Um Conto de Natal
(Um lugar distante)
Olá, eu me chamo Fortunato. Como alguns aqui já sabem, este é um nome fictício. Durante estes dias que se aproximam do Natal eu me peguei lembrando do natal de alguns anos atrás, que tive com meu primo e gostaria de compartilhar com vocês.
A carne é fraca! Sim, esta é uma afirmação; sobretudo quando esta carne pertence a um adolescente cujos desejos são reprimidos pela sociedade e pela própria família. Alguém que reprime seus desejos é incontrolável, quase como um vulcão prestes a entrar em erupção. Em contrapartida, alguém que usufrui dos seus desejos, colocando em prática suas mais profundas ambições carnais, se torna extremamente calmo e compassado, alguém que vê todas as coisas em câmera lenta e é capaz de agir antes e melhor do que qualquer um e fazer o que for preciso para saciar suas vontades.
Antes que eu comece a relatar os acontecidos, quero que você amigo leitor, tenha em mente os dois tipos de personalidades representadas nesta narrativa. O primeiro tipo, meu primo Vinicius, um pouco tímido, sempre zoado pelos tios por nunca ter tido uma namoradinha. Claramente um garoto gay não assumido que fazia de tudo para entrar no universo masculino (Ao qual não pertencia). Se forçava a assistir e a saber tudo sobre futebol apenas para ter o que comentar com os tios e não parecer tão “suspeito”. Estava no auge dos seus desejos, mas continuava a se reprimir.
Do outro lado, eu, criado solto e com toda a liberdade que se é possível dar para alguém. Eu que experimentei desde cedo quase todos os prazeres que a vida tinha a oferecer, sexualmente falando. Eu que cresci sem escrúpulo algum, sempre manipulando as pessoas em volta para ter o que queria. Eu que sabia quando sorrir e quando chorar. Eu, um alguém solitário, mas nunca sozinho. Que sempre soube o que queria e não me importava de jogar baixo para ter o objeto desejado.
Nunca tive muito contato com o Vinícius. Antes disso, eu o tinha visto apenas uma vez, e em apenas um encontro notamos a diferença e o choque de personalidades. O independente VS O mimado. O anjo e o demônio, e quantas dualidades mais conseguirem imaginar. A questão é que mesmo com essa dualidade, nos demos bem. Brincamos juntos durante um dia inteiro, e ao fim do dia a minha mãe me levou para casa; no dia seguinte quando estava de volta a casa da minha avó, ele já não estava mais lá. Tinha retornado a São Paulo.
Indiferença! Esta foi a minha expressão. Esta é outra afirmação. Consegui manter este rosto por muito tempo, até que em 2011 a minha mãe chegou a mim e disse que teríamos visitas pro natal, o Vinícius e a mãe dele viriam passar o natal com a gente. Isto era numa segunda feira, faltavam 5 dias para o natal. Meu rosto mudou da indiferença para a certeza da maldade. Estava disposto e convencido a corromper o anjo de uma vez.
Para a minha surpresa, eles chegaram na mesma tarde. A princípio, não falamos nada, ele estava escondido como sempre atrás da mãe, ridiculamente lindo, louro e mimado. As vezes olhava para mim, mas eu não fazia contato visual, não na frente da minha mãe. Eu estava deitado na rede, tinha acabado de voltar da plantação e tomado um banho, então estava cansado.
Minha mãe me fez levantar para me mostrar para minha tia e ela ver o quanto eu tinha crescido e estava forte. Para se gabar que eu trabalhava na roça e estudava, e mantinha notas boas ainda assim. Enquanto a minha mãe me exibia feito troféu, o Vinícius não tirava os olhos de mim. Os olhos viam cada parte do meu corpo atentamente e aproveitei que a minha mãe estava atrás de mim para sorrir pra ele. Ele desviou os olhos quando percebeu que estava olhando. Esse foi o segundo contato de nossas vidas.
-Este ano eu não quero natal tradicional. -Minha mãe anunciou na hora da janta. -Amanhã de manhã vamos todos pro sítio, nosso natal vai ser longe de toda essa gritaria da rua.
