Oi, gente, mais uma estreia aqui. Estou muito feliz em postar de novo aqui no Casa dos Contos. Amor de Peso, uma das minhas histórias anteriores está reeditava no aplicativo Wattpad. Quem me conhece, sabe que adoro romances e essa história que vou publicar também é bem romântica. Já quero logo avisar, que alguns capítulos vão ser narrados pelo Santino e outros pelo Kleber. Sempre vou colocar o nome do protagonista no início da história para não causar nenhum estranhamento, BLZ? Espero que vocês curtam e comentem bastante, pois, assim consigo analisar a trama. Obrigado e boa leitura!!!!!
Escrito por Santino Peixoto:
Traumas. Por que muitas pessoas gostam de mascarar seus traumas? Existe uma máscara para cada tipo de trauma existente na humanidade. Depende de nós saber qual se adequa a cada situação. Fiquei com o tema na cabeça desde que fiz o Enem. Afinal, esse podia ser um dos temas da redação, mas acabou sendo sobre a imigração dos venezuelanos no Brasil.
— Santino Peixoto. — chamou a secretária da universidade, estralando os dedos e me tirando do universo que chamo de mente.
— Aqui!! — gritei, assustado e levantando a mão como se fosse um maluco.
Sim. O Enem e suas temáticas ainda eram pensamentos constantes na minha cabeça. Ainda mais falando de traumas. E o que eu entendo de traumas, você deve estar se questionando, né? Bem. Tenho 18 anos, cabelos claros, olhos castanhos, 1.85 de altura e 122 quilos. Se colocar um cartaz na minha costa viro o outdoor perfeito. O que estou fazendo aqui? Devia estar ganhando dinheiro no ramo da publicidade de anúncios.
Cheguei perto da atendente, ela é uma manauara típica. O rosto moreno, cabelos negros e lisos, baixinha e uma boca carnuda. Ela olha para os meus documentos, depois para mim. Isso não incomoda de cara, só nas outras quatro vezes. Nesse tipo de situação, acho melhor olhar para o chão, uma vez que não tenho coragem de encara-la.
Muitos devem pensar que a timidez é algo ruim, mas não mantendo contanto visual com a atendente descubro que seu nome é Jennifer e nasceu em 2 de dezembro de 1996. Será que ela guarda rancor do Gabriel Diniz? Uma vez que ele estragou o nome dela. Acho que não, tenho quase certeza que odiar mortos é pecado em algum lugar do mundo. Acabei perdido nos meus devaneios, enquanto, Jennifer analisava todos meus documentos.
Jennifer sabe como me resgatar dos pensamentos. Despertei com o barulho do grampeador, ela percebe que me assustei (pela segunda vez) e ri. Essa não seria a primeira vez que alguém faz isso comigo. Toda ação gera uma reação. Como se me entregasse um prêmio, Jennifer devolve meus documentos originais. Aparentemente, estava matriculado do curso de Design da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Ebaaa!!!! #SQN.
Acho que existem dois tipos de pessoas neste mundo. Aqueles que conseguem superar todos os medos e quem é consumido por eles. Adivinha de qual deles faço parte? Não sei quando minha vida começou a dar errado. Na verdade, sempre deu. Afinal, como minha mãe disse em uma de suas bebedeiras, eu fui uma moeda de troca. Parece cruel gritar isso para uma criança de 12 anos, porém, isso não chega nem perto das outras coisas horríveis que ela falou para mim.
Meu pai. Bem, ele é um filho da pu$%. Nunca entendi o acordo que meus pais fizeram. Eles nunca se casaram, mas papai nos dava uma vida de luxo. Casas, carros, empregados e viagens, a lista era extensa. No início, ele participava de todos os meus aniversário, só que a cada ano inventava uma desculpa diferente para não me ver.
Aos 17 anos, morava sozinho em casa. Quer dizer, os empregados contam como família? Acho que sim. Lembro que no último Natal, passei na casa da Cassilda, a nossa cozinheira. Tudo era muito simples, entretanto, me senti bem em estar ali. A casa ficava em um conjunto chamado Viver Melhor. Acho que foi o melhor Natal de todos, ganhei até um presente dela.
— Gostou do presente, gordinho? — perguntou Cacilda me dando um abraço apertado.
— Gostei. Obrigado, viu. — falei segurando o choro.
