APENAS UMA REGRA (ROMANCE GAY/HOT) - CAP 2: GAROTO OU ZUMBI?

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Homossexual
Contém 2290 palavras
Data: 01/11/2021 04:56:39

Puta que pariu!!!! Corri como se não houvesse amanhã. Aproveitei um grupo de amigos que estavam sentados próximos ao Metrô e sentei o morto-vivo da melhor maneira possível. Tirei a minha jaqueta e o envolvi. Não muito longe dali, um mendigo pediu dinheiro. Ele usava um chapéu da Nike e um moletom de lã gigante.

— Moço, pelo amor de Deus, eu preciso do seu chapéu. — pedi, tendo que me humilhar para a porra de um mendigo.

— Relógio bonito. — ele soltou olhando para o meu pulso.

— Qual é. Te dou R$ 20.

— O relógio ou nada.

Tecnicamente, o relógio valia R$ 20, mas ele seria o presente de aniversário perfeito para Izzy. Para o meu cagaço, o grupo de homens que procuravam o rapaz apareceu na minha frente. Eles não me reconheceram, uma vez que passaram direto.

Olhei para o lado e a Cinderella Zumbi continuava apagada. Barganhei um pouco mais com o mendigo, só que ele levou a melhor, quer dizer, o relógio.

— Seu cuzão. — o insultei quando peguei o chapéu e voltei para o rapaz misterioso.

Com a minha jaqueta e o chapéu do mendigo, ele parecia 20% melhor. O coloquei nas costas de novo, quase parecendo um burro de cargas, e segui para o metrô, pois faltavam apenas 10 minutos para encerrarem as atividades e não ia esperar até 4h da manhã.

Eu moro na República com a minha melhor amiga e irmã, Izzy Grey, na realidade, o seu nome é Isidório Garcia, porém, na transição, ela escolheu o nome de duas personagens de Grey's Anatomy, sua série favorita.

Para chegar até o meu apartamento, a gente precisaria pegar o metrô na Paulista, seguir algumas estações até a República. Ao passar pela catraca, o segurança olhou com desconfiança, entretanto, eu consegui improvisar.

— O desgraçado bebeu até o cú cair no chão. — disse dando um riso maroto para o segurança, que apenas consentiu com a cabeça.

Nesse horário, o metrô está vazio, afinal, a maioria das pessoas já estão em suas festas e tomando bons drinks. Eu, por outro lado, estava com uma versão cadavérica da Bela Adormecida.

Sob a luz do vagão, pude ver mais da fisionomia do rapaz. Ele deveria ter uns 20 e poucos anos. Os cabelos loiros, algumas sardas pelo rosto e uma boca pequena, mas carnuda. Haviam hematomas por todos os lugares. Ele apanhou para caralho, contra isso não há dúvidas.

Não demorou muito e a voz automática do metrô nos avisou que a estação da república era a próxima. Mais uma vez, peguei a "Boneca de Pano Ensanguentada" e coloquei nas costas. Para completar a minha noite, as escadas rolantes estavam fora de serviço, ou seja, precisei subir carregando o garoto.

— Pelo menos, não preciso ir à academia amanhã. — pensei, passando pela roleta e tendo que subir mais um lance de escada.

O frio fez minha espinha dorsal tremer. Atravessei a Praça da República em uma velocidade ímpar. Esse lugar me traz recordações agridoces, porque comecei minha carreira de Garoto de Programa aqui. Tudo continua do mesmo jeito, a fonte, as árvores e o prédio da Escola Normal, porém, eu mudei. O jovem paspalho não existe mais, agora sou mais decidido e corro atrás dos meus sonhos.

Um dos sonhos foi sair da área periférica de São Paulo. Não foi fácil, precisei trabalhar bastante, fazer muitos contatos e gozar pra caralho. Eu não me arrependo em ser Garoto de Programa, existem piores maneiras de ganhar dinheiro.

