Escrito por Kleber Viana:
Santino! Fiquei com vontade de gritar o nome dele pela praia. Como era tão difícil encontrar alguém. A gente podia vir acompanhado de um GPS de fábrica, né? Dessa forma, em momentos chaves, não seria tão difícil nos encontrar. Era a quinta volta que eu dava pela orla e nada do meu ursão.
A pior parte é que um temporal se aproxima. Os banhistas poderiam ir embora. Assim a busca pelo urso perdido ficaria mais fácil. Passo por um grupo de coroas que olham e acenam na minha direção. Velhos enxeridos. Acabo arrependido do look que escolhi para a praia: uma sunga e regata branca.
De repente, o Thor ficou agitado e não aguentei segurar a guia da coleira. O demônio em forma de cachorro saiu em disparada para praia. No início fiquei furioso, porém, um sorriso se abriu quando vi o Santino sentado na areia. Caramba, ele está mais lindo do que no dia anterior.
Enquanto o garoto é atacado pelo Thor, aproveitei para tirar uma foto e registrar o momento, não quero esquecer. Vou correndo na direção deles, na real, a vontade é pular e lambe-lo dos pés a cabeça, mas a minha ética de relacionamentos fala mais alto.
Sim. Tenho uma ética de relacionamento. Digamos que o meu último namoro foi cheio de problemas. Uma relação abusiva, graças a Deus, que tive forças de sair daquele circulo vicioso. Algumas pessoas acham que o dinheiro pode comprar qualquer coisa. Por esse motivo, passei a ter certeza do terreno que piso. Desculpa, Santino, você é gato, porém, precisa passar em alguns testes.
Ficamos conversando por um bom tempo, quando olhei para o pulso dele percebi um hematoma. Peguei o meu salva vidas, no caso, uma pomada de Bengué que guardo na mochila por causa do meu joelho podre. Passei uma quantidade generosa do produto e apliquei naquela pele macia e linda. Comecei com movimentos circulares usando os polegares, o Santino fez uma careta engraçada. Como ele pode ser tão fofo?
Consegui ver a diferença do tom de nossa pele. Enquanto, sou o tipo moreno bronzeado, o Santino é branco, na verdade, vermelho devido à exposição ao sol. Ele tem cheiro de flores, com certeza, alguma marca importada de protetor solar. Evitei pensamentos pecaminosos, afinal, não queria causar desconforto e eu estava de sunga #deusmelivre.
Mais uma rodada de conversa. É gostoso falar com Santino. Ele é o tipo caladão e que vai se abrindo aos poucos. É mais interessante papear com pessoas nesse perfil. Detesto aqueles que já nos enchem de informações pessoais. Entretanto, tudo que vou descobrindo sobre o Santino me faz gostar ainda mais dele.
Vamos lá:
1 - Santino vai estudar design, provavelmente, em uma universidade federal;
2 - Seus olhos são castanhos claros;
3 - Ele tem uma boca rosada e carnuda (lembrar de morder essa boca);
4 - O Santino tem um lenço no bolso, sempre limpa o suor de sua testa;
5 - O desenho favorito dele é Dragon Ball Z (consigo viver com isso);
6 - Quando está curioso, o Santino costuma levantar a sobrancelha direita;
7 - Ele é o cara mais doce, gentil e engraçado que conheci na vida;
8 - Estou me apaixonando por ele;
Sim. Esses são alguns fatos que me fizeram gostar do Santino. Ele continua sendo um estranho para mim, mas não consigo evitar de criar um universo onde seríamos namorados. Sou gay orgulhoso, só não cheguei nesse nível de confiança para chamar um cara tão incrível para sair comigo.
E sei que se depender do Santino, o convite para um encontro também não saí. Sempre namorei caras mais velhos, ou seja, mais experientes. Na maioria das vezes, eles tomaram a iniciativa, eu apenas segui o fluxo. O Santino parecia um bichinho indefeso. Ele despertava o meu lado protetor, queria cuidar dele para sempre. Ter certeza que nada e nem ninguém o machucaria, principalmente, aqueles idiotas.
