Capítulo 9
Patrick despertou sorrindo, sentindo o seu rosto ser beijado por Matheus.
Uma bandeija de café da manhã estava ao seu lado na cama. Nela havia um prato com mamão picado em cubos, um prato com ovos mexidos, uma fatia de pão de forma integral e uma xícara de café esfumaçante.
Espreguiçou-se e sorriu, devolvendo o beijo no rosto de Matheus.
_ Olha só! O meu amorzinho me mimando com café da manhã na cama. Que bicha sortuda sou eu._ disse acariciando o rosto de Matheus.
_ É uma forma de te dar boas vindas no seu novo lar.
Eles chegaram na casa de Renata na noite anterior.
Após chegar do trabalho, mesmo cansado, Matheus ajudou Patrick a finalizar a arrumação das malas. A mobília do quarto iria no dia seguinte. Matheus a buscaria com a ajuda do tio e de Tonhão da Van, a quem contratou para fazer o transporte dos móveis.
Ele entregou as chaves do apartamento na semana seguinte, quando havia conseguido vender o último móvel da casa.
Para que Patrick tivesse um pouco de conforto, Renata cedeu o seu quarto para o casal passar a primeira noite e ela dormiu na cama de solteiro que era de Bruno, quando morava na casa.
Ela estava muito feliz com o retorno do seu filho.
Para a recepção do casal, Renata preparou uma lasanha à bolonhesa para o jantar.
Arrumou o quarto para oferecer um clima romântico ao casal, com pétalas de rosas vermelhas espalhadas pela cama outras formando as palavras "Bem-vindos".
Patrick se sentiu muito feliz com a recepção da sogra. O abraço caloroso e as palavras amáveis que recebeu de Renata o fez sentir um carinho familiar que nunca teve do pai.
Tentou conter as emoções, mas foi traído pelas próprias lágrimas.
_ Eu te amo muito pelo bem que você faz ao meu filho e o amor que dedica a ele. Eu quero retribuir tudo isso para você da melhor forma que eu puder.
"Eu sei que você detesta que eu ajude vocês, mas eu não faço por intromissão. Eu não quero ser invasiva. Esse só é o meu jeito de demonstrar amor. E, no que depender de mim, você será muito feliz nesta casa."
As boas emoções impediam de Patrick expressar a sua gratidão com palavras e a fez por meio de um abraço que deu na sogra.
Soluçava em prantos, sentindo-se amado e acolhido pelo marido e pela sogra.
Foi inevitável não se recordar de sua mãe, que falecera quando ele tinha apenas 8 anos de idade.
Ele não tinha na memória nenhuma imagem nítida do seu rosto, já que o seu pai se livrara das fotografias.
Recordava-se do cheiro maternal, do abraço acolhedor, da tranquilidade que sentia ao ouvir a sua voz cantando enquanto estendia roupas no varal.
Em sonhos, via a mulher de longos cabelos castanhos escuros, magra e muito pálida. Vestindo um vestido azul celeste, um avental branco e um lenço sobre os cabelos.
Por muitas vezes, temia que ela fosse fruto de sua imaginação. Mas, graças aos parentes que falavam sobre Luíza, ele sabia que ela foi real.
Luíza nasceu no interior do Ceará e veio para o Rio de Janeiro em busca de trabalho. Conheceu Paulo Cézar com quem se casou e deu a luz a Patrick alguns meses depois do casamento.
A mulher e o filho passaram por momentos dolorosos ao lado do homem mulherengo e violento.
Ela faleceu oito anos depois do nascimento do filho, vítima de um tumor cerebral.
Dois meses depois da morte de Luíza, Paulo Cézar levou a sua amante para viver na casa.
A mulher não tinha paciência com crianças e Paulo ganhou companhia para agredir o filho, que também passou a servir de empregada doméstica não remunerada para o casal.
