Depois da nossa pequena “discussãozinha” no carro nem um dos dois falou novamente, o que, pessoalmente, foi um alívio. Essa atitude de merda do Eduardo tá começando a me tirar do sério de verdade e eu tô rezando para não precisar rodar a baiana, porque se não as coisas vão ficar feias pra ele.
Após comprar tudo o que preciso, com ele apenas me seguindo como um idiota, finalmente saímos do supermercado e estamos cheios de sacolas, já que eu comprei bastante coisa, afinal pretendo passar um tempo sem precisar vir às compras.
— Não entendo pra quê comprar tanta coisa. — Eduardo fala enquanto entra no carro, ele parece mais mal humorado que o normal hoje.
— Se não tivesse um cavalo morando em casa, eu não precisaria comprar tudo isso, mas como eu tenho um de estimação, então...
— É, muito engraçado! Se eu sou o cavalo, você é a égua, e se essa égua fosse um pouquinho mais legal, talvez o cavalo não se irritasse tanto e não precisasse relaxar comendo.
— Então quer dizer que você tem compulsão alimentar?! — o encaro sério, mas ele apenas continua encarando à frente — Você realmente come tudo o que vê pela frente quando tem algum problema?! — ele suspira, mas depois assente.
— É, pois é, desculpa te desapontar, mas sou só um ser humano normal, também tenho problemas, okay?! — ele me encara com tom de desafio, mas eu não digo nada, apenas concordo sarcasticamente — De qualquer forma, porque você acha que eu malho tanto?! Preciso manter a forma e tenho que compensar a quantidade de comida ingerida, malhando.
— Mas é uma surpresa saber que você não tem controle sobre algo desse tipo... — mordo os lábios despercebido; na verdade, digo isso mais pra mim mesmo do que pra ele.
— Por falar em forma... — ele me olha dos pés a cabeça me deixando levemente desconfortável — Você tá precisando malhar também, né?! — o fuzilo com o olhar — Teu corpo tá muito flácido... Aparentemente, a única coisa ainda é dura nesse corpo aí é a bunda, mas tenho quase certeza que não vai demorar muito pra ela cair se você continuar sedentário desse jeito.
— Deixa só eu te lembrar de uma coisa, seu idiota... O corpo é meu, então se ele tá feio, o problema também é meu! — o corto me sentindo ainda mais chateado que antes — Pelo menos tenho certeza que sou melhor que você, que parece um monstro de tão bombado! Se continuar a malhar tanto, vou começar a pensar que vivo com um bicho.
— Você acha mesmo que “um bicho” seria...
— Tsk, só cala a boca, Eduardo... Chega dessa conversa ridícula; eu já esgotei a minha taxa de paciência com você hoje.
— Até parec...
— Você por acaso é surdo?! Não ouviu o que eu acabei de falar?!
— Mas eu...
— Eduardo, é sério...!
— Mas eu tô precisando da sua ajuda... Será que você pode me ouvir só por um minuto, droga?! — o encaro franzindo as sobrancelhas.
— Como assim?
— Bom, acho que é meio obvio, mas... É que eu já estou há quase um mês sem transar...!
— E eu com isso?! — respondo com o tom seco, afinal eu também estou na mesma situação que ele, mas ninguém me ver reclamando — Por acaso eu sou dono de algum cabaré ou algo do tipo?!
— Escuta, tem essa vizinha que me cantou, sabe?!
— Cantou?! — isso é sério?! Quem ainda usa esse termo hoje em dia?!
— Tsk, deu em cima de mim... Será que dá pra facilitar a conversa?! Ou eu tô falando latim?!
— Tá bom... e?! — finjo interesse só pra ele parar de me atormentar com isso.
— O nome dela é Patrícia, e eu quero transar com ela amanhã, mas tem o contrato... — ele faz uma pausa me avaliando, mas não digo nada e o deixo prosseguir — Então chega a parte onde você me ajuda... Eu quero que você me dê cobertura.
— Claro! — ele me encara incrédulo.
— Sério?!
— Sim, quero dizer... Será um sonho ficar com a herança todinha pra mim! — ele bate no volante com raiva e para no sinal, então me encara como se quisesse me matar — Eduardo, não viaja... Eu não vou te acobertar, afinal eu estou no mesmo barco que você, ou você acha que eu também não tenho necessidades?
