Como um calouro da faculdade, meu primeiro ano de curso foi tudo o que eu não achei que fosse ser. Para início de conversa, foi fenomenal que alguém como eu, que nunca ligou muito pra escola, tivesse conseguido passar na maior universidade pública do país e estivesse indo tão bem nas disciplinas. Meu primeiro semestre em Biologia teve o histórico recheado de notas 10, além de elogios intermináveis em cada um dos seminários que apresentei.
Algo que foi assustador pra mim, que sempre fui um moleque tímido, que até pouco estava sendo arrastado pra bailinho na vila e voltando pra casa antes mesmo da meia noite, por não conseguir me entrosar enquanto os amigos já se embrenhavam no meio da multidão e em menos de meia hora já saiam pra algum canto escuro do rolê com uma menina no braço. Eu nunca soube dizer se era só vergonha, se era medo de não ser aceito, baixa auto estima (e olha que eu sou... aceitável, de rosto e de corpo... eu acho).
O fato é que todos esses anos da minha vida eu não saí com ninguém, era retraído nas festas, quieto até entre amigos, e de repente, estou eu na frente de uma turma de 60 alunos, e 3 diferentes professores mestres, falando sobre organismos aquáticos que eu nunca sequer vi na minha frente (só li em artigos e livros), e recebendo uma avalanche de olhares de admiração e elogios por uma pesquisa tão empenhada. Eu, Jonatan, calouro do curso, logo virei uma espécie de aluno-preciosidade, que os professores davam atenção sempre que necessário.
Isso me rendeu um convite, logo nas férias de meio de ano, para eu integrar um grupo de pesquisa que fazia análise da biodiversidade de microorganismos em aquiculturas. Eu não fazia ideia de no que eu ia embarcar, mas o fato é que a pesquisa era em campo e eu ficaria no local por quase três semanas. Minha mãe ficou aterrorizada com a ideia de eu, tão quietinho e aparentemente, dependente, ir sozinho pra um lugar no interior do estado. Mas eu achei que seria importante pra mim, e aceitei o convite. Pouco tempo depois, estava eu colocando duas bolsas de roupa no porta-malas do carro de um professor meu, um homem robusto, barbudo e e com seus 50 e tantos anos e indo pra um município quase na divisa do estado, bem no interior.
A ideia é que ele me deixaria lá, me apresentaria para a comunidade local e eu teria que, todo dia, ir até o rio onde trabalhavam os aquicultores (são pescadores, mas além da pesca, eles cuidam para que as espécies se reproduzam no local), coletaria uma amostra da água, levo de volta para uma escola pública onde nós temos um mini laboratório compartilhado com os alunos, faria algumas medições, anotaria em um relatório e... era só isso. Era um trabalho simples, mas que requeria uma pessoa fazer, e o antigo aluno bolsista havia saído do seu posto, então eu ficaria lá, no lugar dele. Eu ficaria hospedado em uma pousada, conveniada com o instituto de pesquisa, e teria os finais de semana livre para fazer... o que quer que tivesse para fazer em uma cidade rural de menos de 3 mil habitantes.
O lugar era de fato... algo que eu esperava do interior. Ruas calmas, sem carros, muito barulho de insetos, pessoas andando de bicicletas, pessoas sentadas nas calçadas, crianças brincando na rua. A pousada era quase na beira do rio, e os quartos tinham as portas e janelas todas para o lado externo, e o restaurante, bar e recepção ficavam em um anexo. O quarto tinha uma televisão de tubo, uma mesa, cama de casal, e o banheiro era pequeno. Era tudo muito simples, mas era confortável. Quando chegamos, havia uma fila de garotos sentados do lado de fora, com celulares na mão, jogando algum jogo de tiro, aproveitando o Wi-fi do lugar.
Como chegamos já quase 19 horas do domingo, o lugar ia se apinhando de pessoas da cidade toda, que iam para aproveitar o bar e a música. Eu e meu professor sentamos numa mesa, que ficava em uma área semi aberta para a parte externa, como um quiosque, e jantamos ali, arroz, feijão, salada, batata e peixe frito, e eu pedi um refrigerante, e ele uma cerveja. No meio da janta, o lugar já estava abarrotado de pessoas, música tocava alto, uns homens, talvez pouco mais velhos que eu, gritavam em uma mesa de sinuca, uma criançada brincava em um balanço na árvore. Quando terminávamos a janta, um homem parrudo, pele bronzeada, barba por fazer e cabelo curto, se aproximou, jogando as chaves do carro sobre nossa mesa e abraçou meu professor, como um grande amigo. Fomos apresentados, e o nome dele era Sidnei, e ele que era o pescador que iria me levar para fazer as coletas de água.