Ele é uma criatura adorável. Até mesmo quando está com fome. O estomago do Santino ronca mais alto. Ele faz mais uma de suas caretas engraçadas, faço força para não rir e passar a impressão errada, mas acho fofo demais. De repente, os diabinhos dentro da minha cabeça começam a trabalhar e puft. Uma ideia maravilhosa.
— Vamos almoçar? — perguntei, torcendo para uma resposta positiva.
— Claro. — ele me responde sem ter coragem de olhar nos meus olhos.
Recolhemos os nossos pertences, peguei a coleira do Thor e seguimos pela orla. O Santino é um pouco mais alto que eu, então, preciso olhar para cima, apesar dele quase não manter contato visual comigo. Seguimos parte do caminho em silêncio. Eu não me importava de falar bastante, eu sou o campeão em conversação. Só que algumas vezes, besteiras saem da minha boca, como por exemplo:
— Você sua bastante, né? — questionei ao ver Santino limpando o suor de sua testa.
— Sim. Esse calor é horrível.
— Sabia que as solas dos nossos pés também transpiram? Você deve produzir muito suor nos pés.
— Er... — soltou Santino guardando o lenço e ficando quieto.
Ótimo, babaca! Nota 10. Que merda. Soltei um riso nervoso e mudei de assunto. Contei para o Santino que almoçaríamos no restaurante da tia Luciana. Ela é uma cozinheira de mão cheia e tenho certeza que o cardápio dela salvaria o meu encontro informal. Bem, na minha cabeça de vento, o Santino e eu estávamos em um encontro. Era engraçado pensar isso, ainda mais quando ele estava alheio dos meus pensamentos obscuros.
O Santino é solar. Um raio de luz que pode ser visto a milhares de quilômetros. Mas, naquele momento, ele não estava sendo 100%. Será que eu estava sendo invasivo demais? Sempre namorei caras gordinhos, por isso, sei que muitos podem ser introvertidos. Nos meus 'divertidamentes', mil perguntas se formavam, porém, tentava controlar o "Kleber questionador" e falava mais sobre meus gostos.
Depois de um tempo caminhando e conversando, chegamos no restaurante "Cozinha da Dê". O nome é em homenagem a vovó Deuza. Logo na entrada, o Santino esbarrou com a minha mãe. É estranho apresentar o futuro namorado para a sua mãe no primeiro encontro não oficial? Acho que não.
Apresentei os dois e para minha surpresa eles já se conheciam. Eita, destino, devagar. Eu sempre esqueço que o Santino conheceu a mamãe e o Thor no aeroporto. Fazemos os nossos pedidos e ficamos conversando. Eu me considero um cara tímido, mas quando conheço alguém de fato, mesmo que em um período curto de tempo, acabo contando detalhes demais sobre minha vida.
Detalhes da minha vida que contei para o Santino nas últimas horas:
- O joelho que quebrei;
- Que a mamãe trabalha como gari;
- O tempo que perdi em uma luta de judô;
- A pulga gigante que cresceu na orelha do Thor;
- O dia que a mamãe conheceu o Thiaguinho e desmaiou;
- Quando chorei no dia em que reprovei no exame da carteira A;
- A vez que exibi filmes eróticos no telão da escola;
Minha boca é uma metralhadora. Não consigo parar. Claro que escondi alguns detalhes, não por vergonha, só achei irrelevante. Como, por exemplo, a vez que explodi uma bomba caseira no banheiro da escola. O Santino escutava as histórias com atenção, seus olhos quase não piscavam.
Estou sentado de frente para o Santino. As mesas no restaurante não são tão grandes, então, os nossos pés acabam encostando uns nos outros. Ele tem areia nos pés, sinto os grãos quando, acidentalmente, estiquei os meus pés para frente. O meu coração acelerou e as palmas das minhas mãos começaram a suar.
— Você não é de falar muito, né? — perguntei, tentando disfarçar o nervosismo.
— Hum. — ele murmura, arrumando o cabeço que cai perto dos seus olhos.
Monossilábico. Não gosto de pessoas monossilábicas, mas com ele é diferente. Sei que existe algo ali que o impede de ser o Santino solar. Eu não ligo se precisar inventar mil conversas para ter com ele. Gosto de observar os detalhes, como a boca rosada e os cabelos molhados de suor que caem constantemente em seus olhos.
