Ma Petite Princesse - 2° Temporada - XVIII

Um conto erótico de Ana_Escritora
Categoria: Heterossexual
Contém 9089 palavras
Data: 22/11/2021 23:49:18
Última revisão: 22/10/2024 04:02:31

Sinopse: Primeiro mês no segundo semestre. Nívea e Eric longe um do outro, Melissa agindo diferente e tudo o que a nossa jovem menos desejava era ir ao local de trabalho do seu amor o qual estava há semanas sem estar junto.

***

Na minha consulta com a Doutora Márcia, as coisas ficaram um pouco complicadas. Iria fazer os exames de rotina, menos aquele que seria o mais importante: o transvaginal.

- Só poderia realizá-lo na presença e com autorização da sua mãe, Nívea - me explicou - Você não quis que ela estivesse aqui com você?

- Ela ainda não sabe. - respondi esfregando levemente as mãos uma na outra - Por isso eu vim com a minha amiga. - olhei para a Meli que sorriu pra mim.

- Entendi. E há quanto tempo você iniciou a sua vida sexual?

- Já tem um ano.

- Certo.

- A senhora vai contar para a minha mãe? - a aflição me tomou conta.

- Não, de jeito nenhum. Tudo o que for falado aqui fica entre médico e paciente.

- Que bom.

- Você e o seu namorado se protegem?

- Eu continuo tomando a pílula.

- E ele?

- Eu confio nele.

- Tudo bem. - ela suspirou parecendo não muito contente com a resposta - Sendo assim, vou apenas te pedir os mesmos exames do ano passado. O que é uma pena pois com esse exame mais específico, eu iria saber se está tudo bem com você.

Apenas concordei e ela me encaminhou até a sua outra sala onde vesti uma camisola aberta na parte de trás, me deitou na maca para me examinar e colher material. Depois, segui para o laboratório fazer coleta de sangue. Tudo no mesmo prédio.

- Daqui uma semana no máximo vai sair o resultado dos exames. Você pode acessar pelo site do laboratório, imprimir e trazer para que eu os veja.

- Tá bom.

- Alguma coisa que queira me perguntar? Dúvidas?

- Não. Vim apenas por rotina.

- Ok. Nos vemos na próxima consulta.

- Obrigada.

Eu e a Melissa deixamos o consultório e sugeri algum lugar para irmos comer.

- Ah, amiga. É que a minha mãe está me esperando em casa. Vou almoçar com ela.

- Tá bom. Vamos ao shopping hoje de tarde?

- Se importa se eu não for?

- Não. Perguntei porque sempre vamos aos sábados de tarde.

Estranhei aquilo. Melissa não querendo ir ao shopping?

- Meli, tá tudo bem? Você tá diferente... Tô te achando quieta desde a hora que saímos.

- Não, tá tudo bem sim. Só um pouco enjoada de ir pra shopping - senti que ela não queria prolongar muito a conversa.

- Tá. Mas você vem comigo trazer os exames?

- Sem falta, amiga. Venho sim.

Será que a minha amiga estava passando por algum problema e não queria me contar?

- Tem certeza que você tá bem?

- Tenho, Ni. Vamos pra casa?

- Vamos. - achei melhor não insistir.

***

Um mês.

Além de ter sido o meu período de férias de Verão, foi o tempo em que eu e o Eric ficamos longe um do outro desde o retorno das aulas.

O único jeito de matar a saudade foi vê-lo em sala. Ele se comportava normalmente como sempre, apresentando para a turma mais um período literário a ser estudado e comentando sobre a leitura para o bimestre. Mas eu podia perceber um pouco de tristeza em seus lindos olhos por mais que ele tentasse esconder.

Durante os dois horários da aula, eu sentia que ele me observava mesmo que por poucos segundos. Era assim desde a primeira vez que trocamos olhares. Passar as noites de sábado longe do calor do corpo dele foram uma tortura mas as dúvidas que insistiam em grudar na minha mente feito chiclete eram maiores. Não trocamos mensagens, não nos falávamos por telefone. Nada. Com isso, achei melhor me concentrar em outras coisas como a mudança da Melissa que me deixou preocupada. Ela não foi comigo para as aulas de dança mas me acompanhou até a Doutora para eu levar os exames. Felizmente eu estava bem. E de novo ela inventou uma desculpa para não querer passear.

- Tá sendo assim o mês todo - comentei com os meus pais durante o almoço de sábado - A Melissa sempre amou ir pra shopping e do nada ela perdeu a vontade. - Estávamos na mesa comendo frango assado ao forno com salada de brócolis e batatas fritas. Desde a inauguração da filial, minha mãe foi reduzindo os seus atendimentos aos sábados até deixar de atender de vez. Com a ajuda da Marina, ela conseguiu encaixar suas clientes mais antigas para os dias de semana. E então, o almoço em família aos sábados se tornou nossa nova rotina.

- Ela não te disse nada, meu amor?

- Não, mãe. - respondi e percebi que ela e o meu pai trocaram rapidamente seus olhares. - Vocês estão sabendo de alguma coisa?

- Não, món chére. - meu pai de imediato me respondeu - Mas não deve ser nada grave.

- Nem nas aulas de dança ela está indo. Eu não ligo de ir sozinha mas com ela é sempre mais divertido. Será que eu fiz ou falei alguma coisa que ela não gostou?

- Se fosse isso, ela com certeza iria te falar. Melissa não tem filtro.

Terminamos de almoçar e fui para o meu quarto estudar um pouco algumas matérias do colégio. Geralmente eu fazia isso aos domingos mas como a minha melhor amiga estava esquisita sem querer sair, me dediquei em ficar com os estudos em dia e avançar na leitura do livro indicado pelo Eric.

Em meio aos textos dos livros de segunda-feira, meu celular começou a vibrar na mesa com uma ligação da Gabriele. Aceitei a chamada enquanto olhava para uma página do livro de História.

- Tá de bobeira?

- Mais ou menos. Tô estudando.

- Preciso de umas modelos de rosto para testar uns batons que eu trouxe de Londres e aí pensei em você e na Melissa. Aqui em casa, pode ser?

- Pode. Mas acho que a Melissa não vai.

- Por que?

- Ela tá esquisita esses dias mas chegando aí eu te explico.

- Tá legal. Vou ligar pra ela assim mesmo e tentar. Posso pedir pro Evandro ir buscar vocês?

- Pode. Vou trocar de roupa rapidinho e espero ele.

- Show!

Fechei o livro, deixando-o na mesa e troquei de roupa, tirando o short preto e a blusa branca de alças, colocando uma blusa bege tomara que caia mas que cobria os ombros e com botões na frente, marcando os seios. A saia jeans era clara e as sandálias sem salto com mesma cor da blusa.

- Você vai pro condomínio agora meu amor?

Meus pais estavam na sala assistindo alguma coisa na TV quando já estava pronta e falei sobre o convite.

- A Gabi me telefonou, mãe. Ela quer que eu seja modelo de rosto.

- Ah sim... - ela sorriu sem jeito - Foi a Gabi.

- Foi, por que?

- Pensei de você ir para a casa do Frederik.