Ele e meu professor começaram a beber, e no início falaram sobre o trabalho, para me habituar, me explicar coisas banais, como o horário em que o Sidnei saía pro rio, que eu voltaria com ele no horário do almoço, e no primeiro dia, ele me garantiria levar até a escola e me apresentar para o pessoal de lá. Depois começaram a falar da pesca, depois do puxadinho que o pessoal da pousada estava construindo - "ah, é, a cidade tá crescendo, tá vendo só?", falaram sobre futebol, sobre caminhão e carros (assuntos que eu não entendia nada), e por essa altura, falavam alto, às risadas, e eu já estava totalmente alheio, só sorrindo e concordando com a cabeça.
Então chegou um rapaz mais ou menos da minha idade. Um pouco mais baixo que eu, mas com ombros mais largos, pele morena, cabelo curto enroladinho e preto, que descia em um corte degradê, usando uma regata, bermuda de tactel e chinelo de dedo. Se aproximou da mesa assobiando para o Sidnei e esse jogou a chave do carro para ele. Não trocaram uma palavra. O rapaz saiu, e eu segui com os olhos, e outros rapazes se juntaram perto dele, e eles caminharam pra fora, conversando.
-É seu menino? - perguntou meu professor, recebendo uma resposta positiva do Sidnei.
A noite avançou e me despedi do meu professor, que voltaria para São Paulo, do Sidnei, que foi para sua casa e fui para o meu quarto. Já se silenciava do lado de fora, e enfim, eu estava sozinho. Em um lugar desconhecido. Tomei meu banho, troquei de roupa e deitei na cama. Mexi no celular para descobrir 3 chamadas perdidas da minha mãe. Mandei uma mensagem para ela, dizendo que estava tudo bem, e então caí no sono.
### PRIMEIRO DIA
Me levantei às 5 e meia, coloquei uma calça jeans azul velha que eu tinha, calcei meus tênis, coloquei uma camiseta e um boné e fui tomar café da manhã. Pouco depois, o Sidnei chegou, em uma picape, e me levou, primeiro até a escola, onde fui apresentado e peguei meus instrumentos de pesquisa, e depois partimos para onde ele trabalhava.
O trabalho era uma pequena embarcação de pesca, chamada Tâmara, que descia e subia o rio todo dia, e a cada época do ano, se concentrava em um lugar diferente. Havia a cabine de comando, uma parte logo ao lado com uma mesa e quatro banquinhos, e um deck onde se entulhavam redes de pesca, ganchos, barris e caixas de madeira. O cheiro de peixe no lugar logo impregnou meu estômago, mesmo usando a dica do meu professor de passar Vick Vaporub em volta do nariz no começo, até me acostumar. Havia mais duas pessoas no barco, que trabalhavam com Sidnei. Uma era o seu filho, o rapaz do dia anterior, e outro um rapaz um pouco mais velho. Os dois estavam sentados na borda do barco, mexendo no celular e conversando, quando chegamos.
-Já subiu em um barco antes? - Sidnei perguntou, me olhando, com um sorriso. Dava pra perceber que ele tentava me fazer sentir confortável, mesmo eu sendo o menino da cidade, de pele pálida, cujas experiências de vida tinham sido todas através da tela de um computador. Dava pra perceber que ele sabia de tudo isso, e com a postura dele, tentava me acalmar com aquele mundo diferente.
Subi no barco (pela primeira vez), e logo o rapaz mais velho veio de cumprimentar, falando em voz alta, primeiro na direção do Sidnei.
-Porra, Nei! Mais um macho, de novo? - gritou, dando risada. Depois, virando pra mim, em tom mais baixo - Não tem menina na tua faculdade pra mandarem pra cá, não é? Haha! É brincadeira, viu? Seja bem vindo, meu nome é Maciel.
Dei risada e me apresentei pra ele. Ele foi bem caloroso. O outro rapaz, filho do Sidnei, só fez um aceno com a cabeça e me estendeu a mão, me cumprimentando.
-Opa. - ele falou.
Sidnei se aproximou.
-Esse é o Gabriel, meu filho. Pessoal, esse aqui é o Jonatan, o novo pesquisador, - me senti importante, e até incomodado, quando ele falou 'pesquisador' - e vai ficar com a gente aí pelas próximas semanas. Vamos ajudar ele, com o que ele precisar. Jonatan, me mostra o mapa dos pontos de coleta que quando chegar nos pontos, eu te aviso. Enquanto isso, pode ficar sentado, a vontade aí. Qualquer coisa que precisar, só avisa um de nós.