Em uma das minhas asneiras momentâneas, citei meu ex-namorado. A reação do Santino me causou estranheza. Perguntei se ele era homofóbico. Afinal, queria saber em qual terreno estava pisando. Da forma mais fofa possível, ele confirmou que era gay também. Caramba, como ele pode mexer com meus sentimentos?
Após o almoço e um pequeno contra tempo com o dinheiro do Santino, seguimos para a praia. Algumas garotas chamaram por mim, no calor do momento, peguei na mão direita do Santino e levantei. Elas deram risadas e nos desejaram sorte. Uma delas disse que éramos fofos juntos.
Pedi desculpa pela forma como agi e, aparentemente, o Santino levou na boa também. Tirei a blusa e demorei para convencê-lo a tomar banho comigo no mar. Ele estava relutante em ficar sem camisa na praia. Depois de uma conversa motivacional e muita perseverança consegui levar o Santino para o mar.
Cara. Que cena maravilhosa. Eu amo caras gordos, eles me excitam de um jeito único. Nunca entendi o motivo, mas também não reclamo, afinal, os gordinhos são mais carinhosos e afetuosos. O Santino era lindo demais. Sua pele estava vermelha devido ao sol, as sardinhas nos seus ombros se destacavam. Os pelos de seu corpo eram clarinhos. Tive que lutar contra minha natureza masculina e corri para a água.
Nossa. Não existe sensação melhor que o mar gelado em contato com a nossa pele quente. Procurei uma forma de esquecer o show do Santino, não quero assustar o garoto. Emergi, no melhor estilo "Pequena Sereia" e o encontrei tendo dificuldades em entrar na água. Uma onda acabou o derrubando e ele aproveitou para mergulhar.
— Desequilibrei. — essa é a primeira coisa que ele diz ao emergir.
— Não precisa ter medo. Estou aqui. — falei como se estivesse em um filme e fosse o galã da história.
— Hum. — ele soltou novamente, mas dessa vez, não consigo decifrar.
— Sou um pouco menor que você, mas tenho força. — disse mostrando os músculos que cultivei durante os anos.
Para, Kleber. Puta merda. Como consigo falar tanta besteira? O Santino molhado é uma tentação. Seus cabelos são grandes e pretos na altura do pescoço. Por causa da água, eles ficam maiores, ele tem dificuldade para tira-los do rosto. Dou uma forcinha, afinal, tocar naqueles cabelos é uma delicia.
Comecei a nadar em volta dele. Quero muito beija-lo. Sua boca está vermelha. Quem tem uma boca tão vermelha assim? Minha vontade é de passar horas o beijando. Ele ficou de joelhos na areia, apenas observando o movimento das pessoas na praia. Me aproximei, como um predador prestes a abater sua caça e dei um beijo, na bochecha, porém, um belo beijo.
— Beijo salgado. — brinquei, me afastando para evitar que o Santino veja a alegria que se formou na minha sunga.
Cansamos e seguimos para a praia. Por sorte, conseguimos um dos guarda-sóis para descansarmos. Peguei a toalha e passei nos meus cabelos que estão mais curtos. No último ano novo, tentei ficar loiro, porém, só queimei meu couro cabeludo. Uma péssima experiência. Não recomendo para ninguém.
O Santino estava sentado na cadeira, vestiu a camisa no estilo havaiano, chamei assim, pois, tem várias flores coloridas. Infelizmente, os idiotas da escola dele apareceram novamente. Busquei o Kleber zen que morava em alguma parte do meu coração, entretanto, ele não estava disponível. Chamaram o Santino de Saturno. Me apelidaram de vira-latas. Quase soquei a cara deles.
Queria proteger o Santino de qualquer forma. Aqueles valentões não poderiam sair daquela impunes. Depois de um tempo, os babacas foram embora. O coitado do Santino tremia, não sei se de raiva ou medo. Agachei na frente dele, peguei em suas mãos e falei que estava tudo bem.
— Acho que eu quero ir embora. — falou Santino pegando a mochila.
— Espera. Você pode passar seu what'sApp? — perguntei de supetão.
— Uso telegram. Não confio no What'sApp. — ele respondeu pegando o celular e mostrando o aplicativo.