Quando consegui o suficiente para alugar um apartamento decente, diminui o ritmo de trabalho. A Izzy, também é acompanhante, porém, ela atende através de um site. "As ruas são perigosas para um Sr. caralho", ela sempre diz. Hoje, acredito nessa frase, afinal, tem um garoto zumbi nas minhas costas.

Atravessei a Avenida Vieira de Carvalho, também conhecida como o point das gays, devido aos seus bares voltados ao público "G", da bandeira LGBTQIA+. Algumas pessoas ficaram desconfiadas, eu apenas segui o meu caminho.

Finalmente, cheguei no Largo do Arouche, local que chamo carinhosamente de lar. Ok, eu poderia morar em outros lugares de São Paulo, mas na minha infância no Pará, um dos poucos programas que eu gostava era "Sai de Baixo", que conta a história de uma família que vivia em um edifício no Largo do Arouche.

Eu gostava tanto daqueles personagens que um dia prometi que os encontraria. Dá a porra de um desconto, eu era um moleque e não entendia como a televisão funcionava. Mas, um fato curioso, moro bem perto do prédio que eles usaram no filme do "Sai de Baixo".

Ao chegar na entrada do edifício, o porteiro, seu George, tem a mesma reação de todos que já passaram por mim. Estou tão cansado que nem invento uma desculpa, apenas entrei carregando um defunto. Foda-se. Apertei o botão do elevador e entrei, orando para não ter nenhum morador fuxiqueiro. Para a minha sorte, não apareceu ninguém, então, cliquei no botão do 14º andar.

No elevador, consigo sentir a respiração do Gasparzinho no meu pescoço. Ela é rápida e me faz cócegas. Ao entrar no corredor, as luzes automáticas acendem e tenho dificuldade para tirar as chaves do bolso. Com a porta aberta, entrei e deitei o rapaz no sofá.

— Puta que pariu, Stef. Você matou alguém? — perguntou Izzy de maneira dramática. — Não. Não responde, eu não quero saber. — fechando os olhos e pegando a bolsa. — Eu não quero ser cumplice de assassinato. Sabe o que eles fazem com as trans no presídio?

— Larga de ser psicopata, sua encapetada. Eu não matei ninguém não. A Bela Adormecida do capiroto que me pediu ajuda. — falei sentando no braço do sofá, porque estava cansado demais.

— Chocada. Passada. — comentou Izzy se aproximando do rapaz e o analisando. — Gente, a mona tem uma blusa da Gucci, mas esse sangue todo estragou o tecido.

— Ele estava desesperado. Tinha acabado de pegar um cliente, inclusive, encontrei a Nicky. Ela entrou em um carro e o zumbizinho apareceu. — expliquei.

— Tá, mas a gay estava fugindo de quem? E se for barra pesada? Drogas? tráfico de órgãos? — questionou Izzy tocando em sua barriga na direção dos rins.

— Não. Ele disse que não podia morrer, pois queria terminar o mestrado. Olha para a cara da criatura. Sem chance dele ser um de nós. — falei tirando o chapéu da cabeça dele e jogando longe.

— Bem, estamos sem qualquer tipo de produto para primeiros socorros. Vou à farmácia. Fiz um programa babadeiro hoje. R$ 400. — revelou Izzy jogando os cabelos na minha direção.

— Olha, bateu a meta. Parabéns, capiroto. O diabo quando quer consegue qualquer coisa, né. — brinquei. — Fiz 100 e um relógio, quer dizer, agora um chapéu da Nike.

— Eita, anjo caído. Vai ter que ralar esse mês. Essa piroca vai ter que trabalhar. — disse Izzy, saindo do apartamento.

— Ainda tem gente que glamouriza a nossa profissão. Ainda bem que tive você na minha vida, Izzy. Nem imagino o que teria acontecido sem você. — abri o meu coração, antes dela sair.

— É a vida, bebê. Enfim, deixa eu ir comprar os remédios. — avisou Izzy.

