Sinopse: Amizades formadas, representante de turma escolhido e um possível mal entendido marcam a primeira aula de Literatura Francesa da turma do 2°ano.
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- Bonjour les filles! Entrez! Le professeur Schneider et moi vous attendions!
(Boa tarde meninas! Entrem! O professor Schneider e eu estávamos esperando vocês)
- Merci, directeur! - Gabriele agradeceu, cruzando seu braço junto do meu e entramos em sala. O meu olhar e do Eric continuaram fixos um ao outro.
- Ferme la porte!* - ele ordenou em um tom baixo, porém firme na voz, no que imediatamente nós obedecemos e logo desviei meu olhar do dele indo para a minha mesa.
(Fechem a porta!)
Me sentei e ajeitei meu material escolar, guardando o meu celular e minha bolsa de mão na mochila e Gabriele fez o mesmo. Todos os alunos já estavam presentes e alguns deles conversavam em voz baixa por respeito à presença da Diretora em sala.
- Le Romantisme - Gabriele sussurrou sorridente perto do meu ouvido.
- O quê? - virei meu rosto com o olhar pra baixo sem entender.
- Escrito no quadro, olha!
Li no quadro o que ela tinha me dito.
O Romantismo era o novo período literário que iríamos estudar no bimestre.
- Tudo a ver com o nosso professor lindão, não acha?
- Oui, Gabi - concordei suspirando. O fato era que Gabriele pertencia ao fandom das alunas apaixonadas pelo Eric.
- Bon, tous les élèves sont déjà dans la salle, non? - a Diretora voltou seus olhos para a turma e em seguida para o Eric - Je serai bref, professeur Schneider.
- Sans hâte.
(Bem, todos os alunos já estão na sala, certo? Serei breve, Professor Schneider.
- Sem pressa.)
Ela olhava para o fundo da sala como se procurasse por algum aluno e pediu:
- Frederik, pouvez-vous venir ici un instant?
(Frederik, você pode vir até aqui um instante?)
Ouvimos uma cadeira se arrastar e quando olhei para trás, Frederik se levantou vindo até a frente com uma cara de poucos amigos e sendo acompanhado por todos os olhares da turma. Ficou ao lado da Diretora com a cabeça um pouco baixa e ambas as mãos nos bolsos das calças dando um meio sorriso. Carinhosamente, a Dona Jacqueline cruzou seu braço com o dele fazendo um leve carinho e continuou o que iria falar:
- Je tiens à vous dire, ainsi qu'à tout le monde dans la salle, que l'année dernière vous étiez un excellent représentant de classe. Et je me demande si vous pouvez à nouveau représenter la classe. Y a-t-il quelqu'un dans la salle qui s'y oppose? Professeur? - ela virou seu olhar para o Eric.
- S'il a fait du bon travail, continuez! - Eric concordou mostrando indiferença.
(Quero dizer para você e para todos em sala, que no ano passado você foi um excelente representante de turma. E gostaria de saber se você pode novamente representá-los. Alguém em sala se opõe? - Professor?
- Se ele fez um bom trabalho, que continue!)
- Merci - Frederik agradeceu sério e sem jeito com os elogios que recebera.
Et alors ? - a diretora continuou - Acceptez-vous Frederik de vous représenter à nouveau ?
(E então? Vocês aceitam Frederik para representá-los novamente?)
- J'accepte! - Gabriele levantou a mão - Je veux rester le meilleur ami du représentant - ela brincou e todos começaram a rir.
(Eu aceito! Quero continuar a ser a melhor amiga do representante)
Os alunos em sala também concordaram com o pedido que Dona Jacqueline havia feito a ele e não lhe restou outra saída se não aceitar, por mais um ano letivo, ser o representante da turma 2A.
- D'accord, si tu insistes... - sorriu sem jeito.
(Tudo bem, se vocês insistem...)
- Tu es douée dans ce que tu fais! - uma das alunas o elogiou deixando ele mais sem graça.
(Você é bom no que faz!)
- Félicitations, Frederik! - após todo o burburinho em sala, tomei a iniciativa em lhe dar os parabéns e inesperadamente ele olhou na minha direção, abrindo o seu sorriso encantador.
- Merci beaucoup, copine!
(Muito obrigado, parceira!)
- Comment ça, copine? - a diretora olhou para nós dois curiosa.
