O outro capítulo 29 Liberdade

Um conto erótico de Arthur Miguel
Categoria: Gay
Contém 10073 palavras
Data: 02/04/2022 19:14:26
Assuntos: Brigas, Gay, Paz, Sexo, Tesão

Capítulo 29

A chuva caía com força do lado de fora, e o vento balançava as árvores com brutalidade. Pela vidraça molhada da janela, Leandro podia observar o dia cinzento e tempestuoso.

No entanto, não prestava atenção na paisagem invernal.

Com as duas mãos e um lado da face apoiadas na vidraça, Leandro gemia enlouquecido. Estava completamente nu e os seus quadris moviam-se de frente para trás, sendo preenchido pelo pênis de Abner.

Abner metia com força, e os corpos de ambos estavam banhados em suor e dominados pelo tesão.

Leandro virou a cabeça para olhá-lo por cima do ombro e quando os seus olhos se encontraram, ambos emitiram brasas ardentes.

As bocas se aproximaram num beijo delicioso. Suas línguas se entrelaçavam, se devorando, aproveitando ao máximo que podiam.

Abner aumentou o ritmo das metidas, segurava nos quadris do amado, o fazendo ir ao paraíso de tanta felicidade.

Abner atacou o pescoço, deslizando a língua sobre ele e beijando em seguida.

_ Você é tão gostoso, Leandro, que quero devorar cada parte do seu corpo... não vou desperdiçar nada._ Abner sussurrou com a voz rouca ao pé do ouvido de Leandro, que sorriu satisfeito, amando sentir o Outro dentro de si.

Leandro despertou ofegante. Apesar do sonho ter chegado ao fim, o seu corpo implorava para ser amado intensamente.

Permaneceu deitado, olhando para o teto. Deslizou a mão sobre o peito nu, descendo pela barriga até chegar ao pênis, que estava endurecido. Penetrou a mão por dentro da cueca, libertando o pau.

Fechou os olhos, deslizando a ponta da língua pelos lábios inferiores, masturbando-se, imaginando-se de quatro, e a língua de Abner entre as suas nádegas.

Retirou a cueca, a jogando ao chão. Pôs dois dedos nos lábios, chupando-os com gosto, imaginando ser o pênis do ex amante. Gemia com eles na boca, sentindo uma vibração gostosa entre as pernas.

Levou os dedos umidecidos até o ânus, penetrando aos poucos, entre as pernas abertas, sem deixar de se masturbar.

Erguia os quadris, gemendo, sentindo o coração bater acelerado.

Elevou-se ao prazer supremo, gozando na própria mão.

O arrependimento bateu em seguida. Sentiu-se tolo por ter sido Abner o seu objeto de desejo, o cafejeste que feriu o seu coração.

_ Miserável! Até em sonho esse infeliz vem me perturbar.

Leandro sentou na cama e se viu observando a lua cheia pela janela do quarto.

Sentia falta de sexo, há tempos não se dava ao luxo de ter uma boa foda.

Lembrou de Ezequiel e das outras muitas opções que tinha, lamentando por não poder concretizar o seu desejo.

A imagem de Júlio atentando contra a vida de Abner ainda o perturbava. Nunca sentira tanto medo do ex marido como sentiu dos últimos meses. Temia que Júlio o matasse ou a qualquer homem que se aproximasse dele. Em hipótese alguma duvidava da crueldade do seu ex marido, já que teve a infeliz oportunidade de provar o gosto amargo do seu veneno.

Lamentou mais uma vez por ter que oprimir os seus desejos, refugiando-se na solidão, onde se sentia um pouco seguro.

No entanto, era difícil para Leandro manter a resistência diante das investidas de Ezequiel.

Sempre que podia o colega, apoiava a mão em suas coxas, acariciando singelamente.

Nervoso, Leandro se afastava, inventando algo para fazer.

A situação piorava, quando Leandro se aproximava do cantinho do café, a mesinha ficava localizada num corredor estreito. Ezequiel passava por ele, dando um jeito de encoxa-lo. Ao sentir o pênis roçando nas suas nádegas, Leandro sentia o pênis umidecer.

Procurava manter a postura, fingindo seriedade e não gostar da situação.

Ezequiel já não se intimidava mais. Sentia que também despertava tesão em Leandro, e isso o empolgava em investir cada vez mais.

Aquela era a primeira vez que Leandro se via atraído por alguém sem que o amor estivesse presente. Ele sabia que era só desejo sexual e adorava essa nova sensação. Sentia-se livre por alguns instantes.

O horário do almoço era um dos mais tranquilos na diária de Leandro. O ritmo do trabalho ele era acelerado, e quase não tinha tempo para relaxar.

Após fazer a refeição na cozinha dos funcionários, Leandro e os colegas de trabalho descansavam no jardim do condomínio comercial, onde ficava localizada a empresa.

Alguns deles aproveitavam o espaço ao ar livre arborizado para fumar, conversando sobre assuntos do dia a dia.

Apesar de Leandro gostar de interagir com os colegas, ele pediu a Valéria para almoçar depois que todos retornassem ao trabalho. Estava imerso na leitura do livro A pediatra, da autora Andréa del fuego, e queria aproveitar o horário do almoço para ler com tranquilidade.

Acomodou-se debaixo de uma árvore, apoiando as costas em seu grosso tronco, e pôs o livros sobre as pernas dobradas.

O clima frio estava agradável, e o sol o aquecia de um jeito aconchegante.

O silêncio também foi o seu grande aliado para que a leitura fluisse.

Olhou em volta sentindo uma paz interior, que não sentia há tempos. Exclamou para si mesmo o quão boa era a sensação de ter tirado um peso das costas. Já não pensava em Júlio, Abner e nem em nada ou alguém que tirasse o seu sossêgo, somente apreciava a sua própria companhia.

Sentiu uma mão masculina pousar em seu ombro. Ao olhar para cima, viu Ezequiel sorrir para ele com ternura.

_ Posso sentar ao seu lado?

_ Claro._ Leandro respondeu sorrindo, mas mentalmente não gostou do fato de receber a "visita" inesperada de Ezequiel, pois desejava ler em paz.

_ Hum! A Pediatra... Esse livro é sobre o quê?

_ Uma pediatra que não gosta de crianças.

Ezequiel o olhou com espanto, arregalando os grandes olhos azuis.

_ A protagonista excerce a profissão por comodismo, o pai é médico e ela se formou em pediatria por ter um espaço no consultório do pai, onde pudesse trabalhar. Até que ela conhece o filho do amante e passa a ter uma obssessão pela criança.

_ Nossa! Interessante. E pelo visto você já está terminando a leitura.

_ Os capítulos são curtos e a linguagem é simples, o que tornam a leitura fluída. Creio que termino hoje mesmo.

_ Quando terminar de ler, me empresta?

_ Eu emprestaria se o livro fosse meu. Este eu peguei na biblioteca pública, que fica próxima daqui. Depois que saí da casa do Júlio, fiquei carente de leitura, já que deixei todos os meus livros para trás.

_ Não se preocupe. Semana que vem, você já vai se mudar para o apartamento novo, vai poder resgatar os seus livros.

_ Não creio. A essa altura o Júlio já deve ter se livrado de todos._ Leandro respondeu com tristeza.

_ Ele não faria isso.

_ Ele faria qualquer coisa para me magoar.

_ É um babaca.

_ Eu não quero falar sobre ele._ Leandro esboçou um sorriso, fechando o livro._ Alguma novidade?

_ Sim. Trouxe um presentinho para você.

Ezequiel o entregou um pequeno pote transparente, contendo um bolo de amandoim, com cobertura de coco ralado e uma colherzinha de plástico branco.