Enquanto a Izzy comprava os medicamentos, fui até o meu quarto e abri um pequeno cofre que mandei instalar em uma das paredes sob o quadro com a minha foto, um ensaio que fiz para divulgar o meu trabalho. Fiquei bonito pra porra. Dentro havia um montante de dinheiro. Estávamos no 20º dia de junho e, apesar de conseguir apenas R$ 100, eu já havia juntado a quantia de R$Em fevereiro, por causa do carnaval, consegui R$ 7.000, claro que participar de um filme pôrno ajudou, ah, estava mascarado, então, ninguém me reconheceu. Fiz duas cenas, uma gay e outra hetero. A Izzy, também, participou, na real, ela conseguiu o trabalho para nós.

A nossa rotina é difícil e cheia de riscos, mas com o tempo fomos descobrindo uma maneira de dar certo. Na real, a Izzy é a dona da casa. Ela é responsável por pagar as contas e gerenciar tudo. Graças a administração da Izzy, nós conseguimos morar em um lugar bacana e nada nos falta.

Troquei minhas roupas, coloquei algo mais confortável: uma camisa sem manga surrada e uma samba canção. O rapaz estava do mesmo jeito. O que será que aconteceu? O peguei no colo e levei para o meu quarto.

Com todo o cuidado do mundo, o deitei na cama, nem me toquei em tirar as cobertas, ou seja, sujou tudo de sangue. Terei sua camisa e fiquei surpreso com o físico dele, um cara magricela, porém, trincadinho. Nem eu, com anos de academia consegui esse shape.

O sangue estava grudando em sua pele, então, achei melhor o levar para a banheira e limpá-lo. Tirei os seus sapatos, meias e calça. Ele usava uma cueca da Burberry. Nunca ouvi falar dessa marca. Acho que ele não é tão rico quanto eu penso. Tirei a sua cueca e, diferente de mim, o garoto mantinha os pelos ao natural.

— Porra. Me lasquei. — pensei indo até a banheira, ainda pensando no fato dele ser um pobretão, e ligando a água quente.

Com todo o cuidado, o peguei no colo novamente e o levei para o meu banheiro. O coloquei na banheira e tirei todo o excesso de sangue, ele reagiu algumas vezes, mas ainda estava fraco por causa da surra.

— Cara, tú precisa reagir. — pedi, enquanto o limpava com o auxílio de um pano.

— CARALHO! — gritou Izzy entrando correndo no banheiro com a cueca do garoto nas mãos.

— O que foi retardada? — perguntei me recuperando do susto.

— Anjo Caído. — Izzy fez uma pausa dramática, o que me fez revirar os olhos. — Ele estava usando essa cueca?

— Sim. O que tem haver essa porra de cueca? — perguntei e fiquei com uma cara de cú.

— Amado! — exclamou Izzy digitando alguma coisa no celular e me mostrando.

***

CUECA BURBERRY BOX BOXER

R$ 392

***

— É mais cara do que essas tuas espeluncas da Calvin Klein. — soltou Izzy olhando para mim e virando os olhos para o garoto.

— Onde... onde... eu estou? — ele perguntou com uma voz fraca e doce.

— Eu te ajudei na rua. Tú estava fugindo de alguém. Não se preocupe, vamos cuidar de ti. — garanti usando o pano para limpar o rosto dele.

Com o banho tomado, levamos o rapaz de volta para a cama. A Izzy fez os primeiros socorros e desinfetou todas as feridas. Em seguida, ela deu alguns comprimidos para o garoto. Eu a observei durante todo o processo.

A Izzy é dedicada em tudo que faz, seja em um filme pornô de carnaval ou no curativo de um desconhecido. Eu não existo sem ela e, provavelmente, ela não existe sem mim. Somos como dois irmãos siameses que não querem ser separados.