Tentei observar a rotina de trabalho, e tentei ficar o mais no canto possível, para não atrapalhar nenhum deles. No começo, tirei e coloquei de volta da bolsa os equipamentos de medição umas 30 vezes, só para fingir que estava fazendo alguma coisa, enquanto esperava. Me sentia, de certa forma, um alienígena, estando ali no canto, enquanto eles paravam o barco em um lugar, desciam na borda para ver a rede, martelavam alguma coisa. Em alguns minutos, Sidnei me chamou para ver ele puxarem a primeira rede com peixes. Os dois rapazes puxaram e despejaram os peixes em um caixote, que ficaram pulando ali, enquanto sufocavam fora da água. Não era muito peixe, mas ainda assim, puxar a rede da água parecia um trabalho que exibia bastante força no braço.
Fiquei mexendo nas minhas coisas, e pouco tempo depois, o barco parou, e ouvi uma voz me chamando.
-Ôw. É aqui que cê pega a água.
Levantei o olhar e era o Gabriel, que tinha vindo do outro lado do barco. Ele estava sem camisa, e seu peitoral liso mostrava as linhas de músculo de alguém que não malha, mas trabalha pesado todo o dia. É difícil de explicar, mas é como se seus músculos não fossem lineares, definidos, como alguém que malha na academia, mas sim naturais, não definidos por iguais em todos lados, mas presentes. Ele usava uma bermuda e uma botina. A borda da cueca transparecia, do canto. Assim que percebi que estava olhando para o corpo dele, e não no rosto dele, me assustei, e olhando nos seus olhos, agradeci. Levantei, peguei o instrumento de medição e fui coletar a água. Senti que ele ficou me olhando o tempo todo enquanto eu coletava, e senti medo. De estar sendo julgado, medido. Mas no fim, ele só estava esperando eu terminar para dar partida, outra vez no barco. Assim que partimos, ele sumiu de vista outra vez.
Quando terminamos, perto do meio-dia, o barco voltou para o cais e desembarcamos. Sidnei pediu que Gabriel me levasse de carro até a escola, e eu disse que não precisava, pois estávamos a menos de 10 minutos a pé dela. O Sidnei insistiu, ao mesmo tempo que Gabriel entrou no carro e se sentou no volante, esperando. Deu para perceber que eles achavam que se me deixassem sozinho, era capaz de eu me perder na cidade.
Entrei na picape e Gabriel deu partida. Ele ainda estava sem camisa e cheirava peixe. Não olhou pra mim.
-Faz tempo que você trabalha com seu pai? - perguntei, pra tentar quebrar o gelo, enquanto atravessávamos a cidade. Ele se resumiu a balançar a cabeça que sim, e fez uma careta de quem parecia não querer papo. Eu entendi, e fiquei quieto o resto da viagem. Quando chegamos na escola, agradeci e ele foi embora sem dar uma palavra.
### SEGUNDO DIA
No dia seguinte, levantei mais cedo, para mostrar que conseguia navegar sozinho pela cidade, e depois do café da manhã, fui direto para o cais, mandando mensagem para o Sidnei que não precisava ir me buscar na pousada. O dia correu tranquilo, e sem muito o que fazer, e Maciel, percebendo meu tédio, me chamou em uma das puxadas de rede.
-Ei, Jonatan, vem cá. Vou te ensinar a puxar a rede.
Eu fui, curioso. Na outra ponta, Gabriel fez uma cara de impaciência, como se estivesse sendo obrigado a participar de uma brincadeira da qual ele não queria, em primeiro lugar.
Maciel, sorridente e simpático, por outro lado, me ajudou e ficou atrás de mim, me mostrando como usar a minha postura ao meu favor na hora de puxar a rede. Naquela posição, senti o cheiro da colônia dele, e senti o braço dele descendo através dos meus, e tocando a minha cintura. Ele me dava instruções com o rosto perto do meu pescoço. Não havia qualquer sensualidade, mas havia sua presença. Era um outro homem, em contato comigo, me tocando. Eu segui suas orientações, enquanto puxava a rede, e em um momento me desequilibrei e a rede escapou alguns centímetros da minha mão, o que fez com que Gabriel precisasse compensar com força, do lado dele.
-Porra! - gritou Gabriel.
