Sinopse:
Em um jantar ao lado dos pais, Nívea inesperadamente encontra um rosto conhecido do seu dia a dia.
No primeiro dia de aula, são muitas as mudanças na rotina escolar da nossa jovem, mas que não a fazem esquecer totalmente o seu coração machucado.
****
Eu não tinha reparado no rapaz que ainda estava sentado com os cotovelos na mesa e o olhar fixo em seu celular nas mãos, distraído com a nossa chegada. No momento em que ele se levantou, desviando os olhos na nossa direção, tomei um susto quando o vi e ele se assustou por igual.
- Você?? - eu o encarava surpresa.
- Fille timide?* - ele abriu um sorriso ao me ver.
- Ué, vocês se conhecem, filha? - minha mãe perguntou, também surpreendida, olhando para nós dois.
- É o Frederik, o representante da minha turma! Bom... Até o ano passado.
- Caramba - ele sorriu ainda mais com a coincidência guardando o celular no bolso da calça - Que bom te ver! Tudo bom?
- Sim, e você? - respondi e ele se aproximou me dando dois beijos no rosto e um abraço acariciando no alto das minhas costas meio que sem jeito.
- Estou bem.
- Viu só filho e você não queria vir conosco - a mãe dele brincou - Agora podem fazer companhia um ao outro.
- Eu também não queria vir - confessei totalmente sem graça.
- Vocês estão em uma idade em que não fazem mais questão da companhia dos pais - Sr. Simon falou no que todos riram - Mas por favor, vamos nos sentar!
Sentamos na mesa e Frederik sentou-se ao meu lado. A mesa era retangular e enquanto nossos pais sentaram em uma ponta, nós dois ficamos do lado oposto mantendo uma certa distância. Ele parecia contente e aliviado por ter alguém para conversar em um jantar que tinha tudo para ser uma tremenda chatice.
- Posso te perguntar uma coisa?
- Pode sim!
- Por que ''fille timide?''
- É porque você é a aluna mais tímida e calada da turma. Então eu e mais dois amigos meus te apelidamos assim!
- Entendi... - sorri sem graça.
- Mas agora te vendo aqui, você parece simpática.
- Das poucas vezes que nos falamos você também foi simpático comigo.
Um garçom se aproximou de nós dois após anotarem os pedidos dos nossos pais.
- Com licença, vocês já escolheram? - ele nos perguntou atenciosamente.
- Fiquem à vontade para pedirem! - o pai do Frederik nos disse do lugar onde estava.
- Bom, eu não sei... Vocês aqui servem bife com batata frita? - perguntei ao garçom.
- Servimos sim, senhorita - ele me respondeu muito educado - o bife é acebolado acompanhado com arroz branco.
- Então eu vou querer uma porção mas sem o arroz, pode ser?
- Claro - e continuou anotando.
- Duas porções! - Frederik emendou o seu pedido ao meu se voltando pra mim - Você vai beber o quê?
- Pode ser suco de laranja?
- Show! - ele concordou - Traz uma jarra pra dois.
- Certo...
Ele terminou de anotar os pedidos e se retirou.
- Detesto estes lugares - ele se aproximou perto do meu rosto me confidenciando baixinho.
- Eu também não me sinto à vontade.
Frederik estudava no mesmo colégio que eu desde que éramos pequenos. No entanto, como eu sempre era muito tímida, não nos falávamos muito. E naquele momento estando mais próxima, poderia conhecê-lo melhor. Ele era um pouco mais alto que eu, tinha os cabelos castanhos bem claros, quase loiros em um corte curto, os olhos azuis e por ter a pele branca, suas bochechas ganhavam um tom rosado. Além de ter um sorriso encantador.
- E então, já sabe em qual turma você vai ficar esse ano? - me perguntou com os dedos entrelaçados sobre a mesa me encarando. Seu olhar além de bonito, era intenso mas eu não me sentia intimidada.
- Recebi o horário das aulas essa semana - suspirei ficando séria, lembrando de coisas que não queria lembrar - Minha turma será a 2A.
- Mesmo? Então, mais uma vez, estaremos na mesma sala.
- Que bom.
- Tenho quase certeza que a nossa turma será a mesma do ano passado. A Gabriele e o Patrick também ficaram nessa turma.
- São eles os seus amigos?