— É diferente, e além do mais, você acha que eu não sei que aquele seu amiguinho de merda anda te fodendo?!
— O quê?! Que amiguinho?! Você pirou de vez?!
— Não pense que eu sou trouxa, André... Até um cego conseguiria ver os olhares que vocês trocaram naquele dia que ele foi à mansão levar os pedaços de torta! Ou você acha que só porque eu não sou gay não conseguiria perceber esse tipo de coisa?! Eu consigo até imaginar o que vocês fazem só pelo jeito que ele te olha...
— Você tá falando do Edward?! — pergunto divertido, porque é muito ridículo; quero dizer, quem me dera, mas é meio impossível agora.
— Não, tô falando do príncipe Harry.
— Vem cá, você é idiota assim mesmo ou só se faz?! — digo rindo — Ou... não me diga que está com ciúmes?!
— Vai sonhando, princesa... Eu tô muito é puto, isso sim! Porque você fica por aí deixando os outros te comerem enquanto eu fico em casa, só na vontade!
— Acho melhor você parar de fantasiar coisas que não existem, antes que se espalhem boatos e eu acabe perdendo minha parte por alguma babaquice que você disse... E pro seu governo, a monitoria me segue onde quer que eu vá, então, a não ser que eu transe com ele por telepatia, você pode ir se aquietando aí e comesse a usar essa sua mão pra se consolar, porque-não-vai-rolar, fui claro?!
— Até parece que você me engana... Sai por aí fodendo com qualquer um e agora quer pagar de santo comigo?! Faça-me um favor, né?! Quem é que ia acreditar nisso?! Cê acha que eu sou otário?! — antes de conseguir me controlar, lhe dou uma tapa bem forte no lado direito do rosto, a marca dos meus dedos fica estampada na pele; ele me encara com os olhos arregalados em surpresa — Você tá louco?!
— Eu só vou falar isso uma vez, então eu espero que você me escute com atenção... — digo soltando fumaça pelo nariz; estou com tanta raiva que minha voz está tremendo — Eu não sou como as vadias com as quais você sai, Eduardo... não sou qualquer um pra você falar assim comigo, e você me conhece muito pouco pra dizer que eu durmo com todo mundo. Eu escolho meus parceiros a dedo e não o primeiro que me “canta”, como você faz! E outra, com quem eu fodo ou deixo de foder é problema meu e de mais ninguém, então você não tem que tá resmungando como uma criança fazendo birra por causa disso... O corpo é meu e eu deixo quem eu quiser fodê-lo, entendeu?! Isso não me faz pior que você em nada, afinal sexo é sexo, não importa se é entre dois homens ou entre uma mulher e um homem.
Chegamos à mansão e ele para o carro, eu desço e dou a volta no carro abrindo o porta-malas, ele vem logo atrás de mim, com a cara emburrada e o rosto ainda vermelho pelo tapa. Pego algumas sacolas e começo a dar as costas pra ele, mas sinto meu pulso ser segurado com força e sou obrigado a voltar; minhas costas batem no carro e eu olho pra cima sem entender o que está acontecendo, mas assim que faço isso prendo a respiração. O rosto do Eduardo está a apenas alguns centímetros do meu, ele parece perigosamente irritado e me encara com olhos tingidos de vermelho pela raiva, quando ele fala, sua voz sai baixa e calma, cortante e fria, quase como um aviso silencioso e isso quase me faz sair correndo dali pra fugir dele; sinto minhas pernas tremerem, mas me mantenho firme e seguro seu olhar.
— Certo, agora que você deixou de cacarejar, é minha vez de falar... — ele sorri, mas o sorriso é frio e não atinge seus olhos — Quem “você” pensa que é pra falar comigo assim?! Se eu não te conheço, você tão pouco me conhece também, então não julgue que, porque estamos atados a esse contrato ridículo, eu vou mudar meu jeito de ser ou começar a aceitar você... A próxima vez que você me bater, essa também vai ser a última vez que você vai ter uma mão pra bater em alguém, entendeu?! — ele solta meu pulso e me dá as costas pegando o restante das sacolas; meu pulso agora está dormente pelo aperto forte demais.