(Como assim, parceira?)
- Mon père et le père de Nivea travaillent ensemble dans la même entreprise. Nous l'avons découvert samedi soir lorsque nous nous sommes rencontrés dans les restaurants.
(O meu pai e o pai da Nívea trabalham juntos na mesma empresa. Descobrimos isso no sábado à noite, quando nos encontramos nos restaurante.)
Respirei fundo. Não havia uma parte do meu corpo que não estivesse ficado tensa naquele momento. Dei um sorriso forçado, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da orelha. Frederik não tinha culpa alguma mas eu sabia que aquele simples comentário me causaria problemas. Tentei agir normalmente, embora as minhas mãos com os dedos entrelaçados na mesa começassem a se esfregar uma na outra. Mesmo não o encarando, eu sabia que Eric estava com o olhar mortal na minha direção.
- Quelle coïncidence! - ela sorria para nós dois - la fin de vos vacances était amusante!
(Que coincidência! o fim das férias de vocês então foi divertido!)
Gabriele sorria pra mim me dando leves beliscões em forma de cócegas na cintura e somente ela foi capaz de aliviar um pouco o meu nervosismo diante do clima pesado que pairou naquela conversa.
- Bon, le choix était fait et je vais m'arrêter là. Merci de votre attention, professeur.
- Ce n'était rien.
- Nous aurons une réunion avec les représentants mercredi à cinq heures, Frederik.
- Je serai la.
- C'était un plaisir d'être avec toi, classe. Bon cours et excusez-moi.
(Bom, a escolha foi feita e termino por aqui. Obrigada pela atenção, professor.
Não foi nada.
Teremos reunião com os representantes na quarta-feira às cinco horas, Frederik.
Estarei presente.
Foi um prazer estar com vocês, turma. Tenham uma boa aula e com licença.)
Eric apenas concordou em um gesto com a cabeça, voltando a sua atenção para o material na sua mesa e finalmente a diretora saiu de sala, fechando a porta. Frederik voltou ligeiro para o seu lugar e então a primeira aula da tarde iria começar.
- Ouvrez vos livres dans la période décrite au tableau! - ele ordenou com a voz séria, com ambos os punhos fechados sobre a mesa quando, enfim, o seu olhar e o meu voltaram a se cruzar. A rigidez no seu pescoço junto das veias era visível.
(Abram os seus livros no período descrito no quadro!)
Durante a nossa conversa no sábado à noite por telefone eu não menti para ele. Realmente eu saí com os meus pais para jantar. No entanto, eu jamais poderia imaginar que o filho adolescente que minha mãe tinha falado era o meu colega de turma e que estava se tornando um amigo próximo.
Mesmo sendo essa a verdade, eu tinha certeza de que um milhão de coisas estavam passando na cabeça daquele que é o meu professor de Literatura em sala e o meu amante até o fim do ano passado.
''A situação já está ficando insuportável e com o Frederik comentando o que aconteceu piorou tudo'' eu pensava, enquanto pegava o meu livro de dentro da mochila e abria na página da matéria a ser estudada.
***
Os dois períodos de aula correram normalmente. Eric nos explicava sobre o início do Romantismo literário na França tendo como destaque a escritora e romancista Madame de Staël que viu de perto o início da Revolução Francesa. Como sempre, eu escutava e anotava com atenção tudo o que ele falava e somente assim foi possível esquecer o que aconteceu antes da aula começar.
Mesmo com o silêncio em sala, pois estávamos atentos respondendo as questões contidas no livro sobre a escritora, eu sabia que estava sendo observada. Felizmente, alguns comentários que a Gabriele fazia sobre as questões também serviram para me distrair.
Olhei pelo celular dela que estava na mesa e vi que faltavam pouco menos de dez minutos para o fim da aula, quando me peguei pensando que o Eric ainda não tinha falado sobre a leitura bimestral. ''Será que eu pergunto? E se ele me responder com grosseria? E no meu caso vai ser uma grosseria em dobro!'' eram várias as paranóias que surgiram.
- Professeur, Schneider. - levantei a mão e a abaixei de imediato. Eu já havia terminado de responder as questões quando o chamei. Eric olhou na minha direção com sua expressão normalmente séria dentro de sala mas eu sabia que a sua seriedade ao me encarar estava diferente.