_ Olhaaaa! Parece delicioso!

_ A minha irmã faz para vender. Eu comprei esse para você. Espero que goste.

_ Aaah, obrigado, amigo.

Leandro provou fechando os olhos gemendo. O pequenino pedacinho de bolo se dissolvia em sua boca, proporcionando um prazer indescritível.

_ Hum! Muito bom! A sua irmã é uma cozinheira de mão cheia!

_ Fico feliz que tenha gostado.

_ Eu amei. Me passe o contato dela. Vou encomendar alguns. A minha filha vai amar.

Ezequiel percebeu que o canto do lábio superior estava sujo com um pedacinho de bolo. Aproveitou-se da situação para deslizar a ponta do dedo sobre ele. Leandro sentiu o corpo se arrepiar.

_ Saiu._ disse Ezequiel mostrando a ponta do dedo suja de bolo.

_ Obrigado. Só você mesmo para me proporcionar esse prazer.

_Eu amo te dar prazer. Se me você permitir, posso te dar outros tipos de prazeres.

Ezequiel aproximou a boca a de Leandro. Tinha um olhar penetrante, deixando o colega com as pernas bambas.

Leandro sentia o hálito de Ezequiel próximo aos seus lábios, e o olhar desse devora-lo.

Ezequiel tocou no seu queixo, erguendo a sua cabeça, a levando em direção aos seus lábios.

_ Você me permite te proporcionar mais prazeres, Leandro?

Leandro não quis resistir. Decidiu que alimentaria a sua fome de desejo.

Puxou Ezequiel pela nuca e o beijou.

Tanto o bolo quanto o livro foram postos ao lado. Leandro permitiu que Ezequiel o tomasse nos braços, sem interromper o beijo, e que explorasse o seu corpo com as mãos.

Ao final do beijo, Leandro puxou o lábio inferior de Ezequiel, com uma mordidinha leve, dando um celinho em seguida.

_ Que beijo gostoso, meu deus! O melhor que já experimentei na vida._ disse Ezequiel, o abraçando.

O sorriso de Leandro se desfez ao perceber que estava sendo fotografado por um homem que estava dentro de um carro preto, parado em frente ao condomínio.

_ Puta que pariu!

Leandro levantou num rompante. Caminhou quase correndo em direção ao carro.

Contudo, o misterioso motorista saiu com brutalidade, o deixando para trás gritando.

_ Desgraçado! Volte aqui! Volte aqui! Que merda!_ gritou Leandro socando as próprias pernas.

_ O que aconteceu?

_ Tinha alguém nos espiando.

_ Tem certeza?

_ Claro que tenho! O cara que estava dentro do carro...ele estava fotografando! Caralhoooo! Eu tenho certeza que era alguém a amando dele.

_ Ele quem?

_ O Júlio, porra!

_ Calma, Leo!

_ Você não está entendendo! Não há como ficar calmo! Ele é louco!

.....

_ Você vai mesmo sair com um cara que conheceu num aplicativo?!_ Leandro perguntou atónito.

_ Hum, hum!_ Valéria respondeu, enquanto passava o batom vermelho nos lábios._ O que acha deste vestido, Bijuzinho?

Ela usava um vestido preto e justo, que media até o meio das coxas.

_ Acho chique e sexy. No ponto. Mas, vem cá, não é meio perigoso?

_ Eu já me encontrei com esse cara antes. É super de boa.

_ Ah, mas...

_ O que, Bijuzinho?

_ Sei lá...fazer sexo com um...bom...

_ Hum! Vai dar uma de bicha puritana agora?perguntou Valéria com tom de brincadeira, pondo a mão na cintura.

Leandro mordeu os lábios e sorriu.

_ Amiga, é que... Aaaaa faz tanto tempo que não faço sexo, que a vontade tá batendo.

_ Então, vá trepar, homem! Você não precisa entrar num relacionamento. Você pode viver o tempo que precisa, mas pode fazer sexo casual.

_ Cara, só de pensar em sexo, eu fico com os nervos a flor da pele. Sinto uma coisa assim por dentro.

Leandro se jogou de costas para a cama.

_ Aaaaa! Eu preciso dar._ disse sorrindo.

Valéria sorriu e deitou ao seu lado.

_ Tá sedendo por uma pica bem gostosa te comendo, né?

_ Agora tô ficando com vergonha._ Leandro cobriu o rosto, sorrindo.

_ O Ezequiel está a sua disposição.

Parou de sorrir e olhou para o teto.

_ Eu sei. Mas não acho certo pôr a vida dele e nem de ninguém risco.

_ Como assim?

_ Eu sei que Júlio tá na minha cola. Ele colocou um detetive atrás de mim. Eu sempre sinto que tem alguém me seguindo. Depois do que ele fez com Abner, tenho medo que faça isso com qualquer pessoa que chegue perto de mim. Amiga, é horrível isso que tô vivendo. Me sinto sufocado...como se eu fosse refém dele.

_ Não é justo que você viva desse jeito. O casamento de vocês acabou. Aquele idiota tem que respeitar isso.

_ Hoje mesmo, na hora do almoço, eu beijei o Ezequiel... lá no jardim do condomínio.

_ Como é que é?!_ Valéria perguntou empolgada.

_ Aí, amiga, estava tudo indo tão bem. Até que eu vi que um homem nos fotografava dentro de um carro.

_ Sério?!

_ Eu tentei ir atrás dele, mas não consegui alcançar e nem anotar a placa do carro. Foi tudo tão rápido! Eu tô apavorado. Morro de medo do Júlio fazer alguma coisa com o Ezequiel.

_ Mas isso é um absurdo! Aquele cretino não tem esse direito! Temos que ir á delegacia!

_ E vamos dizer o quê? Não tenho nenhuma prova contra o Júlio! Eu nem sei quem é aquele homem!

_ Que merda! Júlio não pode se dar bem em todas! Isso não é justo!

_ Eu sei. Só espero que não demore muito para que Júlio se envolva com alguém e me esqueça de uma vez por todas. Eu só quero viver, amiga. Quero paz.

Valéria o abraçou.

_ Você vai viver. Você ainda vai ser muito feliz, meu amor.

....

Na noite em que Leandro saiu da casa de Júlio, tentando se libertar daquela tortura psicológica, ele se viu dominado pelo medo, sentindo uma sensação de impotência.

Sabia que a partir dali teria que começar do zero, e não se sentia capacitado para reconstruir a sua vida.

Olhava em volta do seu apartamento devidamente limpo, exalando um perfume agradável dos materiais de limpeza e do amaciante das cortinas e roupas de cama. Sentia orgulho de si por ter construído com muito esforço cada pedacinho do seu lar.

Leandro fazia questão de manter as janelas sempre abertas, convidando os raios de sol para que dominassem o ambiente com a sua luz e calor.

Deu preferência as cores claras para as paredes e móveis. Economizou cada centavo dos seus salários dos últimos meses para investir do seu cantinho.

As plantas davam vida a cada cômodo, sendo essas de várias espécies e aparências saudáveis.

A mobília era de grande maioria de estilo vintage, compradas em brechós. Não era só por motivo económicos que preferiu esse tipo de mobília, mas também pelo charme que cada um deles proporcionavam ao local.

O pouco de modernidade no apartamento vinha da Smart TV presenteada por Valéria e do refrigerdor de inox, que comprou numa loja popular de Eletro doméstico, parcelado em diversas vezes.

Mesmo com toda a simplicidade do apartamento, sentia-se feliz por finalmente ter um teto todo seu. Cuidava com esmero, mantendo sempre tudo em ordem.

