Glitter (parte 1 de 4)

Um conto erótico de Jader Scrind
Categoria: Gay
Contém 2220 palavras
Data: 11/05/2021 13:35:32
Última revisão: 12/05/2021 08:40:42
Assuntos: Gay, Homossexual

GLITTER (parte 1 de 4)

Jeferson olhava da janela do saguão enquanto os carros subiam a serra lá fora, tão enfileiradinhos um no outro que pareciam formigas caminhando com folhinhas nos ombros e estacionavam no vasto jardim do hotel, porque as vagas do estacionamento já estavam cheias fazia tempo.

– Quantas pessoas ainda faltam chegar? – ele perguntou a uma moça que corria de um lado para o outro atarefada com a prancheta bem presa entre os peitos.

– Esses que estão chegando são os funcionários da filial do interior... os da capital já estão alojados no terceiro andar, faltam uns três ou quatro da filial do outro estado e já estarão todos aqui...

– Ótimo, ótimo – ele olhou o grande relógio ornamentado na parede do hotel colonial, marcando seus segundos com toda calma apesar daquela confusão de pessoas correndo de um lado para outro, procurando o check-in, cumprimentando colegas que não viam há tempos, alguns levaram a família para aquele fim de semana bancado pela empresa e agora crianças com boias nos braços se estabacavam na decoração chique procurando qual era a saída que levava a piscina. – Avise todo mundo que a cerimônia vai ser as 20:30, e não mais as 19:30.

Apesar de muito profissional, ela deixou escapar uma respiração pesada de alivio, como se Jeferson tivesse acabado de tirar uma anilha de 20 quilos dos seus ombros. teria tempo para por uma ordem naquela zorra toda.

– Claro, senhor. Com licença.

Quando ela se afastou, dois ou três colegas de Jeferson vieram cumprimentá-lo, e ele os respondeu com toda a educação do mundo, mas não conseguiu deixar de pensar que pelo menos dois deles nunca falavam com ele na empresa, e agora agiam como se fossem irmãos que dividiram o útero.

– Nem te reconheci com essa roupa casual, amigão – um deles falou depois de chacoalhar a mão de Jeferson tão forte que parecia querer ficar com o seu braço. – Todo dia aquele terno e gravata na empresa, né? Anda fazendo academia, meu irmão?

Meu irmão? Jeferson riu de leve. Ele teve coragem de falar “meu irmão”?

Respondeu com algumas banalidades e tratou de se dirigir para o elevador para não ter que lidar com gente assim por agora. Com certeza os que começaram a tratá-lo assim sem mais nem menos ficaram sabendo da novidade, uma empresa daquele tamanho nunca conseguia guardar adequadamente os seus segredos.

Aquela reunião toda informal no hotel chique nas serras era para, entre outras coisas, anunciar os homens que seriam promovidos a mesa diretora, e Jeferson era o único da filial da capital que subiria a esse cargo, mesmo que para isso tivesse que se mudar, porque seria o diretor responsável pela filial do interior.

E isso era o que mais o irritava, aqueles homens nem seriam seus subordinados, eles continuariam na filial da capital, mas mesmo assim ali estavam, bajulando-o, porque o puxa-saquismo é um hábito tão difícil de largar para eles que nem notavam o quanto estava sendo inútil naquele caso.

A porta do elevador se abriu e ficou feliz que ninguém entrou com ele na cabine, não ia aguentar manter aquele sorriso cordial por vários andares trancado numa cabine. E por isso apertou com pressa o botão do último andar, mas logo em seguida se arrependeu, porque quando a porta automática estava se fechando ele viu o cara que passou pela porta de entrada do hotel, e parecia magia, porque o cara também parecia te-lo visto, já que entrou olhando justamente na direção daquele elevador.

Foi um segundo, talvez menos que um segundo, e a porta de fechou de vez pondo o elevador em movimento, mas Jeferson tinha certeza de que era ele, só podia ser ele, e isso o deixou muito mas muito nervoso. Muito mais nervoso do que estava até aquele momento, e olha que ele teria que fazer um discurso de agradecimento na frente de todas aquelas pessoas dali a poucas horas. Mas sempre foi muito bom em lidar com o público e isso até ajudou na sua promoção, mas o nervosismo era outro. Era com aquele cara. Era com aquele homem.

O que ele fazia ali, não era possível que de todas as empresas do país ele trabalhava na mesma que o Jeferson, que espécie de coincidência filha da puta era aquela?