- Sim. Você vai conhecer eles na segunda-feira. São meus amigos de infância e moramos no mesmo condomínio acho que desde sempre.
- Bom, pelo meu apelido você sabe que eu nunca tive amigos. Só no ano passado que fiquei muito amiga da minha vizinha de apartamento.
- Ah, legal.
- Você será o representante da turma de novo?
- Por mim tanto faz. Se a turma fizer questão... Não é uma função difícil. Única coisa chata são as reuniões de todos os representantes com a diretoria de 15 em 15 dias depois do horário da saída. E a presença é obrigatória.
Além do sorriso, a simpatia dele também era encantadora. Em meio à conversa, percebi minha mãe olhando para nós dois de um jeito sorridente nos admirando e aquilo me incomodou. Tanto ela quanto o meu pai sabem que eu nunca namorei. Eu era a filha comportada, estudiosa que nunca deu preocupação alguma. Pelos olhares e eu com 16 anos recém completados, certeza que a minha mãe estava com pensamentos precipitados em relação a mim e ao Frederik.
Nossos pedidos chegaram e realmente a comida estava deliciosa. O bife no ponto acompanhado com cebolas e as batatas crocantes.
- Nívea, sua mãe estava nos contando que você é uma excelente aluna! - a mãe do Frederik virou se na minha direção comentando.
- Ah sim, eu estudo bastante... - respondi amigavelmente.
- É verdade, mãe! - Frederik confirmou enquanto tirava o celular do bolso pra tirar uma foto do prato que pedimos - A Nívea é a primeira aluna da turma.
- Ah, para! Não é pra tanto! - rebati enquanto dava uma garfada nas batatas - Você também deve ser bom!
- É... - ele deu de ombros - Minhas notas não são ruins. Nenhuma abaixo de nove.
Após terminarmos de comer, ele gentilmente me convidou para ir até a mesa do buffet que estavam as sobremesas: várias opções de tortas e cheesecakes além de diversos sabores de sorvetes. Os clientes poderiam se servir à vontade.
- Nossa, mas é tanta coisa - eu olhava para as tortas de diferentes tamanhos, cores e sabores - Dá vontade de comer um pouco de cada.
- Eu só não faço isso porque eu vou passar mal depois - ele brincou.
Escolhi uma fatia de torta holandesa com uma bola de sorvete de flocos. Frederik ficou apenas no mousse de maracujá. Voltamos para nossas mesas e saboreamos as iguarias.
O compromisso em família o qual eu reclamei por não querer ir, acabou se tornando horas muito agradáveis. Ter a inesperada companhia de um colega de turma fez com que eu esquecesse a semana triste pela qual eu estava passando. Conhecendo melhor, senti que Frederik era um garoto legal e que também estava bem à vontade por ter com quem conversar em um jantar para adultos.
Aproveitamos que já tinhamos comido o que queríamos e saímos do restaurante para dar uma volta na piscina do hotel que, mesmo de noite, estava aberta para os visitantes. Nossos pais conversavam animadamente e acho que nem perceberam a nossa ausência. Além da piscina, passeamos por outros locais e com o celular em mãos, Frederik fazia vários stories no seu Instagram.
- Você não trouxe o seu celular? - ele virou se e perguntou curioso.
- Não - respondi seca - De vez em quando eu costumo ficar off por alguns dias. Me desligo de rede social.
- Entendo. Eu fico off na aula. É isso ou não presto atenção em nada.
- Isso eu também faço.
Eram dez e meia da noite quando todos nós saímos do restaurante e nos despedíamos enquanto esperávamos os manobristas trazerem os carros.
- Então nos vemos segunda-feira no colégio? - Frederik me perguntou apertando e mantendo o aperto de mão.
- Claro, primeiro dia eu nunca falto... - confirmei sorrindo timidamente.
- Ótimo! Até lá! - se aproximou e me beijou na testa.
- Foi um enorme prazer conhecê-los! - Minha mãe se despediu dos pais do Frederik - Vamos um dia repetir esse encontro!
- Com toda certeza, Helena! - Dona Denise confirmou - E farei uma visita na sua clínica sem falta.
- Terei um enorme prazer em recebê-la pessoalmente.
- Foi uma noite incrível - Senhor Simon se despediu de nós.
Terminamos de nos despedir e voltamos para casa. Passeio agradável, boa comida, ótima companhia. Uma noite surpreendente.
