ESCRITO POR KLEBER VIANA:
— É isso que você quer? — perguntei para Santino, enquanto, tirava a minha blusa.
— Sim, Kleber. Você é tudo o que eu sonhei. — ele respondeu, fazendo uma carinha de menino sapeca me fazendo pirar.
— Você é muito gostoso. Quero passar a vida toda com você. — aproveitei para confessar os meus sentimentos.
— Me beija, seu gostoso! — gritou Santino rasgando a própria blusa e beijando minha boca.
Que beijo gostoso. A boca do Santino tem um sabor único, quase um de tutti-frutti. Infelizmente, os beijos se tornam mais ásperos e melequentos, então, dou conta que tudo não passava de um sonho e os únicos beijos que recebi vieram do Thor.
Soltei um gemido baixo e sentei na cama. O Thor correu de um lado para o outro no único quarto da casa. Ele subiu novamente na cama e, para acalma-lo, afaguei os seus pelos caramelo. Aquela inquietude tem apenas um motivo: a rua.
Como o Thor é um cachorro grande, costumo passear três vezes ao dia com ele. Claro, que nem sempre é possível, porém, não gosto de deixa-lo agitado. De acordo com o veterinário, a falta de atividades pode fazer mal para a saúde dele.
Ao chegar em casa, após uma caminhada de uma hora, coloquei a ração para o Thor e preparei um shake caseiro com linhaça, gergelim, aveia em flocos e amendoim e, claro, guaraná em pó. Cara, essa receita é uma delicia ainda mais quando adiciono gelo. Aproveitei o meu momento de paz para xeretar as redes sociais do Santino.
— Santino. Porquê tão fofo? — perguntei dando um gole no meu shake e curtindo as poucas fotos dele.
A mamãe me trouxe de volta para a terra, essa era sua principal missão na minha vida. Brincadeira, eu amo a mamãe, afinal, ela sempre esteve ao meu lado nos melhores e piores momentos.
A nossa rotina matutina era apressada, a mamãe trabalhava cedo e eu também. No início do ano, consegui um estágio em uma empresa de manutenção para celulares. Na verdade, sou apenas o rapaz que entrega os aparelhos para os seus donos, porém, o dinheiro é útil para nós.
A minha primeira tarefa pela manhã era deixar a minha mãe no seu trabalho que é caminho do meu. Em seguida, cheguei para abrir a loja e arrumar tudo para os primeiros clientes. O meu horário é das 7h às 11h, infelizmente, às vezes passo desse horário, mas um atraso de 10 minutos já desestabiliza todo o meu dia.
Sempre tive a sorte de conseguir bons chefes, a Dona Heloísa não era uma exceção. Mulher, preta e que conseguiu criar uma empresa do zero. Me senti honrado em fazer parte do seleto grupo de funcionários da Call Center.
— Kleber!!! — gritou Dona Heloísa, colocando o seus famosos óculos amarelos e analisando uma planilha.
— Chamou chefinha linda? — perguntei aparecendo na frente da Dona Heloísa, pois, estava organizando alguns materiais na prateleira.
— Não quero ser bajulada, por favor. — ela diz levantando os óculos e sorrindo. — Ok, só um pouquinho.
— Chefe das chefes, a única de sua espécie, nascida no meio de celulares analógicos, a que não queima placas, concertadora de celulares e notebooks, maravilhosa, vitaminada...
—Tudo bem, já entendi que sou demais. Por favor, você precisa entregar um documento no banco. Eu estou cheia de demandas.
Opa, trabalho externo. Melhor do que ficar preso dentro do prédio. Não gosto de reclamar de serviço, porém, os trabalhos externos eram mais legais. Enfim, após um dia agitado e cheio de tarefas externas, peguei a minha moto e segui para a faculdade.
Além de atuar como gari, a mamãe também desenvolvia um projeto na Ufam. Ela pegava lixo, na sua maioria plástico, e transformava em brinquedos para as crianças carentes. Eu ajudava no que podia, afinal, acho uma atitude nobre e que precisava ser reconhecida.
Enquanto esperava por ela, conversava com o Santino. Ele escolheu estudar de manhã e no período da tarde também. Infelizmente, a grade curricular de alguns cursos exigiam jornadas duplas. Por causa do emprego, precisei escolher bem as aulas que queria e os melhores horários.
***
SANTINO <3:
Que aula chata. O professor está falando da grade curricular do curso. #sono
KLEBER:
Indo pegar a mamãe no serviço e quem sabe eu não tiro esse tédio.