- Mademoiselle Martin.
- C'est sur la lecture bimestriel - por pouco minha voz não saía - Quel sera le livre?
(É sobre a leitura do bimestre. Qual será o livro?)
- Bien sûr - ele suspirou, se levantando da cadeira na sua mesa, seguindo em direção ao quadro - Je veux que tout le monde écrive le titre du livre.
(É claro. Quero que todos anotem o título do livro.)
"Graziella"Deixou escrito no quadro.
- L'ouvrage appartient à l'auteur que nous étudierons la semaine prochaine - ele explicou apontando o dedo polegar para o quadro e voltando para a mesa -
Commencez à lire dès que possible! Et les questions du livre seront également corrigées et discutées au cours suivant.
(A obra pertence ao autor que estudaremos na próxima semana. Comecem a leitura o quanto antes! E as questões do livro também iremos corrigir e discutir na próxima aula.)
O sinal tocou. Me distraí observando ele guardar todo o seu material na mochila, fechando o zíper e colocando as duas alças nos ombros, saindo a passos rápidos da sala. Nem olhou uma última vez pra mim, me deixando com um aperto no peito.
Se partiu dele a decisão de começar a dar aula de noite e, então, ficar menos tempo comigo eu não tinha motivos para ficar angustiada diante daquela frieza durante a aula. Mesmo assim, eu me sentia mal porque ele estaria pensando o pior de mim. O que aconteceu no sábado foi uma coincidência e era a verdade.
***
Eu mal conseguia acreditar que o primeiro dia de aula tinha terminado. Guardei o todo o meu material, observava a Gabriele retocar o batom super vermelho que usava e quando olhei o meu celular, óbvio que tinha uma mensagem dela.
- Já saiu amiga?
- A aula acabou agora - digitei.
- Tá, vou ficar te esperando na portaria porque eu estou ansiosa querendo saber de tudo!
- Tá bom kkkkk
Em pé e ajeitando minha mochila nas costas pronta pra sair, senti meu braço sendo tocado e o me virar, dou de cara com o mais novo e já esperado representante de turma.
- Como você vai embora, Nívea? - Frederik gentilmente me perguntou.
- Geralmente eu vou a pé - expliquei ao ver o Patrick do seu lado também prestando atenção no que eu dizia com as mãos segurando as alças da sua mochila - eu moro aqui mesmo no bairro. Não é longe mas eu ando um pouco até a minha rua.
- Ah, entendi - ele sorriu.
- Eu vou na biblioteca agora buscar o livro que o professor Schneider indicou.
Saí da sala e o corredor estava repleto de alunos que estavam indo em direção à saída. Não demorei muito na biblioteca. Segui até o corredor onde ficavam os títulos românticos e rapidamente encontrei o livro. Fui até a mesa onde estava a secretária responsável, fiz o empréstimo e saí.
Cheguei na portaria do colégio e, em meio à movimentação do horário de saída, vi o Frederik e do seu lado, um homem branco, bem alto de ombros largos, usando blusa social branca e calça também social na cor preta. A cabeça bem raspada parecendo um militar. Os dois estavam parados na beira da calçada e um carro preto parecido com o do meu pai estacionado. A porta de trás estava aberta e pude ver os dois irmãos dentro dele.
- Eu estava te esperando - Frederik se aproximou ao me ver, com o seu celular na mão - Deixa eu te apresentar, esse aqui é o Evandro, o motorista da minha família.
- Muito prazer, senhorita Nívea - ele estendeu a mão me cumprimentando e sorrindo simpático.
- Oi, prazer - lhe cumprimentei de volta. Ele tinha a aparência jovem e era bonito!
- Então, eu telefonei pro meu pai, ele autorizou o Evandro e você pode ir embora com a gente. Vamos te deixar em casa.
- Ah não, Frederik! Eu não quero incomodar! Eu posso ir pra casa sozinha.
- Não é incômodo nenhum! - o rapaz confirmou.
- Vem Nívea - A Gabriele de dentro do carro me chamava - Dá pra ir nós três aqui atrás!
Realmente indo embora de carro, como acontecia nas vezes em que minha mãe ia me buscar, eu chegava mais cedo em casa. Pensei e não vi problema em não aceitar. Afinal, as tardes de segunda-feira não seriam mais as mesmas.