- Ia ter algum problema se eu fosse?

- Não, meu anjo, mas é que...

- Problema nenhum, Nívea. - meu pai interrompeu o que ela iria dizer - Sua mãe está preocupada apenas com o seu rendimento no colégio. Não é isso, Helena? Afinal, é mais um bimestre que começa.

- É... - ela me olhava com a mesma ternura de sempre - É isso.

- Ah sim. Mas eu prometo não demorar.

- Tudo bem, vá despreocupada. O Evandro vem te buscar?

- Sim, deve estar a caminho. Vou descer e esperar ele lá embaixo.

Era impressão minha ou não era apenas a Melissa que estava esquisita?

Me despedi dos meus pais e fui até o apartamento vizinho saber se ela iria comigo ou não.

- A Melissa não vai sair hoje, Nívea. - Dona Cecília foi quem me atendeu - Coloquei ela pra fazer faxina no quarto.

- Ah, que pena.

- Vocês conversaram?

- Não. Sobre o quê?

- Nada. - ela cruzou os braços - Além do quarto, ela vai me ajudar com algumas coisas aqui em casa. Por isso não vai sair.

- Entendi. Então dá um beijo nela por mim.

- Dou sim.

***

Eram incontáveis os itens de maquiagem espalhados pela penteadeira com o espelho e as pequenas lâmpadas em volta dele que lembravam um camarim. E todo o quarto da Gabriele teve a decoração mudada como se tivesse passado por uma pequena reforma. Talvez um dos vários presentes de aniversário, pensei enquanto observava tudo.

Fiquei sentada de lado, dando rápidas olhadas no espelho e ela analisava o meu rosto antes de começar os testes de beleza.

- Vocês duas são praticamente gêmeas - ela comentou enquanto me observava - É muito estranho te ver aqui sozinha, sem a Melissa. Você sabe o seu tipo de pele?

- É mista.

- Imaginei que fosse - ela abriu uma das gavetas, tirando um tônico facial com alguns discos de algodão - Vou limpar o seu rosto rapidinho, tá bom?

- Tá. E ela tá desse jeito. Evitando de sair comigo. - Gabriele colocou uma fita de elástico branca acima da testa, para afastar os fios de cabelo do meu rosto, molhou o algodão com o produto e começou a passá-lo na minha pele - Nem nas aulas de dança ela está indo.

- Deve ter acontecido alguma coisa muito séria... - terminou a rápida limpeza, jogando fora o algodão usado e guardando o tônico - Porque eu liguei pra ela e o celular só dava desligado. - voltando a me observar com mais atenção.

- Que foi?

- Nada. Estou analisando o seu rosto e esperando um pouco até o produto secar na sua pele. Cara, eu amo esse azul dos seus olhos...

- Também gosto. Se quiser fazer uma maquiagem preta, pode fazer que eu adoro. Eu só sei usar lápis de olho e máscara que aumenta os cílios porque destaca mais o azul.

- Pode deixar. Mas o meu foco está nos batons.

- Quais cores você comprou? - perguntei assim que ela pegou no meu queixo, levantando um pouco o meu rosto e ficou de pé, bem perto de mim.

- Alguns tons de vermelho, puxado para o cobre.

- Legal.

- Eu queria que a Melissa também viesse porque seria a minha primeira vez maquiando uma ruiva. - pegou uma base líquida e colocou uma pequena quantidade nas costas da mão - As suas bochechas são tão rosadas e contrastam com a sua pele branca...

- Isso é ruim?

- Mais ou menos. Não é qualquer tom de base que eu posso colocar no seu rosto. Você pode virar um palhaço de circo. - e rimos.

Gabriele começou a procurar uma base que tivesse um tom mais natural até achar uma pequena bisnaga, colocando no meu rosto e espalhando com um pincel macio. A habilidade dela era incrível. Quando terminou, me olhei no espelho e parecia que não tinha maquiagem nenhuma.

- Essa base é ótima. - elogiei enquanto me olhava.

- Depois você tira uma foto da embalagem se quiser comprar - voltou a fazer com eu olhasse na sua direção - Agora um batom vermelho escuro, que tal? Depois eu vou para os seus olhos.

- Meu rosto hoje é seu!

O batom era um vermelho bem escuro que ela começou a passar nos meus lábios com a ajuda de um pequeno pincel.

- Cadê o seu irmão, Gabi?

Ouvimos uma voz desconhecida na direção da porta do quarto. Tomei um susto quando vi uma garota, mais branca que eu cujos cabelos eram loiros cheio de luzes até abaixo dos ombros e com os olhos borrados de maquiagem preta, apareceu na porta do quarto usando apenas calcinha e sutiã cor de rosa.

- Não devia estar com você na cama? - Gabriele respondeu normalmente voltando a atenção para o meu rosto.

- Acordei e ele não estava. Nem no banheiro.

- Deve ter ido na cozinha, sei lá... E coloca uma roupa ao invés de ficar andando pelos corredores da casa desse jeito porque minha avó não é obrigada a cruzar com você assim.

- Ih, tá bom sua chata! - ela fechou a cara - Vou esperar por ele no quarto! E saiu batendo os pés descalços e segundos depois ouvimos o bater de outra porta se fechar.

- Seus pais não ligam do seu irmão trazer as garotas pra cá?

- Nada. Melhor dentro da nossa casa do que em outro lugar, isso vazar para as revistas de fofoca e atingir os nossos pais - ela explicou enquanto passava com atenção a máscara que deu um volume enorme nos meus cílios - Os assessores deles concordam que assim é melhor até porque ainda somos menores de idade. Essa bobeira toda de imagem.

- Isso é verdade. E qual o nome dela?

- Sei lá! Não viro super amiga das garotas que o meu irmão come. Elas me conhecem mas eu não.

Gabriele continuou a me maquiar e quando terminou, quase que não me reconheci. Ela conseguiu produzir um efeito nos meus olhos em que o azul ganharam um destaque lindo.

- Vou no outro quarto pegar a câmera do meu pai - e saiu ligeira me deixando sentada na penteadeira. Não demorou muito e ela voltou com uma câmera preta nas mãos estilo profissional. Tirou a fita dos meus cabelos e ajeitou os fios antes de começar a me fotografar.

Foram várias as fotos do meu rosto em que eu fiquei fazendo todas as poses possíveis. E a cada mini sessão, um retoque na base e uma nova cor de batom para novas fotos. Para mim que sempre fui tímida, foram momentos divertidos.

- Vou postar ainda hoje mas eu te envio antes. Posso te marcar no meu Instagram?

- Pode postar as fotos mas sem me marcar.

- Não quer ganhar seguidores não, boba? Linda do jeito que você é!

- Eu já tenho cinco mil e acho muito!

- Depois que o meu perfil ganhou o selo azul de verificado, os seguidores dispararam!

- Que bom. Ainda vai tirar mais fotos?

- Não, já tirei o bastante. Se quiser, pode ir no banheiro limpar o rosto - e abriu novamente a gaveta mas desta vez, me entregando um outro tônico removedor de maquiagem e vários discos pequenos de algodão.