— @kleberviana. — disse pegando o celular e achando o meu nick. — Vou mandar um oi. Quero garantir que vou ter o seu contato.
— Hum. — ele murmurou balançando a cabeça em consentimento.
— Quer que eu te leve?
— Não precisa. Eles seguiram para o outro lado.
Bem. Pelo menos, consegui o telegram dele, já é um começo. Problemas de confiança, hein? Sabia que existiam outras camadas ali. Voltei para casa correndo, queria queimar toda aquela ansiedade. Será que eu mandava a primeira mensagem? Não queria parecer desesperado, entretanto, também não podia soar indiferente.
Minha família estava jantando, o prato da noite? Bobó de camarão. Que delicia. Os sabores do Ceará são tão únicos, repeti mais duas vezes. No chuveiro, pensei bastante no Santino. Lembrei do sorriso, nos cabelos caindo em seus olhos, naquelas bochechas rosadas, no beijo roubado. Estar apaixonado pode ser divertido e assustador.
Entrei no quarto e a mamãe conversava com o Elias, um de seus pretendentes. Eles trabalhavam juntos e dividiam uma conta na Netflix, isso é quase um relacionamento sério. Deito, abro o telegram e fico olhando a foto do Santino. No perfil não tem número de celular, por um instante fico preocupado. E se ele me enganou?
— Filho. — a mamãe diz quase cantando, quando termina de conversar com Elias.
— Oi? — pergunto, sem tirar os olhos da foto do Santino.
— Quem era aquele garoto fofinho? Encontrou em um aplicativo de pegação?
— Mãe! O Santino é apenas um amigo. — tentei disfarçar, odeio quando a mamãe é intrometida.
— Amigo? Você quase engoliu o garoto com os olhos durante o almoço. — ela lembrou e não mentiu, o Santino era lindo demais.
— Dona Bruna, por favor, não viaja.
— Filho. Eu já conheço seus gostos para rapazes. Você prefere os ursões. — ela solta e depois dá uma risada alta.
— A senhora está proibida de usar a internet. — repreendi a Dona Bruna.
Cara, que dia maravilhoso. Estar com o Santino me fazia acreditar no amor de novo. Infelizmente, tive meus contratempos na área amorosa, algo que causou uma magoa enorme, e ainda assim, o coração ainda consegue palpitar novamente. É Santino Peixoto. Você está fazendo milhares.
No dia seguinte, acordei cedo como de costume. Fiquei deitado na cama por alguns minutos, tudo bem, fiquei admirando a foto do Santino no Telegram. A mamãe voltou a dormir, após o despertador a tirar de um sonho perfeito que envolvia o Brad Pitt. Pensei em mandar uma mensagem para o meu crush, entretanto, acredito que ele não seja uma pessoa que acorda às 5h30.
Tomei uma ducha caprichada. Escolhi roupas leves para caminhar, não estava afim de correr naquela manhã. O Thor adorava nossa rotina matinal. Ele abanava o rabo peludo sempre que me via com a guia nas mãos. Nunca entendi o motivo da mamãe ter um cachorro tão grande, mas com o tempo, o Thor virou o meu melhor amigo.
Lá fomos nós. O homem e seu melhor amigo, literalmente. Adorava absorver os primeiros raios de sol. Acho que na outra vida era uma planta. Sim, acredito em vidas passadas. Acho que tudo que fazemos está conectado com quem éramos antes. Segundo o budismo, a vida não acaba com a morte. Quando alguém morre, renasce outro ser vivo. Um verdadeiro ciclo da vida.
No calçadão, conversei com Thor sobre Santino. Sei, muito estranho, mas sou assim. A melhor vantagem é saber que ele nunca vai contar nenhum segredo meu. Como no majestoso dia que quebrei o vaso favorito da mamãe. Consegui repor a peça sem ser pego. A minha única testemunha é o Thor, ou seja, ótimo em guardar segredos.
— Ele é bonito, né? — perguntei para Thor, enquanto caminhávamos na orla. — Digo, ele é atraente. Aquelas covinhas ficam lindas demais. Fora que o jeito abobalhado dele, nossa, Thor. Você precisa ver. — Thor olhou e latiu para mim. — Acha que eu devo mandar uma mensagem? Eu vou mandar, né. São quase 8h.
