentos tava quase finalizando o caso e chegando no paradeiro dela. - disse André respirando fundo. - O assassino queria por um fim na investigação. Fora que, como a Roboalda estava meio fora de si no dia da morte, não levaram em conta o depoimento dela. - concluiu André.
- Vocês tem o depoimento dela? Chegaram a ler algo, lembram de algo? - perguntei para ambos, e aguardei.
- Sim, sim, a gente lembra de alguma coisa. - falou Lola. - Olha, ela disse que eles estavam chegando na cidade, e aí um animal pulou na frente do carro, ela disse que parecia ser uma onça, disse que era uma animal bem grande, e como estava escuro, pois era noite, ela não conseguiu ver muito bem. - disse Lola pensativa. - Por fim, ela relatou que com o impacto, os airbags inflaram, mas que alguém chegou do lado do banco do motorista, e logo em seguida ela ouviu ar vazando, nisso desmaiou. - concluiu Lola.
- Bom, então é isso, finalizaram a execução mesmo. - disse por fim.
- Gente, me ocorreu uma coisa aqui. A gente não viu a profissão do tio do Nicolas, né? - perguntou André já puxando o telefone e pesquisando o que ele fazia da vida. - GENTE! ELE ERA POLICIAL INVESTIGATIVO. - falou eufórico.
- MEU DEUS! - exclamamos ambos, Lola e eu.
- Bom, agora fica bem óbvio né. Já que ele era detetive também, o caso do desaparecimento provavelmente passaria pras mãos dele, e aí ele poderia concluir o trabalho que o Getúlio estava fazendo. - disse André.
- Sim, agora tudo faz sentido. - falei quando parei de repente notando a diferença das datas dos ocorridos. - Ih gente, não é possível, porque as datas não batem, olha isso aqui. - mostrei a diferença basicamente de quase 20 anos.
- AFF! Quando achamos que poderíamos estar perto, novamente voltamos umas casas atrás, não é possível. - disse Lola desacreditada.
- É a vida galera, a única coisa que podemos fazer é continuar pesquisando e investigando pra saber onde toda essa história vai chegar. Não tem jeito. - falou André.
- Pelo menos a gente já tem noção do que procurar, porque vamos combinar que antes a gente não sabia nem aonde começar. - falei tentando animar o pessoal. - Pensem que por um lado a nossa investigação talvez esteja tomando um rumo que leve a alguma coisa. - falei.
- Concordo com você. - disse André.
Com aquela conversa e todos os pontos expostos a gente decidiu descer pra comer alguma coisa, enquanto falávamos de coisas aleatórias da vida, e eu contando como foi a viagem, o ocorrido do galpão, como o Branco tinha aparecido misteriosamente, e por hora eu decidi não contar ainda sobre como ele podia fazer magia, não que fosse algo estranho, mas se ele tivesse se matriculado em Hogwarts eu ficaria muito chateado, pois era meu sonho.
Ao final daquele dia me preparando para dormir, lembrei de dar uma olhada nos e-mails da faculdade, checar minha caixa de entrada pra ver se tinha algo interessante, mas não havia nada demais. Olhando as redes sociais, vi as fotos do pessoal que também resolveram viajar para lugares diversos, e até mesmo David e Adriano que foram para o litoral.
Deitado já, resolvi escrever uma lista de coisas a que procurar quando tivesse tempo hábil para tal. Comecei pelo tio do Nicolas, e onde ele morava seria uma boa pista do começo da investigação, onde ele poderia ter passado, ou morado depois que se formou como detetive, não poderia esquecer que na verdade ele estava vivo, e morava num dos bairros próximos à minha casa.
Talvez tentar também descobrir se isso tinha alguma relação com aquele pessoal da floresta, minha forte intuição me dizia que poderiam ter ligação. Mas todos aqueles pontos teriam explicação em algum momento, ou pelo menos eu esperava que tivesse. Terminando a lista, voltei para o lado, desliguei tudo, e fui dormir ainda pensativo sobre tudo isso que descobrimos.