Fui na sua suíte e tirei toda a maquiagem que ela havia feito até não sobrar mais nada. Quando voltei, a sua penteadeira estava arrumada e ela apenas retocava o batom rosado nos lábios.

- Que tal irmos ao bosque dar uma voltinha? - ela terminou de pintar os lábios, guardando o batom e se virando pra mim.

- Prometi aos meus pais que não ia demorar muito.

- O Frederik ia adorar ver você - e sorriu do seu jeito debochado, me fazendo fechar a cara - Tá bom, deixa pra lá! Mas é uma pena...

- O quê?

- Você não dar uma chance pra ele. O Frederik é muito gente boa, Nívea. Namora com ele!

Abaixei o olhar, sem saber o que responder. Mesmo sem estar junto, eu pensava no Eric todos os dias. A saudade das nossas noites de sábado era imensa e a situação entre eu e ele não estava resolvida, me deixando triste. Me sentia incomodada em ter essa conversa com a Gabi pois eu jamais seria capaz de corresponder ao verdadeiro sentimento do meu amigo.

- Não é justo com ele. Começar a namorar sem sentir nada especial.

- Você não quer nem tentar?

- Já disse, não é justo!

- Tá legal, mesmo torcendo por vocês, tenho que concordar. Quer que o Evandro te leve pra casa?

- Se ele não tiver ocupado...

- Eu falo com ele - pegou o seu celular na cama enviando uma mensagem - Vamos lá pra sala.

Deixamos o quarto e seguimos até a sala onde a Dona Raquel estava assistindo um programa de culinária.

- Já vai pra casa, minha querida? - sua atenção se desviou da televisão para nós duas.

- Sim, Dona Raquel. Só vim pra ser a modelo da Gabi.

- Podia passar o final de semana conosco.

- Deixa para uma próxima vez.

- Você viu o meu irmão, vó?

- Desceu com o seu pai mas eles não iam demorar... Por que?

- Ele traz essas garotas para cá e depois some.

No mesmo instante, a porta do elevador da cobertura se abriu onde pai e filho apareceram juntos.

- Oi Nívea! - Patrick abriu um sorriso ao me ver e me beijou na testa - Vai ficar o fim de semana aqui?

- Como vai, Nívea? - William me cumprimentou, do mesmo jeito que o filho.

- Vou bem, obrigada. Não Patrick, já vou pra casa. Só vim ser modelo pra sua irmã por algumas horas.

- Patrick, vai no seu quarto e dá um jeito na bonitinha que você largou por lá! - a irmã ordenou.

- A Lívia ainda não foi embora? - perguntou surpreso.

- Não, ela não foi!

- Leva a menina até em casa, filho! Ela é daqui de onde a gente mora não é?

- É, sim.

- Nem almoçar a mocinha quis - Dona Raquel comentou - Ficou o tempo todo no seu quarto.

- Saco. Vou lá falar com ela. Bom te ver, Nívea. - e saiu em direção ao corredor que levava aos quartos.

- Vamos descer, o Evandro já está vindo.

Me despedi da avó e do pai dos meus amigos e desci com a Gabriele para a portaria. Não demorou muito e o carro que iria me levar estacionou em frente à entrada no que eu me despedi dela rapidamente entrando no carro.

- Boa tarde, Evandro - me acomodei no banco de trás.

- Como vai senhorita Nívea?

- Vou bem.

- Senhorita Melissa não veio com você? - ele deu partida no carro dirigindo em direção à saída.

- Desta vez não. Todos estranham quando não estamos juntas - e ri.

- Realmente é estranho. - ele concordou.

Seguimos o caminho até a minha casa em silêncio. Fim da tarde de sábado e o trânsito estava tranquilo. Evandro não dirigia em alta velocidade e isso me deu tempo para pensar no que eu e a Gabriele tínhamos conversado. Será que o Frederik sofria por eu não corresponder ao que ele sentia por mim?

- Evandro...

- Sim, senhorita.

- Posso te perguntar uma coisa? Mas é um pouco pessoal...

- Se eu puder responder...

- Já amou sem ser correspondido?

- Sim, na minha época de escola. Principalmente quando se tratava do gordinho da turma que sofria bullying e a garota mais bonita do colégio nem olhava pra você.

- É sério? Você era gordinho? - fiquei sem reação ao ouvir o que ele havia acabado de me revelar, me aproximando do assento do motorista.

- Impressionante, né? - e deu um sorriso sem tirar os olhos da direção.

- E é ruim amar sem saber que não tem a menor chance?

- Muito. Na adolescência é pior porque são muitos os questionamentos nessa fase. O que eu tenho de errado? Por que ela não me olha? E no meu caso, era pior devido aos meus complexos por ser gordo. Baixa auto estima, pior aluno nas aulas de educação física...

- E como você fez para melhorar? Não que ser gordo seja defeito.

- Um dia eu me olhei no espelho e não gostei do que vi. E decidi de uma vez por todas que iria mudar. Me matriculei em uma academia e fiz dieta. Quando entrei para as forças armadas, minha dedicação com a aparência dobrou.

- E as garotas passaram a se interessar né?

- Digamos que nesse campo, as coisas melhoraram sim - ele sorriu um pouco envergonhado - Mas por que a pergunta, senhorita?

- Eu fico pensando no Frederik - abaixei a cabeça - Infelizmente eu não posso corresponder ao que ele sente por mim.

- O que ele sente por você é verdadeiro e muito especial.

- Eu sei. E me sinto mal por isso mesmo eu não dando esperanças à ele.

- Eu entendo. Ele comentou comigo uma vez que você namora uma pessoa mas escondida dos seus pais.

- Sim - e de novo o dono dos olhos azuis mais lindos que eu conheci dominou os meus pensamentos - Eu o amo muito.

- Sem querer me intrometer, senhorita, mas por que não conversa com os seus pais sobre essa pessoa?

- Ele é mais velho que eu, Evandro. Não sei como eles reagiriam a isso.

- Muito mais velho?

- Mais velho que você.

- Uau - ele suspirou fundo demonstrando um certo espanto - Se eu estou com vinte e sete anos e ele é mais velho... Realmente as coisas complicam um pouco. Por acaso eu o conheço?

- Eu... Eu prefiro não falar - e voltei os meus olhos para as minhas mãos estalando os meus dedos de leve.

- Tudo bem.

- Você guarda segredo, não guarda?

- Desde que aceitei trabalhar para as duas famílias, o que eu mais tenho feito de melhor é guardar segredos. O seu será apenas mais um.

- Ah sim... - os flashbacks de vários momentos que o envolvia se espalharam pela minha cabeça e fiquei pensando o que mais ele poderia esconder.

- A única coisa que eu espero é que você tome muito cuidado para que ninguém descubra quem é essa pessoa.

- Eu tomo cuidado sim. Eu e ele.

- Que bom.

Evandro me deixou em frente ao meu prédio eram quase sete da noite e entrando em casa, tudo estava silencioso. Fui até o quarto dos meus pais e ao ver a porta fechada e um ar frio sair por baixo dela, achei melhor não incomodá-los. Sempre respeitei a privacidade deles.