***
Kleber S2:
Desculpa por ontem. Não devia ficar chateado. Esses teus colegas são ridículos.
***
— É uma boa maneira de começar uma conversa, Thor. — falei passando a mão esquerda nos pelos do Thor e fico surpreso com uma resposta rápida.
Tino:
Eu quem devia pedir desculpas. A gente teve uma tarde tão agradável. Tenho uma nova chance?
Kleber S2:
Quantas você precisar. Estou aqui para te defender e ajudar. Inclusive, quer dar uma volta hoje. A moto do meu primo está liberada.
***
A resposta é positiva! Caramba. Vou levar o Santino para passear. Tá, mas para onde? Abri o celular e pesquisei sobre as praias acessíveis da cidade. A Praia do Barro Preto pareceu o lugar adequado para levar o meu futuro marido. Ok, Kleber. Não viaja tanto.
No ano passado, o meu primo e eu, fomos lá. Nem preciso dizer que deu confusão, né? As nossas mães meio que nos forçaram, afinal, somos primos e devemos nos respeitar. Eu voltei para casa com um olho roxo e o meu primo com o braço torcido. Enfim, as minhas energias precisavam estar 100% focadas no Santino. Xô, primo homofóbico.
Cheguei em casa e preparei algumas comidas para levar. Pedi permissão da tia Luciana para lavar a moto, ela estava em um péssimo estado. Não queria chegar muito tarde, uma vez que, quando estamos perto de alguém que a gente gosta, o tempo passa rápido demais. Pilotei em direção ao posto de gasolina, consegui colocar R$ 20 e uns centavos de combustível.
Geralmente, sou um cara muito concentrado no trânsito, mas aquele encontro conseguiu mexer comigo. Eu sou esquentado, não vou mentir. Já me meti em muitas confusões por causa do meu temperamento. Não sei ver ninguém sofrendo injustiça, ainda mais alguém que eu gosto. Como já disse, e vou repetir durante toda essa história, o Santino traz à tona um Kleber protetor e eu amo isso.
Havia uma fila em frente ao resort, porém, não demorei a entrar e encontrei o Santino na entrada. Tão lindo. Aquele gordinho maravilhoso seria só meu por um dia inteiro. Ele vestia uma camiseta branca com um desenho do Timão e Pumba, bermuda preta e um chapéu estilo pescador. Eu, por outro lado, usava uma das minhas milhares de regatas e o short do Timão! Vai, Corinthians! Adorava roupas leves, ainda mais no calor infernal do Ceará.
— Preparado? — virei e bati três vezes no banco do carona.
Dei o capacete para ele usar. Nossa, quase dei um grito quando ele colocou. Ficou a coisa mais linda do universo. Externalizei meus pensamentos e o Santino ficou vermelho. Acho que ele não deve receber muitos elogios. Suas bochechas ficaram rosadas, deu vontade de apertar, mas controlei o "Kleber malvado".
Bati três vezes no banco, queria parecer descolado, mas acho que não funcionou. Então, pedi para o Santino subir na moto. De início, ele teve dificuldades, então, ajudei como pude. Precisei usar toda minha força com o pé esquerdo (ainda bem que não foi o danificado), não queria pagar um mico no primeiro encontro. Meu orgulho não me deixa passar vergonha e, pela primeira vez, funciona.
O silêncio do Santino é desafiador. Ele é do tipo de pessoa que observa, absorve e guarda. Peguei suas mãos e coloquei em volta da minha cintura. Elas estão geladas e tremulas. Com uma voz rouca, o Santino pediu para sairmos, algumas pessoas idiotas passavam e apontavam em nossa direção. Não pensei duas vezes, liguei a moto e pegamos a estrada.
Adoro a sensação do Santino me tocando. A mão dele é macia e gelada. O vento levantou a minha regata, e quase surto, quando suas mãos tocam diretamente a minha pele. De repente, o Santino começou a acariciar meu corpo, de forma sutil e leve. Tentei não me desconcentrar, apesar de estar amando aquele momento, ainda tinha a responsabilidade de leva-lo em segurança.