Ali também havia vida. Era agradável ver um vaso de flores sobre a mesa de jantar, vestida com uma toalha de renda branca, os desenhos realistas de paisagens, pessoas queridas e cenas de livros marcantes feitos com as suas próprias mãos emoldurados nas paredes, o cheiro delicioso dos pratos vindo da cozinha, perfumando a casa. Tudo emanava amor, carinho e paz.

No quarto de Vanessa ele dedicou mais carinho do que nos outros cômodos, dando liberdade para que a menina pudesse escolher cada detalhe.

Vanessa não se animou tanto com o seu segundo quarto, ele não tinha nem a metade do luxo e do conforto que o da cobertura. Mas ela não quis magoa-lo e disfarçou com um sorriso largo, palavras de agradecimento e beijos pelo rosto.

_ Eu amei tudo, pai! Ficou perfeito!

_ Eu fico feliz que tenha gostado. Confesso que fiquei preocupado por não poder te oferecer o que você está acostumada.

_ Tá tudo bem, pai. Não esquenta a cabeça. Você fez o que pode.

Vanessa o abraçou com força, como se quisesse protegê-lo. Sentiu pena dele por viver naquela situação, acreditando que o pai merecia muito mais, que não era justo sair do casamento sem direito aos bens de Júlio.

Era o seu primeiro final de semana sob os cuidados de Leandro, mesmo estranhando tudo, quis passar por cima disso para não estragar a felicidade do pai.

_ Huuuum! Que cheiro bom, pai! Cheiro de massa. O que está preparando?

_ Pães caseiros.

_ Como assim?! Você não sabe cozinhar!

_ Eu aprendi. Acho que já estão quase prontos. Venha comigo.

Leandro a puxou pela mão. Estava orgulhoso de si mesmo e queria muito que a filha aprovasse o gosto dos pãesinhos.

Pôs sobre a mesa os pães pequeninos, lustrosos devido a gema pincelada por cima antes de assa-los. O aroma invadia as narinas da menina, fazendo o seu estômago roncar.

Leandro a serviu contente. Cortou um deles ao meio e passou a margarina amerelinha, que derretia ao tocar na superfície quente e esfumaçante da massa.

_ Prove.

Vanessa o olhou desconfiada. A possibilidade de ter sido Abner que o ensinou a fazer os pães a deixou nervosa.

_ Onde você aprendeu a fazer pães? É estranho, já que você não sabia nem fritar um ovo. Não vai me dizer que isto é receita daquele puto nojento._ Vanessa perguntou com um ar desafiador e arrogante, deixando Leandro entristecido.

_ Não, "senhora". Eu não aprendi com quem você está insinuando. Essa é uma receita que aprendi com a Soraya, a moça que trabalha na casa da Val.

_ Mas você não sabia cozinhar e já está até preparando um banquete! Até convidou os seus novos amigos para almoçarem aqui amanhã.

A garota sentia o ciúme a dominar. Não admitia que nenhum dos seus pais tivessem relações com outras pessoas. Abominava qualquer um que se aproximasse deles: Ezequiel, Luciano e Abner... principalmente Abner, que ela julgava ser o pivô da separação do casal.

_ Eu aprendi porque não sou mais uma bicha dondoca._ Leandro respondeu irritado._ Se é que você não está percebendo, mas agora não tenho mais empregada. Sou eu mesmo que tenho cuidar da casa e de nós dois. Aprender a cozinhar faz parte das minhas atuais obrigações. E fiz uso da internet para isso.

Vanessa sentou á mesa séria, com os braços cruzados como uma criança birrenta.

_ Eu odeio aquele homem! Ele acabou com a nossa família!

_ Vanessa, eu não quero mais falar nele. Quero deixar tudo no passado e seguir em frente. Pode ser? A minha saúde mental já não está muito boa e não tenho dinheiro para fazer terapia. Eu preciso lutar para manter um pouco de sanidade mental... então, colabore. Por favor, não toque mais neste assunto.

_ Tudo bem...mas você me garante que não tem nada com ele?

_ O que você acha?

_ E nem com o idiota do Ezequiel? Nem com ninguém?

_ Uh, é! Vou ter que fazer votos de celibato?_ perguntou Leandro, em tom de brincadeira.

_ Você é o meu paizinho. É só meu._ Vanessa levantou da mesa e o abraçou e apoiou a cabeça no seu peito._ Eu não quero te dividir com ninguém.

Leandro a beijou no alto da cabeça.

_ Eu te amo, meu amor. No momento, só quero me dedicar a você e a mim.

_ Sem ninguém entre nós?

_ Sem ninguém entre nós.

Trocaram sorrisos, beijos pelo rosto e afagos, antes de sentarem á mesa e saborearem os deliciosos pãesinhos.

A temperatura esfriou muito naquele noite chuvosa de sábado.

Enrolada no edredom rosa, Vanessa bateu no quarto do pai e pediu para dormir com ele. Levou consigo um ursinho surrado branco, que vestia um macacão azul. Foi o primeiro presente que recebeu dos pais, assim que foi adotada por eles. Tinha um carinho enorme pelo brinquedo.

Aconchegou-se na cama macia do pai, pondo a cabeça em suas pernas. Leandro voltou a leitura do livro Véspera, de Carla Madeira. Estava impressionado com a narrativa frenética da autora e com a história envolvente.

Vanessa navegava na internet, deslizando o dedo pela time line do Twitter, interagindo com os posts de fofocas sobre celebridades. Foi interrompida por uma ligação de Júlio. Ela revirou os olhos para cima, se recusava a atendê-lo.

_ Quem é?

_ É o meu outro pai.

Leandro engoliu a seco o pavor que sentiu. Teve medo que Júlio estivesse por perto, o vigiando.

O advogado insistia nas chamadas, mesmo não sendo atendido. Odiava ser ingonorado.

_ Atende logo. Ele vai ficar insistindo.

_ Eu não vou atender. Vou uma mandar uma mensagem.

"O q tá pegando?"

"Eu só quero saber como vc tá, minha princesa linda.❤️"

"Tô suave."

P q ñ me atendeu, filha?"

"Pq estou tentando dormir e vc tá me atrapalhando." mentiu Vanessa.

"Tudo bem. Vou te deixar em paz. Como tá o seu pai?"

"Ele tá ótimo. Ainda mais que não precisa mais olhar para a sua cara de pau."

" Não precisa ser tão grossa."

"É o que vc merece. Agora vou dormir. Tchau."

"Tchau, meu amor."

A última mensagem não foi lida por Vanessa naquela noite, pois ela o silenciou e abriu novamente o aplicativo do Twitter.

_ Paizinho, bem que a gente poderia ver um filminho, comendo pipoca e tomando um chocolate quente, né._ Vanessa pediu fazendo beicinho.

_ Oooh, e eu sou louco de recusar isso com você fazendo essa carinha fofa, que eu amo? O problema é que a TV está na sala.

_ Eu pego o meu notebook, enquanto você prepara o chocolate e a pipoca.

_ Tudo bem.

Leandro derreteu algumas barras de chocolate que estavam na geladeira, pondo um pouco de leite batido, dando uma aparência mais cremosa na bebida. Sobre as pipocas, postas num balde, pôs uma cobertura de manteiga derretida.

O filme foi escolhido por Vanessa, optando por Girl, um drama belga sobre uma menina trans. O momento cinema pai e filha deu a Leandro uma alegria enorme. Olhava para Vanessa distraída compenetrada no filme.

Acariciou os cabelos da menina, o amor sentia por ela aquecia o seu coração. Era tão bom tê-la ao seu lado! Como ele a ama!

....

Leandro não conseguiria pôr as coisas em ordem no apartamento sem a ajuda dos amigos. Todos os colegas de trabalho e Patrícia foram muito solícitos nessa tarefa árdua.