Jeferson olhou para a câmera de segurança do elevador, que o encarava com aquele único olho vermelho e piscante, e se manteve firme, ereto, com a aparência calma de sempre, mas agora era fingimento, ele sabia que sua mão estava tremendo de leve. Que seu coração estava acelerado, que seu corpo passava por uma ebolição.

Foram segundos naquele elevador, mas parecia uma eternidade e meia, ainda mais que naqueles poucos instantes ele conseguiu lembrar de tudo, toda aquela história que jurara certa vez que estaria enterrada no passado.

Virou de costas para conferir no espelho se estava tudo bem. Jeferson se mantinha impecável como sempre. Sempre foi experto em disfarçar o que passava por dentro de si mesmo. O cabelo continuava milimetricamente penteado, a barba desenhada a perfeição, e cerrada na altura certa, os braços tranquilos e apertados na camisa polo, além do peito estufado que parecia encher o tecido da camisa um pouco mais do que ela aguentaria, como se pudesse arrebentar a qualquer segundo, como se estivesse tão grudada ao seu corpo negro e musculoso que poderia ver o coração palpitando ali abaixo do peito, como um latejar que se fosse mesmo visível estragaria toda a sua atmosfera de homem forte e sério, inabalável.

Mas era impressão, esse tipo de coisa não acontecia, isso de poder ver o movimento do próprio coração saltitando era exagero. Assim esperava, não conseguia ter certeza.

A porta finalmente se abriu e ele saiu em disparada daquele elevador, como quem foge de um fantasma.

Droga, o que está acontecendo comigo?, Jeferson pesou já no corredor. Ele não era de agir assim, não era de apressar o passo daquele jeito. De um jeito meio fora da realidade pensou “o que o vigilante que assiste essas câmeras de segurança vai pensar de mim?”. mas sabia que era bobagem, sabia que ninguém ligaria, que isso eram coisas que só ele percebia em si mesmo, que estava pirando.

Abriu a porta do quarto e ao fechá-la outra vez respirou aliviado. Era como se ali tivesse recuperado sua privacidade, um espaço neutro onde podia ser ele mesmo, onde podia deixar uma ou duas torres do seu castelo desabarem que ninguém estaria atento observando, querendo invadir.

Droga droga droga!, exclamou em pensamento. O que ele está fazendo aqui? Como ele me achou? Como ele conseguiu um emprego na minha empresa? Seria de propósito? Começou a trabalhar aqui para me chantagear? Não, não é possível, não tinha como se ele sequer sabia meu nome completo. E isso não é coisa que as pessoas fazem assim, na vida real, é? Ir atrás de alguém, mudar a vida toda, mudar de emprego, mudar de carreira para ir atrás assim de alguém que só viu uma vez na vida, por uma noite. Não, não, claro que não, era coincidência, claro. Só podia ser. Não era por mal, e não ia dar em nada.

Respirou, compassado. Duas, três vezes.

Também podia ser um engano, ele só viu o cara por um segundo, o saguão estava uma zorra só, podia ter se confundido, claro, claro, era um rosto comum aquele, podia ser outra pessoa. Jeferson estava pirando por nada. E ele pensou que mesmo que fosse a mesma pessoa, era bom pensar isso, que não passou de um engano, porque isso o tranquilizava, e ele precisava estar calmo, o sol já se punha por entre as montanhas mais altas, daqui a poucas horas aconteceria a festividade e também o seu discurso.

Isso, claro. Calma Jeferson, você está enlouquecendo por nada. Nem era a mesma pessoa. Não era o Daniel, não podia ser. Foi até o banheiro, um banho gelado ia ajuda-lo, se despiu completamente em frente ao espelho de corpo todo do hotel. Droga, eu não disse que era engano? pensou tentando ainda se convencer e ficou em duvida se chegou a falar em voz alta sozinho no quarto de tão nervoso que ficou com aquilo.

Porque parecia que seu corpo duvidava das suas palavras, do seu cérebro racional que estrategicamente tentava se convencer que viu errado. O corpo titubeava, o corpo sabia, e o pau duro como a torneira larga da pia estava ali como prova.

Um banho gelado. Isso. Um banho gelado.

A água caía na pele e parecia efervecer, Jeferson quase podia jurar que ouvia os ssssss na pele, feito gotas frias em panela quente, e não ajudava que enquanto suas mãos deslizavam com o sabonete líquido pelas pernas, barriga, peito, a lembrança vinha constante e clara como se estivesse vendo um filme em ultra 4K. Daniel, o cara loiro, magro naquela medida que a academia mantem, como se só houvessem músculos debaixo daquela pele branca e levemente bronzeada, ao mesmo tempo soando frágil e forte. O cabelo cacheado, como o de um anjo doce, mas que de doce não tinha os olhos, aquele azul maquiavélico e frio. Droga, ele era tão novo, pelo menos dez anos mais novo que o próprio Jeferson, como alguém que não devia ter mais de 22 anos podia ater aquele olhos tão fortes, ardentes e maldosos?