Voltando para o meu quarto e tentando telefonar para a Melissa, realmente o celular dela estava desligado. Eu poderia ir mais uma vez falar com ela pessoalmente mas talvez eu me passaria por chata. Ainda assim eu estava preocupada sobre o que estaria acontecendo com a minha amiga.

Mais um fim de semana sem me divertir com a Melissa e mais uma noite de sábado sem estar no conforto dos braços do Eric. Pizza e filmes seriam a minha companhia naquela noite.

Aquele primeiro mês do início de semestre se tornou o mais entediante e chato para mim desde que tornei a melhor amiga da minha vizinha de apartamento e conheci o meu amor.

***

Final de mais uma segunda-feira de aula e fui uma das primeiras a sair de sala, seguindo direto para a portaria do colégio. Evandro já nos aguardava do outro lado da rua com o carro estacionado e então atravessei, ficando perto dele e esperando pelos meus amigos para irmos embora. Foi bom ficar longe da movimentação da saída de alunos porque não queria arriscar ver o Eric. Ser apenas a aluna dele nas primeiras semanas de volta às aulas se tornou algo angustiante pra mim. Estar perto por apenas duas horas não era o suficiente para amenizar a saudade de nós dois juntos.

Vi Frederik e Patrick atravessarem a rua sem a Gabi.

- Cadê a sua irmã?

- Foi no banheiro, ela já deve estar vindo.

- Seu pai falou alguma coisa com você, Nívea?

- Não Frederik, sobre o quê?

- O bloco de carnaval que você desfilou junto com a sua mãe e a Melissa, a concentração dele foi naquela faculdade não foi?

- Sim, por que?

- O meu pai vai dar uma palestra amanhã para os alunos do curso de Direito no horário da noite e convidou nós três pra irmos, que tal?

- É, Nívea, fazer uma zoeira em faculdade!

''Onde o Eric dá aula...''

- Ah não sei, pode acabar tarde...

- O Senhor Bertrand vai palestrar em dois horários, senhorita - Evandro explicou, deixando de olhar para o seu celular e dando atenção para mim - Podemos ficar tranquilamente apenas no primeiro que vai começar por volta das sete da noite e depois voltamos para casa.

- Eu vou pensar... Posso responder amanhã?

- Pode sim. Mas vai ser legal se você for.

- O Felipe, irmão da Meli, vai se formar em Direito no fim do ano. Posso falar com ele também.

- Ah legal, vê se ele não quer assistir a palestra do meu pai, é sobre Direito Empresarial.

- Assim que eu chegar em casa, vou direto falar com ele.

- Fechou então.

Esperamos mais alguns minutos e então vimos a Gabriele do outro lado da calçada esperando alguns carros passarem. Ela atravessou, se juntou a nós e então entramos no carro para irmos embora.

Ir na faculdade em companhia dos meus amigos seria um bom passeio. Mas eu iria correr o risco de me encontrar com ele e não saber como reagir. Muita falta de sorte, eu e o Eric nos encontrarmos em um lugar tão grande como aquele.

Uma confusão de sentimentos dentro de mim começou a ganhar força: a saudade por ficar longe dele e o medo de possivelmente nós dois nos encontrarmos e ficarmos a sós sem conseguir nos acertar. Durante o percurso até a minha casa, eu pensei bem se seria uma boa ideia ou não essa ida até a faculdade.

Assim que saí do elevador, fui até o apartamento vizinho torcendo para o Felipe estar em casa e falar com ele. Toquei a campainha e, para a minha surpresa, Melissa atendeu.

- Oi amiga! - ela sorriu pra mim. Estava super a vontade com uma calça de pijama xadrez e blusa preta de alças.

- Seu irmão tá em casa? - perguntei de forma direta.

- Você quer o quê com o Fê? - ela cruzou os braços, dando uma levantada na sobrancelha - Brincadeira, entra aí! Felipe, a Nívea quer falar com você!

Por sorte, não apenas o Felipe mas o pai e a madrasta estavam em casa. Dona Cecília deitada no sofá com alguns papéis se virou para me cumprimentar, enquanto que pai e filho estavam sentados na mesa de jantar com o notebook aberto.

- Precisava falar com você, Lipe - me aproximei da mesa ficando em pé atrás de uma das cadeiras.

- Sobre o quê?

- Você tá sabendo das palestras que estão acontecendo na sua faculdade não é?

- Não apenas sabendo como me inscrevi em algumas. Participei hoje de duas e depois vou em mais algumas na quarta e na quinta-feira. Essa semana toda os alunos não terão aulas, vai ser só palestras, oficinas, essas coisas...

- Ah, entendi. Você não quer participar de uma palestra amanhã de noite, não?

- Amanhã de noite... - ele voltou a atenção para a tela do notebook - Pode ser... É sobre o quê?

- Sobre Direito Empresarial, vai começar acho que sete horas.

- Deixa eu ver... Terça-Feira de noite... Achei. O nome do palestrante é Simon Bertrand?

- Isso! É o pai do Frederik!

- Aaahhh - ele deu um sorriso debochado e me encarou, colocando as duas mãos cruzadas atrás da cabeça - O pai do menino Frederik - e manteve o sorriso.

- Ai Felipe, deixa de bobeira!

- Tô falando nada, ué.

- Frederik é o menino que viajou para a Inglaterra? - o pai perguntou - Lembro do seu pai comentar no dia do seu aniversário.

- Isso, ele falou comigo sobre a palestra agora na saída do colégio.

- Entendi.

- A apresentação dele vai começar sete e meia da noite - Felipe comentou com os olhos na tela - Na verdade serão dois horários de palestra e cada um vai contar com quatro horas de atividade extracurricular. Interessante...

- E isso é o quê?

- São horas de atividades a mais que os alunos precisam acumular ao longo do curso inteiro, além das disciplinas. Eu já bati a minha meta e tô indo a essas palestras só porque os temas tem a ver com o que eu quero. A área criminal.

- Ah tá. E a palestra dele não tem muito a ver com você...

- Na verdade, nada a ver. - e sorriu.

- Bom filho, mesmo não sendo o assunto do seu interesse por que você não vai? Serão mais horas acumuladas.

- E eu tô vendo aqui, o primeiro horário conta com duzentas vagas e já tem cento e oitenta e seis ocupadas. Vai ser no auditório... - ele continuava a olhar para o notebook com atenção - Vou me inscrever então.

- Ah, legal! - coloquei a minha mochila pra frente do meu corpo e peguei o meu celular na bolsinha - Vou mandar uma mensagem pra ele dizendo que você vai!

- Isso... Fala com o seu amor.

- Chato.

Enviei a mensagem rapidamente para o Frederik confirmando a inscrição do Felipe e até então, Melissa estava quieta ouvindo toda a conversa.

- Você também vai, Ni?

- Então... O Frederik quer que eu vá e...

- Ooown, que fofo! - o irmão mais velho continuava a debochar - Ele quer que você vá! - e começou a rir sem parar.

- Felipe, não tem graça!

- Tem sim! - continuou a rir - Muito mais graça do que você imagina!