Como forma de agradecimento, Leandro ofereceu um almoço em sua casa para os seus fiéis ajudantes.

O cardápio foi decidido por votação no trabalho. A maioria optou por feijoada, com arroz branco, farofa, couve refogada e rodelas de laranjas.

Como os seus dotes culinários não haviam evoluído ao ponto de preparar sozinho o prato, contou com a ajuda de Patrícia.

Eles marcaram de se encontrarem no supermercado, na manhã de domingo, comprariam os ingredientes para a feijoada e partiram para o apartamento de Leandro.

Quando Leandro entrou em casa acompanhando de Patrícia, encontrou a filha dançando na sala, com o som no último volume. A menina vestia um conjunto de moletom rosa composto por um shortinho e um cropped. Os cabelos presos num coque, no alto da cabeça, com um dos cachos dourados caídos na testa.

Ao ver Leandro, Vanessa se atirou nos seus braços, envolvendo os braços no pescoço do pai e o beijando no rosto.

_Paizinhoooo!

Leandro se equilibrou para que as sacolas não caíssem de suas mãos. Ao se afastar, as pôs na mesa da cozinha.

_ Bom dia, Patrícia.

_ Bom dia, Vanessa. Como você está?

Leandro retornou á sala, abaixou o volume do rádio.

_ Filha, você já fez a lição de casa?

Vanessa se jogou no sofá, deitando de bruços, ergueu as pernas para o alto, digitando algo no celular.

_ Vanessa! Vanessa!

_ Ah, o que que foi, pai?

_ Você já fez a lição de casa?

_Ainda não. Daqui a pouco, eu faço._ Vanessa respondeu sorrindo, sem tirar os olhos da tela do celular.

_ Levante e vá fazer a lição. As suas notas estão muito baixas para ficar negligenciando os estudos.

_ Ah, pai, depois eu vou.

Patrícia fez um sinal negativo com a cabeça. Mentalmente, desaprovava a atitude da menina.

_ Levante agora e vá fazer a lição! Caso contrário, eu vou tomar o seu celular!_ ordenou Leandro num tom de voz aguda e firme, quase como um grito.

Vanessa não ousou a respondê-lo. Naquele momento, não podia contar com a proteção de Júlio. Levantou e foi para o quarto contrariada.

Patrícia o olhou sorrindo, admirada com a atitude inesperada do amigo.

_ Leandro, homem do céu! Eu tô pasma! Finalmente você foi firme com essa menina. Está de parabéns!

Leandro mudou a expressão de bravo para sorridente.

_ Amiga, é tão bom poder educar a Vanessa sem as intromissões do Júlio!_ Leandro disse aliviado, com a mão sobre o peito.

_ Verdade. Júlio estraga essa menina com tantos mimos. E sem contar que o término com o ele foi o melhor grito de liberdade que você deu.

_ Eu sempre fui muito fraco no quesito educação da Vanessa. Você acredita que eu quis que ela estudasse no Canadense, que foi a mesma escola que estudei, mas o Júlio me impediu?

_ Sério?! Justo o Canadense, que é um colégio tão bem conceituado por ser uma das melhores escolas bilíngues do país.

_ Sim. Mas na época, a Vanessa quis estudar na escola atual por causa dos amigos. Júlio, como sempre, fez a vontade dela e eu mais uma vez fui desmoralizado. Mas, isso acabou. O pouco tempo que Vanessa ficou sobre os cuidados do Júlio, ela foi muito negligenciada, principalmente nos estudos e na alimentação. Agora vou virar o jogo. Vou correr atrás do prejuízo e cuidar da minha filha.

_ É isso aí. Estou amando essa sua nova versão.

A panela de barro foi posta fumegante sobre a mesa vestida com uma toalha xadrez. O caldo negro borbulhava e na superfície as aparências das carnes suculentas aguçavam a fome de todos em volta.

O verde das couves refogadas era de uma vivacidade impressionante, dando água na boca de quem as observavam. O aroma das especiarias se mesclava ao alho dourado, promocionando uma sensação agradável. A farofa e o arroz completavam em perfeita harmonia a mesa, acompanhados com as garrafas de cerveja geladas e a garrafa de refrigerante.

Nove pessoas tiveram que se acomodar no pequeno apartamento, se espalhando pela cozinha e sala. Os fumantes optaram por ficarem próximos á janela, onde podia libertar sossegados as fumaças do tabaco de seus pulmões não sadios.

Leandro relutou muito para não convidar Ezequiel. Temia que estivesse sendo observado por algum detetive particular intruso, a mando de Júlio. Queria preservar a segurança do amigo.

_ Nada disso. Você não pode deixar que o carcamano controle a sua vida, Bijuzinho. E além do mais, ele sempre é muito gentil contigo. Pegaria muito mal se você não o convidasse.

Leandro não tinha como negar que Valéria tinha razão. Imaginou que, por muitas pessoas estarem presentes, não teria problema em convidar Ezequiel.

Talvez Júlio não ficaria tão irritado. Que merda! Odiava ter que se preocupar com a opinião de Júlio! O que mais desejava era Júlio se perdesse na escuridão do seu passado e nunca mais retornasse.

Ezequiel ficou feliz pelo convite. Mesmo com Valéria explicando a situação, ele temia perder a amizade de Leandro, que foi uma pessoa que ele aprendeu muito a estimar.

Já havia desistido de ter algum tipo de envolvimento com o amigo. O tesão não conseguiu se sustentar devido a muitas investidas rejeitadas.

No entanto, o carinho e a admiração prevaleceram. Leandro era amável, inteligente e isso o fazia apreciar a sua companhia.

Ezequiel não é homem de reprimir afetos. Foi criado num lar amoroso e retribuía ao mundo o amor que recebera da família.

Em meio as risadas e conversar agradáveis, ele abraçava e beijava os rostos dos colegas.

Vanessa não gostou nada do amigo do pai. Não era ingênua, sabia que Ezequiel tinha interesses em Leandro, aos quais ele julgavam indevidos.

Passou a tarde com a cara amarrada, estava sempre ao lado do pai impedindo qualquer aproximação de Ezequiel ou de qualquer outro homem ali presente. Marcava o território como um cão competente.

Aquela reunião com os amigos foi um oasis no meio do deserto para Leandro. Por aquelas horas esqueceu de tudo o que perturbava. Gargalhava, falava alto, saboreava com gosto a feijoada de Patrícia, abraçava a filha com ternura, Sentia-se digno de um pouco de felicidade.

A noite se aproximava e todos se preparavam para partir. Patrícia ofereceu ajuda para lavar a louça, mas ele recusou com gentileza o favor da amiga, a agradeceu por tudo que fizera por ele naquela tarde inesquecível de domingo.

Pediu para que Valéria dormisse com ele naquela noite. Não queria que a sua felicidade tivesse fim e a presença da amiga era aconchegante.

Acompanhou a todos até a portaria do prédio. Despediu-se distribuindo beijos e abraços nos amigos, prometendo oferecer, futuramente, mais almoços como aquele.

A visão do carro preto estacionado em frente ao seu prédio o feriu como uma adaga penetrando no peito. O sorriso se desfez no mesmo instante.

_ É o carro, Val! Olhe!

_ Eu não acredito que Júlio colocou cão de guarda na portaria do seu prédio! Gente, esse demônio é doente!

_ Vamos subir, amiga. Vou ignorar esse cara. Hoje nem Júlio estraga a minha felicidade.

Vanessa vibrava com a vitória na rodada do jogo de tabuleiro. Valéria protestava alegando que a menina havia roubado e Leandro sorria com as duas.

Por mais que estivesse tenso por ser vigiado, ele procurava espairecer a cabeça, não alterando o seu humor para não provocar desconfianças em Vanessa. Leandro é um pai zeloso. Vanessa precisava ser protegida.

