Escrito por Santino Texeira:
Atônito. Essa é a palavra certa para descrever minha reação. Renan e Sérgio pareciam duas metralhadoras de insultos. Eles riam a beça, tentei levantar, mas Renan me empurrou de volta para a área, caí e machuquei o pulso. Queria chorar, porém, nem forças para tal coisa eu tinha. Olhei para Kleber que ficou vermelho, seus olhos estavam diferentes. De repente, ele passa a guia de Thor para mim.
— Tú se acha engraçado? — perguntou Kleber empurrando Renan com violência. — Acha legal ficar falando dos outros?
— Olha só, Sérgio. O tampinha é estressado. — disse Renan, rindo de nervoso e olhando para os lados.
Tudo aconteceu muito rápido. Com apenas dois golpes, Kleber derrubou Sérgio e Natan. Eu não sei se gostei ou reprovei a atitude. O Thor começou a latir, acho que tão nervoso quanto eu. Enquanto meus colegas estavam imóveis no chão, Kleber pegou o chapéu, colocou na cabeça e segurou na minha mão. Como estava sem reação, apenas o segui para uma parte mais movimentava. A gente ficou um tempo em silêncio.
— Eles te machucaram? — questionou Kleber limpando a areia do corpo.
— Não... — falei de forma baixa.
— Desculpa, Tino. Eu não queria te assustar, mas aqueles moleques mereciam uns tapas. — Enquanto falava, ele pegou a coleira do Thor. — Afinal, você conhece eles?
— Estudam comigo. São dois babacas. Kleber, preciso voltar para o hotel.
— Se quiser te deixo lá. A gente te protege, né? — pegando na cabeça de Thor que late e abana o rabo.
— Não. Estou bem. Obrigado.
Caramba. O que aconteceu aqui? O Kleber é um ninja. Repassei a cena na minha cabeça várias vezes. Nem reparei que havia chegado no resort. No quarto, recebi uma mensagem da minha mãe. "Espero que esteja se divertindo em Recife". Um prêmio de mão do ano. Não sabe nem onde o filho está. A brisa da mar invadiu o quarto. Fui até a sacada e fiquei admirando o céu laranja.
À noite, aconteceria a primeira festa da turma. Essa eu teria que participar, pois, algumas fotos oficiais seriam tiradas. Vesti minha roupa. Todos usariam a mesma coisa, incluindo, as meninas. Uma calça jeans azul, blusa branca e um chapéu azul claro.
Sério. O comitê de formatura se superou nessas escolhas ridículas. O salão estava bonito, não vou reclamar. A comida também, alguns pratos típicos da Amazônia (no Ceará) e muito álcool.
Fiz o meu papel de formando. Tirei fotos. Vi todas as homenagens dos pais em um vídeo de gosto duvidoso e brega. O auge foi assistir ao espetáculo da Emilly e suas amigas. Choravam como se fosse o final de uma novela ruim da TV Mundo. De repente, uma mulher aparece segurando um microfone e a luz da Câmera me deixa cego.
— Então, qual a mensagem que deixa para os seus colegas? — ela pergunta com um sorriso artificial no rosto, tão largo que me fez perceber o batom vermelho em seus dentes.
— Bem. Desejo que todo mundo siga um bom caminho. — falei, pensando na coisa mais clichê para se dizer, além de "Vão tomar no cool bando de arrombado".
Entrevistada concedida. Fotos tiradas. Bucho cheio. Voltei para o quarto e coloquei meu pijama. Fiquei zapeando pelas redes sociais, infelizmente, no feed eu só conseguia ver Fortaleza. Lembrei do Kleber. Da forma como ele me defendeu do Renan e Sérgio. Queria ter aquela força e destreza, derrubar meus inimigos com um único golpe. Só que no fim das contas, eu era apenas o Santino, o gordo inútil do terceirão.
Coloquei a primeira temporada de "Grey's Anatomy" para assistir. Achava engraçado ver os atores tão novinhos. Acho a Ellen Pompeo, a atriz principal do seriado, uma gatinha. A única mulher que me faz duvidar da minha sexualidade. Meu sonho era fazer medicina, mas Santino e sangue não se bicam. Adormeci no final do terceiro episódio, não resisti.