Queria que aquele passeio durasse para sempre, entretanto, a praia não ficava tão distante. Droga, se eu soubesse, o levaria para passear em Fortaleza. A brisa do mar nos atingiu assim que alcançamos o estacionamento. Parei na vaga para motos, ao estacionar, tenho dificuldade, porém, o Santino me ajuda. Maldita perna direita, sempre falhando no momento errado. Ok. Não arranhou meu orgulho.
— Não precisava. — falei tentando manter minha pose de macho alfa.
— Deixa de ser marrento. — ele retrucou ainda segurando na minha cintura, mas solta quando um grupo de garotas começam a rir.
— Enxeridas! — soltei revoltado com a intromissão.
Apresentei a praia do Barro Preto para o Santino. Então, o nervosismo começou a tomar conta do meu corpo. A metralhadora existente dentro da minha boca voltou a funcionar e soltei várias curiosidades sobre o local. Algumas coisas, pesquisei de antemão. Sou um garoto preparado para qualquer situação de risco, ainda mais envolvendo um crush tão gato.
Decidimos alugar um guarda-sol para nos protegermos do sol. Duh! Sou muito idiota, falei algo parecido para o Santino que soltou uma risada abafada. O calor ficou mais intenso, por esse motivo, tirei a camisa e a calça do Timão. Não sei o que se passa na cabeça do Santino, ele está usando óculos escuros, por tanto, ficou um pouco difícil de decifrar.
— Ei, Santino. Passa protetor solar em mim. — pedi, mas ele não esboçou reação nenhuma, então, estalei os dedos na direção dele e coloquei o protetor próximo ao meu rosto.
Se eu soubesse que isso iria acontecer voltaria no tempo e evitaria tanto constrangimento. Fiquei de costa para o Santino, agachado na areia, quando ele começou a passar o protetor solar nas minhas costas, cara, que toque gostoso. Foi um sentimento inexplicável, como se eu estivesse sendo levado para o céu. Uma sensação de prazer invade meu corpo, literalmente.
As mãos mágicas do Santino me fazem ter uma ereção. O meu coração começou a palpitar mais que o normal. Geralmente, sou um cara mais controlado, juro. Acho que é a primeira vez que tenho uma reação tão espontânea. Tentei cobrir o Kleber Júnior com as mãos, mas o que estava ruim ficou pior.
Pedi que o Santino pegasse minha toalha e, em um movimento rápido, cobri o estrago, quer dizer, o culpado. Ele percebeu o motivo da minha agonia e virou o rosto de uma vez. Que vergonha. Sentei com as pernas cruzadas, completamente, constrangido.
— Não sei o que aconteceu...
— Ei, relaxa. Tá tudo bem. Não é uma coisa de outro mundo. — Santino tentou me tranquilizar, mas estava envergonhado também.
À tarde seguiu sem acidentes. Foi até bastante divertida. O Santino não precisava fazer muita coisa para me deixar feliz. Só o fato dele ouvir minhas baboseiras e rir comigo, e não de mim, já era o suficiente. Decidimos dar um mergulho para espantar o calor.
De início, o Santino é resistente, porém, o Kleber aqui tem um poder de persuasão surpreendente. Sim, não sou apenas um rostinho bonito. Tenho muitas qualidades guardadas, por favor, se prepare Santino Peixoto.
Apostamos uma corrida até o mar, o Santino quase tem um choque térmico, realmente, a água estava fria. Nadamos um pouco para acostumarmos com a temperatura. Fiquei hipnotizado com a beleza dele. Os cabelos do Santino são pretos, mas com um leve tom azulado. Por causa da água, eles ficavam caindo em seus olhos.
As ondas nos aproximaram várias vezes, quero pular naquele corpo e beijar todos os lugares, entretanto, o receio de levar um toco falou mais alto. Outra onda nos aproximou, então, aproveitei para tomar uma atitude extrema: abracei o Santino e passo as pernas em volta da sua cintura.
Nossos rostos ficaram coladinhos. Os lábios dele estavam tremendo. Perguntei se podia beija-lo, ele balançou a cabeça e soltou o seu famoso "Hum". Entendi aquilo como um sim. Primeiro, toquei em suas bochechas, elas estavam tremendo. Caramba. Aproximei meu rosto e nossos lábios se tocaram. Nunca dei um beijo tão gostoso. Nossos lábios se encaixavam como duas engrenagens.