Muitas vezes, presenciou brigas intensas do casal com agressões físicas e ameaças de facadas, como também cenas eróticas, já que o casal não tinha nenhum pudor em transar pelos cômodos da casa, o que deixava Patrick extremamente desconfortável.
_ Eu vou buscar a mobília do quarto com o meu tio. E hoje mesmo nós vamos montar e poderemos dormir no nosso quarto.
_ Você vai demorar muito?
_ Não, não! Só vou pegar os móveis e voltar para a casa. A minha mãe vai dar um churrasco de boas vindas para nós.
_ Ela vai convidar muita gente? _ Patrick perguntou receoso. Não gostava da maneira penosa como as pessoas o olhavam.
_ Não se preocupe, que não haverá nenhum vizinho fofoqueiro. Só a família mesmo.
_ Ufa! Eu fico muito mais aliviado. Com a sua família eu me sinto seguro. Ninguém me trata como se eu fosse um coitado.
Matheus sorriu e acariciou o seu rosto.
_ Todo mundo te adora. Aliás, é impossível não te adorar.
_ Se continuar me bajulando assim, daqui a pouco, vão te chamar de patrickminion.
_ Que chamem! Eu sou gado mesmo.
Matheus o beijou.
Segurando a face do amado disse:
_ Sou gado do amor da minha vida!
_ Ah, pare de ser fofo, meu bebê!
Desta vez, foi Patrick que o beijou. Ambos os olharem brilharam e os corações se aqueceram do amor que emanavam um para o outro.
Matheus deitou a cabeça no colo de Patrick, e esse acariciou os seus cabelos, entrelaçando entre os seus dedos magros e compridos.
_ Você é muito privilegiado. Ser gay e ter uma família que não te rejeita é algo muito bom. Eles não te toleram e nem têm vergonha de ti. Eles te amam! Nos tratam com a mesma normalidade que tratam outros casais héteros.
"Eu queria muito ter uma família assim. Queria muito que o meu pai me aceitasse e me amasse como a Renata te aceita e te ama. Neste momento tão difícil, que estou passando um amor paternal seria muito bom."
Matheus segurou a mão de Patrick e a beijou.
_ Amor, o que define o amor familiar não são apenas os laços sanguíneos e sim, uma série de sentimentos como: amor, respeito, afetos e cumplicidades.
"Veja, a Marília não é a minha avó biológica e isso não a impede de ser a minha avó. A tia Rose era apenas a esposa do tio Gustavo e é um amor de pessoa comigo. Já o Bruno que é meu primo legítimo é uma cobra venenosa, que não vale porra nenhuma.
"Por mais, que você não tenha o sangue da minha família, ela também é sua família. Todos vocês se amam e é isso que importa."
_ Obrigado, amor. Obrigado por tudo que está fazendo por mim.
Matheus conversou com a mãe a respeito da carência afetiva que Patrick tinha de um amor familiar.
Renata o aconselhou a procurar Paulo Cézar, propondo um encontro entre pai e filho.
_ Eu não acho uma boa ideia, mãe! Aquele homem é um imbecil homofóbico. O idiota agrediu o Patrick e o expulsou de casa. Nunca o procurou para saber se estava bem ou mal. O melhor para o Patrick é manter a distância daquele verme.
_ Matheus, pai é pai! E o amor paternal está está fazendo falta para o Patrick.
_ Amor esse que ele nunca recebeu do pai.
_ Mas, o cara não sabe que o filho sofreu um atentado e está paraplégico. Creio que quando souber, possa se arrepender e fazer as pazes com o filho.
_ Gente assim nunca se arrepende. O veneno da homofobia faz parte da personalidade deles.
_ Não é bem assim. As pessoas podem mudar.
Matheus ficou muito resistente à proposta da mãe. Não achava adequado que Patrick tivesse contato com um homem tão tóxico.
Contudo, ela o convenceu alegando que essa reaproximação poderia fazer bem a Patrick. E pelo bem estar do marido, Matheus era capaz de passar por cima dos próprios orgulhos.