Sentiu-se aliviado quando espiou pela janela da sala e percebeu que o carro não estava mais lá.

Após o banho, pôs o pijama e deitou ao lado da amiga em sua cama, onde conversavam muito, enquanto Vanessa adormecia em seu quarto.

A vibração do celular interrompeu a conversa do casal de amigos. Leandro gelou ao ver que tratava de uma mensagem no WhatsApp de um número desconhecido e sem foto no perfil.

_ Quem é?_ perguntou Valéria preocupada, percebendo a palidez apavorante do amigo.

_ Eu não sei.

_ Deixe eu ver.

Valéria tomou o smartphone da mão trêmula de Leandro, abrindo a mensagem.

_ Se for Júlio, eu vou arrasar com a vida de..._ ela interrompeu a palavra, olhando para a tela de um jeito interrogativo._ E a foto do Ezequiel num bar.

Leandro pegou o celular de volta, olhou a foto sem entender o que estava acontecendo.

Mais umas fotos foram enviadas. Ezequiel estava sentado num balcão de um bar LGBT, conversando com algumas pessoas.

"Eu não vou errar o alvo dessa vez". Foi a mensagem de texto recebida, que deixou Leandro em pânico.

_ Que merda, Valéria! O Júlio tá com o Ezequiel! Olha isso!

Valéria leu a mensagem quieta e pegou o próprio celular. Entrou no perfil do Instagram de Ezequiel, clicando nos stories. Ezequiel postou um vídeo bumerangue e algumas fotos no bar, marcando o local.

_ Caralho são fotos ao vivo, Bijuzinho! Que merda!

Imediatamente, Leandro ligou para Ezequiel. A cada toque não atendido o seu coração acelerava amedrontado.

Mais fotos eram enviadas, o som das notificações deixaram Leandro desesperado.

Por fim Ezequiel atendeu! Ufa!

_ Fala, meu querido._ A voz de Ezequiel era mais doce que de costume. O álcool já começava a fazer efeito e quando isso acontecia, Ezequiel ficava mais dócil que de costume.

_ Ezequiel, saia já desse bar. Pegue um táxi! Saia já daí.

_ Uh, é! Por quê?

_ O Júlio, o meu ex, está me perseguindo desde o dia que nos beijamos no condomínio. Ele pensa que temos um caso. Ele está furioso e está me enviando fotos suas daí do bar.

Ezequiel olhava em volta procurando entre muitos rostos a desagradável face de Júlio. Tinha a intenção de partir para cima, mostrando que não sentia medo.

Mas não o encontrava. O bar não estava tão cheio assim. Não era possível que não podia vê-lo.

_ Eu não estou vendo ele por aqui.

_ Porque não está aí. Deve ter enviado alguém. Só saia daí, por favor._ a voz de Leandro era trêmula, desesperada.

Ezequiel recebeu uma notificação do Instagram. Um perfil fake o chamava vía direct, enviando fotos suas no bar.

Naquele momento, sentiu o medo o golpear. Pagou a conta às pressas e correu em direção a um táxi. Manteve-se com Leandro e Valéria na linha, avisando a eles que também estava recebendo as fotos.

_ Vá para a delegacia. Nós estaremos lá em alguns minutos._ sugeriu Valéria, irritada.

Ezequiel se apavorou ainda mais quando recebeu novas fotos suas entrando no táxi.

Leandro estava farto de todo aquele terror psicológico que estava sendo submetido. Júlio precisava ser parado. Não era justo que o infernizasse sempre. Basta!

Pediu ajuda a uma vizinha idosa, que ele havia feito amizade logo assim que se mudou para o prédio. Deixou Vanessa aos cuidados da boa mulher, enquanto ele e Valéria iam a delegacia.

Vanessa estava sonolenta. Não se deu conta que fora conduzida no colo do pai até o apartamento em frente. Dormiu no sofá da sala da idosa, abraçada com o seu urso, abrigada num edredom confortável.

A ocorrência foi registrada com sucesso.

Quando chegaram á delegacia o perfil fake já havia sido excluído e o número do WhatsApp bloqueado.

_ Vocês podem rastrear a porra do número! _ Valéria exigia.

_ Senhora, aqui consta que o aparelho está localizado num aterro sanitário. Na certa o stalker jogou lá e sumiu.

_ E mais uma vez, vocês não vão fazer nada? É isso mesmo? Mais uma vez o Júlio vai se sarfar?

O detetive já estava farto da presença de Valéria e decidiu tomar uma atitude.

_ Vamos enviar uma aviatura para a residência do Júlio Medeiros.

_ Ele vai ser preso?

_ Senhora, não podemos prende-lo sem provas. Vamos até lá averiguar se ele esteve no bar. É só uma investigação.

"O senhor tem certeza que não viu o Júlio no bar?"_ o detetive perguntou a Ezequiel.

_ Eu não o vi.

_ E nem mesmo alguém suspeito fotografando?

_ Havia muitas pessoas fotografando. Não tinha como eu saber quem era o stalker.

Júlio atendeu o interfone simulando uma voz sonolenta. Vestia apenas uma cueca samba canção xadrez em diferentes tons de azul.

_ Doutor Júlio, há um detetive aqui querendo conversar com o senhor.

_ Comigo? Do que se trata? Aconteceu alguma coisa com a minha filha?

_ Não, senhor. Eles disseram que só querem fazer umas perguntas.

Júlio autorizou a subida dos policiais.

Vestiu uma blusa de pijama para ficar mais apresentável. Recebeu-os com cara de espanto, perguntando pela filha ou se havia acontecido alguma tragédia.

Luciano entrou na sala vestindo um pijama de seda vermelha, composto por uma calça e casaco. Tinha os cabelos desgrenhado e bocejava. Sentou ao lado de Júlio, perguntando o que estava acontecendo.

Os detetives explicaram a situação e perguntaram onde Júlio esteve durante toda a noite.

_ Era só o que me faltava! Eu estive aqui o tempo inteiro. O Luciano está de prova.

_ Sim. Nós ficamos juntos a noite inteira.

_ Vocês podem confirmar com o porteiro...podem até verificar nas câmeras do prédio que não saí de casa esta noite.

_ Senhor, eu sinto incomodá-lo. Só vinhemos por...

_ Está tudo bem. Vocês estão fazendo os seus trabalhos. Espere um instante.

Júlio subiu as escadas, retornando alguns minutos depois com uns papéis em mãos.

_ Eu sei que tive uns probleminhas com o meu marido devido a infidelidade dele. Eu me arrependi muito do que fiz ao amante dele. Mas, o meu marido não é um homem equilibrado. Veja, aqui há receitas dele com calmantes e medicamentos para dormir. Leandro nunca foi uma pessoa equilibrada.

Júlio mostrou a receita aos detetives.

Era verdade que durante muitos anos Leandro fez uso desses medicamentos, devido ao alto nível de estresse que teve provocado por Júlio.

_ Eu sinto muito pelo incomodo, doutor Júlio. Desculpe por isso. Tenha uma boa noite.

_ Igualmente._ Júlio respondeu com um sorriso agradável.

Depois de conduzir os detetives até a porta. Júlio sorriu vitorioso. Puxou Luciano pela cintura.

_ Agora que já eles foram, podemos brincar um pouquinho._ sugeriu acariciando a bunda de Luciano, beijando o seu pescoço.

_ Júlio, você teve alguma coisa a ver com isso?

_ Bora lá pro quarto.

_ Mas...

_ Só quero essa boquinha linda chupando o meu pau e não fazendo perguntas. Você sabe muito bem por onde o peixe morre.