Estávamos ofegantes. Nossos corações batiam em perfeita sincronia. Nem ligávamos para os banhistas que estavam perto. Senti o forte gosto do mar na boca dele, mas a textura daqueles lábios me ganharam. Fiquei completamente rendido pelo gordinho tímido.
Não consegui controlar a força do beijo, o Kleber Júnior ficou feliz e perto demais do Santino, que conseguiu se desvencilhar. Droga, Kleber. Acabei pedindo desculpa pelo excesso. Para a minha surpresa, o Santino ficou envergonhado e mergulhou.
Foi nesse momento. Essa atitude que definiu o grau de amor que estava sentindo pelo Santino. Posso ser apressado? Posso. Impulsivo? Também. Porém, eu sentia uma necessidade de proteger aquele garoto de todas as formas possíveis. Queria ele para mim, e eu também queria ser dele.
— Você podia ser menos adorável. — pedi passando a mão direita no cabeça dele e arrumando os fios que estavam fora do lugar.
— Desculpa. Eu não sou acostumado com essas coisas.
Aquelas palavras me atingiram como um trem bala. Como assim? O Santino era o cara mais lindo, fofo e gentil do universo. Ele mais do que ninguém deveria sentir o amor na sua forma mais plena. Para tentar anima-lo, falei que aquele tinha sido o melhor beijo que ganhei. E, juro, não menti.
Aquele dia foi perfeito. Não queria que acabasse. Sentamos na areia para assistir ao pôr do sol. Os raios alaranjados foram ganhando forças e ricochetearam no mar. Eu queria pegar na mão dele, deixar aquele clima mais romântico, mas, ao invés disso, fiquei reclamando do sal no meu cabelo.
— O mar pode ser tempestuoso, mas, em alguns momentos, traz tanta paz, né? — ele perguntou olhando em direção ao oceano.
— Sim. — respondi, pensando em alguma coisa bonita para falar.
Poucas pessoas na praia, aquele vento gostoso nos refrescando, o clima perfeito. O Santino deve ter ficado chateado e resolveu dar o primeiro passo. Ele encostou a cabeça no meu ombro. Nem preciso dizer que fiquei arrepiado da cabeça aos pés. Será que aquela era a forma dele dizer que confiava em mim? Me rendi ao momento. Não queria mais pensar em nada.
À noite caiu e decidimos voltar para o resort. Uma viagem tranquila e fria, ainda bem que o meu ursão me aqueceu no caminho. Ele gostou de acariciar minha barriga, e eu também, claro. Essa é a melhor parte de pilotar uma moto, os corpos das pessoas se encontram a todo momento. Cara, que dia perfeito.
Chegamos ao resort e percebemos uma movimentação diferenciada. Muitos adolescentes arrumados, pareciam ir para alguma festa havaiana. Santino explicou que aquela noite aconteceria a última festa de sua escola. Então, ele perguntou se eu poderia ser o seu par no baile.
Precisei segurar a emoção. Não queria parecer uma garotinha emocionada. Antes de responder, fiz um charme, falei que não tinha uma roupa, entretanto, o meu crush me acalmou e afirmou que a temática era sobre o Havaí. Então, poderia usar roupas confortáveis e com uma pegada tropical. Nos despedimos, e eu continuei todo bobão por causa do convite.
Cheguei em casa e minha família estava bebendo. O assunto à mesa era o meu novo namorado. Tive sorte de ter pessoas tão receptivas na minha vida, quer dizer, tirando o primo homofóbico. Contei a novidade para a mamãe, que não escondeu a alegria. Devido aos meus estudos e trabalhos de meio período, além das atividades esportivas, não gostava muito de sair.
— Meu amor, tenho a roupa perfeita. — afirmou minha tia, deixando a bebida na mesa e indo em direção ao seu quarto.
— Pena que não posso te ensinar uns passos de dança. — brincou meu tio que riu e mostrou a mão enfaixada.
— Tudo bem, tio. Eu confio nos meus movimentos.
De repente, o meu encontro com o Santino virou assunto principal. A mamãe pediu para tomar cuidado e usar preservativos. Ela pegou uma cartela que estava em sua bolsa e entregou na minha mão. A tia Luciana entregou algumas roupas que eram do meu primo. Ah, se ele soubesse que o gay da família usaria suas roupas.