Maciel riu, e me ajudou a puxar a rede. Gabriel, por outro lado, pareceu incomodado. Assim que retomei a pegada na rede, Maciel me deixou terminar de puxar e levar a rede junto com Gabriel até o caixote, para despejar os peixes. Deixei Gabriel fazer o despejo, enquanto eu mantinha a rede firme, pois não queria derrubar um monte de peixes no convés e deixar ele mais irritado ainda. Assim que terminamos, Maciel olhou pra mim, sorridente, balançando a cabeça na direção de Gabriel.
-Liga não, esse moleque é mal humorado mesmo.
Eu assenti, sorrindo. De fato, aos poucos percebi que Gabriel não ia nem um pouco com a minha cara, e naquele dia, fui ficando cada vez mais próximo de Maciel, que era sempre simpático, estava o tempo todo cantando, brincando e fazendo piada. Em um momento do dia, enquanto eu me debruçava sobre água para fazer a coleta, o cós da minha calça foi puxado, e algo esguio e gelado desceu pela minha perna.
Eu pulei no lugar, gritando, quase derrubando o instrumento de medição na água, enquanto sentia um peixe deslizar por dentro da minha calça, na frente de um Maciel que não parava de rachar o bico. Chutei meu tênis para longe e deixei o peixe cair no chão do barco. Assustado, vi o peixe pular no chão, e comecei a rir junto.
### QUINTO DIA
Os dias se passaram, e fui convivendo com os dois. Sidnei só embarcou no primeiro dia, pois geralmente era Gabriel e Maciel que faziam todo o trabalho. Gabriel quase nunca falava nada, sempre que me olhava, era com um olhar seco, como se não aprovasse a presença de um menino da cidade ali no meio deles, e só conversava eventualmente com Maciel. Esse, por outro lado, estava o tempo todo brincando, fazendo piadas e puxando assunto comigo. No quinto dia da semana, na sexta-feira, desci o barco apenas com Maciel. Era um dia que eles não puxariam peixe nenhum, só precisava ver se os postes de cada cultura estavam no lugar, e fixar eles, caso a correnteza tivesse afrouxado eles.
-Então nesses dias, é só você que vem? - perguntei, enquanto ele dava partida no Tâmara.
-Geralmente é o Gabriel, mas falei que vinha hoje.
-Ah... - falei. - Eu acho que ele não vai muito com minha cara.
-Relaxa. Ele é caipira mesmo, não sabe falar com as pessoas. É assim com todo mundo. - falou Maciel, rindo.
Ficamos conversando, e o Maciel perguntou se eu namorava. Eu disse que não, e ele respondeu que tinha acabado de terminar com a namorada dele. Me perguntou se eu estava gostando dali, e eu falei que era bem tranquilo, e a comida da pousada era gostosa. Só não tinha me acostumado ainda com os mosquitos. Ele perguntou então se eu gostava de jogar Free Fire, e eu falei que não sabia jogar, e ele falou pra eu fazer uma conta, que ele me ajudava no começo. O tempo todo, estávamos sentados, enquanto o barco descia lentamente, e ele fazia perguntas sobre mim, sobre como era onde eu estudava, o que me levou a escolher Biologia, que time eu torcia, e tudo o mais.
No meio da conversa, ele se levantou, parou na borda do barco e começou a mijar na água, de costas pra mim. Ele falava algo sobre ir jogar bola no final de semana, mas eu já nem prestava atenção. Quando ele terminou, vi ele se movimentar como se balançasse para respingar as gotas, e então se virou, ainda guardando o pênis na cueca. Entre seus dedos, que pareciam se demorar para guardar o pau, brotava um membro, flácido e grosso, escuro - em contraste com sua pele clara, com a glande coberta. Era um pau "gordinho", não muito grande, mas espesso. Ele ainda deu uma balançada, que mais parecia uma exibição do que um chacoalho, antes de guardar o pau na cueca branca. Quando ele fechou o zíper da calça, percebi pela primeira vez que Maciel tinha uma bela mala entre as pernas.
-...e se você for, a gente fecha um time de sete. - completou ele, e então parou de repente, olhando pra mim.
Eu olhei na cara dele e percebi que ele tinha visto que eu tinha ficado reparando na rola dele, ao invés de prestar atenção na conversa. Pronto. Agora é o momento que não adianta mais mentir pros outros, muito menos pra mim mesmo. É isso, Jonatan. Você gosta de homens e você está a fim desse na sua frente.
-Ahn... Eu não sou muito bom de bola. - falei.