Pediu a Cinthia que o fornecesse o endereço de Paulo Cézar.
A mulher também se mostrou contra a essa aproximação, compartilhando da mesma opinião que Matheus sobre o pai de Patrick, mas acabou cedendo.
Além de informar o endereço, ela fez questão de ir junto com ele.
Os latidos agitados do cão caramelo anunciava que havia visitas de estranhos.
Por trás dos portões de grades, Cinthia e Matheus puderam ver um homem de meia idade, baixa estatura, pele bronzeada, um barba cumprida e uma careca lustrosa. Paulo Cézar tinha o rosto emburrado e um olhar desconfiado.
Saiu em direção ao portão e disse com uma voz ríspida:
_ Eu não quero comprar nada e nem assinar nada!
_ Nós não somos vendedores. O senhor é Paulo Cézar?_ perguntou Matheus.
Paulo cruzou os braços e o olhou de um jeito desafiador.
_ Quem são vocês?
_ Eu sou Cinthia, amiga do Patrick, e esse é o Matheus, marido dele. Precisamos falar com o senhor sobre o seu filho.
Paulo lançou em Matheus um olhar de uma noite de tempestade.
_ Como ousa a vir até aqui? Fora!
_ Nós precisamos falar sobre o seu filho. Ele...
_ Eu já disse para cairem fora! Eu não quero saber daquele veado de merda!
Matheus conteve a raiva e firmou a voz.
_ Eu tenho notícias nada boas sobre o seu filho. Você vai me ouvir por bem ou eu vou ter que gritar para que os vizinhos todos ouçam?
_ Diga! Mas, seja breve!
_ Podemos entrar?_ perguntou Cinthia.
Paulo Cézar saiu para fora do portão
_ Digam aqui mesmo. A minha casa é um lugar decente. Não é para gente como vocês.
Cinthia e Matheus se olharam com raiva.
Matheus respirou fundo antes de narrar o ocorrido.
À medida que falava, percebia a frieza de Paulo Cézar, que não expressava nenhum sentimento de compaixão pelo filho.
_ E eu com isso? Não é você quem come o rabo dele? Então, arque com as consequências sozinho. De mim não terão um centavo.
Impaciente, Matheus gritou:
_ Eu não estou te pedindo dinheiro! Não preciso de um centavo sequer que venha do seu bolso! Eu só achei que você poderia ter algum tipo de solidariedade pelo seu filho, caralho!
_ Tudo na vida tem um preço. Ele escolheu dar a bunda. Se desenronrar como homem e jogar na lama o nome da família. Desobedeceu a Deus e teve que arcar com as consequências! Com deus não se brinca!
A ira possuiu Matheus de um jeito intenso. O ódio consumiu toda a sua capacidade de raciocínio, o fazendo partir com tudo para cima de Paulo Cézar.
Acertou o primeiro soco no rosto do homem, que devido ao impacto, caiu no chão.
Matheus subiu por cima e despejou muitos socos, depositando neles toda a sua ira.
Cinthia tentou tirá-lo de cima de Paulo Cézar, mas ela não tinha forças o suficiente para isso.
Matheus retomou a consciência quando foi afastado de Paulo Cézar por três homens fortes.
Ensanguentado, Paulo Cézar esbravejava palavrões e rogava pragas para o genro.
_ Bicha! Boiola de merda! Vocês todos deveriam morrer! Seres infernais! Não vejo a hora de Ricardo Policarpo chegar na presidência da república e acabar com esse veadagem no Brasil! Aí sim, vocês verão o que é bom pra tosse!
Muitas pessoas curiosas saíram de suas casas para presenciar a cena.
Cinthia segurava o ombro de Matheus, dizendo algumas palavras que ele não conseguia compreender.
Com a respiração ofegante, sentia o corpo cansado. Ao olhar os punhos, percebeu que estavam cobertos pelo sangue do homem que ofendera o seu grande amor.