A música que tocava era "Somewhere Only We Know", do Keane. É quase uma canção de ninar. De madrugada, sonhei com o Kleber e o Thor. Eles eram uma espécie de heróis e me salvavam de monstros especiais. No fim, a gente tomava sorvete na praia olhando para o pôr do sol.
No dia seguinte, acordei me sentindo um lixo. Sinto uma dor aguda no pulso. Ele ficou roxo por causa da queda que levei, cortesia do Renan (babaca, idiota do inferno). Que raiva. No banheiro, assustei com o bronzeado que ganhei. Estava vermelho pimentão. Após um banho, desci para o café da manhã.
A gastronomia do Nordeste é maravilhosa. No cardápio tinha bolos de milho, aipim e de trigo, cuscuz, tapioca, polvilho frito, biscoito cozido e assado, banana cozida, ovo frito, canjica, curau, sucos de laranja e de melancia, café e leite. Sentei o mais longe possível dos meus colegas, eles continuavam felizes, principalmente, quando o câmera aparecia.
Decidi voltar para a praia que encontrei o Kleber e Thor. Dessa vez, algumas nuvens carregadas impediram o sol de queimar minha cabeça. A areia fofa, fazia meus pés afundarem mais. Como é difícil caminhar em uma praia. Levei comigo uma mochila com livros para passar o tempo.
Que brisa gostosa. Conseguia sentir o gosto do sal que era carregado pelo o ar, o barulho das andas quebrando deixava o clima mais aconchegante. Por causa do tempo fechado, poucas pessoas transitavam, então, a leitura fluiu bem.
A primeira obra que li foi "A Arte de Correr na Chuva", que narra a história do cachorro Enzo e sua família humana. Leitura fácil e gostosa. Em seguida, peguei "Com Amor, Simon", um queridinho da literatura LGBTQI+. Consegui finalizar dois livros em três horas.
De longe, vejo um temporal se aproximando da praia. Alguns poucos banhistas se arriscam no mar que ganhou uma cor escura. Odeio nadar em lugares que não vejo o fundo. No Amazonas, por exemplo, nunca tive coragem de pular no famoso "Encontro das Águas", uma atração turística natural. Deus me livre.
Para minha alegria, Thor apareceu com a energia renovada. Todo serelepe, lambeu meu rosto e cheirou minha mochila. De repente, o mundo para ao meu redor. Kleber vem correndo, diferente de mim, não tem dificuldade nenhuma em correr na areia. Ele está vestindo apenas uma regata branca e uma sunga da mesma cor.
Por um instante, tenho a sensação que entrei naqueles filmes eróticos que passam na TV a Cabo. Onde o cara gostosão aparece e nos faz delirar de prazer. O corpo de Kleber é lindo. As pernas grossas torneadas, tenho certeza que ele pratica algum tipo de luta, ainda mais pelo jeito que agiu com meus colegas no dia anterior.
Babei, isso é um fato. Ele acena e senta ao meu lado. Thor continua nos rondando, curioso e ofegante. Kleber pega sua mochila e tira um pote. Depois abre uma garrafa e despeja a água para o cachorro beber.
— Ele está com sede. A gente correu um pouco. — comentou Kleber me atualizando de sua atividade diária.
— Legal. É um cão atleta. — soltei rindo da minha piada ruim.
— Quase isso. E você, conta. Aqueles valentões mexeram com você? — ele perguntou.
— Não. — falei coçando o rosto por causa da areia que voava para todos os lados.
Kleber notou a marca roxa no meu pulso. Ele pegou uma pomada e passou delicadamente. No início ardeu, não vou mentir, ardeu bastante. As mãos dele começaram a massagear o local que havia machucado no dia anterior. Um movimento circular e calmo.
— Sempre ando com Bengué na mochila. Você é um sortudo. — explicou Kleber continuando a sessão de massagem.
— Vai dizer que você é massagista? — questionei sem manter contato visual com ele.