-Ah! Eu também não sou! - disse ele, rindo e se sentando de volta ao meu lado, sem mencionar nada sobre minha manjação escancarada. - Ninguém é profissional não, mas vamos lá. - E então, ele deu uma pegada no saco, por cima da calça, como se estivesse coçando. Mas foi só uma pegada mesmo, e uma pegada quase feroz, como se ele quisesse mostrar pra alguém o volume ali entre as pernas. E naturalmente, a única pessoa perto para ver, era eu, espremido ao seu lado. Eu olhei de relance. E ele percebeu.
Maciel abriu mais as pernas, e sua perna esquerda roçou na minha perna direita.
E então...
Seu celular tocou.
-Eeeei, Gabizinho, diga lá, meu patrão - atendeu ele, no viva voz.
-Cadê você, cara? - a voz de Gabriel, do outro lado, parecia impaciente.
-Eu desci hoje com o barco, pra fazer a rotina, eu avisei seu pai. Ele não te avisou?
Do outro lado, deu para ouvir um resmungo. Gabriel claramente não tinha sido avisado.
-Tá, mas eu preciso da caixa de ferramenta, e do motor, que tá aí no barco. - falou Gabriel, do outro lado.
-Relaxa. A gente já tá voltando.
Maciel levantou-se e manobrou o Tâmara, para voltarmos, no rio. Continuei sentado, absorto, e então só decidi arrumar minhas coisas, e guardar minhas amostras de água do dia. Quando atracamos, Gabriel estava parado, no caís. Olhou para nós dois, de um para o outro e balançou a cabeça, negativamente, e subiu no barco sem falar uma palavra.
Maciel havia descido para dar nó no barco, no cais, e eu estava carregando apenas a mochila nas costas. Gabriel se debruçou sobre um motor, que estava no chão do cais e tentou levantar ele, sozinho, mas o motor era pesado e caiu de volta no chão. Assim, me aproximei do lado dele, e falei, oferecendo ajuda:
-Aqui, eu pego de um lado e você do outro.
Gabriel olhou pra mim e se levantou.
-Você faz o seu trabalho... o seu trabalho aí de pesquisador. Pega sua água, suas coisas aí nessas garrafinhas, e cuida disso. Deixa que eu faço o meu serviço. - falou, de forma seca.
Foi como se eu tivesse tomado um tapa, e fiquei ali, parado. Na segunda tentativa, ele levantou o motor sozinho e tirou do barco. Maciel, que ouviu Gabriel, falou, enquanto ele descia do barco.
-Ei, cara, que foi, que foi? Eu avisei eu pai, que onda é essa?
Ele parou, olhando fulminante para Maciel. Em seguida olhou pra mim, e depois de volta pra Maciel.
-Vai lá, ajudar seu amiguinho cientista a descer do barco.
-Ah, vai se fuder, cuzão - retrucou, Maciel, e pela primeira vez nesses dias eu vi ele bravo. Desci do barco e me despedi dos dois, e ia tomar rumo em direção a escola, quando Maciel me alcançou.
-Bora, eu vou andando também.
Fomos andando e Maciel foi quieto o caminho todo. Deu para perceber que ele estava bravo e incomodado com os comentários de Gabriel. Perto da escola, ele virou em uma rua, dizendo que ali a gente se separava, que ia para a casa dele. Nos despedimos e eu segui em frente.
Na escola, o trabalho era rápido, e não demorava mais que uma hora até fazer análise microscópica, preencher todos os relatórios, guardar as amostras e fechar o laboratório. Foi uma boa atividade pra tirar a chateação e o incômodo da ignorância de Gabriel. Quando eu ia saindo, me dei de cara com Maciel, do lado de fora. Estava com outra roupa. Uma bermuda, chinelo, camisa de botão colorida, aberta nos primeiros botões, de onde pendia um cordão. E estava de banho tomado.
-E aí, você almoça lá na pousada? Se sim, vou almoçar lá também.
### PÔR DO SOL
Fomos juntos e almoçamos, e Maciel parecia estar outra vez animado, como se a estupidez de Gabriel fosse algo que nem existisse mais. Ele falava alto, pois o restaurante estava cheio no horário, e ele conversava de um jeito, com um tom, que até os assuntos que menos eram interessantes para mim, se tornavam divertidos. Talvez fosse o sorriso de canto de boca, que sempre trazia um conforto, ou o próprio tom com o qual ele falava, que sempre dizia de certa forma "e você, o que você acha?", sempre reconhecendo a minha existência.