Escolhi uma blusa de botões azul com desenhos de abacaxi. Ficaria perfeita junto a minha bermuda branca e o all star branco que tanto amo. O tio Cláudio me emprestou um chapéu panamá, que de acordo com ele, foi criado na equador. Corri para tomar banho e ficar apresentável para o Santino.
Nunca fiquei tão nervoso na vida. Na real, estudei em uma escola pública e supletivo, logo, não tivemos um baile de formatura ou uma viagem super cara. Tive que viajar centenas de quilômetros para participar de uma formatura do ensino médio. Olhei no espelho e tudo parecia certo. Passei um pouco de perfume no pescoço e pulsos. Sério, eu estava muito gatão.
Desci e todos me aguardavam na sala. Tirei fotos, vídeos e até boomerang. Parecia uma debutante, a mamãe é a que mais falava. Sempre pedindo para ter cuidado, não arrumar confusão com os granfinos e usar proteção. Aff, a Dona Bruna sabe extrapolar na vergonha alheia.
Caramba, o nervosismo só crescia. A medida que a moto se aproximava do resort, o meu coração palpitava mais e mais forte. Estacionei e pensei em ligar para o Santino, mas lembrei que não tinha o número dele. Mandei uma mensagem para o Telegram. Vi uma movimentação no pátio e segui para lá.
Fiquei chocado com a decoração, pois, tudo remetia ao Havaí. Quatro garotas vestidas com saias de palha, sutiã de coco e flores no cabelo, entregavam colares para os alunos. De repente, um dos garotos que praticava bullying contra o Santino se aproximou e colocou um colar rosa em mim.
— Puxa. O Santino convidou mesmo o garoto de programa! — ele, praticamente, gritou e chamou a atenção de todos.
— Cara, eu não quero confusão. Você está bêbado e a festa mal começou. — tentei levar a situação da melhor maneira.
— Renan. Chega. — pediu uma moça loira que se apresentou como Emilly. — Desculpa, moço. Ninguém tem nada a ver com a sua profissão.
— Olha. — respirei fundo para pensar na melhor resposta possível. — Eu não sou garoto de programa. Sou um amigo do Santino e...
— Vish. Você está esperando o Santino? Acho que perdeu o seu tempo, viu. Ei, michê. O Santino está no quarto do Sérgio. — disse Renan, segurando em meu ombro e fingindo uma tristeza.
— Ele ainda está lá? — perguntou Emilly parecendo surpresa. — Acho que estão se preparando para viajar. O velório é amanhã.
— Estão nada. — Renan gargalhou e assustou todos. — O Sérgio está comendo o gordo.
— Impossível. — interveio Emilly. — O Sérgio e o Saturno?
Ainda em risos, Renan, tirou o celular do bolso e nos mostrou uma foto de Santino e Sérgio deitados na cama. O meu coração parecia estar se quebrando em mil pedacinhos, não queria ficar mais ali. Só que o Renan envolveu os braços no meu pescoço e me levou na direção do salão de festas.
Eu não podia acreditar. O Santino mentiu para mim. O que aquela cena significava? Como ele podia se entregar para a pessoa que mais lhe causou dor e sofrimento. Sim, esse era para ser o encerramento de um dia perfeito, só que eu não estou em uma comédia romântica, né?
A vida como sempre pegando suas peças, e eu como o idiota que sou tentei dar uma chance ao amor, entretanto, nasci para ser só. Pelo menos, agora sei quem o Santino é de verdade. Babaca. Escroto. Idiota.
— Cara! Vamos aproveitar a festa! — gritou Renan me entregando um copo de caipirinha.
— Verdade, amigo. Você é muito mais bonito que o Saturno. Vamos aproveitar!!! — emendou Emilly tascando um beijo na minha boca.
Quer saber, Santino? Vai se lascar. Eu vou curtir a vida. Sofri tanto para tentar encontrar alguém legal e o que ganhei? Só decepção. Aproveitei a bebida gratuita e os colegas que fiz. Sem dor, coração partido e lágrimas. Apenas dancei e bebi.