Eu era o gordinho da Cacilda. Muitas pessoas usam a palavra gordinho de modo pejorativo. A Cacilda não. Eu adorava ser o gordinho dela. Infelizmente, minha única aliada precisou viajar para o interior do Amazonas. Pelo que eu entendi, uma familiar dela estava muito doente e não tinha outra pessoa para ajuda-la.
Após pegar um chá de cadeira na Ufam, cheguei em casa e não havia ninguém. Com certeza, a mamãe estava em alguma viagem de férias que, no caso, eram todos os dias. Nas redes sociais, a última postagem dela foi em Aruba. O cenário paradisíaco mostrava o tipo de ostentação que ela gostava. O novo namorado dela era bonito, pena que não ia durar até o fim da viagem.
Ao chegar, encontro a mesa de jantar posta. Faço cara de nojinho ao ver as opções. Pelo visto, a nova cozinheira não gostou de mim. Como eu sei disso? Ela fez vários pratos fitness. Frango grelhado, batata doce e suco verde. Comi na força do ódio, porque não ia ser derrotado dentro da minha própria casa.
Subi para o quarto, olhei no quadro de avisos que tenho e algo me deixou ansioso. A minha turma do ensino médio não quis festa de formatura, ao invés disso, os pais bancaram uma viagem de quatro dias ao Beach Park, em Fortaleza. Eu não estava afim de ir, entretanto, a mamãe ameaçou cortar meu cartão de crédito, então, Ceara, aí vou eu.
Acabei assistindo uma maratona de "Friends" para pegar no sono, lógico que funcionou. Em menos de 2 episódios eu já estava dormindo. A última coisa que ouviu foi: "How you doing?", uma pergunta icônica do personagem Joey.
Dormi até cedo, antes das 0h, só que o despertador tocou. "Como assim?", pensei comigo mesmo. Levantei aos poucos, mexi no celular e já havia uma movimentação no grupo da viagem. "Idiotas", soltei.
Cheguei cedo no ponto de encontro, avistei alguns colegas de longe. Tenho que colocar minha máscara da indiferença. Aprendi essa técnica nos últimos três anos. Cada pessoa ali era responsável por um gatilho diferente na minha vida. De repente, um cameramen aparece e junto dele a Emilly.
— Santino! — gritou Emilly correndo na minha direção. — Me abraça, bolota. Estamos fazendo um vídeo da viagem. — ela falou baixo perto do meu ouvido. — Vê se não estrada tudo.
— Ok. — soltei no mesmo tom que ela.
— Gente. Esse é o Santino. — fazendo a atuação da vida dela. — Nossa, cara. Tantas aventuras nesse terceirão. Espero que essa seja a viagem das nossas vidas. — sou surpreendido com um beijo na bochecha, algo que me faz corar.
Você já foi vítima de bullying? Eu já. As provocações começaram como brincadeiras. "Rolha de poço", "Baleia Assassina", "Barriga de nós todos", "Saturno", "Free Willy", esses eram alguns dos nomes que ganhei durante o ensino médio.
Ninguém me chamava de Santino. Depois, as coisas ficaram físicas, como empurrões, beliscões e cuecões. Eles transformaram a minha vida em um pesadelo. Eu poderia virar o garoto revoltado, mas não tive coragem para tal.
Três anos no inferno. Três anos sendo humilhado. Três anos desejando morrer. Mas, no fundo, eu era covarde demais para tirar a própria vida. Descontava toda a frustração em comida e compras online. Meu quarto está abarrotado de coisas. Se houvesse uma versão adolescente de "Acumuladores", eu seria um dos personagens. A pior parte é que tenho noção disso.
Depois do show da Emilly, coloquei meu fone e óculos de sol para tentar entrar no modo invisível. O plano funcionou nos primeiros minutos, até que sinto um beliscão na costa e um tapa na cabeça.
Eram Natan e Sérgio, os idiotas que comandavam a centra de bullyings do terceiro ano. Eles me entregaram suas malas e ordenaram que eu deixasse no ônibus.
Faço isso para ficar longe deles, quanto mais longe, melhor. Joguei as malas de qualquer jeito e entrei no ônibus. O ar-condicionado estava funcionando em força total. Sentei, mas minhas pernas ficaram esbarrando na poltrona da frente. Não existem vantagens em ser gordo e alto. Os outros colegas começaram a chegar, ninguém senta ao meu lado. Três alunas preferem dividir os acentos.