***
No quarto, eu estava sentada na cama tirando os meus sapatos para alívio dos meus pés quando ouvi duas batidinhas na porta e minha mãe apareceu apenas com a metade do corpo na porta ainda com a roupa da noite e ao invés dos sapatos, usava um par de chinelos.
- Posso entrar, meu amor?
- Claro mãe - afirmei sentada na beira da cama com as pernas e os pés esticados - E o meu pai?
- Está tomando banho - falou e veio sentar do meu lado - Foi tão ruim a noite de hoje?
- Não. Foi legal.
- E o seu mais novo amigo? - Ela me olhava com uma estranha expectativa - Vocês combinaram de fazer alguma coisa? Hein?
- Não, mãe! - fiquei tensa com aquela pergunta - Vamos nos ver de novo na segunda-feira no colégio.
- Ah filha, vocês dois juntos estavam lindos! - ela afirmava com um brilho nos olhos - E seu pai também gostou do que viu.
- Mãe, nada a ver!!!! Eu e o Frederik somos colegas de turma - eu precisava acabar com aquela conversa - Você sabe que eu não penso nessas coisas...
Eu estava apavorada com o que minha mãe estava tentando insinuar ao mesmo tempo que mentia pra ela com a maior naturalidade do mundo em dizer que não pensava ''nessas coisas'' pois há sete meses eu transava com o meu professor de literatura escondida do mundo.
- Eu sei meu amor, eu sei... Mas...
- Então, por favor, não fala mais disso - pedi à ela com calma, pegando na sua mão - Você sabe que eu só vivo pra estudar e ficar na companhia da Meli e do Lipe nos finais de semana. E caso aconteça algo entre eu e o Frederik será apenas amizade.
Ela me olhava sério analisando o que eu havia dito.
- Tá bom - ela me beijou no rosto - Eu me precipitei. Você está certa e ainda é nova pra pensar nisso. Quando comecei a namorar com o seu pai, eu estava com 20 anos.
Eu prestava atenção no que dizia e então me despertou uma curiosidade.
- Mãe, posso te fazer uma pergunta?
- Claro, meu anjo.
- Se você tá me dizendo isso... Então, o papai foi o primeiro?
Ela sorriu pra mim entendendo realmente o que eu queria saber.
- Foi, minha vida. O meu primeiro namorado sério foi o seu pai.
- Eu também quero isso pra mim - sorri pra ela - Quero o mesmo que aconteceu com você.
- Hoje você teve uma chance - sorriu irônica.
- Mãe! - fechei a cara.
- Tá bom! Tá bom! - ela levantou as mãos na altura dos ombros - Não vamos mais falar disso.
- Por favor - pedi e ela fez um carinho no meu rosto dando um outro beijo em seguida.
- Vou ver se seu pai já saiu do chuveiro.
Saiu do quarto e eu fiquei pensando na nossa rápida conversa. Por mais que ainda estivesse magoada com o Eric, eu não conseguia me imaginar ficando com outro menino. O que me fez lembrar do meu celular desligado há pelo menos dois dias.
Me levantei e fui ligeira até a gavetinha na minha mesa de estudos. Liguei o aparelho e esperei alguns minutos indo me sentar na ponta da cama. Foram tantas as notificações que ele chegou a travar. A maioria claro, dele. Apenas li todas as mensagens carinhosas que Eric havia me mandado e a triste conversa voltou à minha mente para me perturbar.
Ele estava online mas não o respondi. Em vez disso, enviei uma mensagem para Melissa.
- Cheguei agora em casa - digitei.
- E foi legal lá?- ela me retornou rapidamente.
- Não foi tão chato como eu achei que ia ser - pensei bem e decidi naquele momento não contar sobre o Frederik. Mesmo não acontecendo nada, não queria dar motivo pra imaginação fértil da Melissa.
- Que bom. Mas e aí? Vai continuar dando um gelo nele?
- Não sei.
- Olha, estou contigo nessa. Mas uma hora vcs vão ter que conversar né? Eu queria ser uma mosquinha pra estar na sua sala de aula na segunda-feira hahahahahahaha.
- Eu nem quero pensar nisso. E se eu sentar no fundo da sala igual da outra vez, ele vai enlouquecer.