— Não. Sou universitário, curso de Ciência da Computação. — ele diz, terminando de massagear minha mão e fechando a pomada.
— Design Gráfico. — quase minha voz não sai.
— Oi? — perguntou Kleber colocando a pomada na mochila e fechando.
— Vou fazer o curso de Design Gráfico. — repeti, dessa vez em um tom mais firme.
— Sério. Era minha segunda opção.
— Pela forma como você agiu com meus amigos, achei que você era um atleta. — comentei, enquanto guardava meus livros.
— Quase. Tive um acidente há alguns anos. Jogava futebol e fazia jiu-jitsu. Posso não ser grande, mas tenho força. — Kleber mostrou os músculos, algo desnecessário, mas que adorei ver.
— Um personagem de Dragon Ball Z. — sugiro rindo.
— Prefiro Naturo. Ele é mais descolado.
Pronto. Começamos a falar sobre desenhos e referências gráficas. Nunca fiquei tão a vontade com outra pessoa. Um fato sobre o Kleber, ele é bonito, porém, não é aquela beleza óbvia. Seu corpo é pequeno, entretanto, como o mesmo falou, forte. As veias de suas mãos são salientes. Os poucos pelos que existiam em seus braços balançavam com a força do vento.
A conversa durou um bom tempo. Até que minha barriga começou a roncar. O Kleber percebeu e me convidou para almoçar. Abri o celular e percebi que na programação da formatura, os alunos almoçariam em um restaurante cinco estrelas. Bem, prefiro deixar o meu novo amigo fazer uma surpresa.
Seguimos o caminho oposto do hotel. Andamos um ao lado do outro por alguns minutos. Os prédios luxuosos vão dando lugar a construção mais humildes. A chuva que estava ameaçando cair desiste e dá lugar ao sol.
Apesar de usar roupas frescas, o calor acaba comigo. Dessa vez, escolhi uma camiseta branca e um calção de surfista preto e sandálias. A caminhada faz meu corpo reagir, pois, comecei a suar por todos os cantos possíveis. Gosto de andar com um lenço no bolso, principalmente, em lugares como Manaus e Fortaleza, mas nem ele conseguiu cessar a transpiração.
— Aqui tem ótimos restaurantes. — Kleber anunciou. — Como o da minha tia, por exemplo.
— Sério. Então, você sai conhecendo estranhos na praia para os levar no restaurante da tua tia? Hum... devo ficar preocupado? — perguntei, rindo e enxugando minha testa com o lenço.
— Para. O Thor gostou de ti, logo, não é um estranho. — ele garante pegando no meu ombro, enquanto tem dificuldade de segurar Thor.
Chegamos em uma construção de madeira, um quiosque com telha de palha. "Cozinha da Dê", estava escrito em uma placa de madeira, cada letra com uma cor diferente. O espaço apesar de pequeno contava com boa quantidade de mesas e cadeiras. A decoração chamou minha atenção, haviam várias fotos da praia em épocas diferentes. Uma lousa pequena mostrava algumas opções para o almoço.
Prato do Dia:
Pescada Amarela
Cabe no seu bolso:
Moqueca Cearense
Baião de Dois com carne de sol
Galinha à cabidela
Esbarro em uma mulher. Para a minha surpresa é a mesma que encontrei com Thor no Aeroporto, logo, era a mãe de Kleber. Ela usava um vestido florido, uma toca na cabeça e um avental com o nome do quiosque. Seus traços eram bem forte, mesmo sem maquiagem continuava bonita.
— Oi, mãe. Trouxe um amigo para almoçar. Vamos rachar a conta. — ele anunciou, enquanto prendia a guia de Thor na mesa.
— Ei, seu moleque mal educado. Não vai me apresentar para o teu amigo? — a mãe dele faz uma careta engraçada e começou a rir.
— Santino, essa é Bruna, também conhecida como mãe ou "Enquanto morar no meu teto, vai respeitar minhas regras". — Kleber tentou imitar a voz da mãe, sem sucesso.
