Olá, esse é meu primeiro conto aqui. Ainda estou tentando escrever sobre o que aconteceu nesses últimos meses. Tenho 23 anos e tudo relatado aqui aconteceram nos últimos meses (em sua maior parte ainda tinha 22 anos). Espero que vocês gostem. :-)
Em 2005, ainda com 6 para 7 anos, entrei numa escola de ensino fundamental no interior de Minas Gerais, na 1ª série, hoje chamada de 2º ano. A maioria dos meus colegas de turma vinham de uma mesma escola de educação infantil, mas eu era o único que vinha de uma outra escola e não conhecia ninguém. Aos poucos fui me aproximando dos coleguinhas, mas desde aquela época percebi que meu lugar não era com os meninos que iam jogar futebol durante o intervalo. Um deles em especial, Rodrigo, chamou minha atenção desde pequeno. Sem entender bem o que era atração, eu achava que tinha inveja dele. Eu gostava do cabelo dele, dos olhos dele, das bochechas dele e de como todo mundo gostava dele. Achava que queria ser ele, mas estava errado.
Aos poucos, fui despontando como o aluno mais inteligente da sala. Ele não ficava muito atrás e, conforme os anos iam passando, eu ia assimilando que o que eu sentia por ele não era inveja, era atração, ao passo que reprimia esse sentimento com força, afinal, estudávamos em um colégio católico e eu era criado com pais católicos. Ele me procurava apenas para os trabalhos em grupo, pois acreditava que eu seria uma opção mais produtiva de trabalho que seus amigos que não tinham o mesmo desempenho acadêmico dele. Nessa época, nossa relação não passou muito disso.
Em 2011, o último ano em que estudamos juntos, as coisas mudaram rapidamente. Logo no primeiro mês de aula, a entrada de Mirela na turma bagunçou as coisas. A nova garota popular loira, bronzeada e de olhos claros rapidamente se interessou por Rodrigo e em menos de um mês eles estavam namorando. A situação era um pouco constrangedora, contudo. Apesar deles sempre serem vistos juntos, aos poucos as pessoas começaram a reparar que era sempre Mirela quem dava as mãos e tomava a iniciativa e, por mais de uma vez, reparei que Rodrigo tinha o hábito de entrar no banheiro no início do intervalo e só sair no fim do intervalo e a situação ficou clara para mim: ele fazia isso para fugir dela. Em algum tempo, rumores sobre a sexualidade dele começaram a pipocar e, embora o padrão de evitá-la acontecesse, a conclusão natural era de que os fundamentos dos rumores eram puramente na inveja do garoto que conseguiu a menina mais bonita. Durante o resto do ano, a situação permaneceu na mesma e ao fim do ano letivo, ambos se mudaram para outra escola.
Não vi Rodrigo pela maior parte de 2012. Dei de cara com ele, na capital do estado, em um processo seletivo para estudar em um dos melhores colégios do Brasil em meados de setembro. Ele também faria a prova e veio conversar comigo após a aplicação querendo comparar as respostas. Após algum tempo a lista de convocados saiu. Eu tinha passado e ele não.
Ele foi cursar o ensino médio em um colégio de uma cidade maior que a que vivíamos, enquanto eu fui para a capital. Não conversamos, não mantivemos contato. Quando, no terceiro ano do ensino médio, em 2015, eu comecei a assumir para algumas pessoas próximas a minha sexualidade, a pergunta do primeiro crush começou a pipocar e a imagem dele passava na minha cabeça. Era algo tão sutil e tão raro quea existência dele mal era lembrada.
Em 2016, fui cursar faculdade em uma universidade estadual no estado de São Paulo enquanto ele ficou um ano no cursinho se preparando para a faculdade de medicina que ele entraria no ano seguinte. Não nos vimos no decorrer dos últimos cinco anos.