Solitário, quieto e invisível. Acho que me acostumei a ficar sozinho. Aprendi a pensar com mais lógica. Tenho altas conversas dentro da minha cabeça. Sou profissional em criar teorias da conspiração e fanfics.
Durante a eleição do grêmio da escola, decidimos que o líder da viagem seria o professor William, de Educação Física. Ele era o mais legal de todos, sempre me tratou com respeito e não deixava os outros alunos implicarem comigo.
— Galera! — ele gritou assobiando, chamando a atenção de todos. — Para a viagem, além de mim, a escola convidou os professores Mário e Antonieta. Todos os alunos com a pulseira verde. — levantando o braço direito. — Vão responder a mim. Amarela ao professor Mário. Já os estudantes com pulseiras vermelhas estarão com a professora Antonieta. Por favor, tenham cuidado. Não vamos exceder. Essa é uma viagem teste, então, comportem-se. Não quero ter que reprovar vocês.
— Ele não pode fazer isso, né? — perguntou Emilly desesperada.
Calma, Emilly. A gente sabe que a biblioteca nova que o teu pai pagou serviu para adulterar o teu boletim, você está salva. Graças aos céus que não vou aturar mais esse povo.
— Alguém vai sentar aqui? — questionou o professor William, batendo a prancheta no acento.
— Não, professor. De boas. — falei.
— Valeu. — sentando e mexendo nos botões na parte superior do ônibus. — Você não parece tão animado, Santino. Algum problema?
— Nenhum professor. É que praia não é muito o meu lance. — soltei, arrumando os fones e tirando os óculos.
— Santino. Ei sei que é difícil para você. Não sou cego. Eu te protegi até onde deu. Eu fui um garoto gordo também. É difícil. Chato. Mas, lá fora, no mundo real, as coisas vão ser diferente. Eu prometo. Agora, só curte a viagem, viu.
Eu não esperava uma conversa tão profunda com o professor William. Ele sempre foi um aliado, pena que se revelou muito tarde. No caminho até o aeroporto choveu. Encostei a minha cabeça no vidro e curtia uma música depressiva. Escolhi "Someone Like You" da Adele, a música perfeita para um dia chuvoso.
O Aeroporto Internacional Eduardo Gomes está lotado como sempre. Pessoas vem e vão. Todas ansiosas demais para chegarem ao seu destino. Sempre gostei de aeroportos, por exemplo, não fico chateado quando preciso fazer escalas ou esperar por outros voos. O meu universo de solidão me tornou uma pessoa observadora, até por demais.
Sei o segredo da maioria dos meus colegas de classe, porém, a vida deles e nada, pelo menos, para mim é a mesma coisa. Sei que a Jéssica trai o Bruno com o Otávio, que são "melhores amigos". O Sérgio já usou drogas na escola. O Renan namorava a professora de Biologia. Ninguém conseguia esconder um segredo de mim. Todo mundo já fez algo de errado, se não fez, bem, um dia vai fazer.
Eita, check-in demorado. Alguns alunos aproveitam o momento para uma sessão fotográfica no aeroporto, que brega. Seguimos para o corredor que liga a sala de espero com o avião. O Renan, como sempre ele, inicia uma sessão de bullying.
— Ei, professor! — gritou Renan. — Acho melhor o Santino entrar por último. Vai que...
— Calado. Não quero ouvir nenhum comentário! Todo mundo com o seu papel na mão e direto para o assento. — ordenou o professor, mais enrolado que papel higiênico.
O voo estava lotado. São 30 alunos para três professores. A minha sala transformou a viagem dos outros passageiros em um pesadelo. Pelo menos, eu não ia sofrer sozinho. O Renan continuou a fazer piadas gordofóbicas. O resto da turma pegava corda. São comentários como 'O avião não vai subir com o Saturno aqui' ou 'Será que não é melhor o Saturno ficar no meio do avião'. Coloquei meu fone e esqueci eles.
São quatro horas de viagem. Consegui ouvir minha playlist três vezes. Meus joelhos, que estão espremidos contra a poltrona da frente, começaram a doer. Já a bexiga parece que vai estourar, quero ir ao banheiro, mas isso não é uma opção, então, seguro o máximo que consigo. Ouço o coro dos anjos quando o comandante avisa que vamos aterrissar. São os 20 minutos mais demorados da vida.