— Prazer, Dona Bruna. — falei, tentando não parecer um estranho.
— Tino, já decidiu? — Kleber perguntou pegando no meu ombro.
Levei alguns segundos para entender que o Kleber falava comigo. Ninguém me chamava de Tino. Geralmente, usam Saturno como forma de comparação ao planeta. Afinal, para algumas pessoas, os gordos lembram planetas. Inclusive, não acharia ruim se meu nome fosse de fato Saturno. É muito poético.
— Oi. — respondi igual um bobo, isso faz Kleber rir.
— Você já decidiu?
— Deixa eu ver. Quero... Baião com carne de sol. Pode ser?
— Pode.
— Então, baião de dois com carne de sol para o meu bebê e seu amigo, Tino. — Bruna anotou o pedido e deu um beijo no rosto de Kleber.
— Mãe! — ele protestou limpando o rosto e a beijando de volta.
Que momento fofo. Sorrisos sinceros. Abraços carinhosos e apertados. E beijos, muitos beijos. Como será que é ser amado pela própria mãe? Senti uma energia forte entre os dois. Deu para perceber que eles são unidos, quase que amigos. Nunca vivenciei tal coisa em minha vida. Não fiquei triste, apenas imaginando como seria.
Dona Bruna voltou para a parte da cozinha do quiosque. Lá dentro estava a tia de Kleber, Luciana. Ela preparava os pratos com uma maestria de dar inveja. De acordo com ele, o marido dela sofreu um acidente de carro, por isso, a sua mãe se ofereceu para ajuda-la naquele mês.
Do nada, o Kleber pegou o celular e tirou uma foto nossa, mas não gostou da iluminação. Pedi para utilizar o meu, que é conhecido por ter uma das melhores câmeras do mercado. Tenho a mania de limpar a lente na camisa, então faço isso e entrego o aparelho para ele.
Três selfies salvas com sucesso. Antes de devolver o telefone, Kleber abriu o aplicativo Telegram, digitou o seu nick "K.leber" e enviou um oi. Ele pareceu entender bastante de celulares. Explicou vários funções legais que eu nem sabia que existiam no meu.
O Kleber é assim. Inquieto. Gosta de conversar. Conheço ele há dois dias e já sei muitas informações sobre sua vida. Como por exemplo, o joelho quebrado durante um jogo de futebol, a suspensão que levou ao utilizar os computadores da escola para fins ilegais e sua relação complicada com o ex-namorado.
Espera. Ex. Ex-namorado? O Kleber é gay. O meu coração começou a palpitar forte. Como assim, o Kleber era gay? Ele não tinha o direito de jogar essa informação em uma conversa tão informal. Que tipo de pessoa faz isso?
Cadê o jovem com uma luta interna para abraçar sua sexualidade? Kleber era gay. Ele tinha um ex-namorado. Também poderia ser bissexual. O Kleber tinha duas covinhas que cresciam em seu rosto quando sorria. Enquanto continuava me metralhando com informações, ainda não conseguia superar o "Ex-Namorado".
Tento disfarçar o nervosismo, mas não consigo. Kleber acaba percebendo e pergunta se sou homofóbico. O quê? Eu homofóbico. Cara, acorda para vida. Tenho uma placa na minha testa escrito "Urso Gay".
Na minha cabeça, as coisas funcionam perfeitamente, porém, no mundo real, eu parecia uma foca treinada pelo Sea World.
— Não. Eu.. euhomo...homofóbico — engulo seco. — Sou gay. — digo ofegante e visivelmente desesperado.
— Ei, tudo bem. — ele falou, se esticando pela mesa e pegando no meu braço. — Desculpa pela pergunta idiota. Eu sou um idiota. Rei do Reino dos Idiotas.
— Você é legal, Kleber. Não é nenhum pouco idiota. — a mão dele tocava minha pele e a sensação é muito gostosa.
A mãe de Kleber chegou com o nosso pedido. Gente, que comida deliciosa. Nunca provei uma carne tão macia e suculenta. O baião de dois com a quantidade certa de tempero. Ela serviu também um suco de melancia, que deu uma surra no do hotel cinco estrelas.
