Acorda no pulo foi algo que jamais deveria acontecer, eu tentei merecer, mas logo sentí meu corpo gritando por causa do meu esforço.
Voltei a cama, estava numa cama confortável e sabia que não era a minha. O quarto tinha piscas que mudavam de laranja, vermelho pra azul e verde. Uma vista bonita para um grande mato e quase não se ouvia carros.
Onde estava ?
Minhas roupas não eram a mesma que tinha usado, meu corpo estava seco e ataduras estavam postas pela perna e pelo queixo.
Os piscas piscas estavam alternando de cores e meus ouvidos começaram a zunir. Tatuei a cama e não encontrei meu celular, tentei ver mais ou menos por onde estavam e não consegui saber bem.
“Está melhor?”
A pergunta me fez gritar de medo e logo em seguida de dor, por mexer minha perna quebrada.
A pessoa que estava na minha frente era um garoto, não passava de seus 19 anos, os cabelos eram enrolados, ele usava óculos e seu rosto me era familiar. Um garoto baixo, de pele negra e corpo troncado.
“Está melhor ou ainda sente dor?”
A voz do rapaz era preocupada e suave, da porta de onde ele estava, foi se aproximando, chegando mais perto e pude ver seus olhos, castanhos mel é uma boca um pouco torta para o lado, seu nariz era arrebitado e seus dedos era finos e compridos.
Seu toque era quente e começou a ver minha perna.
“Ainda sente dor? Preciso saber se sente para ver melhor sua perna.”
Ele começou a ver minha perna e tocou em partes que doía e gemí em resposta.
“Ainda está quebrado, pelo visto o estrago foi bem feio. - Respondeu o rapaz, tentando me tocar.
“Onde estou? Eu… preciso saber… onde… “
Eu sabia lutar alguma coisa, pelo menos fui dois meses no jiu-jítsus, conheço algum golpe.
“Calma, eu vou te explicar tudo, se você não quiser morrer, eu posso…”
Tudo aconteceu muito rápido, tentei pular por cima dele e o aperta com a perna boa, mas o disparo que ouvi foi mais rápido. Meus ouvidos zuniam e bati minha perna machucada soltando um palavrão e voltando a gemer me encolhendo.
“Se voce tentar fugir daqui o próximo tiro vai ser na sua cabeça.”
Meus olhos ficaram na persona a minha frente e quase me engasgo com quem eu vi.
Dos cabelos loiros queimado quase puxado para o ruivo, seus olhos eram azuis celestes, seu nariz era afinado e seu queixo era quadrado, o rapaz deveria se cuidar desde de cedo, seu corpo era forte, ombros largos e coxas torneadas por causa do short, a camiseta mostrava um peitoral definido e grande, sem marca de tatuagem ou ferida. A arma estava ainda apontando pra mim, o sulco feito na parede ainda soltava fumaça.
O rapaz que estava ao meu lado, não sorriu e ficou a encarar o maior a nossa frente, ele estava com medo ou surpreso, era diferente saber. Ele tinha classe até com uma arma na mão, e aquilo me fez acordar, a realidade dando na minha cara.
Eu estava mais que fudido.
“Caio, o que nosso bagulho aqui está mostrando?”
Caio era o rapaz que estava me avaliando, ele engoliu em seco e voltou seus olhos para minha perna.
“A perna está quebrada, o maxilar nao parece estar comprometido, não temos ossos quebrados ou fraturados. Mas a perna aqui vai ser um problema. Vejo pelo menos 6 meses para se recuperar. - Disse o garoto colocando toda confiança naquela frase.”
O estranho a minha frente estava a me encarar, ele ficou a cabeça com a arma e olhou para Caio.
“Saia, quero ver pessoalmente no que nós metemos.”
O garoto sem pensar duas vezes, saiu correndo, nos deixando sozinhos.
O estranho andou mais alguns passos e encarou minha perna, e guardou a arma nas sua cintura. Aproximou e pegou na perna com delicadeza.
“Você sente dor ainda?”
Minha cabeça queria pegar a arma e atira nele e fugir, mas logo meu lado consciente voltou a tomar contar e ver que aquilo era suicidio, com uma perna daquelas e outra que não saberia disparar.
“Dói muito, ela está quebrada não?”
“Está, pelo que nosso médico nos disse. - A voz dele estava mais macia, de perto consegui ver seu rosto, ele era delicado, apenas uma cicatriz que aparecia debaixo do seus lábios, que ia até o queixo. - Espero não ter assustado você com a arma, tenho que parecer do mal.”
Ele sorriu pra mim e se sentou na cama ao meu lado.
“Está bem? Quer algo? Depois que te salvei…”
“Você fez o que? Eu… onde estou? Minha mãe…”
“Calma ai príncipe, estou te salvando, um dos homens do Barão te marcou para roubar, sua sorte é que estava próximo dali, e consegui te salvar.”
Minha mente girou mais um pouco, o ar estava ficando mais rarefeito.
“Você é um traficante? Meu Deus, não me mata, eu tenho mãe para criar eu, preciso… - a dor começou a voltar.”