- Pois eu sentava só pra irritar ele kkkk. Vou te perguntar, mesmo já sabendo a resposta: vai pra casa dele hoje? Quer que eu e o Fê te deixe lá?
- Não, sem chance.
- Tá bom. Se você quiser, vem aqui pra casa! A gente faz pipoca, vê um filme...
- Eu tô um pouco cansada. Mas se eu mudar de ideia, te falo.
- Tá legal então. Beijão.
Enviei um emoji de beijo, deixei o cel na cama e fui pro banho. Quando terminei e voltei pro quarto, havia duas ligações perdidas dele e uma lágrima escorreu pelo meu rosto sem que eu percebesse. Meu coração acelerou ao ver quem estava me ligando novamente e eu não podia mais fugir da situação. Deslizei o dedo para aceitar a chamada.
- Oi Eric - me sentei na cama de frente para a varanda e não sei explicar como tive voz para atender.
- Fico aliviado em saber que pelo menos você está viva... - me respondeu ríspido e eu fiquei muda - Nívea?
- Tô na linha.
- Eu e você não podemos continuar desse jeito. Precisamos conversar. Eu sei que o seu modo de reagir quando não sabe lidar com uma situação é fugindo dela, mas isso não resolve.
Ao ouvi-lo dizer tudo isso, comecei a chorar baixinho e tampei minha boca com a mão para que ele não me escutasse soluçar. Eric estava certo mas eu ainda não estava pronta para aquela conversa.
- Você vem pra cá hoje? É nosso primeiro sábado juntos esse ano... Vem, por favor... Vamos conversar com calma.
- Eu cheguei em casa agora - tentava ao máximo disfarçar o choro na voz - Saí pra jantar com os meus pais.
- Sei... - senti ele falar de um jeito seco.
- É sério. Eu não estou mentindo. E também não estou mentindo quando te digo que ainda estou magoada com você e não quero conversar.
- Que bom.
- Que bom?
- Sim. Você está sendo sincera comigo ao invés de continuar fugindo. Pedi isso à você na nossa primeira noite juntos, lembra? Vou te dar o tempo que precisar.
- Eu prefiro assim por enquanto. Nos vemos segunda-feira na aula.
- Está certo. Até segunda.
Encerramos a ligação, coloquei o celular no criado -mudo, vesti uma camisola de alças finas, bem leve de tecido quase transparente e após apagar a luz do quarto, me deitei, e chorei como em todas as noites daquela semana. Se tudo estivesse bem, Eric e eu nos encontraríamos para matar a saudade em forma de amor. Eu ainda estava confusa sobre o que ele havia decidido e me dito, se deveria acreditar ou não. Outra mulher na sua vida e da mesma idade que ele? Era realmente trabalho? Eram dúvidas e mais dúvidas que estavam explodindo na minha cabeça.
***
- O que houve, chérie? Está tão calada... Triste porque as férias acabaram? - meu pai perguntou enquanto estava atento na direção à caminho do colégio.
- Sim... Fim de férias é sempre assim - respondi tentando demonstrar tranquilidade quando na verdade, estava aflita pois eu iria me reencontrar com o Eric.
- Normal, mon amour. Mas tenho certeza que você vai ficar bem como em todos os anos. Em especial neste ano.
- Como assim? - me virei pra ele confusa.
- Seu novo amigo, o menino Frederik. Ou você ainda não o considera um amigo?
- Nos divertimos no sábado, père*. Ele foi simpático comigo mas daí sermos amigos, vai acontecer aos poucos.
- Claro. Eu e sua mãe gostamos muito dele.
- É, eu sei! - respondi bufando e ele sorriu enquanto estávamos parados no sinal vermelho.
De repente me dei conta de algo a respeito do meu pai.
- Pai...
- Sim.
- Você está indo para a empresa agora?
- Oui, pourquoi?
- Você não é um dos Diretores? Por que está indo cedo? Os chefes chegam a hora que bem entendem.
- Certos hábitos nunca mudam, mon ange. Eu prefiro manter a minha rotina de sempre. E chegando cedo, a equipe se sente mais segura com a minha presença.
- Entendi - sorri ao ouvir sua explicação.
Chegamos na rua do meu colégio e meu pai estacionou alguns metros longe do portão pois o fluxo de outros carros era grande.