- Bobo - no fundo eu sabia o que ele queria dizer - Mas então Meli, ele quer que eu vá mas ainda estou pensando... Você não quer ir com o Lipe? Aí a gente se encontrava lá.

- Xiii - olhei para ele sem entender.

- Mãe, deixa eu ir, por favor... - a ruiva pediu à Dona Cecília que continuava deitada no sofá lendo os papéis nas mãos - Os amigos da Nívea devem ir...

- Eles vão. - confirmei.

- Eu e você já conversamos sobre isso, Melissa. Assunto encerrado. - falou a deixando triste.

- Deixa a menina ir, Cecília! - o padrasto interveio - Ano que vem é o último ano no colégio, vai ser bom esse passeio na faculdade!

- E é por sua culpa que ela está assim! - se levantou rapidamente do sofá com a voz alterada, jogando com força as folhas de lado e apontando para o marido, que respirou fundo calado - Por você passar a mão na cabeça dela e enchendo de vontade!

- Eu volto depois... - o assunto em família iria pegar fogo e o melhor era ir embora.

- Não Nívea, fica! E assim a sua amiga conta a verdade! Conta Melissa! Ou você acha que a Nívea não percebeu o que está acontecendo esse mês todo?

- Eu percebi, Dona Cecília, mas achei melhor não perguntar nada, nem insistir. - olhei para a Melissa e ela já chorava sem parar. Lhe dei um abraço com o rosto dela apoiado no meu ombro - O que tá acontecendo Meli? Me conta.

- Melissa está de castigo, Nívea. - a mãe finalmente revelou o motivo de toda aquela mudança da filha.

- Castigo? Mas por que?

- Está com notas baixas no colégio. Matemática, Física, Química... Quer que eu continue ou você fala?

- Meli, por que você não me contou? Eu podia te ajudar!

- Você já estuda o dia inteiro, eu não ia encher o seu saco com isso. - me falou em meio às lágrimas.

- Por isso então você não estava saindo comigo...

- Isso mesmo. - Dona Cecília continuou - Permiti apenas que ela fosse com você na sua médica. Cortei a mesada dela pela metade desde as primeiras provas e quando eu recebi as notas do segundo bimestre, precisei engolir em seco porque ela já tinha viajado com a minha irmã! Se fosse antes ela não ia viajar. E quando as aulas recomeçaram, nós conversamos sério, mantive o castigo, cortando o celular nos finais de semana e os passeios que ela tanto gosta. E a mesada continua pela metade até as notas dela melhorarem!

- Poxa amiga, que feio. Você é tão esperta... - continuamos abraçadas - E agora?

- Agora ela vai se virar pra estudar e tirar boas notas. Isso se quiser escapar da recuperação. Eu sinto muito Nívea, mas precisei fazer isso.

- Tudo bem, é triste mas eu entendo.

- Ela já tem idade suficiente para ser responsável com os estudos e já que não se interessa, tirando notas baixas, vai ficar sem o que gosta de fazer. A Melissa não vai amanhã. - deu a sua palavra final, recolheu as folhas do sofá e saiu da sala indo para o seu quarto.

Felipe e o Senhor Henrique estavam calados ouvindo todo o sermão e quando viu que a esposa já estava dentro do quarto, o padrasto se levantou da mesa, ficando frente à frente com nós duas.

- Melissa, olha pra mim. - ele pediu calmamente com os braços cruzados e ela obedeceu ainda com o nariz vermelho e inchado de tanto que tinha chorado - Você sabe que a sua mãe está com a razão, não sabe?

- Eu sei... - a voz dela estava de um jeito que cortou o meu coração. Nunca tinha visto a minha amiga assim.

- Eu vi os seus dois boletins e não tive como impedir o que ela fez. Suas notas estão decepcionantes, sim. Agora me responde uma coisa: como você acha que ela vai reagir se descobrir que a parte da sua mesada cortada sou eu que estou cobrindo? Dando na sua mão em dinheiro porque nem via pix eu posso transferir pois ela tem acesso à sua conta. Me diz? Imagina se ela descobre?

- Meu Deus... - arregalei os olhos com aquela revelação.

- Tá vendo só? - Felipe se intrometeu - É nisso que você erra! Enche a minha irmã de vontade e ela tá desse jeito!

- Shhiuu, Felipe! - o pai virou apenas o olhar, sem encará-lo, pedindo o filho para ficar quieto.

- NINGUÉM TE CHAMOU AQUI NA CONVERSA SEU IDIOTA! - a ruiva gritou com ele, ainda chorando.

- Fica calma, Meli... - e continuamos abraçadas com o seu rosto no meu colo.

- Eu estou indo lá dentro agora, conversar com a sua mãe e tentar convencer ela pra deixar você ir amanhã. Entendeu?

- Entendi... - ela falou baixinho.

- Olha pra mim - ela enxugou o rosto, limpando as lágrimas e o olhou nos olhos - Agora somos eu e você - ela fez que sim com a cabeça.

- Vamos na cozinha amiga, você bebe um copo d'água e se acalma - tirei a mochila das minhas costas, colocando no sofá e pegando ela pela mão.

Enquanto ela pegava uma garrafa de água na geladeira para beber eu a observava.

- Eu devia ficar muito chateada com você, sabia? Podia ter pedido a minha ajuda! - reclamei e ela bebia calmamente a água.

- Eu não quis te falar nada - terminou de beber, deixando o copo na pia e ficou com os braços cruzados - Mas eu não tô legal esse ano não... A viagem de férias foi a melhor coisa que aconteceu até agora.

- O quê que você tem?

- Depois nós conversamos melhor.

- Eu não quero que você me esconda mais nada porque eu não te escondo!

- Eu sei. Me desculpa. - e me deu um abraço bem apertado.

- Melissa, vem aqui - ouvimos a voz do padrasto que apareceu na porta da cozinha.

Saímos nós duas e quando chegamos na sala, Dona Cecília estava de volta com o marido por trás acariciando os seus ombros e cheirando os seus curtos cabelos ruivos. Seu olhar ainda estava sério mas ela parecia mais calma.

- Eu vou deixar você sair amanhã, Melissa... - ela comunicou, o que fez a ruiva abrir um enorme sorriso mesmo com os olhos inchados - Mas vou fazer isso por causa da Nívea! - O padrasto por trás também sorria.

- Ai mãe, obrigada! - ela correu para abraça-la - Eu prometo recuperar todas as minhas notas! De verdade.

- Não é mais pra mim que irá cumprir as suas promessas! Você está nas mãos do Henrique!

- Isso mesmo, minha querida - ele apertou os ombros da esposa - Melissa a partir de hoje tem um compromisso comigo.

- A única coisa que ficará mantida é o corte da sua mesada, ouviu?

- Vai sim! Fica tranquila... - e ele piscou para a minha amiga.

- Tá bom, mãe. - disse fingindo e terminando de limpar o rosto.

- E depois eu e você também vamos conversar - peguei minha mochila de volta colocando nas minhas costas - Vou pra casa agora. - dei um beijo no seu rosto e me despedi de todos, saindo em seguida.

***

Sentada em posição de borboleta na cama dos meus pais e usando roupas confortáveis, eu demorei um pouco para absorver o que meu pai tinha acabado de dizer.