De bucho cheio, a gente continuou conversando. Percebi que temos um gosto bem parecido. Gostávamos de Pokémon, Digimon, Friend's, Resident Evil e Grey's Anatomy. Como pode? Tive que viajar mais de três mil quilômetros para fazer um amigo.
De forma irônica, a mãe de Kleber chegou e deixou a comanda em cima da mesa, um valor total de R$ 56. Peguei o celular para fazer a divisão, sou péssimo em matemática, a matéria que mais sofri durante a preparação para o Enem.
— R$ 28 para cada. — ele soltou pegando a carteira e contando os trocados.
— Aqui aceita cartão de débito? — perguntei tirando a carteira da mochila.
— Não. — Kleber diz dando um sorriso amarelo.
Reviro minha mochila inteira. Por sorte, encontro uma nota de R$ 100 que milagrosamente apareceu, pois, não lembro de ter a deixado ali. Desamassei o dinheiro e entreguei para o Kleber. Ele me devolveu a sua parte, duas notas de R$ 10, que parecem ter saído de um filme de terror, além de oito moedas de um real.
Os termômetros de Fortaleza subiram rapidamente. Acho que foi o fato do Kleber ser gay. Aquelas palavras ainda martelavam na minha cabeça. "Ex-namorado", "ex-namorado", "ex-namorado". Que droga, Kleber. Agora eu seria obrigado a construir uma fanfic onde a gente seria um casal apaixonado.
Peguei o troco e guardei na carteira. Percebi que uma das notas de R$ 10 está rabiscada. É um desenho do Thor. Os traços são bonitos, sei disso por que passei anos estudando desenho e sofri para aperfeiçoar meu estilo.
— Cortesia do Kleber. — brinca Bruna ao me ver encarar o desenho.
— Mãe, a senhora cuida do Thor? Vou passear com o Tino. — pediu Kleber pegando a mochila e pegando na minha mãe. — Vamos, antes que ela comece a contar histórias constrangedoras.
Nem tenho tempo de dizer tchau, o Kleber é uma força da natureza. Não consegue ficar parado. Enquanto a gente caminha pela praia, ele começou mais uma sessão de informações pessoais. Confesso que prefiro pessoas assim, pois, se dependesse de mim, o papo não teria futuro.
Um grupo de garotas passam por nós. Elas usam seus biquínis apertados e coloridos. Uma delas chamou a atenção de Kleber. De forma espontânea, ele pegou na minha mão, deu com os ombros e sorriu. Acho que fiquei vermelho, quer dizer, estava vermelho. As garotas começaram a rir e nos desejaram sorte.
— Desculpa, viu. Acho que você não gostou muito, né. Eu não penso muito nas coisas que faço. — ele falou fazendo uma carinha triste.
— Não, tudo bem. Só que eu não esperava. — tentei agir da melhor maneira possível, mesmo tendo um surto dentro de mim.
— Você é engraçado. Tem coisas que você fala, mas seu rosto diz outras. — afirmou Kleber.
A gente ficou vagando pela praia, até que o calor ficou insuportável. O Kleber tem a brilhante ideia de dar um pulo no mar. Ele tirou uma toalha da mochila e colocou na areia. Tentei dar uma desculpa para não entrar na água, mas como já falei anteriormente, ele é uma força da natureza.
Sem nem pensar, o Kleber tirou a regata. A ação dura apenas alguns segundos, mas minha mente pervertida consegui aproveitar cada momento. Vamos lá. O Kleber não é um cara sarado, mas tem tudo no lugar. Não tem quase nenhum pelo no corpo. O que chama a atenção é a entrava em V que ele tem no abdômen. Até desvio o olhar.
Ele olhou para mim e faz um gestão de tipo "Você não vai tirar a roupa". Observei em volta e vi a movimentação na praia. Não sei o que fazer. Para o Kleber, tirar a roupa é simples. "Cheguei no lugar e tirei tudo", afinal, ele tem o corpo para isso.