Júlio o beijou com vontade. Deliciando-se.

Leandro entrou no apartamento aos prantos. Estava trêmulo e a raiva o consumia por completo.

_ Eu não aguento mais! Não aguento! Eu só quero ser feliz, porra! Eu tenho esse direito, caralho! Isso não é justo!

Valéria também quis surtar de raiva, mas percebeu que seria muito mais útil se mantivesse a calma e consolasse o amigo.

Ela se encarregou de dar a Leandro um calmante para que o auxiliasse a adormecer.

Valéria também se encarregou de ir buscar Vanessa na casa da vizinha.

Despertada Vanessa perguntou como e por que foi parar lá.

_ Eu e o seu pai decidimos sair para beber. Aí você sabe como é o Bijuzinho, não quis te deixar sozinha. Ficou preocupado.

_ E precisava incomodar a dona Rebeca? Era só o meu pai me acordar e me levar com vocês.

_ Até parece que o Bijuzinho iria te levar a um bar de strip-tease, chatinha.

Vanessa corou de vergonha ao ouvir isso.

_ Pra mim não foi incomodo algum. Foi um prazer te receber aqui._ disse dona Rebeca, segurando no queixo de Vanessa.

...

Os primeiros raios de sol invadem o quarto pelas frechas das persianas. Leandro abre os olhos pela milésima vez, percebendo que o dia já amanheceu e ele ainda não conseguiu dormir.

Rolou pela cama, aflito. Sentia a própria carne tensa por causa do pavor.

Júlio não saia da sua mente. Aqueles olhos malignos desejando acabar com a sua vida, a boca retorcida severa era a imagem que o perturbava.

Sentou na cama, apoiando os cotovelos nos joelhos, olhando para o chão. Dentro dele, os gritos eram altos, mas não conseguia liberta-los.

Leandro não queria apenas a separação, queria embora não admitisse, devolver a Júlio cada dia do seu sofrimento.

As obrigações eram maiores que a vontade de permanecer deitado. Levantou-se para cumprir os rituais matinais de higiene e tentou tomar o café da manhã. Mas nada descia.

Valéria chegou falante. Enquanto retirava os saltos e o sutiã, a mulher narrava mais uma das suas aventuras sexuais, e Leandro tentava ao máximo se concentrar para não desagradar a amiga.

_ Bijuzinho, você pode fazer o favor de atender os clientes da manhã para mim? Hoje eu só apareço naquela empresa depois das duas da tarde. Estou morrendo de sono._ disse Valéria bocejando.

Quase nunca Leandro era impaciente no trânsito, mas naquela manhã tudo o irritava. Era os ciclistas na contra mão, as buzinas infernais dos outros carros, a lentidão de uma idosa ao atravessar a rua.

Fez esforço para cumprimentar o porteiro. Não queria ver e falar com ninguém. Desejava sumir.

Reparou que enfrente ao prédio um homem o fitava inespressivo. Era um sujeito de pele morena, cabelos cacheados escuros, cenho franzido e feição desafiadora, como se fosse um convite a briga.

O homem era alto e corpulento. Estava de pé com os braços cruzados.

Leandro sentiu-se apavorado. Tinha certeza que era alguém mandado por Júlio, e correu ao máximo que pode para entrar no prédio.

O bom humor dos colegas o pareceu insuportável. Para não ser antipático, se trancou na sala de Valéria, com a intenção de permanecer lá até o fim do expediente.

Não queria ver ninguém, principalmente Ezequiel. Quanto mais se mantivesse afastado do rapaz melhor para a segurança de ambos.

A empresa ficava no primeiro andar do prédio. Pela janela, a visão da rua era mais nítida.

Reparou que o homem permaneceu no mesmo local e na mesma posição até a hora em que voltou para a casa.

No dia seguinte, o homem não estava mais lá. O que deveria ser um alívio para Leandro. No entanto, havia uma substituta. Uma mulher branca, de baixa estatura e meia idade. A mulher também tinha uma expressão cruel e assustadora. Estava no mesmo local e posição do homem.

A cada dia uma pessoa diferente, atuava no local, posto do mesmo modo, com as expressões carrancudas. E Leandro estava cada vez mais apavorado.

Afastou-se de Ezequiel de vez, nem mais um "bom dia" o dava.

Relatou a Valéria o que estava acontecendo.

_ Eu não aguento mais isso! Ele tá querendo me matar de aflição. Quer cometer o crime sem sujar as mãos de sangue.

Valéria ficou ainda mais revoltada diante do estado de pânico, em que o amigo se encontrava. Os seus belos olhos escuros estavam desenquietos, com uma mancha arroxeada os contornando, devido as noites mal dormidas. A falta de apetite fez com que Leandro perdesse peso.

_ Já chega! Vamos á delegacia agora!_ Valéria ordenou, socando a mesa.

_ Sinto muito, mas não há nada que possamos fazer._ respondeu o policial sentado em frente a eles, registrando a ocorrência.

_ Como assim não podem fazer nada?! Enlouqueceu?_ Valéria gritava, batendo na mesa.

_ Senhora, peço que se acalme, por favor.

_ Me acalmar! Eu me acalmar?! Ah, pelo amor da deusa! Eu digo que um sociopata está torturando o meu amigo e você diz que não pode fazer nada!

_ Os senhores não me apresentaram nada de concreto contra o Júlio. Só suposições. E não é crime as pessoas ficarem paradas no meio da rua. O senhor foi agredido ou ameaçado por essas pessoas ou o seu ex companheiro?

_ Eu tenho que esperar que eles me façam mal para poder pedir ajuda?

_ Mas senhor, se não há crime, não há o que fazer.

_ Isso é um absurdo!_ Valéria quis gritar mais algumas palavras de derrota, mas Leandro a conteve.

_ O senhor mesmo me disse que tem uma medida protetiva, que impede o Júlio de se aproximar do senhor. Alguma vez ele descumpriu?

_ É lógico que ele se aproxima de mim! Temos uma filha juntos! Essa medida protetiva é uma piada. Você acha que se Júlio tiver de me matar vai deixar de fazer isso por causa de um papelzinho? Quer saber, eu sabia que seria perda de tempo vir até aqui. Vamos, Val. Pra mim já deu.

Decidiu tentar ignorar os perseguidores que se alternavam entre homens e mulheres de diferentes cores, altura, idade e vestimentas.

Irritada, Valéria saiu do seu escritório, partindo para cima de uma das mulheres dando bolsadas.

_ Vá procurar o que fazer, desocupada!

A mulher não devolveu a agressão, apenas se defendeu, encolhendo as mãos sobre o rosto.

O porteiro a segurou pela cintura,a afastando da mulher misteriosa, a levando de volta para o hall do prédio. Todos os funcionários tentaram alcama-la.

Todavia a mulher permaneceu no local até o fim do expediente dos funcionários da empresa.

Leandro já não aguentava mais. Sentiu que chegou a hora de encarar Júlio.

....

Júlio recebeu com espanto o anúncio que Leandro solicitava autorização para entrar em sua sala. O espanto não era negativo. E sim de alegria. O que mais desejava era vê-lo em sua frente.

No entanto, Leandro entrou como um furacão, abrindo a porta com brutalidade e caminhando em direção a Júlio bufando de raiva. Tinha a expressão colérica, como Júlio nunca o vira antes, a ira endurecia a sua feição e retorcia os seus lábios, não deixando no seu belo rosto nenhum vestígio de amabilidade de sempre.

Sem pensar, Leandro fechou o punho disparando um soco no centro do rosto do ex marido, fazendo com que Júlio virasse o rosto com o impacto.

_ Que porra é essa?_ Júlio perguntou espantado, pondo a mão no nariz sangrando e dolorido.