Receber reconhecimento pelas minhas pesquisas na faculdade, me deixava sim feliz, mas não preenchia uma parte de mim, uma parte que precisava de aceitação, de estar ali, no mundo real, falando de coisas ordinárias. E Maciel conseguia fazer isso como ninguém nunca conseguiu. Eu nunca tinha saído com ninguém, nunca tinha tido um date. Então, eu não sabia se aquilo chegava perto de um. Se sim, estava sendo ótimo.
Minhas tardes até então eram preenchidas com estudo, e geralmente Maciel e Gabriel almoçavam no próprio barco e continuavam a tarde trabalhando no cais, mas naquela tarde parecia que o trabalho já tinha acabado pra eles, e no meio do papo com Maciel, percebi que preferia passar o resto do dia e o final de semana ouvindo ele falar do que sequer tocar em algum livro. Então, quando ele me convidou, eu nem pensei duas vezes.
-Ei, Jonatan. Vamo dar uma volta. Vou te mostrar a cidade.
Foi um imediato sim. Mesmo que a cidade não tivesse muito que ser visto. Ele primeiro me levou até a casa dele. A avó dele estava sentada em uma cadeira na calçada, uma senhorinha muito simpática. Na entrada, ele pediu benção para ela, algo que não fazia parte do meu costume. Me chamou até o corredor ao lado da casa e pegou uma bicicleta e empurrou na minha direção, enquanto puxava outra para ele.
-Toma. É a bike do meu irmão mais velho, mas ele mora em Minas agora. A gente vai precisar dessas bicicletas.
Pedalamos primeiro pela cidade, da qual eu já tinha visto toda, e então pegamos uma pista que levava em direção à rodovia. Mas ao invés de usar a rodovia, desviamos para uma estrada de terra e era quase uma trilha no meio do mato. Tivemos que parar algumas vezes para tomar ar, principalmente por minha causa, que não estava acostumado com tanta atividade física e não tinha tanta força para pedalar por muito tempo. Mas pedalamos por mais de uma hora, e já era quase fim de tarde quando chegamos onde Maciel queria me levar.
Dos lados, se erguiam árvores, e à frente, o chão rochoso se abria para o horizonte, muito acima do terreno lá embaixo, quase como um mirante. De fato, era um mirante natural, secreto. Vínhamos subindo o terreno todo e agora estávamos ali, diante da cidade, lá embaixo, perdida em meio às árvores e ao rio que serpenteava, a água escura agora era apenas um fio dourado, o reflexo do sol laranja que se punha no horizonte.
-Caramba! - eu só consegui dizer, quase sem fôlego. Era uma imagem linda.
Maciel desmontou da bicicleta e olhou pra mim, sorridente. Depois virou para horizonte.
-Maneiro, né?
-Demais. Isso é um pico turístico?
Maciel riu.
-Aqui não é um lugar de muitos turistas, porque não tem tanta coisa pra se ver. Mas não, não é. Mesmo o pessoal que mora aqui não conhece esse lugar. A gente até saiu da trilha, pra chegar aqui, e é bem escondido. - ele se virou pra mim - Legal né? A gente vê toda a cidade, lá embaixo. Mas a cidade não vê a gente.
Eu desmontei da bicicleta, também. Estava estonteado. Sentei em uma pedra que se projetava do chão. O lugar não apenas era bonito como parecia ter uma aura espiritual, algo que me tocava o sentimento. No fio dourado de água, não se via o Tâmara nem nenhum dos vários barquinhos de pescadores que se atracavam no cais ou desciam e subiam o rio. Mas estavam lá, em algum canto, tão pequenos que eram como os organismos no microscópio.
-Foi meu pai quem me trouxe aqui pela primeira vez. Ele que mostrou esse lugar - disse Maciel.
-E ele vem aqui ainda, com você? - perguntei.
Maciel olhou pra mim, mas não respondeu. Ele andou até a pedra que eu estava, e se sentou do meu lado. Seu ombro se colou no meu.
-Na verdade, eu nunca mostrei pra ninguém esse lugar. Quando meu pai faleceu, decidi que esse seria nosso segredo, pra sempre... - ele fez uma breve pausa, e depois sorriu. - Mas você não é daqui, então não tem problema. Quando você for embora, eu vou poder continuar subindo aqui sem ser incomodado - ele completou, rindo.
Ficamos parados, lado a lado, os ombros colados. Eu sentia a sua respiração. Éramos quase como apenas ser, apreciando a pintura mais bela e viva que se tem no planeta. O sol foi se pondo, encostando no horizonte, o arroxeado se estendia pelo céu e metade dele se cobria por estrelas. Um céu tão estrelado, tão limpo, que continuávamos iluminados, mesmo com a ausência do sol. Maciel então se levantou.