- Bonne classe*, mon ange - ele tirou o cinto de segurança me dando um abraço e um beijo no rosto no que eu retribui.
- Merci, papa.
Saí do carro, ajeitei a alça da mochila no ombro e segui em direção a mais um ano letivo. Como primeira mudança pessoal, decidi não levar mais o meu fichário. Apenas os livros, um bloco de folhas coloridas e para cada cor, uma disciplina diferente.
Ao chegar na portaria, novamente vejo as paredes e janelas do colégio pintados e uma pequena aglomeração incomum de alunos em torno de uma das inspetoras distribuindo um papel que parecia um comunicado. Me aproximei, ela me deu uma cópia e enquanto caminhava lentamente pelo corredor, li atentamente o que estava escrito:
Chers élèves,
(Caros alunos)
Soyez bienvenus à une autre année scolaire !
(Sejam bem vindos a mais um ano letivo!)
Cette année, les horaires du déjeuner et la pause ont souffert un petit changement. Le matin, le dernier cours finira à 11h40 et pas plus à 12h. La pause générale restera avec 2h de durée, finissant à 13h40. Cependant, c'est permis aux élèves de manger pendant le cours tant que cela ne dérange pas le professeur et les collègues. Faites le discrètement. La cafétéria sera ouverte pour que vous puissiez acheter des snacks.
(Este ano, o horário de almoço e intervalo sofreu uma pequena mudança. A última aula da manhã terminará 11h40 e não mais ao 12h. O intervalo geral continuará com a duração de 2h encerrando-se 13h40. No entanto, está autorizado aos estudantes se alimentarem durante as aulas desde que não atrapalhe o professor e os seus colegas. Façam de forma discreta. A lanchonete estará aberta para que vocês possam comprar lanches.)
Attentivement,
Jacqueline Bascher - Directrice Générale
(Atenciosamente,
Jacqueline Bascher - Diretora Geral)
''Mais uma mudança'' pensei.
Ao terminar de ler, guardei o papel na pequena bolsa do lado de fora da mochila e peguei o meu celular. Ainda eram 7h00. Mesmo tomando um bom café da manhã em casa, caminhei ligeira até a lanchonete que por sorte haviam poucos alunos. Comprei um sanduíche natural de frango com um achocolatado gelado, mais um biscoito recheado que guardei na mochila. Fui lanchando até chegar ao banheiro para escovar os dentes. Logo que terminei, estava de frente ao espelho colocando a pasta na pequena escovinha quando duas alunas entraram e também começaram a se olhar no espelho.
- Adivinha quem será o nosso professor de Literatura esse ano? - uma delas perguntou para a amiga.
- Aquele professor que parece um príncipe?
- Ele mesmo! Mas vamos ter que esperar por ele até o fim do dia. Será a nossa última aula.
Conversavam em português nas dependências do colégio. Se uma das inspetoras flagrasse, as duas levariam uma advertência. Enquanto escovava os dentes, não pude deixar de ouvir a conversa e suspirei, voltando ao que estava fazendo. Como meu pai disse naquela manhã, ''certos hábitos nunca mudam'' e o assédio das alunas pra cima do Eric continuaria o mesmo.
Terminei de usar o banheiro e segui direto para a minha nova sala que ficara em um andar acima da minha antiga. Felizmente eu estava dentro do horário então não precisei correr.
***
- OLHA ELA AÍ!!! - tomei um susto assim que cheguei na porta, ao ver o Frederik apontando pra mim e falando em voz alta, sentado na mesa do professor - A MINHA PARCEIRA DO BIFE COM BATATA FRITA.
Acabei rindo sem jeito e me aproximei dele, que estava junto dos seus dois amigos, segurando as alças da mochila um pouco tensa.
- Bonjour - cumprimentei normalmente os três. Em voz baixa, é claro.
- Bonjour, fille timide* - a amiga que estava encostada na mesa ao lado dele, me olhava dos pés à cabeça e me cumprimentou muito simpática - O Frederik contou pra gente sobre sábado. Realmente, foi muita coincidência. Prazer, eu sou a Gabriele - E me deu um beijo no rosto me segurando pelos ombros.
- É um prazer conhecê-la - sorri envergonhada.
- E eu sou o Patrick - ele que estava sentado na cadeira do professor, me estendeu a mão me cumprimentando no que eu correspondi - sou o irmão gêmeo dessa chatinha aí.