— A próxima vez que você me ameaçar, eu vou prestar queixa! — digo lhe encarando em tom de desafio, mas ele apenas me olha de lado.
— É mesmo?! Então a próxima vez que você me agredir, eu farei a mesma coisa. Agora vê se cala a boca e trás logo essa merda dessas sacolas pra dentro.
— Você não passa de um bicho! — digo passando por ele e indo para a cozinha.
— E você de uma bicha, que ironia, não?! — respiro fundo — Você devia aprender a dobrar essa língua, isso sim... É por serem tão abusados que gente como você acaba sendo morta por aí.
Fico tenso ao ouvir isso, porque já ouvi de um colega de escola e doeu exatamente como tá doendo agora. Sinto as lágrimas queimando em minha garganta e não consigo engoli-las de volta, baixo a cabeça rapidamente quando a primeira delas escorre molhando minha bochecha. Deixo as sacolas na cozinha e saio porta a fora, indo direto para o jardim, aos prantos; eu estava tentando ser forte, mas Eduardo me desarmou com aquelas palavras... Parecia até que eu tava revivendo aquele inferno de novo.
— Algum problema? — olho pra cima rapidamente e encaro um rapaz de aproximadamente vinte anos, que me olha de cima parecendo preocupado — Você está bem?
— Se eu tô chorando, é claro que eu não tô bem!
— Nossa, foi mal!
— Porque você tá aqui?!
— Eu sou o jardineiro, seria estranho se eu não estivesse aqui, você não acha?! — limpo algumas lágrimas insistentes e me recomponho.
— Como é que eu nunca te vi?!
— Tive uns probleminhas de família... Meu irmão morreu.
— Nossa, eu sinto muito, muito mesmo!
— Mas vim cuidar dessas maravilhas hoje! — ele sorri terno e eu o acompanho fazendo o mesmo.
— Eu sei como é... Amo esse jardim!
— E então... — ele parece meio cauteloso — porque você tava chorando?
— Porque, aparentemente, algumas pessoas não sabem o quanto certas palavras machucam.
— Você é empregado daqui?
— Na verdade, sou meio que o dono!
— Ah, então você deve ser o André?!
— Como sabe meu nome?
— A equipe de monitoramento me avisou, mas confesso que esperava alguém mais... metido?!
— E então, a monitoria lhe contou o porquê de eu estar aqui?
— Sim!
— Ah tá... Isso me poupa o trabalho de explicar, não é?! — rio sem graça — Mas, como você se chama?
— Leonardo!
— Prazer Léo! — eu lhe dou um sorriso, mas ainda penso nas palavras do Eduardo.
— Bom, acho que vou voltar ao trabalho.
— E eu vou dar uma volta de patins.
— Foi um prazer conhecer você!
— Digo o mesmo!
****
A brisa fria acaricia minhas bochechas enquanto eu patino tranquilamente pela praça, o fone de ouvido faz seu trabalho enquanto “Sua cara” toca alto; o horizonte já começa a assumir os tons alaranjados do por do sol e os últimos vestígios de luz natural tinge de dourado os telhados e as árvores ao redor, isso me faz ficar um pouco melhor e mais calmo, e até me ajuda a esquecer temporariamente o porque de o meu humor tá tão ruim.
Estou meio perdido em pensamentos, ultimamente ando bem avoado e talvez seja porque a minha vida está um verdadeiro caos, e o pior de tudo é que eu não posso fazer nada pra mudar essa situação ridícula... Me sinto impotente e inútil. Claro, eu ainda posso simplesmente começar a ignorar o Eduardo, mas talvez isso só piore ainda mais a nossa convivência e, sinceramente, eu não quero sofrer e me estressar ainda mais.
Suspiro me sentindo esgotado psicologicamente e resolvo que já está na hora de voltar pra casa, sento em um banco e tiro meus patins recolocando minhas chinelas; caminho tranquilamente pelas calçadas observando meu novo bairro; é um lugar bastante agradável, eu queria mesmo estar casado com alguém de minha escolha pra poder ser feliz aqui.