-Vamos indo, senão vai ficar escuro demais.
E de fato, já estava escuro. Eu enxergava o caminho de volta, a bicicleta, mas o entorno, das árvores, era uma massa escura. Fomos descendo a trilha silenciosamente, e devagar. Em um momento, quando estávamos quase chegando na trilha principal, perto da rodovia, eu escorreguei e a bicicleta tombou para o lado, fazendo um barulho. Maciel freou, à frente.
-Tá tudo bem? - perguntou ele, alguns metros a frente.
-Sim, eu só escorreguei. - falei, me levantando. Subi de volta na bicicleta, mas percebi que a corrente tinha se soltado, e desci de novo para tentar colocar.
Com a lanterna do celular, tentei colocar a corrente, sem sucesso. Toda vez que eu tentava encaixar ela, ela escapava dos meus dedos. Maciel se aproximou, ao meu lado, se abaixando.
-Deixa comigo. - e ele arrumou em um estalar de dedos, como se fosse apertar um botão. Nós dois nos levantamos e ele virou na minha direção, me medindo, de cima a baixo - Você tá bem? Se machucou?
-Não, eu tô bem, nem me ralei, nem nada.
E então ele continuou parado, na minha frente, respirando. E eu, que olhava só para mim, vendo se eu estava tudo bem, olhei pra ele. E para me deixar firme, de pé, ele me segurou pelos ombros.
Mas foi mais que pra me deixar firme. No segundo seguinte, eu senti mais do seu corpo na minha frente, no escuro. Sem enxergar o nosso redor, ele me abraçou e de repente, eu estava escorado em uma árvore. Maciel na minha frente, com o peso do corpo sobre mim. Minha boca preenchida pela sua língua em um beijo que, o dia todo, estava desesperado em acontecer. E ali acontecia. E eu, sem reação, não sabia o que fazer, estava apenas parado.
Ele afastou o rosto do meu, olhando nos meus olhos. Ele ia pedir desculpas, pois me pegou de surpresa, num ímpeto inesperado. Mas antes de pedir desculpas, ele leu meus olhos, e viu que eu tinha o olhar de um rapaz que estava surpreso, mas surpreso com alguma alegria. Então, começou a me beijar de novo, e dessa vez, eu joguei meus braços ao seu redor, agarrando ele. Meus dedos se entrelaçando no tecido leve da sua camisa, puxando pra mais perto. Escorregamos pelo caule da árvore e em um segundo, eu estava sentado no chão, quase deitado. Mas não deixei o beijo escapar. Continuei com minha língua dentro da sua boca, e deixava ele inundar a minha boca com sua língua. Seu corpo pressionava-se contra o meu, e senti Maciel colocar a mão sob a parte baixa das minhas costas, puxando-a para cima.
Nossos ventres estavam apertados, um contra o outro, e eu sentia o volume do seu pênis, rígido, gritando para sair da bermuda leve que ele usava. O meu pênis, muito mais tímido em volume, se pressionou, também duro, contra ele. Por um instante, eu não entendi o que ia acontecer. Demorou algum tempo para cair a ficha, que eu iria perder a minha virgindade com um outro homem.
Nós paramos para respirar. Maciel olhou firme pra mim, buscando palavras. Mas nenhuma palavra parecia vir. Ele parecia estar louco por mim, tanto quanto eu parecia estar afundado em um desejo por ele. Ele beijou meus lábios, e sua boca desceu para o meu pescoço, brincou com o lóbulo da minha orelha. Minhas mãos começaram a desabotoar a camisa dele, e logo ele estava com o peito nu contra o meu, cuja camiseta já tinha se levantado até quase o pescoço. Seu cordão balançava, brincava, se esfregava no meu peito. Minha calça começou a ser abaixada, e eu abri, com um puxão, a bermuda dele, sentindo minha mão se arrastar pela sua cueca com um volume roliço.
E aquele momento foi se enchendo de luz.
Mais luz.
Luz demais.
E Maciel se levantou em um pulo, e se ajeitou, puxando a bermuda arriada. Eu tentei me levantar, desengonçado, enquanto um carro se aproximava com o farol jogado em nós dois. Como estávamos perto de uma curva, o carro não deve ter visto nós dois atracados no chão enquanto se aproximava, mas com certeza via agora o Maciel de pé, com a camisa toda aberta, e eu sentado no chão. O carro parou. Era uma picape e Sidnei estava no volante.
-Oxe? O que vocês dois tão fazendo aí?