Ele riu, uma risada frouxa que me fez gelar mais um pouco. Eu vi os anéis em seus dedos, eu vi a corrente com um cadeado em seu pescoço, ele era diabolicamente angelical.
“Calma príncipe, não vou te machucar. - Ele sorriu frouxo - Você é filho da dona Val, não posso fazer isso com aquela mulher. Eu matei o cara, ou ele mataria você, e ainda por cima ele me desafiou, apenas coloquei ordem em minha zona. Mesmo sabendo que o Barão não vai gostar nada disso.”
Eu sabia quem era o Barão, um dos traficante donos da zona Norte da cidade, uma das áreas mais perigosas, tirando a leste. Barão, era um dos caras mais respeitados da cidade, mas aquele cara me incomodava até demais, ele estava tranquilo, mesmo sabendo que eu e ele morreríamos por isso.
“Desde de quando conheci minha mãe? Onde estou ? Eu preciso…”
“Primeiro príncipe você precisa descansar, e segundo claro que conheço sua mãe, ela era muito gentil com meus meninos, e outra tenha calma, já mandei um pessoal falar para ela que está comigo e que vai ficar tudo bem.”
Ele sorriu novamente e mexeu no celular
“Quem e você?”
“Príncipe, esqueceu de mim mesmo? Nossa estou ofendido mesmo. - disse ele fingindo rancor, - Sou Ikaro, mais conhecido agora como Alemão.”
Minha cabeça se partiu ao meio, e meus últimos neurônios não estavam ligando nada. Aquele garoto deveria ser alguém que conhecia, mas não lembrava.
“Não, Nao…”
“Não acredito que nao lembra de mim. Tá de sacanagem com minha cara?”
Ele se ajeitou pra mais perto e seus lábios encostaram os meus, me beijando. O beijos que vinha de sua parte era simplemente saudades, ele tentava tatear meu corpo à procura de alguma coisa, como se aquilo fosse algo valioso e que ele tivesse esperando a muito tempo.
Ikaro/Alemão, me fez lembrar de uma lembrança que eu reprimí dentro de mim a muitos anos, que me fez ter cicatrizes em meu corpo por causa daquilo.
A um tempo atrás quando eu estava no ensino fundamental me apaixonei perdidamente por um rapaz hétero da escola, ele se chamava Ikaro, sabe aqueles garotos idiotas que te faziam sorri de tudo? Que te abraçavam na rua e não estavam nem aí? Que te defendía de tudo? Esse era o Ikaro, ele era mais alto que eu e mais forte, seus pais não eram ricos, mas tinham condições e mesmo estudando numa escola publica, ele era super inteligente.
Ikaro era o terror da escola e das meninas, mas era um amigo que conquistei por fazer um trabalho com ele, sabe aquele amor platônico que você cria?
Era eu com ele, eu tinha um caderno que escrevia histórias com o nome dele e o meu, sonhava em poder está com ele até o final dos dias.
Ele me chamava de Príncipe, e toda a escola me chamava assim, era meu sonho de princesa te-lo. Até que num belo dia, alguém rouba meu caderno e espalhou pra a escola toda sobre minhas histórias. Naquele bendito dia meus pais estavam na escola para pegar meu boletim e os mesmo pegaram as xerox da história.
Por causa de uma simples história, eu perdi meu amigo, que não queria mais falar comigo, fui trocado de escola, porém perdi um ano interior por não ter mais vaga. Meu pai me bateu tanto naquele dia com o cinto que marcas e cicatrizes foram feitas na minha costa.
Por causa disso, não vou à praia e não gosto de piscinas, meu pai me marcou e disse que se não virasse homem, eu estaria com dias contados. Resolvi então jamais apreciar meu lado gay, ou me apaixonar de novo.
O beijo me fez chorar, chorar por aquele garotinho que estava dentro de mim que queria sair, que estava implorando pra ser ouvido.
“O que foi príncipe? Lembrou de mim agora? - A voz doce de Alemão me fez tremer e parar de chorar, eu não seria nocauteado por causa disso.”
“Eu… você está diferente. Você parece mais velho, você tinha um futuro tão lindo pela frente…”
Tentei disfarça da melhor forma possível, já que ele tinha percebido que lembrei, e que as lembranças eram coisas bem ruins.
Alemão entrou na brincadeira, já que ele percebeu.
“Eu tenho um futuro importante, estou fazendo dinheiro aqui, comecei de baixo, porém tenho poder, estou sendo o novo dono da zona leste e sul. - Ele disse com orgulho. - Fora que estou mandando dinheiro pra fora, e criando uma rota de fuga de tudo isso. Já que…”
Alguém entrou correndo o quarto abrindo a porta com força e olhou pra Alemão.
“O barão quer falar com você. Urgente.”
Ele respirou pesado e olhou para mim.
“Príncipe, fique aqui, vou resolver isso para você. Estou muito feliz de ter te encontrando de novo. - ele sorriu e se levantou. - Bem, o dever me chama.”
Alemão me deixou ali sozinho, quando a porta se fechou, tudo em mim estava confuso, meu corpo tremi e eu chorava, chorava que nem criança.