Quando saio do avião, o primeiro lugar que procuro é o banheiro, o xixi luta para ganhar sua liberdade. A fila está enorme, entretanto, resisti bravamente contra a vontade de mijar. Respiro aliviado quando consigo uma vaga no mictório. Geralmente, tenho vergonha, mas aquilo era questão de vida ou morte.
No corredor, encontrei uma caixa gigante, dentro dele um pastor alemão tentava cheirar o lado de fora. Uma mulher, provavelmente a dona, estava mexendo no celular quando percebeu que eu olhava para o animal.
— O nome dele é Thor. Ele é um amorzinho. Pode fazer carinho. Ele está precisando. Uma viagem longa. — ela disse, voltando a mexer no telefone.
— Oi, Thor. — falei pegando em sua cabeça que era quatro vezes maior que minha mão. — Você deve estar cansado, né? Sei como é passar horas espremido. Bem, preciso ir. Foi um prazer te conhecer.
Encontrei o grupo de alunos na sala de desembarque. Houve uma confusão com algumas malas, sorte que a minha chegou sã e salva. O calor de Fortaleza é diferente do de Manaus. No Ceará, você não sente o corpo queimando, o vento é fresco e ajuda a encobrir a temperatura ardente. Nem deu tempo de ver a cidade, o professor nos separou em várias vans, tentei ficar o mais distante possível do Renan e Sérgio.
Por incrível que pareça, a viagem até o resort foi tranquila. Tirei algumas fotos no caminho e salvei, mesmo sabendo que não postaria ou enviaria para alguém. Ao chegarmos no hotel, fomos recebidos por um grupo de forró. As meninas arriscaram dançar, pois, foram convidadas pelos dançarinos. Sorrisos, cabelos voando e charme, e claro, a atuação perfeita.
Tive que pagar uma taxa extra para ter um quarto só meu. Valeu a pena cada centavo. Desfiz a mala e olhei para o mar. Agora entendia quando a Moana cantava para o mar. Ele é deslumbrante. Uma cor azul que aquece nosso coração. Sim, gosto de filosofar. Não me julgue.
Na cama, havia toda a programação dos quatro dias que ficaríamos no resort. Peguei, olhei e decidi pular todas as atividades não obrigatórias. Como estava preso ali, quis explorar mais a região, conhecer a cultura e gastronomia local. Vesti uma camiseta florida, uma bermuda cor bege e um chapéu de palha. Lambuzei minha mão com uma quantidade ignorante de protetor solar e protegi meu rosto.
Sol. Praia. Pessoas. Diversão. Odiava essas palavras, odiava ainda mais o fato de estar naquele lugar. A turma ficou hospedada no resort de luxo que funcionava dentro do Beach Park. No saguão, desviei do Renan e Sérgio. Eles estavam trajando suas sungas perfeitas e exibindo os corpos sensuais. Grandes bostas.
Depois de passear por algumas feiras ao ar livre e fazer algumas comprinhas, sentei para apreciar o mar. A temperatura caiu, então, a contemplação ficou mais agradável. O vento fresco do litoral, o som das ondas quebrando e o céu azul no céu. Se houvesse um paraíso, o que não existe, queria que ele fosse daquela maneira.
A sensação de paz foi destruída por um empurrão. Virei pronto para espraguejar alguém e me surpreendi quando vi um pastor alemão gigante. Ele começou a latir na minha direção, de início fiquei assustado, mas logo reconheci o animal. Era o Thor, o cachorro que conheci no aeroporto. Peguei a guia e verifiquei o nome na coleira.
— Thor! — exclamei ao ler o nome dele. — Ei, garotão. Está perdido? — questionei para o cachorro, esperando que o animal respondesse algo. — Sou patético. — ri da minha idiotice. — Seu nome é Thor, né? Seus donos devem estar preocupados. Eu ficaria se perdesse um animal tão bonito. — fazendo carinho nos pelos cor de caramelo dele.
— Thor!!! — gritou um garoto correndo na nossa direção.
O rapaz fez Thor ficar agitado e, aparentemente, feliz. Soltei a guia e Thor correu para os abraços dele. Por causa do tamanho do cachorro, o garoto foi ao chão e riu da situação, e também, por causa das lambidas de Thor. Ao ver o final feliz, decidi deixar os dois sozinhos e voltar para o resort.