***

SÃO PAULO - CINCO ANOS ATRÁS

Logo quando cheguei em São Paulo me envolvi com as pessoas erradas. Eu tinha 18 anos, um garoto do Pará que mal tinha acabado o ensino médio. Precisei ralar para conseguir alimentos e um teto.

Em um dos meus milhares de trabalhos, precisei distribuir panfletos de um curso de enfermagem. Só que até no universo da panfletagem existe competição. Um grupo de pivetes me deu uma surra por distribuir os panfletos em uma área que era deles.

Fiquei jogado no chão. A vontade de chorar era enorme, mas eu levantei e peguei alguns panfletos caídos no chão. Até que alguém pegou no meu ombro, no reflexo, quase lhe desferi um soco.

— Ei, porra. — esbravejou Izzy que trajava a farda do curso de enfermagem. — Eu quero te ajudar. Vem.

Naquela época, a Izzy ainda estava transacionando, ou seja, alguns de seus traços eram mais masculinos. Eu não conseguia manter contato visual. Ela limpou minhas feridas e colocou um band aid perto do meu lábio.

— Você não deveria brigar. Um rapaz tão bonito. — afirmou Izzy tocando no meu rosto de uma forma tão gentil.

— O...obrigado. Eu quase não senti nada. O senhor é muito bom no que faz...

— A senhora. Eu sou uma Lady. Me chamo Izzy Grey. — ela estendeu a mão e deu um sorriso.

— Sou Stefano. — respondi lhe cumprimentando.

— Prazer, Stefano. Você é da área?

— Sou do interior do Pará, uma cidade chamada Salinas. Estou morando sozinho aqui. — contei, sem ter pretensão de nada.

— Menino. Um pobre Anjo Caído. — comentou Izzy rindo. — Vamos fazer o seguinte. Eu estou morando sozinha e ter alguém para me ajudar em algumas tarefas vai ser bom. Você não é cracudo, né?

— Não senhora. Não uso drogas, não bebo. Sem qualquer tipo de vício. — falei tentando parecer o mais sincero possível, pois não podia perder aquela oportunidade.

— Ótimo, Anjo Caído. Agora vamos, temos um longo caminho até chegar em casa. — ela disse toda animada.

***

SÃO PAULO - ATUALMENTE

Depois de um tempo, eu soube o porquê da Izzy escolher o curso de enfermagem. Ela contou que depois de assistir Grey's Anatomy, o seu sonho era fazer medicina, entretanto, uma mulher trans nunca alcançaria tal proeza. Então, no curso de enfermagem, a Izzy se sentia próximo ao universo do seu seriado favorito.

Fora que no Brasil, uma mulher trans com conhecimento em primeiros socorros pode salvar vidas.

— Ei, capiroto. Será que ele quebrou alguma coisa? — perguntei, escorado na porta, observando Izzy terminar os curativos.

— Stef, eu não sei. Externamente, tudo está em ordem. E que ordem. — ela comentou olhando para o pênis do garoto.

— O remédio vai ajudá-lo a dormir, mas amanhã, meu filho, a gay vai sentir uma dor horrível, principalmente, no rosto. — garantiu Izzy levantando e passando por mim. — Eu vou tomar um banho. Qualquer coisa me avisa, Anjo Caído.

— Meu Deus. Quem será esse garoto? — pensei, o observando de longe, enquanto ele dormia profundamente na minha cama.

***

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Comentários

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Muito bom mesmo. O tipo de que história que te prende. Amanhã eu volto e leio o próximo capítulo.

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Anjo Caído, Stef, ou Garoto de Salinas - aqui na Bahia também tem um lugar lindo, uma cidade entre o mar e rios, chamada Salinas da Margarida - tua narrativa é gostosa de ler. Gosto da maneira com que vai costurando o texto, e já estou gostando de ti e de Izzy, e até do rapaz da cueca caríssima. Vejo que há uma corrente de ajuda entre vocês, coisa que tem se perdido no mundo hétero. Estou curioso com o desenrolar dessa trama que nos conta. Então... Conte-nos mais, querido.

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