Ela que decidia tudo. Lá em casa sempre reinou o matriarcado, então nem o meu pai e nem os meus irmãos dissemos nada, apenas arrumamos tudo para sair no outro dia bem cedo. Até aí o meu primo estava distante, e não vou dizer que também não estava, eu me irritava com quase tudo que ele fazia. Sempre reclamava de alguma coisa ou outra. Por esse motivo não tentei aproximação. De qualquer forma ele sempre estava conversando com algum dos meus outros irmãos.
Tínhamos que sair pelo menos 4:30 da manhã para chegar sem o sol ferver os nossos miolos. Eram 16km de estrada de terra esburacada e com pedras, o que significa que: nada de carros ou motos. Eram cavalos e carro de boi. Enquanto todo mundo já estava de pé, a princesa Vinícius ainda estava dormindo. Eu o chamei três ou quatro vezes até ver que ele não acordaria. Me inclinei um pouco pra frente e dei um beijo nos seus lábios vermelhos.
-Que cê tá fazendo? -Ele pulou da cama.
-Acordando a princesa. Vamo que o sol já tá no meio do céu.
Deu certo, ele levantou. Durante o percurso da estrada, ele ia todo enrolado pro sol não queimar a pele dele. Enquanto isso, eu já estava sem camisa. Os meus irmãos e o meu pai foram na frente com os cavalos e os cachorros, minha mãe foi guiando o carro de boi que levava os mantimentos e a minha irmã, enquanto eu fiquei com o carro que levava a minha tia e o Vinícius. Vez ou outra trocávamos olhares, ele assustado ou curioso sobre o que tinha acontecido mais cedo, e eu com a melhor cara de que nada tinha acontecido.
Chegamos no sítio quase 10 da manhã. 16km de nenhuma alma viva por perto. Tiramos os arreios dos bichos, fomos dar água e colocar no pasto, enquanto isso, o meu primo ficou com a minha tia, minha mãe e a minha irmã na casa. As meninas ficaram fazendo o almoço e ele fugindo do sol. Os meus irmãos foram andar com os cachorros e ver se pegavam carne pra jantar e eu voltei sozinho par casa. Cheguei calado apenas para ouvir o que conversavam.
Minha tia e a minha mãe estavam cortando verduras e carne, e o Vinícius com elas na cozinha. Minha mãe estava falando que eu sabia cozinhar, que me virava em qualquer lugar mesmo sem uma mulher ou outro homem. Minha tia por outro lado se reclamava.
-Ai que inveja, tudo que esse aí sabe fazer é fritar um ovo, e ainda por cima queima.
-Então deixa ele aprender comigo. -Entrei na cozinha e dei um cheiro em mãe; que reclamou por que cheguei suado e fui logo entrando.
-Aprender o que? -Ele falou ainda sentado.
-Aprender a se virar também.
-Eu adoraria. -Minha tia comentou sorridente. -Tá aí Vini, fique com o seu primo, ele vai lhe ensinar coisas boas. Tente aprender.
“Vou ensinar as melhores coisas” Meus pensamentos eram os piores. “Vou ensinar ele a ser meu.”
-Vamos lá. -Chamei ele, que levantou ainda olhando pra mãe dele, talvez esperando que ela o mandasse ficar. -Mainha, vamo dar um mergulho na cachoeira antes do almoço.
-Não demore lá não, daqui a pouco o povo chega pra comer.
Saí puxando o meu primo pelo braço. Depois de andar por quase 20 minutos em silencio por dentro do mato, entrando por veredas que só eu conhecia, meu primo finalmente falou. -O que você está fazendo?
-Sumindo com todo mundo, ficando sozinho com você e te levando pra nadar comigo. -Ouvimos o barulho da água nas pedras e eu tirei todas as roupas.
Pulei na água e o meu primo ficou tapando os olhos. A água estava bem fria, ótima para aliviar o calor.
-Vem pra cá, a água tá ótima.
-Não, eu não sei nadar.
-Eu te ensino, e nem é tão fundo. Não dá pra se afogar aqui. Entra, vai ser o meu presente de Natal.
(Continua)