-A gente veio dar uma volta de bicicleta, Nei... E o... - olhou pra mim - o Jonatan caiu quando a corrente saiu da bicicleta... Aí ele tá ali sentado... A gente sentou... A gente tava esperando ele dar uma descansada, sabe?
-E você tá bem, machucou algo? Eu te levo já no pronto socorro. - perguntou Sidnei, olhando assustado pra mim.
-Não, que isso. Eu tô bem, tá tudo bem - disse, me levantando. - Eu tô tão bem que acho que já dá pra ir indo.
-Sobe vocês dois aí na caçamba que eu levo vocês até a pousada. Eu vou passar em casa pra pegar o Gabriel pra ir jantar lá, mesmo.
Jogamos as bicicletas na caçamba e ficamos sentados, em silêncio. Maciel olhou pra mim, rindo, e eu não consegui retribuir, de tão assustado que estava. Quando Gabriel entrou na picape, não percebeu que nós dois estávamos na caçamba de imediato. Ele virou, do lado de dentro, e olhou pra nós, com olhar arregalado, pela janela traseira, quando Sidnei falou que estávamos ali. Não falou nada.
Foi então que alguma coisa fez um clique na minha cabeça e eu olhei para Maciel. Cheguei perto dele, e perguntei, bem baixo, de forma que o barulho da picape em movimento abafasse minha voz.
-Você... e...- apontei na direção de Gabriel.
Maciel riu imediatamente.
-O Gabriel? Credo, cara. Claro que não. Tá me tirando? Haha, eu tenho bom gosto. - disse, rindo. - Além disso, o Gabriel não é de gostar dessas coisas não. - completou, em tom mais baixo. - Eu mesmo, também nunca fiz nada. Tive curiosidade, sim, já. Mas você foi o primeiro cara que eu beijei na vida.
-Ah... Eu também. Quer dizer, você também foi o primeiro que eu... Sabe?
Ele riu. E voltamos para a pousada. Eu sentia que tinha feito a maior safadeza da minha vida, mesmo que eu só tivesse beijado outra pessoa. Mas no fundo, nós dois sabíamos que tínhamos atravessado uma linha ali, que só convidava a irmos mais além. Sentimos o corpo um do outro, nos acariciamos, ainda não de forma tão intima, mas quase. Sabíamos, em segredo, que dentro do outro, residia um desejo ainda não saciado.
### DESEJO
Maciel desceu na sua casa, e eu ajudei ele a tirar as bicicletas e guardar elas. Voltei, na picape, para a pousada. Sidnei e Gabriel foram jantar, mas eu fui para o meu quarto. Precisava de um banho, e precisava processar o que tinha acontecido há meia hora atrás.
Sob o chuveiro, eu sentia ainda a pressão de Maciel sobre mim, seu corpo pressionado sobre o meu. Naturalmente, minha mão desceu até o meu pênis, e comecei a me masturbar. Fechei meus olhos, friccionando meu pau, e de repente, na minha imaginação, Maciel estava ali, do meu lado, nu debaixo do chuveiro comigo. Ele agarrava meu corpo, passava a mão entre meus cabelos, eu sentia seu peitoral se aproximar de mim, e aquele seu pênis - aquele que vi no barco, se esfregava no meu corpo enquanto nos abraçávamos, nos beijávamos.
Me masturbava com mais força, e comecei a suspirar, respirar, suspirar, gemia baixo sob o chuveiro. Queria Maciel ali, desejava ele. Queria sentir o seu corpo como havia sentido há pouco, queria sentir mais dele. Queria beijar cada parte dele. Senti meus dedos mais rápidos. Nunca havia batido punheta com uma imagem tão viva na cabeça. A língua de Maciel explorava cada parte do meu corpo, e então ele olhava pra mim.
O êxtase chegava, minhas pernas ficavam mais bambas, eu sentia o jorro vir pelo meu pênis e eu abri os olhos, e deixei minha imaginação persistir, numa imagem, na minha frente. Mas então não era mais Maciel.
Era Gabriel, seus finos olhos pretos, seu cabelo cortado em degradê e seu tronco definido pelo trabalho e amorenado pelo sol.
Eu gozei. Uma, duas, três jatadas. Pularam, grossas e brancas no ar e desceram, bateram no azulejo e escorreram para o piso. Á agua do chuveiro foi lavando elas, foi lavando, e a minha imaginação, esvaneceu. Eu soltei meu pênis, que pendeu, vermelho e quente sob minhas pernas. Não quis pensar sobre meus desejos. Não quis entender o que eu tinha imaginado.