Chego em casa por volta das quatro e meia da tarde e o Gustavo ainda está esparramado no sofá, reviro os olhos e vou pro quarto, mas não vejo nem um sinal do idiota número 1. Dou de ombros sem me importar muito com sua ausência e até agradecendo por isso, então tomo um banho e troco de roupas; desço para a cozinha, já que preciso preparar o jantar, e enquanto misturo alguns condimentos o Gustavo entra no cômodo como quem não quer nada, senta em um banco,e me observa por alguns minutos. Me sinto realmente desconfortável, porque consigo ver que ele está me encarando, mas finjo não ligar, então ele se levanta novamente e começa a procurar algo.
— Tem alguma coisa pra comer aqui?
— Tem bolo... e mousse, no congelador. — depois de uma pausa onde repenso o que disse, me corrijo — Quer dizer, tinha... Mas não sei se ainda tem, pode já ter sido devorado, sabe?!
— Obaaa! — uno as sobrancelhas desgostoso, tem realmente alguma coisa que me incomoda nesse cara — O bolo ainda tá quase inteiro... — ele diz e abre a geladeira, pega refrigerante e volta a sentar — E então, o que ‘cê ‘tá fazendo?
— O jantar!
— Hum... Posso te fazer uma pergunta?
— Pode! — como se já não bastasse tudo o que tenho que aguentar do Eduardo, ainda tenho que suportar os idiotas que ele chama de “amigos”.
— Você transa com o Eduardo?! — imediatamente eu congelo, largo o que estou fazendo e viro lentamente para o encarar, mas ele parece bem despreocupado enquanto come um pedaço de bolo.
— Porque você pergunta?!
— Curiosidade?!
— Não, nós não transamos! — respondo secamente.
— E eu posso saber o por quê? Afinal, vocês são casados, não é?! — volto a dar as costas a ele e engulo em seco; se ele tá perguntando isso é porque o Eduardo não contou pra ele sobre o contrato — De qualquer forma, o Eduardo tinha me falado que vocês transavam, por isso eu fiquei curioso... Sabe como é, né?! Ele era hétero e agora tá casado e até transa com outro cara, isso é no mínimo suspeito! Então eu só queria saber se o sexo é assim tão bom ao ponto do gênero não importar, sabe?! Tipo, é assim tão gostoso que dá pra ignorar o fato de você ser um cara...!? — o encaro com nojo, afinal quem pergunta isso assim?! E se ele quer saber esse tipo de coisa, devia perguntar diretamente ao Eduardo não a mim.
— É, pois é, foi mal, eu só não gosto de falar sobre nossa intimidade com estranhos, mas sim, nós transamos... Isso não quer dizer que eu gosto de ficar espalhando isso por aí, é assunto pessoal! — tento disfarçar, afinal nem todo mundo pode saber do testamento e dessa história maluca e eu quase dou com a língua nos dentes... Preciso me controlar.
— Ah tá, foi mal, eu não sabia que você era tímido. — ele sorri malicioso e eu uno as sobrancelhas tentando controlar o meu nível de irritabilidade — É só que o Eduardo falou pra gente que você é insano na cama, que deixa ele loucasso, então não imaginei toda essa timidez... Mas deve ser porque você guarda tudinho pra ele, hein?! Maldito sortudo... — ele me olha dos pés a cabeça enquanto eu engasgo com minha saliva diante daquela conversa pra lá de sem sentido — Acho que eu também não me importaria se fosse com você.
— Ele disse que transava comigo?!
— Pois é! Tenho certeza que ele tava até de pau duro na hora. — Gustavo ri aparentemente se lembrando do momento, mas eu permaneço em confusão total — Olha, pra dizer a verdade, eu sempre pensei que ele fosse mesmo gay, mas não diz isso pra ele! Apesar de quê, eu meio que entendo ele.
— Hum... — lhe dou um sorriso amarelo tentando disfarçar meu desconforto.
— Acho que ele tem razão...!
— “Razão” sobre o quê? — pergunto sem muito interesse, afinal não é como se o papo estivesse bom.
— Sobre você ter uma bunda delic... — ele se para e depois repensa as palavras — Sobre... sua bunda ser realmente legal, sabe?! Bonita, grande... redondinha! — arregalo os olhos o encarando; aquele maldito disse o quê sobre a minha bunda pra aqueles amigos tarados dele?! — Acho que eu tô começando a entender ele...! Você malha muito pra manter ela assim? — respiro fundo tentando organizar meus pensamentos que estão a mil.