Maldosos. Essa era a palavra, apesar de parecer exagerada. Havia maldade naqueles olhos, e uma maldade que cintilava mais quando Daniel fazia o que bem entendia naquela noite. Quando ele colocava o grande Jeferson de joelho e com o seu pau na boca, quando ele batia na cara séria de Jeferson com um tapa estalado e via Jeferson involuntariamente sorrir em resposta, quando ele o segurava pelo queixo e o fazia abrir a boca para cuspir lá dentro e dizia duro: “engole!” E Jeferson engolia.

E lá estava sua mão com sabonete esfregando o pau, numa punheta lenta que nem notou que havia começado. Não, não ia fazer isso. Não ia bater uma para ele, Jeferson jurou certa vez que aquilo tinha ficado para trás, que foi só aquela noite, que foi só uma escapada de carnaval, um homem matando a sua curiosidade, nada além disso. E depois, nos meses que se seguiram, mesmo que as vezes voltasse a sua mente aquela noite de fevereiro, ele nunca bateu uma pensando naquilo, ele nunca correu atrás de repetir a dose, ele nunca se pegou olhando no calendário para ver quantos meses faltavam para o carnaval, ele nunca ficou minutos inteiros olhando o frasco pela metade de glitter na dispensa de casa, a lembrança constante da outra metade, que brilhava ardentemente na sua bunda, naquele dia, e não mão de Daniel quando ele batia com tapas pesados e dizia “rebola, safado, rebola na pica do teu macho!”

Aquele glitter a marca do crime que persistiu, que saia aos poucos em cada banho, dias, semanas depois, e Jeferson podia jurar que mesmo agora, em pleno outubro, se procurasse direito um ou outro grão poderia estar ali ainda, na sua grande bunda, genética marcante que sempre chamou a atenção e ele, hétero convicto que sempre foi, sempre tentou esconder com calças mais folgadas, menos naquela noite de carnaval, menos naquela única vez que saiu sozinho para farrear e resolveu experimentar isso porque afinal, era carnaval, estava em uma cidade diferente da sua e depois nunca mais precisaria pensar nisso, não haveria consequência nenhuma.

E agora ali estava a consequência. Alguns andares abaixo, caminhando pelo saguão, ou talvez já se arrumando para a cerimônia de mais tarde.

Talvez já estivesse vestindo o terno e gravata na frente do espelho do próprio quarto, tão diferente da roupa de guerreiro romano que vestia daquela vez, naquele carnaval...

Não, não vou pensar mais nisso, Jeferson repetiu para si e levantou a cabeça, deixando a água gelada colidir em gotas pesadas no seu rosto, como se conseguisse amainar seus pensamentos em chamas. Desligou a ducha e se enxugou em frente ao espelho. Se esforçando para deixar o pau novamente em repouso, isso Jeferson, você precisa parar de pensar nisso, você precisa parar de pensar naquela noite, naquele homem. Você precisa focar no seu discurso, no seu momento. Depois, o resto daquele fim de semana passaria trancado no quarto para evitar esbarrar em Daniel por ali e estaria resolvido, se mudaria para o interior, trabalharia num andar especifico para a diretoria e aí sim, aí sim, aí sim, aí sim, aquela noite estaria enterrada para sempre no passado.

Mas aí, em vez disso, o que aconteceu foi a porta do seu quarto se abrir lá fora do banheiro.

E aí todo seu esforço e concentração foi por água abaixo.

Os passos caminhando para o interior, a porta se fechando outra vez.

Jeferson parou de movimentar a toalha, seus olhos atentos encarando a si mesmos no espelho. Medo. Ansiedade.

Tesão.

Não era possível. Não, não podia ser possível.

Quando o silêncio se rompeu lá fora, Jeferson caiu estupefato no olho calmo do redemoinho de emoções, pensamentos e sentimentos que giravam em turbilhão pela sua cabeça.

– Amei o serviço de lavanderia desse hotel, amor. A gente devia ter feito a nossa lua-de-mel aqui, hein.

Era Jéssica, sua esposa.

***

Oi, pessoal, estou finalizando as outras duas partes, acho que ainda hoje a história completa vai estar aqui no site.

Beijo.

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Comentários

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Que bom que voltou a postar suas maravilhoas histórias.

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