- Larga de ser estúpido, garoto! - ela rebateu.
- Vocês são parecidos - comentei - pelo menos nos cabelos.
- Só isso mesmo. Mais nada - ela fez questão de afirmar.
Gabriele e Patrick tinham a pele branca, os olhos castanhos e possuiam os cabelos pretos, curtos, repleto de cachos com a diferença de que ele tinha os fios largos e desleixados e ela, mais definidos parecendo pequenas molas. Mas eram muito bonitos. Um arco vermelho com estampado branco junto de um laço era o acessório que usava para enfeitá-los. O colégio não proibia o uso de acessórios e maquiagens entre as alunas mas mantinha as regras rígidas a respeito dos uniformes. Patrick tinha a cara ainda inchada de sono e a irmã usava um batom vermelho vivo nos lábios e os cílios estavam o dobro do tamanho comum. Os irmãos eram magros com a diferença de que ela, sendo menina, tinha os quadris um pouco menores do que os meus.
- Meus pais adoraram você, Nívea - Frederik comentou - Te acharam um amor.
- Eu digo o mesmo dos meus. Eles acharam você o máximo.
- A gente nunca puxou assunto com você antes porque tu sempre foi quieta - Gabriele me falou dando de ombros - Mas aí o Frederik disse que era o seu jeito mesmo.
- Sempre foi.
- Bom, to indo pra minha mesa - Patrick alertou se levantando da cadeira - O sinal já vai tocar e o professor Maurice vai chegar daqui a pouco. E agora com a Nívea, seremos um quarteto!
- Isso mesmo - Frederik saltou da mesa dos professores indo para o fundo da sala - A Gabi agora não será minoria entre nós três como era antes.
Todos os alunos que também estudaram na 1A no ano anterior já estavam presentes e uma outra mudança chamou minha atenção: as mesas estavam arrumadas em fileiras duplas. Coloquei minha mochila na mesa da segunda fileira de sempre e vi a Gabriele parada no meio da sala olhando para mim e ao mesmo tempo, olhando para o fundo onde estavam os meninos. Ela seguiu até sua mesa mais atrás, pegou sua mochila preta repleta de acessórios pendurados, segurando junto ao peito e veio se sentar ao meu lado.
- Vamos sentar juntas? - ela me perguntou já se sentando - Pra você não ficar sozinha.
- Claro. - me sentei, tirando o meu material da mochila e o ajeitei na mesa - Eu só não converso durante as aulas.
- Ah, sem problemas! - ela concordou e colocamos nossas mochilas, quase ao mesmo tempo, pendurada nas cadeiras.
O sinal tocou e o Professor Maurice de Geografia entrou na sala cumprimentando todos na turma com sua enorme pasta de couro. Um senhor barbudo e muito simpático que também foi nosso professor no ano anterior.
- Já está sabendo, não é? - Gabriele chegou perto de mim, me perguntando baixinho no ouvido.
- Não. Sabendo de quê?
- Você não viu o horário? O professor mais lindo e maravilhoso da face da Terra vai continuar a dar aula pra gente depois do intervalo! - falou eufórica.
- Ah sim... Eu vi. - dei um meio sorriso pensativa.
Após as primeiras mudanças que presenciei no início daquela manhã que desviaram a minha atenção, eu voltei à realidade junto de uma palpitação no peito. Mesmo falando baixinho, senti a empolgação da Gabriele na voz. Em poucas horas, Eric Schneider e eu estaríamos frente a frente. Fiquei aliviada e triste. Aliviada porque eu teria algumas horas para me preparar em revê-lo e triste porque nossa situação ainda não estava resolvida.
Continua...
Nota da autora: Estava moleza adivinhar quem era o rapaz que ela encontrou no restaurante com os pais né, gente? Hahahahahahaha. Duas leitoras minhas mataram a charada de primeira, logo que dei a dica sobre ele no fim da primeira temporada 😉
Esse novo ano letivo promete ou não promete, meu povo amado? Hahahahaha
Mudanças e novos amigos para a nossa ''Petite'" que vão agitar ainda mais sua vida.
Novamente, peço para que não briguem comigo pois o nosso casal voltará às boas.
Bonne classe* = Boa aula.
Père = Pai
Instagram: @aescritora_
Contato: a _escritora@outlook.com
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