Até que em meados de outubro de 2020, eu estava no supermercado e dei de cara com ele. Máscaras tampavam o rosto mas eu reconheci ele no momento que ele apareceu no corredor. Seus cabelos dourados caíam na altura das maçãs do rosto, abrindo espaço para seus olhos marcantes de cor parecida com seus cabelos e as maçãs do rosto bem definidas apareciam parcialmente antes que sua máscara cobrisse o resto. Rodrigo sempre teve bochechas fartas e rosadas, em contraste com seu corpo magro e pálido. Ele me cumprimentou e tivemos um daqueles papos em que mesmo que se fale, nada é dito. Por fim, enquanto meus pais levavam o carrinho até o caixa, fui ao banheiro do supermercado.
Embora fosse um banheiro razoavelmente grande, só tinha eu ali. Fui em direção a um mictório, pois, devido a pandemia, não queria ter que encostar em mais coisas do que gostaria. Não tinha percebido que havia uma chave no banheiro até que eu escutei a porta se trancando. Da posição que eu estava não conseguia ver a porta do banheiro, mesmo que me virasse. Imaginei que fosse algum funcionário e estava preparado para ter que bater na porta até alguém escutar e abrir para mim, mas terminaria de urinar primeiro.
Quando me virei, dei de cara com ele. Ele estava a aproximadamente um metro de distância de mim e seus olhos penetraram os meus. Ele não estava mais usando máscara. Suas bochechas permaneciam as mesmas que eu cresci vendo, invejando e sonhando. A única coisa que tinha mudado era o contorno de sua mandíbula, que agora dava a ele uma expressão de adulto. Naquele momento, os anos de distância não significaram nada, meu coração acelerou e era meu primeiro crush de novo. Eu não entendia a situação, mas a atmosfera o tornava irresistível. Eu congelei, não disse nada, não pisquei. Fiquei encarando os olhos dele. Ele deu um passo para frente, retirou minha máscara e me beijou.
Meu tempo de reação foi lento e eu demorei alguns segundos para levantar os meus braços e colocá-los em suas costas, mas ele já fazia isso, me puxando com força contra o corpo dele. Nossas línguas se entrelaçaram, brigando com força e sorri mentalmente ao perceber que seu hálito tinha sabor de morango. O beijo podia ter durado segundos ou horas, eu não saberia dizer. Então ele se afastou, desviou o olhar para o chão, se virou, arrumou rapidamente sua camisa e foi embora.
Novamente meu tempo de reação foi lento. Descobri que minha máscara estava caída no chão. Não queria usá-la mas não podia retornar ao saguão do supermercado sem ela. Peguei-a e fui em direção ao lavatório, confuso se o que tinha acabado de acontecer não tinha sido um sonho acordado muito real, mas eu sabia que não tinha sido. Me encarei no espelho: os cabelos castanhos desarrumados, as olheiras fundas ao redor dos olhos castanhos, o rosto quase tão pálido quanto o do garoto que de forma surpreendente tinha acabado de me beijar, contrastando dele pela mandíbula não definida, bochechas menos fartas e pela presença de uma barba cheia. Passei uma água no rosto e saí, torcendo por pelo menos mais uma troca de olhares, mas não o vi em lugar nenhum. Quando voltei, meus pais ainda não tinham terminado de passar pelo caixa e, dado o tamanho original da fila, deduzi que não tinham se passado mais que 5 minutos. Quando chegamos ao estacionamento vi o carro que meu pai disse ser do pai dele saindo para a rua.
Ao chegar em casa, fui procurá-lo nas redes sociais apenas para perceber que ele tinha me bloqueado em todas elas. Ok, isso era prova suficiente de que algo real tinha acontecido, mas era frustrante demais porque agora eu não conseguia tirá-lo da minha cabeça. Até que semanas depois, nas vésperas do natal, recebi a seguinte mensagem: "Não devia estar fazendo isso, mas não consegui parar de pensar no que aconteceu no supermercado. Foi errado demais, mas certo demais. Eu culpo você, mas preciso falar com você." e continuava dando instruções para um encontro. Senti medo, mas independentemente de quando aquilo pudesse ser arriscado, comecei a me preparar emocionalmente para vê-lo em dois dias.