- Tudo bem - sorri apertando um pouco as alças da minha mochila com as mãos.
- Só vou precisar do seu endereço - Frederik me pediu e no mesmo instante peguei o celular na bolsa de fora e lhe passei a localização de onde eu morava.
- Podemos ir? - Evandro perguntou.
- Vamos! - entrei no carro, me sentando ao lado da Gabi e seu irmão no outro lado. Frederik deu a volta se sentando no carona e o rapaz entrou assumindo o volante, dando a partida no carro e fazendo a manobra na direção da rua.
Depois de nós três nos ajeitarmos e sentada com a mochila no meu colo, vi o quanto o meu corpo e mente estavam cansados após um dia inteiro de aulas. Algo normal no fim das férias. Senti o meu celular vibrar na minha mão e ao ver a chamada, meu coração bateu forte. O emoji de coração que eu tinha colocado para salvar o número do Eric apareceu na tela.
- Você não vai atender? - Gabriele perguntou me tirando do transe causado pela ligação.
- Não - balancei a cabeça, recusando a chamada e guardei o aparelho.
- A gente conversou tanto no intervalo, trocando Instagram que eu nem peguei o seu zap.
- Verdade - sorri e abri novamente minha bolsinha de fora da mochila lhe dando um pequeno papel branco - Eu sou a pessoa que não decora o próprio contato. Pode salvar.
- Manda pra mim depois, Gabi - Frederik pediu virando o seu corpo no banco do carona - Quer entrar pro grupo da turma, Nívea?
- É obrigatório participar?
- Não - ele balançou a cabeça e sorriu, achando graça da minha pergunta.
- Eu não tenho paciência pra grupos, quase não interajo. Só estou em dois.
- Ah, amiga nós três aqui fazemos parte de vários! - a minha mais nova amiga dizia empolgada - Mas agora me conta: o que a aluna mais quieta da turma faz no fim de semana?
- Bom, geralmente eu e a minha amiga, a Melissa, até falei dela pro Frederik no sábado, comemos pizza na casa dela às sextas-feiras e no sábado de manhã, vamos pra aula de dança em uma academia perto de onde nós moramos. Geralmente de tarde, vamos ao shopping, cinema, essas coisas... E domingo eu fico em casa. Basicamente é isso.
Não poderia de jeito nenhum falar para eles sobre os meus sábados à noite.
- Ah, legal - Frederik prestava atenção no que eu dizia - No condomínio onde moramos, a gente dificilmente sai. Lá tem tudo: padaria, academia, quadra de esportes, pizzaria, piscina, salão de festas.
- Sério? - perguntei espantada.
- Nívea - Patrick que estava concentrado em seu jogo portátil entrou na conversa - nós moramos lá desde que nascemos e até hoje de vez em quando, esquecemos o que tem. Além da pizzaria, estava rolando um abaixo assinado em conjunto com a administração do condomínio e os moradores para que abrisse uma pequena loja da Starbucks somente para nós. Isso eu fiz questão de fazer campanha no nosso grupo de amigos e estou na torcida para a empresa aqui no Brasil aceite o pedido.
- Poxa, que legal. Realmente tem de tudo.
- Tô te falando, não precisamos sair pra nada.
- Mas aí a chata aqui entre nós dois insiste em ir bater perna no shopping.
- Mas é claro! Onde eu vou comprar as minhas maquiagens? - ela rebateu e acabei rindo - e o shopping fica em frente onde nós moramos!
- Mesmo enjoando de vez em quando eu adoro ir à shopping. E sair com a Melissa é diversão na certa. Ela se parece muito com você, Gabi!
- Sério? - ela sorriu.
- Então é outra mala - o irmão zombou.
- Não, não é isso... Vocês são espontâneas e divertidas.
Mesmo com o trânsito no bairro sempre intenso e lento naquele horário, nossa conversa foi tão descontraída que eu não percebi quando o motorista chegou na minha rua, parando em frente ao meu prédio.
- Olha ela ali - de dentro do carro avistei a Melissa na portaria atenta ao celular com o seu visual de sempre, usando short preto e blusa cinza de alça fina calçando um par de havaianas brancas.
- Ela é a sua amiga? Apresenta ela pra gente! Podemos ir, Evandro?
- Se vocês não demorarem podem sim.