- Então nosso querido menino Frederik estragou a surpresa - ele disse sorrindo, enquanto tirava o paletó de trabalho e os sapatos ficando mais à vontade - Mas tenho certeza de que ele não fez por mal.

- Você também vai palestrar na Universidade, papa?

- Oui, filha. A Universidade fechou uma parceria com a empresa e alguns diretores irão se apresentar durante essa semana. Eu serei um deles. Sexta-feira estarei com os alunos de Engenharia de Produção.

- E o Senhor Simon será amanhã...

- Exactement! Eu e sua mãe iremos como convidados dele e fico feliz em saber que você irá com os seus amigos.

- A sorte é que amanhã eu estarei na filial do campus atendendo - minha mãe saiu do seu closet comunicando - Fecho a clínica às sete e me encontro com vocês! - ela se sentou na cama e deu um beijo no meu rosto.

- Eu devo chegar mais cedo porque o Evandro vai nos levar quando sairmos do colégio.

- Melhor ainda, meu anjo.

Se eu ainda tinha alguma chance de não ir até a faculdade, ela se foi pelo ralo. Tudo piorou mais ainda depois de saber que eu estaria lá novamente na sexta-feira por causa do meu pai. Realmente eu não tinha como escapar.

Talvez um sinal de que a minha situação com o Eric já estava passando da hora de ser resolvida. Respirei fundo me rendendo para aquela semana que me aguardava.

- Descobri o que estava acontecendo com a Melissa... - mudei de assunto para não pirar e meu pai se sentou na beira da cama - Vocês já sabiam?

- A Cecília conversou comigo e com a sua mãe quando vocês estavam viajando. A situação dela na escola é bastante delicada.

- Fiquei triste porque ela podia ter me contado.

- Ela ficou envergonhada, meu amor - minha mãe tirou uma mecha do meu cabelo colocando atrás da minha orelha - Por isso não te disse nada.

- Ela só vai amanhã porque o Senhor Henrique conseguiu convencer a Dona Cecília.

- Será que a Cecília autoriza a Melissa a ir na sexta-feira também?

- Só se você conversar com ela, pai! Aproveita e convida o Felipe também.

Ele me observava pensativo e decidiu:

- Certo, vou tomar um banho e depois vou até lá conversar com eles.

***

Quando saímos do colégio, o trânsito a caminho da faculdade estava lento, algo normal para o horário. Mesmo assim, não foi nada estressante. Por mim, quanto mais lento melhor pois demoraríamos para chegar.

Fiquei quieta durante todo o percurso enquanto os meus amigos não paravam de falar. Na verdade, quem falava mais era sempre a Gabriele. E o cansaço normal de um dia inteiro de aula não foi o bastante para que a aflição em mim não diminuísse por saber que talvez eu e o Eric iríamos nos cruzar.

Evandro conseguiu estacionar em uma rua próxima ao campus e a movimentação de carros e de alunos era intensa. O comércio, os restaurantes e outras pequenas lojas pareciam não dar trégua nos atendimentos.

Aquele clima universitário ainda não me chamava a atenção em nada. Não tinha motivo para pensar em qual graduação eu iria estudar uma vez que ainda faltavam longos meses para o fim do Ensino Médio. Mas eu achava legal saber que os meus três amigos já sabiam o que queriam fazer na vida adulta. Frederik no Jornalismo, Gabriele se tornar uma maquiadora famosa e Patrick alguma coisa voltada para Informática que ele já tinha comentado.

- Fiquem todos juntos! - Evandro orientou enquanto saíamos do carro - Vão levar as mochilas com vocês?

- Eu vou levar a minha - segurei as duas alças com força tentando controlar a ansiedade - Quando acabar a apresentação eu volto pra casa com os meus pais.

- Tá certo, senhorita.

Frederik, Gabriele e Patrick deixaram as mochilas no porta-malas e então seguimos pela calçada até a entrada principal do campus. Meu coração batia acelerado porque mesmo em um lugar tão grande como aquele, eu e ele poderíamos nos cruzar.

- Vocês vão se importar se eu ficar na clínica com a minha mãe? Ela fica logo ali - apontei para o outro lado da rua - Ainda é cedo até a palestra começar.

- Tem certeza, Nívea? Podemos passear pelo campus até o horário da apresentação do meu pai.

- A minha mãe também vai com o meu pai, Frederik. E aí nos encontramos no auditório.

- Se você prefere...

- Você tá bem, Nívea? Ficou calada o tempo todo no carro...

- Estou bem Patrick, só cansada mesmo.

- Tá legal.

Eles concordaram e enquanto eu os via entrando, segui em frente e atravessei a rua até a clínica da minha mãe. Respirei aliviada por conseguir adiar uma coisa que eu nem sabia se ia acontecer.

Toquei a campainha que era semelhante a um interfone e que ficava ao lado do portão, no muro repleto de folhagens verdes e suspensas. Depois de poucos segundos, ele se abriu e eu entrei. O chafariz da decoração na entrada estava ligado e criava um clima mais ameno ao calor que fazia naquele início de noite.

Entrei na recepção e não havia clientes esperando. ''Minha mãe deve estar realizando o último atendimento'', pensei enquanto me aproximava do balcão. E se eu perguntar pela minha mãe talvez elas não saibam quem é. Então vai ser o nome.

- Boa noite. A Helena está atendendo?

Uma das recepcionistas muito bem maquiada e vestida, usando um uniforme de cor azul e com os cabelos presos em um coque, igual o de aeromoças, levantou da cadeira e me olhou de cima a baixo com um ar esnobe que me incomodou.

- Você é estudante? - me perguntou apoiada no balcão sem tirar os olhos de mim.

- Sou sim, mas é que...

- A Helena Toledo só atende com hora marcada e no seu caso, que é estudante, acompanhada de um responsável maior de idade! - e cortou o que eu iria dizer sem me deixar explicar, sendo grosseira e ríspida.

- Não, mas você não está entendendo...

- Não estou entendendo o quê? Já disse o que é preciso fazer. Caso queira marcar uma consulta, precisa telefonar para cá - me entregou um pequeno cartão o qual eu já tinha decorado todas as informações nele - E procurar saber sobre os horários dela de atendimento.

- Eu já tenho esse cartão, senhora. - recusei e respirei fundo, revirando os olhos.

- Carla, você tá doida? - a sua colega de trabalho, sentada do lado, chamou a atenção - Tratar a menina desse jeito?

- E tu conhece ela de onde, Isabel?

- Você não estava aqui no dia da festa de inauguração não é mesmo? - perguntei tranquilamente - Não me lembro de você.

- Estou cobrindo as férias da Cláudia desde ontem... Eu trabalho na matriz da Barra. Mas pra quê você quer saber?

- Sendo a MINHA FILHA, ela pode perguntar o que quiser, Carla! - minha mãe apareceu na entrada que dá acesso às salas de atendimento - Então é assim que você trata as clientes que aparecem sem hora marcada?

- Filha? - ela ficou pálida e sem saber como reagir pois não tinha reparado na presença da dona do Espaço - Meu Deus, me desculpe por favor!