Leandro jogou sobre ele uma carta.

_ Tá satisfeito, seu merda?! Espero que agora me deixe em paz!_ Gritou Leandro, irado, em seguida cuspiu no rosto de Júlio._ Por que você me odeia tanto, Júlio? O que foi que eu te fiz?

_ Do que você está falando?

_ Não se faça de louco, Júlio. Basta do seu cinismo. Espero que esteja satisfeito. Eu pedi demissão. Agora já pode parar de mandar aqueles lixos pararem de acampar da empresa da Valéria! Já pode parar de colocar cão de guarda atrás do Ezequiel! Acabou! Você venceu!

_ Eu não faço ideia do que você está falando, meu amor.

O ódio gritava dentro de Leandro e o cinismo de Júlio o alimentava ainda mais. Foi crescendo com uma força descomunal. Como luz matando as trevas, o ódio matava o estado racional de Leandro, fazendo com que fosse com tudo para cima de Júlio.

Os braços fortes de Luciano o impediram de chegar perto de Júlio. Mas não foram o suficiente para conte-lo por muito tempo. O jovem teve que contar com o auxílio de outros funcionários do escritório.

Genaro ouviu os gritos do filho na sala. No mesmo instante, foi até onde vinha o som. Confuso, perguntou o que estava acontecendo.

Não obteve respostas. A sua presença foi ignorada. Todos estavam concentrados nas discussões acaloradas.

Júlio negava com veemência que teria algo a ver com as perseguições que Leandro sofrera e o acusava de ser o responsável.

_ Eu não sou louco! Você quer me enlouquecer, mas ainda não conseguiu!_ Leandro gritava, com a face vermelha e os olhos lacrimejando. Já não tinha mais forças para conter as lágrimas._ Você só me faz mal! É como um câncer maligno! Eu não mereço isso, porra! Nunca te fiz nada de errado! O meu único erro foi te amar! Eu te amei mais que a mim, te coloquei em primeiro lugar, passei por cima de tanta coisa por você... Me soltaaaaa!

Júlio fez sinal para Luciano e o outro funcionário obedecessem a Leandro.

Sem forças emocionais para se manter de pé, Leandro sentou em prantos na cadeira de couro preta, que ficava em frente a mesa de Júlio.

Apoiou os cotovelos nos joelhos e penetrou os dedos entre os fios lisos de negros dos seus cabelos. Soluçava desesperado. Sentia o peito arder de angústia. Estava triste, sentia vergonha por estar descontrolado diante daqueles olhos inquisidores ao seu redor.

Não tinha forças para reagir.

Genaro foi tomado por uma empatia paternal. O sofrimento do filho, pela primeira vez, penetrou o seu coração interesseiro.

Quis protegê-lo, retirá-lo dali e abriga-lo em seus braços.

No entanto, Leandro recusou o seu abraço.

_ Não toque em mim! Você é cúmplice desse demônio. Vendeu a sua para ele!

Genaro se afastou por respeito ao filho. Por Júlio sentiu um ódio além do normal. A frieza no semblante do genro o enfureceu. Olhou em volta e se perguntou, em silêncio, o que fez da vida ao sem render a Júlio.

_ Esse foi o meu erro, amar o outro além de mim...a não me auto respeitar. Olha pra você, Júlio, é só um homem como qualquer outro. Eu posso ter quantos eu quiser, há um mundo lá fora, inúmeras oportunidades tanto pra mim, quanto pra você...viva a porra da sua vida e me deixe em paz. Aceite que o nosso casamento acabou.

Desesperado, Júlio não pensou duas vezes e se atirou aos pés de Leandro. Desarmou a armadura de superioridade pelo medo.

_ Não acabou não! Eu errei com você, mas posso melhorar! Eu faço terapia, eu te dou o que quiser, boto o mundo nos seus pés, mas eu não posso te perder, meu amor...eu te amo, porra!

Júlio deixou que as lágrimas caíssem. Eram sinceras.

_ Você não me ama, Júlio._ Leandro respondeu com a voz cansada._ Você está doente! Olha a que ponto você chegou, olha as coisas pavorosas que está cometendo... você quase matou o Abner!

_ E me arrependo muito de não ter conseguido matar! Aquele desgraçado te roubou de mim! Maldita hora que fui me envolver com ele! Eu tenho tanto ódio de mim por isso! Tenho vontade de pôr uma bala na minha cabeça por tamanho é o meu arrependimento. Mas eu te levaria comigo. Você é meu! Nunca vou permitir que seja de outro.

_ Mas que absurdo você está dizendo, Júlio!_ exclamou Genaro, contendo a vontade de partir para cima do chefe._ Basta de espetáculos! Vocês voltem ao trabalho! Andem, chispam!_ ninguém o obedeceu.

Genaro pegou Leandro pelo braço, o convidando para ir a sua sala. Ele estava tão exausto, que deixou ser guiado pelo pai sem oferecer nenhuma resistência.

Júlio permaneceu de joelhos em prantos.

_ Fora daquiiiii! Fora, imbecis!

Ninguém ousou a desobedecer o patrão, saíram no mesmo instante.

Júlio levantou e fechou a porta com brutalidade. Amaldiçoando a Abner e a todos que julgava responsáveis pelo fim do seu casamento, Júlio descontava a sua fúria na destruição dos objetos do seu escritório.

Todos ouviam a quebradeira assustados, mas ninguém teve coragem de entrar no escritório.

...

Leandro não conseguia manter o copo com água com firmeza nas mãos trêmulas.

Foi levado para o escritório do pai, onde Genaro fez de tudo para acalma-lo.

_ Eu preciso saber o que está acontecendo. Eu te conheço, Leandro. Sei que não é de perder a cabeça, ainda mais em público. O houve?!

_ Quer saber mesmo o que houve, pai? Pra quê? Pra defender o Júlio? Nem perca o seu tempo.

_Leandro, eu não tenho a menor vontade de defender o Júlio. O casamento de vocês é causa perdida e já estou conformado com isso. Não estou aqui como advogado dele e sim como o seu pai.

Leandro poderia sair da sala sem dizer uma palavra. Não confiava no pai. No entanto, estava tão transtornado que não conseguiu engolir as palavras, elas estavam indigestas.

Narrou tudo com fúria e tristeza. As lágrimas não conseguiu conter e teve raiva por isso.

_ Meu Deus! Júlio está completamente louco!

Você também, heim! Que mole foi dar de se envolver com esse tal de Abner.

_ Agora o erro foi meu? Eu lá sabia que ele era amante do Júlio? Mas eu tenho certeza que você sabia. Sempre ocultou as safadezas dele.

_ Eu juro que não sabia, meu filho._ Genaro mentiu com uma atuação tão perfeita, que se Leandro não o conhecesse bem, teria acreditado.

_ Eu estou tão exausto que não quero perder o meu tempo discutindo com você.

_ O jeito agora é acabar com esse casamento de uma vez. Dar logo entrada no divórcio e acabar com esse inferno. Júlio está passando dos limites.

Genaro gostava muito das mordomias que recebia de Júlio, isso não é segredo para ninguém. Mas, recordou da história dos pais do genro e teve medo de que, futuramente, Leandro fosse vítima de um crime passional.

Além disso, estava de saco cheio de Júlio. Nunca o estimou. As bajulações só mascaravam a raiva que tinha pelo genro.

Depois da demissão de Lorena, não via mais sentido permanecer naquela empresa e ter que conviver com uma das criaturas que mais tinha repugnância.

Ofereceu carona para levar o filho de volta para a casa, mas Leandro recusou, alegando que precisava ficar sozinho.

...