— Não, comecei a malhar há poucos dias!
— É silicone?
— Deus é mais!
— Então, é tudo natural mesmo?!
— Sim! — respondo brusco; porque ele tem quer ser tão idiota, meu Deus?!
— Eu posso pegar pra ter certeza?!
— Nunca! — ele ri dando de ombros.
— Bom, bem que eu tentei. — ele me encara ficando sério e percebo um convite silencioso, ele tá quase dizendo: “Se você quiser, eu quero” com os olhos — De qualquer forma, eu só estava brincando, não pegaria na bunda do marido do meu amigo.
***
Finalmente, após uma árdua tarde na cozinha, acabo de me arrumar. Depois de um longo banho e alguns minutos escolhendo minha roupa, estou pronto e, sem querer me enaltecer, mas me sinto deslumbrante, um verdadeiro arraso. Essa calça skinny preta que eu comprei ressalta o que eu tenho de melhor e unida a essa blusa gola V que mostra um pouco mais as minhas clavículas e deixa meu pescoço mais exposto que normal, me sinto empoderado. Ponho um colar de prata bem sutil, mas que dá o toque final ao meu look, junto com um relógio de pulso também prata, então desço para a sala me encontrando com o Eduardo, que está conversando animadamente com o Gustavo; reviro os olhos e sento em uma poltrona enquanto mexo em meu celular os ignorando por completo, afinal não aguento mais olhar pra esses dois.
A campainha finalmente toca e eu vou correndo abrir a porta... Enfim chegou o momento mais esperado da minha noite...
— Edward... oi. — sorrio tímido — Entra, por favor.
— Hunf... Uau! — ele continua parado na porta e me analisa dos pés a cabeça mordendo o lábio inferior e cerrando levemente os olhos.
— Algum problema?
— Não! Quer dizer, acho que pode-se dizer que é um problema, hum?! — ele diz depois de uma pausa.
— E o que seria?! Aconteceu alguma coisa?!
— É só que... você está magnífico, mas já é casado! — ele diz fingindo tristeza e eu sorrio sentindo meu rosto esquentar.
— Besta... eu digo o mesmo, você tá muito gostos... — porra, ia falando merda... Me recomponho e limpo a garganta reformulando minha frase de uma forma mais apropriada para um “homem casado” — Muito... elegante! — ele ergue as sobrancelhas e me lança um sorriso de lado que vai direto no meu coração.
— Bem, com licença. — ele se dirige ao sofá e senta — Boa noite, rapazes!
— Boa! — Eduardo responde seco como o deserto do Saara me deixando envergonhado com sua falta de educação.
— Boa noite! — Gustavo responde, mais receptivo que o amigo... ainda bem.
— Edward, esse é o Gustavo, um amigo do Eduardo. — sento ao lado de Edward — Gustavo, esse é o Edward, nosso vizinho e um... bom amigo meu! — eles acenam com a cabeça.
— Então, você também mora por aqui?!
— Pois é, mas só na casa da frente, não é nada demais!
— Nada demais pra quem?! Afinal não dá pra competir com uma mansão, né?! — Gustavo ri amigavelmente e isso deixa o clima menos tenso — Mas pelo que eu vi, todas as casas aqui tem essa vibe, mesmo não sendo mansões.
— É, pode ser. — Edward ri de volta e começo a me sentir confortável.
— Quando nós vamos jantar? — Eduardo corta a conversa dos dois e Gustavo o olha com as sobrancelhas erguidas, já eu o fuzilo com o olhar.
— Bom, eu também tô ansioso por isso, estou morrendo de fome! — Gustavo fala ainda encarando o amigo de uma forma estranha.
— Assim o Edward vai pensar que nessa casa todo mundo passa fome! — digo olhando para os dois com raiva, mas me levanto antes que eles me façam passar mais vergonha — Vamos, antes que vocês me envergonhem ainda mais, se é que isso é possível!
— Não vejo o porquê de toda essa frescura com o Edward, até parece que ele já não veio aqui...— o encaro sério, estou realmente começando a ficar com raiva.