Enquanto caminhava pela praia, ouviu alguém gritar. Ao me virar, vejo Thor e seu humano vindo na minha direção. O garoto agradeceu pela ajuda, mesmo que eu tenha servido apenas para segurar o cachorro.
— Cara, valeu. Minha mãe ia acabar com a minha vida. O Thor é o xodó dela. Ah, sou Kleber. Kleber Viana — esticando a mão na minha direção, sorrindo e ofegante.
Ok. Sou péssimo em situações sociais. O sonho da mamãe era que eu participasse da High Society Manauara. Um covil de pessoas podres e egocêntricas. Até tentei no início, fiz aulas de etiqueta e outras baboseiras, porém, desisti quando mandei a professora catar coquinho, não com essas palavras, se é que me entende.
— Sou Santino. — falei baixo, tentando evitar contato visual.
— Severino? — perguntou Kleber fazendo uma careta engraçada.
— San... Santino! — dessa vez, aumentei o tom de voz e Kleber entendeu.
— Ah, legal. Você aceita um sorvete? É um prêmio. Por ter achado o Thor e salvado minha vida.
— Eu... eu...
Não houve tempo para resposta. Kleber pegou na minha mão e saiu me arrastando até uma barraca de sorvete. Ele quase teve um troço ao ver o valor do sorvete. O Kleber olhou a carteira que tinha apenas uma nota de 20 reais, o que não daria para comprar nem um sorvete daquele. Ele engoliu seco, olhou para mim e deu com os ombros.
— Eu quero dois, por favor. — pedi, abrindo a carteira e dando o dinheiro para a vendedora. — Escolhe. — olhando para Kleber, que ficou sem graça.
— Ei, eu que preciso pagar. — protestou Kleber, apertando firme a guia de Thor.
— Tudo bem. Você ficou tão feliz com o sorvete. Não tenho problema com isso, sério. — expliquei, tentando manter contato visual com Kleber, sem sucesso.
Sorvetes comprados. Kleber escolheu de morango. eu o de chocolate. Optamos sentar na praia, Thor ficou entre nós. Logo, percebemos que tomar sorvete de frente para o mar é complicado. Uma guerra contra o vento começou. Lambuzei toda minha camisa florida. Os pés do Kleber não escaparam do sorvete de morango. Acabei dando o último pedaço para o Thor, que adorou, pois, não deixou uma gota cair no chão.
Traumas. Porque eles me perseguem? Eu queria ter sido um adolescente normal. Paquerar as gatinhas, sair com amigos e participar de festas, entretanto, tudo na minha vida me fez duvidar do meu verdadeiro potencial.
Sentado naquela praia, ao lado de Kleber e Thor, pude provar um pouco dessa normalidade que me faltava. A gente não conversou muito, mas só de ter alguém ao meu lado me sentia bem.
O Kleber era um cara engraçado e bonito, como se diz no Amazonas: "Um moreno cor de jambo". Não vi muito do cabelo dele, pois, usava um boné verde claro colocado para trás. Kleber vestia uma camiseta da cor do chapéu e uma calça estilo surfista. Ele era um pouco mais baixo que eu, na verdade, qualquer pessoa é menor que eu. O seu corpo era cuidado, diferente do meu. Tentava não olhar muito, mas ficava cada vez mais difícil.
— Você não é de falar muito, né? — ele perguntou esticando as pernas na areia.
— Não muito. — falei encarando o mar.
— Olha só, Sérgio! — gritou Renan baixando e pegando nos meus ombros. — O Free Willy conseguiu um namorado. — rindo a própria piada ruim.
— Deixa ele, Renan. — pediu Sérgio, olhando para mim e desviando.
— Verdade. Eu não posso atrapalhar a única oportunidade que ele tem pra arrumar uma transa. Ele tá te pagando quanto? — perguntou Renan tirando o chapéu de Kleber e lançando longe.
Sim. Os traumas me perseguem. Eles fazem parte de que eu sou. Acho que nem lembro quando eles começaram a aparecer. Vai ser assim até o fim da minha vida? Tento enxergar a tal luz no fim do túnel, mas a cada dia que passa ela parece mais um vagalume.