- Ela parece estrangeira - Patrick comentou enquanto a observava.
Saímos os quatro do carro e ao me ver, a ruiva sorriu e ao mesmo tempo estranhando eu estar acompanhada. Evandro também saiu, ficando parado e encostado na porta do carro.
- Oi Meli - trocamos um abraço e logo em seguida apresentei os três à ela - esses são os meus mais novos amigos, Frederik, a Gabriele e o irmão dela, o Patrick.
- Prazer - ela acenou e percebi o seu olhar para cada um eles, levemente com um ar de deboche como se na sua cabeça estivesse passando várias coisas.
- A Nívea falou muito de você - o representante da turma falou lhe estendendo a mão.
- Jura? - ela devolveu o cumprimento - Espero que bem!
- Não liguem, a Melissa é o deboche em pessoa.
- Eu conheço vocês dois? - a ruiva perguntou aos irmãos intrigada - Não me parecem estranhos.
Gabriele e Patrick trocaram um olhar e sorriram sem jeito.
- Talvez você já tenha me visto pelo Instagram!
- O perfil dela tem mais de sete mil seguidores, amiga - comentei - certeza que é isso!
- É... Pode ser... - Melissa continuava a observá-los mas não muito convencida.
- Com licença, Frederik? - o jovem motorista se aproximou o chamando - recebi uma ligação agora do seu pai, me autorizando a trazer a sua amiga em casa todos os dias após a aula.
- Ah, legal!
- Não sei Frederik, realmente eu não vou incomodar?
- Claro que não, Nívea! Vai ser bom porque você não precisa vir sozinha pra casa!
- E se bem conheço o Sr. Bertrand, ele já deve ter comunicado ao seu pai, senhorita.
- Tudo bem, então. Obrigada.
- Acho melhor a gente ir, Frederik - Patrick olhava na tela do seu celular - o trânsito deve estar lento até em casa.
- Vamos! Foi um prazer te conhecer, Melissa! - Frederik lhe deu um beijo na testa - Vamos marcar alguma coisa no fim de semana, nós cinco.
- Claro! Sem falta.
- Nívea, não esquece de ver os meus vídeos tutoriais!
- Vou assistir sim, Gabi. Pelo menos um por dia.
Nos despedimos e observei eles voltarem para dentro do carro, indo embora.
- Que príncipe lindo é esse? - senti o cotovelo da Melissa me cutucando no braço.
- O quê? - me virei pra ela após ver o carro se distanciar - Que príncipe, Meli?
- Como que príncipe? Esse menino, o Frederik!
- Você achou ele bonito? - perguntei entrando no prédio e indo para o jardim no que ela me seguiu ficando ao meu lado - Tá, tudo bem, ele é bonito sim.
- Bonito? Ele é um gato! Que o Felipe nunca saiba o que estou dizendo! - ela tampou a boca com a mão me fazendo rir.
- Você lembra do sábado de manhã quando minha mãe comentou que o colega do meu pai iria levar a família no jantar de noite?
- Lembro.
- Pois é, o filho adolescente era o Frederik.
- Tá brincando? - ela me encarou arregalando os olhos.
- É sério - chegamos em um banco perto do canteiro de flores, nos sentamos e coloquei a mochila no meu colo - Nunca poderia imaginar que os nossos pais trabalham na mesma empresa.
- Coincidência bacana!
- Sim. Menos para um certo professor de Literatura - suspirei com o olhar baixo.
- Deus do céu, o quê que aconteceu??? Me conta como foi esse reencontro!!!!
Contei à ela o que aconteceu em sala, o ingênuo comentário do Frederik sobre o sábado e o clima horroroso durante a aula.
- O Eric deve está pensando o pior de mim, ficou me telefonando logo depois que eu entrei no carro quando viemos embora. A Gabriele viu a chamada do celular na minha mão mas por sorte eu não tenho o nome dele gravado.
- Amiga, ele é quem está errado nessa história! Se afasta de você e fica te ligando pra quê?
- Mesmo assim, eu to me sentindo mal - falei triste.
- Você não vai ligar pra ele de volta né?
- Não, claro que não. Mas do jeito que estamos não dá pra ficar.
- Isso eu concordo. Faz o seguinte, se o Eric te ligar de novo aí sim vocês conversam.
- Mas e se ele não ligar?