— Essa “frescura” que você fala, Eduardo, se chama “modos”, e se eu os tenho com o Edward, é porque ele foi a única coisa boa que aconteceu desde que vim morar aqui e o único que me trata com o devido respeito. — Edward sorri — Afinal, se não fosse por ele, eu teria gastado uma fortuna pra ir à faculdade, já que meu “maridinho” só começou a me ajudar depois de uma série de ameaças e discussões. Você devia era agradecer a ele também.
— Escuta, eu tô cansado dessa sua língua maior que o corpo, tá ligado?! Tô cansado de viver com a sua audácia e todo esse moral infundado que você tem... Agradecer a ele?! Pelo quê?! Será mesmo que a “ajuda” dele foi de graça ou você “deu alguma coisa” a ele que não pode me dizer?! Que respeito você tá me cobrando se você mesmo, como alguém casado, não tem para com o seu marido, saindo com um e outro quando já é comprometido... Você quer me envergonhar, é isso?! Foi você que veio morar na porra da minha casa, e eu tava bem sem você, aí me obrigam a casar com um cara, mesmo sem eu ser gay, e eu ainda tenho que suportar você flertando com outro homem dentro da porra da minha casa, na frente do meu amigo, como se eu fosse um puto idiota?! Você tá tentando testar minha paciência ou quer mesmo que eu te bata?! É masoquista também?! Só me faltava isso; é ainda mais pervertido do que eu imaginei, como se já não bastasse ser gay...!
— Quem está cansado dessa merda de atitude sou eu, seu cuzão. Não suporto mais conviver com um garoto que tenta provar a si mesmo que é um homem, que me humilha só por causa da minha orientação sexual! Desde quando os gays são menos humanos que os héteros?! Acha mesmo que eu escolheria isso se tivesse outra opção?! Estar vinculado a um idiota de mente pequena e limitada, que ainda vive na Era Medieval e se recusa a evoluir e aceitar que o amor não tem gênero era a última coisa que eu queria nesse mundo, mas aqui estou eu, exatamente onde eu menos queria estar. Você não passa de um pirralho mal amado que tenta se sentir melhor pisando nos outros. Você quer saber...?! Sim, eu transaria de boa com o Edward e não me arrependeria nem um pouco, e tenho certeza que ele me satisfaria de um jeito que você jamais faria, mesmo que tentasse por mil anos; é por isso que está com tanta raiva, porque seu orgulho de merda está ferido! — sinto minhas lágrimas ameaçarem cair e tento me manter firme — Mesmo que só existisse você no mundo, eu não te escolheria!
— Retire o que você disse, agora! — ele vem pra cima de mim e segura meus pulsos, sua perna fica entre as minhas me obrigando a se apoiar no corpo dele e sinto sua respiração descompassada bater contra o meu rosto, seus olhos brilham de raiva.
— Gente, calma!
— Cala a porra da boca, maldito ladrão de maridos. — ele fala com Edward, mas não deixa de me encarar como se quisesse me comer vivo.
— Como é?!
— O quê, é uma conspiração?! — ele finalmente me larga e vira pra olhar pra o Edward rindo sem humor algum — Você também pensa que eu sou um idiota?! Acha que eu não vejo o modo como vocês se olham?! Precisam de um quarto ou o sofá serve?!
— O quê?! Não, Eduardo, olha...
— Se você olhar um pouquinho mais, talvez consiga fazer ele gozar já que ele diz que você é assim tão bom...
— Tudo o que eu quero no momento é a amizade do André, nada além disso, Eduardo, e o que ele disse foi apenas uma suposição... Eu conheço o meu lugar e não faria isso sabendo que ele é comprometido, porque não gostaria que fizessem isso comigo também.
— Eu não sou um maldito idiota, cara!
— Mas tá parecendo! Vê se cresce e para de choramingar como uma criança... O André merece um homem de verdade ao lado dele e não um pirralho idiota que não sabe o que quer. Se você tá com ciúmes de mim, devia agir como marido dele e fazer o que não quer que eu faça...
Eu não tenho tempo nem de piscar antes de ver o Eduardo partir pra cima do Edward e lhe dar um soco no nariz; ambos caem no chão agarrados enquanto o Gustavo tenta separá-los. Sinto minhas mãos tremerem e as lágrimas queimarem na garganta, minha noite está arruinada; o que era pra ser uma noite perfeita acabou de virar o caos que eu temia.
Continua...