SANTINO <3:
Kleber!!! (carinha envergonhada)
***
O Santino era um amor de pessoa. Não tenho outra definição para ele. Queria ter essa doçura, porém, nasci para ser um grosseirão. Através das mensagens, tentava distrair o meu crush e estava conseguindo com sucesso. Uns memes, vídeos de gatinhos, letras de músicas e fotos engraçadas, sou uma metralhadora de distração.
— Oi, filhote! — a minha mãe chegou por trás e me abraçou.
— Oi. Vamos? Estou faminto. — reclamei, enquanto entregava o capacete para ela.
— Você toma um suco de grama toda manhã. Isso não tem sustância, meu filho. — ela garantiu, colocando o capacete e sentando na motocicleta.
— Isso não é suco de grama, mamãe. É um suplemento, quero ganhar músculos. — tentei explicar sem sucesso, pois, ela enumerou todas as opções de café possíveis.
Pão com manteiga, tapioca com queijo, bolo de milho, broa, pão doce, bolo de cenoura, croissant, suco de cupuaçu e café com leite de cabra. Sério, foram 10 minutos de sermão sobre a importância de se alimentar no café da manhã. Eu mereço isso, só pode.
Ao chegar na faculdade, a gente se dirige para a área de doação que é, basicamente, um antigo barriu que pintamos para atrair os alunos. Para a nossa surpresa, o ponto de doação estava lotado. Acho que alguém deu uma festa e levou centenas de garrafas e copos de plásticos para doação.
— Estou tão feliz! — gritou a mamãe chamando a atenção de um grupo de alunos que passavam no corredor.
— Caramba. Como vamos levar tudo isso? — perguntei, realmente, querendo saber como levaríamos aquele material para casa.
— Vou ligar para o meu chefe. Acho que ele tem aquelas carrocerias que acoplam em motos. — comentou mamãe pegando o celular e ligando para o chefe.
Eu não sou muito de ter sensações, porém, de uma hora para outra, senti um arrepio na minha espinha dorsal. Em seguida, alguém me tocou e chamou pelo meu nome. Na mesma hora, reconheci a voz do Kiko, então, respirei fundo e virei com uma expressão séria no meu rosto.
— Oi, Kleber. Você não atendeu minhas ligações e...
— Kiko, cara. Essa situação já está ficando chata demais. Eu não quero ter mais nada com você. — tentei, mais uma vez, jogar a real para o Kiko.
— Kleber, pensa direito, por favor. Tivemos uma história tão bonita. — Kiko soltou, antes de tirar o notebook da mochila. — Olha, o site que eu fiz. Ele não está mais online. Eu apaguei. Kleber, eu gosto tanto de você, por favor, me dá mais uma chance.
— Cara. — respirei fundo, pela décima vez, não queria fazer uma cena, ainda mais com a mamãe ali. — Eu não me importo. Você errou, a gente acabou e eu estou seguindo em frente. Não existe a possibilidade de ficarmos juntos. Com licença.
Puta merda. Ele conseguia mexer com todos os meus sentimentos. Não vou mentir, ainda sinto algo pelo Kiko, entretanto, esse amor não é grande o suficiente para encobrir todas as merdas da nossa relação.
Para não explodir, deixei o Kiko falando sozinho e dei atenção para a mamãe. Depois de alguns minutos, o chefe dela chegou com a carroceria para motos, então, acoplei na minha motoca e segui o caminho de casa.
Infelizmente, não consegui passar um tempo com o Santino. Sofri tanto nas mãos do Kiko que quase esqueci de como buscar a própria felicidade. Eu não sou o tipo de cara pessimista, longe disso, apenas tremi com o baque de conhecer a verdadeira face do meu ex-namorado.
***
KLEBER:
- Terra para Santino? Cambio.
SANTINO:
- Oi, gazeteiro. Tudo certo?
KLEBER:
- Você quer fazer algo hoje? (emoji tímido)
SANTINO:
- Que horas?
KLEBER:
- Umas 20h? Pode ser. (emoji de relógio)
SANTINO:
- Claro. Pode deixar (emoji de coração)
***
Eu decidi. Esse ano vou dar uma virada na minha vida. Não vou mais fugir do amor. Quantas oportunidades eu devo ter perdido por causa do medo de me machucar pela segunda vez. Bem, Santino, meu querido, se prepare para habitar o meu coraçãozinho e, agora, eu vou sem medo.