— Ei, qual é. Não vai ficar com vergonha. Você tem um corpo lindo, Tino. — ele falou se aproximando de mim e tocando no meu ombro.
— Eu não sei. — tentava não manter contato com o V do abdômen de Kleber.
— Por favor. A água deve tá tão gostosa. Vamos juntos. Vai ser mais divertido.
Sim. Ele é uma força da natureza. Em menos de dois dias, o Kleber conquistou minha confiança e me fez tomar atitudes inéditas, como por exemplo, tirar a camisa em público. O Kleber observa cada movimento que faço. Ao contrário de mim, ele não tem vergonha de encarar. Sinto algo estranho no meu coração. Uma palpitação fora do normal. Estou tendo um enfarto?
Com as mãos tremulas, deixei a camisa em cima da mochila. Andamos em direção ao mar, a areia está quente e fofa. A água na temperatura perfeita, nem fria e quente. O Kleber mergulhou e desapareceu na água, uma onda me acerta em cheio, perco o equilíbrio e mergulho também. Tento manter os olhos fechados por causa do sal na água.
Que silêncio. O mar não é tão ruim no fim das contas. O meu corpo é puxado de um lado para o outro, mas estou tranquilo, pois, meus pés alcançam o chão. Infelizmente, o ar faltou no pulmão e emergi. Permaneço de olhos fechados, balanço as mãos e tiro o excesso de água do rosto.
— Viu, não é tão ruim. — Kleber diz perto do meu ouvido.
Fico de joelhos, a água bate perto do meu peito. Existem algumas pequenas vantagens em ser alto. Enquanto isso, Kleber, nada perto de mim. Ele começou a cantarolar o tema de Tubarão. Quando passa por mim, o Kleber, simplesmente, me abraça e beija meu rosto. Não se importa com as pessoas que tomam banho perto de nós.
— Beijo salgado. — salienta ele, mergulhando em seguida.
Depois de alguns minutos no mar, decidimos sair e aproveitar uma vaga que surgiu em um dos guarda-sóis, os lugares mais disputados da praia, na verdade, precisei subornar um dos fiscais, mas deixa quieto, pois, o que aconteceu em seguida foi um espetáculo.
O Kleber tirou a toalha de sua mochila e enxugou o seu corpo, a sunga branca era uma tentação, já que destacava a entrada em V do seu abdômen. Eu não conseguia tirar o olho, devia ser constrangedor. Depois de me castigar, ele sentou ao meu lado e ficou em silêncio, apenas admirando o mar.
— Olha só, Sérgio. — gritou Renan, chamando a atenção de todo mundo. — O Saturno ainda está com o gigolô.
— Essa não. — pensei, olhando para Kleber que estava vermelho de raiva.
Que merda, Renan. Tú só me acha nos piores momentos. Eu não sou uma força da natureza, não sei me defender. Sempre fui assim. Faz parte do meu DNA. Afinal, uma pessoa que não é querida por ninguém, um zero a esquerda, nasceu para apanhar da vida. Só que dessa vez, eles não estava apenas mexendo comigo.
— Vocês querem apanhar de novo? — perguntou Kleber se levantando.
— Kleber... — soltei, tentando evitar uma confusão.
— Algum problema? — perguntou um dos fiscais que patrulhavam a praia.
— Nada não. — garantiu Sérgio. — Essa praia já foi melhor frequentada. Agora, vocês deixam qualquer um entrar aqui. Só tomem cuidado. Vira-latas, atraí vira-latas.
— Sérgio. Vamos embora, pô. — pediu Renan, talvez temendo a reação de Kleber. — Ah, Saturno. Cuidado, viu. Ainda temos dois dias até o fim da viagem. — Renan fez uma ameaça antes de ir embora com Sérgio.
É, definitivamente, sou tudo, menos uma força da natureza. O dia perfeito foi estragado por causa do medo. Eu sou um covarde. Deixei o Kleber ser machucado sem motivo algum. Ele tentou disfarçar, mas era perceptível o desconforto dele. Depois do show dos meus colegas, a gente foi embora. Cada um para um lado da praia.