- Ele vai ligar. Você acha que ele vai conseguir passar mais um sábado sem trepar com você? Óbvio que não.
- O assunto é sério e você não consegue pensar em outra coisa!
- Penso sim, em comida. Comer, transar e gozar - falou contando nos dedos - Viu só? - ela sorriu pra mim - Lembrou o título daquele livro que virou filme! Minha mãe tem ele na pequena estante do quarto dela.
Mesmo com todas as besteiras que dizia, era impossível não amar aquele furacão ruivo.
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Chegar mais cedo em casa, realmente tinha vantagens. Retomar a rotina de estudos até a hora do jantar com os meus pais rendeu bastante e consegui começar a ler o livro indicado pelo Eric. O romance possuía um pouco mais de cento e cinquenta páginas e lendo um pouco todo dia, eu o terminaria tranquilamente até a próxima aula.
- Quando o expediente acabou, o Simon foi até a minha sala e conversou comigo, mon chére. - meu pai comentava enquanto jantávamos arroz branco e carne assada com batatas - Quando eu tiver oportunidade, vou querer conversar e agradecer a esse rapaz.
- O Evandro é sério, mas simpático. Foi educado comigo todo o tempo.
- Mas sempre que eu conseguir sair cedo da clínica, faço questão de ir te buscar, minha linda.
- Claro mãe. Vou adorar.
- Visitei o perfil da Gabriele e fiquei impressionada com os vídeos. Que menina mais talentosa! Deixei até um comentário no primeiro vídeo que ela postou sobre limpeza de pele.
- Vou tentar assistir depois que terminar de estudar. Eu prometi à ela.
- Traz ela aqui em casa um dia de sábado pra eu conhecê-la.
- Ela vai surtar com esse convite. Posso convidar os meninos também?
- Claro mon ange* - meu pai permitiu - fazemos questão de conhecer os seus amigos. Não digo o Frederik pois eu já o considero sendo de casa.
Eu sabia onde o meu pai estava querendo chegar com aquele tipo de comentário.
- Père, eu já te disse: eu e ele somos apenas amigos! - afirmei de cara amarrada.
- E quem aqui está dizendo o contrário?
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Como prometido, após terminar de estudar, tomar um bom banho e já deitada para ir dormir, assisti ao primeiro vídeo tutorial da Gabriele em que ela dava dicas sobre como cuidar e preparar a pele do rosto para uma boa maquiagem. Incrível como ela era desenvolta e nem um pouco tímida diante de uma câmera. Diferente de mim que só fazia rápidos stories nas viagens em família ou quando a minha priminha Louise em Lyon pedia para fazer vídeo comigo.
O vídeo era bem explicativo e já tinha inúmeras visualizações e comentários. Escrevi mais um elogiando e curti o que a minha mãe havia deixado mais cedo. Foi nesse instante em que o inesperado aconteceu: o coração vermelho surgiu na tela indicando a chamada. Meu corpo tremia, minha respiração acelerou e meu coração batia errado. Eu poderia não atender, deixar tocar até ele desistir. Já se passava das dez da noite e eu teria uma ótima desculpa de que estaria dormindo. Mas então lembrei do que a Melissa havia me aconselhado. Mais alguns toques até que o aparelho parou para o meu alívio.
''Nívea, eu sei que você tá online. Atende a porra desse telefone!'' - era a mensagem no zap que veio segundos depois.
''Se eu não atendi, então eu não estou online'', pensei em tom de deboche.
Me levantei da cama, deixando o celular e saí do quarto, andando na ponta dos pés pelo corredor até o quarto dos meus pais, que pelo silêncio absoluto quando me aproximei da porta, já estavam dormindo. Voltei pro meu quarto e, quando me deitei novamente, vi mais uma ligação perdida. E se ele desistiu?
Dei um salto na cama ao receber de novo a chamada. Procurei ficar calma e arrastei a tela aceitando a ligação.
- Oi.
- Jantar sábado à noite, carona para casa após a aula e depois? - a voz do outro lado soava ríspida e com ironia - Qual o próximo passo?
Continua...
Nota da autora:
É D.R. que teremos? Hum? Hahahahahaha Eric e Nívea precisam acertar essa situação de um vez por todas não é mesmo?
Contato: a_escritora@outlook.com
Instagram: aescritora_