- Tudo bem... Abaixei a cabeça sem jeito.

- Isso mesmo! A minha filha. Vem cá, meu amor - ela estendeu o braço me chamando e me aproximei onde trocamos um abraço - Veio para a palestra? - Me deu um beijo no topo da minha cabeça.

- Sim. Ainda está cedo e vim ver você.

- Tem mais alguma cliente hoje, Isabel? - ela perguntou abraçada a mim - Marina deixou a agenda com você?

- A de seis e vinte telefonou confirmando e já deve estar chegando.

- Certo. Você me espera, meu anjo? Vamos juntas para a faculdade e encontramos o seu pai.

- Claro.

- E você, Carla... - era estranho ver minha mãe dando bronca - Amanhã mesmo vai assinar uma advertência. Passe direto na sala da Marina.

- Ela já foi embora, mãe?

- Já sim. Vem comigo, fica na minha sala.

Caminhamos juntas e quando olhei para trás, a recepcionista estava sentada sem saber onde enfiar a cara tamanha era a vergonha. Entramos na sala da minha mãe que mais parecia um pequeno escritório. Era a primeira vez que eu estava vendo tudo arrumado pois no dia da festa, fiquei apenas do lado de fora junto dos convidados.

- Ela é sempre grossa desse jeito? - caminhamos até a outra sala dos atendimentos e a observei se arrumar, prendendo o cabelo e colocando o jaleco branco.

- A Carla não queria vir pra cá cobrir as férias da Cláudia pois daqui até onde ela mora fica longe. Mas eu não tinha ninguém para ocupar. Eu também relevei muito essa falta de educação dela com outras clientes. Se fosse a Marina flagrando seria uma suspensão na hora.

- Que chato.

- Pois é, mas não liga pra isso não, meu amor...

Ouvimos o telefone tocar e então ela foi até a sua mesa atender. Era a cliente que a Isabel, que parecia ser mais boazinha, tinha falado.

Deixei a minha mochila no chão e fiquei sentada de bobeira na poltrona confortável enquanto ela recebia sua última cliente do dia. Nos cumprimentamos normalmente e quando elas entraram na sala, peguei meu celular na mochila e minutos antes tinha uma mensagem da Melissa.

- Cheguei aqui no Campus com o Fê agora, tu tá aonde?

- Tô aqui na minha mãe.

- Ah, tá.

- Se acontecer de você encontrar o Eric, não fala nada pra ele que eu estou aqui, não...

- Tudo bem, mas e se ele ver o Frederik ou um dos outros?

- Ah, aí deixa acontecer.

- Tudo bem. Você quem sabe.

- Assim que a minha mãe terminar de atender, eu e ela vamos encontrar vocês.

- Já é então. Beijo.

- Beijo.

Recostei minha cabeça na poltrona e rezei para não me encontrar com ele pelos corredores da faculdade ou por outro lugar que fosse. Não sabia como ele ia me tratar depois de um mês afastado de mim.

Ao mesmo tempo que a saudade dele doía no peito.

***

Eu e a minha mãe chegamos juntas no auditório e ele já estava com quase todos os lugares ocupados. Um burburinho normal de vozes tomava conta do lugar. Perto do palco, vimos o Senhor Simon conversando com um homem e ao lado dele uma moça loira com os cabelos cacheados.

Antes de ir cumprimentá-lo, falamos rapidamente com o meu pai que estava sentado na primeira fileira aguardando a palestra começar.

- Que bom vê-las aqui - o pai do meu amigo nos cumprimentou contente - Espero que gostem da apresentação.

- É um prazer, Simon. - minha mãe sorria mas ao mesmo tempo parecia séria - Como vai, Carina?

Paralisei feito estátua e gelei por inteira ao saber finalmente de quem ela se tratava. Era mesmo linda. Bem maquiada e vestida igual uma executiva dos filmes e séries.

- Vou bem Helena, obrigada - ela sorriu enquanto segurava uma pasta - Você deve ser a Nívea?

- Sim, muito prazer.

- Igualmente.

- Com licençaaaa - ouvi a voz do Patrick surgir atrás de mim e suas mãos pousarem nos meus ombros - Mas a Nívea irá se juntar a nós, onde estamos sentados - e me tirou de onde eu estava, me empurrando devagar mantendo as mãos onde estava - Vem comigo!

Saímos dali e subimos uma pequena rampa até as poltronas onde os nossos amigos estavam, incluindo a Melissa e o Felipe.

- Patrick, aquela ali é...

- Shiuuu - ele sussurrou baixinho no meu ouvido - Ela mesma. Não te disse que era gata?

- Tem razão.

Alguns minutos se passaram e enfim a palestra começou. De onde eu estava sentada, vi a minha mãe se sentar ao lado do meu pai. Eu estava ali apenas para apoiar o pai de um amigo. Fiquei o tempo todo no celular enquanto ele falava coisas sobre a carreira de advogado no mundo empresarial.

- Você está com sorte, não vi o seu amor em lugar nenhum. - era a mensagem da Melissa.

Precisei posicionar o celular dentro da minha mochila aberta para não correr o risco do Patrick ler sem querer.

- Que bom. Tô contando os minutos para ir embora - digitei.

- Relaxa. Vcs não vão se cruzar. Mas vc vai fugir pra sempre? Não pode né?

- Eu sei que não posso.

- Como eu tô relaxada no meu castigo, vou tentar ir pra Ipanema no sábado e você vem comigo e com o Fê, que tal? Aí vcs se encontram.

- É... Vou pensar até lá. Mas não pensa que eu esqueci de você, Meli! Precisa estudar pra recuperar suas notas!

- Tá, eu sei. Vou estudar essa semana toda pra ficar livre no sábado.

- Quero só ver. E na sexta é a vez do pai aqui palestrar. Droga. - olhei para o lado e o Patrick estava atento ao que o Senhor Simon discursava no palco.

- Minha mãe me deixou vir na palestra dele também.

- Legal.

Não soube dizer quanto tempo a palestra iria durar. Só sei que quando acabou, dei graças a Deus. Esperamos todos os participantes saírem do auditório e então ficamos apenas o nosso grupo de amigos. Logo em seguida, Evandro apareceu. Não tinha reparado na ausência dele.

- Evandro, pode levar as crianças pra casa? Vai ficar tarde pra eles até o fim da segunda palestra.

- Claro, Senhor Bertrand.

- Não se preocupe que eu levarei a senhorita Carina até em casa.

- Como quiser. Vamos crianças?

- Vamos sim - Frederik concordou - Sexta-feira nós voltamos.

- Minha avó já está ligando pra gente - Gabriele fechou a cara - Quer saber se vamos demorar muito.

Eu e a Melissa nos olhamos rapidamente. Ele não fazia questão nenhuma de correr o risco de ouvir comentários maldosos. Nos despedimos dos nossos amigos e ficamos esperando pelos meus pais que conversavam alguma coisa com o o colega de trabalho e a amante disfarçada de secretária.

Observei a minha mãe e ela não parecia muito à vontade com a situação. Era como se alguma coisa ali a incomodasse. Acho que eu estava vendo filmes de suspense demais.

- Falei com o seu pai, Nívea e vamos voltar com ele de carona pra casa. Eu estava com preguiça de dirigir e vim com a Mel de Uber.

- Ah, legal.

- Vamos no banheiro comigo, amiga? Antes de irmos embora?

- Eu tô querendo ir pra casa, Melissa. - falei de cara fechada - Tô cansada, com o corpo implorando por um banho e cama.

- Calma, vai ser rápido! Tem um banheiro feminino aqui perto - e me puxou pela mão - Vamos logo.

***

Não sei porque motivo mas nos últimos tempos, eu estava dando sorte em encontrar banheiros públicos vazios e com este do campus não foi diferente. Enquanto a Melissa entrou em uma das cabines, coloquei a minha mochila em cima da pia, abrindo o zíper e tirei minha pequena escova de cabelo, fechando em seguida e deixando a em pé na parede próximo ao espelho.

Lavei as minhas mãos e o rosto, usando uma toalha de papel disponível para me secar e comecei a pentear os meus cabelos, me olhando atenta para o espelho.

- Nívea?

Virei para o lado ao ouvir o meu nome e mais uma vez estávamos nos encontrando. Luciana estava ali, parada na entrada, segurando o seu celular em uma das mãos quando se aproximou.

- Oi... - respondi seca e voltei a me olhar no espelho, não conseguindo mais me concentrar direito no que fazia. A raiva começava a tomar forma dentro de mim.

Aquilo era um pesadelo, não tinha outra explicação. Todo cuidado que eu tomei para não esbarrar com ele, não serviu para nada. Claro que o destino jogaria contra e iria me colocar de encontro com ela.

- Que bom que pensou no meu convite e veio visitar o campus.

- Mais ou menos. - terminei de pentear os cabelos, guardando a escova e fechando a mochila com impaciência - Já estou indo embora. Assisti a uma palestra do pai de um amigo que terminou agora pouco. - E continuei encostada na pia.

- Claro... - senti que ela me observava de cima a baixo e aquilo começou a me irritar. - Essa semana será de muita correria aqui na faculdade.

- Posso imaginar. - fiquei com os braços cruzados e com a impressão de que a Melissa estava demorando dentro da cabine de propósito.

- Como você está?

- Estou bem.

Respostas curtas e grossas. Era assim que ia ser. Não é porque eu achei ela uma pessoa legal e estava irritantemente bonita e loira, usando um vestido verde escuro e calçando seu sapato scarpin preto parecidos com os da minha mãe que íamos nos tornar amigas de banheiro.

- Bom. É uma pena você ir embora. Vai começar uma apresentação daqui a quinze minutos sobre a Literatura Francesa no período da Revolução. Seria ótimo se quisesse assistir.

- Obrigada, mas os meus pais estão me esperando para irmos embora porque amanhã eu acordo cedo. ''E eu vou matar a Melissa que não sai da droga dessa cabine!''

- Se você prefere que as coisas fiquem assim...

- É, eu prefiro!

- O Schneider está muito preocupado com você, Nívea.

- Ele não tem nada com que se preocupar.

- Você marcou uma consulta médica tem algumas semanas e ele ouviu a conversa pelo telefone. Você não quis dizer do que se tratava.

- Eu disse pra ele que era coisa minha. Eu estou bem de saúde.

- Certeza?

- Sim.

- Então venha comigo e diga isso pra ele.

- Eu não quero.

- Nívea, entenda uma coisa - ela encostou na pia, ficando mais perto, o que me fez recuar um passo pra trás - Você não precisa sentir raiva de mim e nem pensar coisas erradas ao meu respeito.

- Eu não tô pensando nada! Ou você agora é vidente?

- Eu e o Schneider temos uma relação de irmãos. Eu fui a primeira pessoa com quem ele estabeleceu um laço de amizade assim que voltou para o Brasil, depois de estudar e se formar na França. Os pais e o irmão caçula moram no Sul e ele estava praticamente sozinho aqui no Rio. Tudo o que queria era começar a trabalhar como professor universitário e eu consegui lhe dar essa chance.

Fiquei quieta ouvindo tudo o que ela estava me dizendo. Luciana demonstrava tranquilidade o que me deixou mais confusa pois parecia ser sincera.

- Esse mês que passou foi muito difícil pra ele, sabia? Não conseguiu trabalhar direito como sempre fez pois se distraía pensando em você o tempo todo.

- Ele tem todos os meus contatos.

- Ele pensava em você mas também tem uma cabeça-dura - e riu - Não ia dar o braço a torcer e te ligar.

- Eu sei que eu e ele precisamos conversar. Mas ainda não estou pronta. Eu não esperava ver vocês dois juntos no aniversário do Felipe - e me lembrar daquela noite foi o bastante para não conseguir segurar as lágrimas que começaram a rolar pelo meu rosto.

- Tudo bem - ela pegou uma folha de papel e me entregou - Eu te entendo.

- Não conta pro Eric que me viu aqui, por favor. - pedi, enquanto secava as lágrimas e soluçava de cabeça baixa.

- Tá certo. Mas também queria te pedir uma coisa, eu posso?

- Depende.

- Não quero que você me veja como uma inimiga.

Não consegui responder. Limpei o meu rosto, jogando o papel fora e colocando a mochila nas minhas costas, pronta para sair.

- Eu preciso ir agora.

- Ao menos pense no que estou te pedindo.

- Vou tentar.

- Pode ir tranquila. Essa conversa ficará entre nós duas.

- Obrigada.

Bati na porta da cabine e então a Melissa saiu com a cara mais de pau que eu já poderia ter visto, exibindo um sorriso amarelo. Esperei apenas ela lavar as mãos e finalmente saímos.

Eu sentia raiva mas era de mim por não saber se podia ou não confiar nela. Luciana era uma pessoa legal, mas essas fofocas em torno deles dois, de que poderiam ser namorados, me destruía por dentro por mais que o Eric tivesse me dito que não e que era nele que eu deveria acreditar.

Aquela ida à Universidade foi uma péssima ideia e ela não terminaria naquela noite. Eram dúvidas e mais dúvidas que cortavam o meu coração feito facas afiadas, fazendo ele sangrar.

Continua...

Nota da autora: Nossa princesa e sua insegurança. Não é fácil galera, tenham paciência com ela do mesmo jeitinho que a Luciana teve rsrsrsrs.

Vamos ver como isso vai terminar.

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Foto de perfil de Ana_EscritoraAna_EscritoraContos: 63Seguidores: 174Seguindo: 34Mensagem "Se há um livro que você quer ler, mas não foi escrito ainda, então você deve escrevê-lo." Toni Morrison

Comentários

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O conto esta interessante e nos prende cada vez mais. Não demore a postar o próximo por favor

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Achei muito interessante você abordar a questão da saúde dela no início, principalmente ela sendo tão jovem.

O capítulo mais uma vez você nunca decepciona. Melissa indo mal no colégio e o padrasto aliviando... momentos blogueirices da Gabriele...

Mas o destaque maior pra mim foi a cena final. Luciana uma verdadeira dama.

No aguardo do próximo.

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