Ao contrário do que disse ao pai, Leandro não foi para casa naquela tarde. Desviou o caminho, optando por caminhar sem rumo pela praia.

Deitou na beira do mar com os braços abertos e os olhos fechados. Ouvia as ondas se quebrarem, na esperança de que o mar tivesse piedade dele e o arrastasse para a suas profundezas.

O véu da tristeza envolveu por completo o seu coração, sentia uma angústia volumosa no peito.

O vento brincava com os seus lindos cabelos cor de ébano. Sentou abraçando as pernas, com o olhar perdido em meio a imensidão do mar.

Lembrou-se que um dia amara Júlio, que fez de tudo para alcançar o seu coração de pedra. Socava a pedra, acreditando que no miolo havia sentimentos. Mas a única coisa que obteve fora as mãos feridas.

No seu coração não havia mais nenhum vestígio daquele amor incondicional que sentiu por Júlio. Só sentia raiva...muita raiva! Uma raiva tão cruel, que triturava o seu coração.

Era injusto sofrer daquele jeito! O seu único erro foi amar. Perdoar era algo que não estava disposto a fazer. Tomou horror da palavra perdão, por gastar demais com Júlio, que sempre que a obtinha, o magoava ainda mais, deixando para Leandro as migalhas de inúmeras frustrações.

Depois de algumas horas, se dirigiu ao metrô. Rejeitava todas as ligações recebidas. Angela, Genaro, Valéria e até Vanessa foram ignorados.

Não queria ver e nem ouvir ninguém.

Sentou próximo a um violista, que tocava uma triste melodia, alimentando ainda mais a sua tristeza.

O desespero bateu como um soco na cara quando pensou que estava desempregado. Como faria para sobreviver? Como se sustentaria? Será que perderia Vanessa de vez?

Temeu ter que pedir ajuda aos pais. Também tinha raiva deles por serem uma força maligna, sempre o arrastando para o inferno Júlio.

Apesar de não ter uma crença definida, pedia a força uma superior do universo que o ajudasse. Chorou tanto, clamando em pensamento por ajuda.

Avistou uma mão negra e enrugada tocar no seu ombro. Era a mesma mão generosa que produziu, há alguns minutos atrás, a bela melodia do violino.

O violinista sorriu, revelando os dentes tortos e amarelados. Era um sorriso tão gentil, que Leandro se sentiu abraçado.

_ Eu não sei o que está magoando o teu coração, mas quero dizer que tudo na vida tem um fim, inclusive os motivos das suas lágrimas.

Entregou a Leandro um bilhete que fora escrito naquele instante, contendo uma bala de morango grudada com uma fita durex.

O metrô chegou ao seu destino, o homem se afastou tranquilo.

Caminhando, Leandro abriu o papelzinho.

"O teu passado não precisa mais de ti. Deixo-o onde deve ficar. Mas o teu futuro sim...ah! Esse precisa muito de ti, pois, esse terá o rumo que tu quiseres."

Leandro respirou fundo lendo a frase. Entendeu como um sinal que tanto pedira.

Mais uma vez, caiu em prantos. Mas ao final desse choro, se sentiu leve, como se a alma tivesse sido lavada.

Sentou num banco da praça, chupando a bala com o papelzinho em mãos. O observava as pessoas em volta, esvaziando a mente. Já não pensava mais em Júlio e em nenhum dos horrores que viveu. Decidiu que iria focar em si. Júlio já o destruiu demais e não estava disposto a facilitar mais uma vez.

A biblioteca pública ficava em frente á praça. Era um prédio antigo, pintado de salmão, com janelas enormes de vidros fumês.

Assim que entrou foi cumprimentado pelo jovem bibliotecário, um homem de uns trinta e poucos anos, cabelos pretos, pele morena, olhos caridosos e sorriso faceiro.

O olhar que recebera era de cobiça, como sempre recebia. Desta vez, Lembro não quis fugir, os encarou com reciprocidade, fazendo homem sorrir pelo canto da boca.

Leandro caminhava pelos corredores, a procura de algo que o interessasse para ler naquela noite. Tinha planos de ir ao supermercado comprar um vinho para o acompanhar na leitura noturna.

Ouviu os passos do homem o seguindo do outro lado do corredor.

A biblioteca estava quase vazia e o silêncio dominava o ambiente.

Prosseguiu caminhando sem eleger nada. Nenhum dos livros despertou o seu interesse.

Ao fim do corredor, seu olhar cruzou com o do bibliotecário.

_ Posso ajudar? Vejo que ainda não escolheu nada, o que não é muito do seu feitio. Você sempre sai daqui com muitos livros.

_ O que me sugere?_ Leandro perguntou com um sorriso cansado.

_ Você não me parece muito feliz. Não vou recomendar nada de terror ou sofrência...hum! Deixe-me ver! Você gosta de clássicos... Que tal variar um pouco e ler estes?

O bibliotecário foi até uma das estantes e voltou com dois exemplares em mãos, entregando a Leandro.

_ O frango ensopado da minha mãe, da Nina Horta. Ela foi uma ótima colunista da Folha de São Paulo. Ela tem uma escrita muito linda. O jeito que ela fala sobre comida nessas crônicas é muito afetivo. O outro é A pequena livraria dos sonhos, de Jenny Colgan. Conta a história de uma moça que ama ler e transforma uma van numa livraria móvel. É bom ler algo fluído e leve às vezes._ o homem recomendava sorrindo.

Leandro decidiu não levar o livro da Nina Horta. Culinária afetiva o remetia a Abner e estava irritado demais com o cozinheiro.

_ Vou levar A pequena livraria dos sonhos. Você tem toda razão. Eu preciso relaxar um pouco. E também, pela estética da capa e a sinopse, creio que a minha filha também gostará.

_ Você tem uma filha?_ o homem perguntou espantado.

_ Sim. Uma linda menina com quinze primaveras._ Leandro respondeu orgulhoso.

_ Jura?! Mas você é tão jovem!

_ Comecei cedo._ respondeu Leandro, encolhendo os ombros.

Enquanto o homem falava algo, que Leandro não prestava atenção, ele observava os lábios carnudos do jovem se moverem úmidos.

Perguntou-se como seria o gosto do seu beijo. Ao mesmo tempo se reprimiu por isso. Em seguida se perguntou o porquê da repressão. Era um homem solteiro. Solteiro! Essa palavra teve o mesmo efeito de um Eureca.

Sim. Estava solteiro! Não devia nada a ninguém! Júlio gostando ou não ele era um homem livre sim! Podia dormir com quem quisesse.

Sentiu as correntes serem quebradas. Júlio era o seu passado e deveria ficar no passado. Decidiu que chegaria ao fim o poder que o seu agressor teria sobre ele.

Sem pensar, se atirou nos lábios do homem, beijando enquanto segurava a sua face.

A princípio, o homem se assustou, mas logo em seguida, se entregou a aquele beijo como um sedento a um copo d'água.

Arrastou-o para uma das salas dos fundos.

Devoravam-se em amassos e beijos, sem dizer uma palavra. Leandro se viu nu, tendo o seu corpo explorado pelos beijos e língua daquele homem que não conhecia direito. Nome? Leandro não sabia e nem fazia questão nenhuma de saber, ser o bibliotecário gostoso (como Valéria o apelidou) já bastava.

Encostou as costas na parede, erguendo a cabeça com a boca aberta. Gemia como um louco tendo o membro engolido pelo bibliotecário gostoso.

A mamada era boa? Sim... até era, mas julgou a de Abner melhor. Merda! Toma vergonha na cara, Leandro! Não devo e não quero pensar nele agora!"

Concentrou a mente no presente, ignorando não só a Abner, mas todo o seu passado.

Ouviu passos vindo da área externa e o medo da possibilidade de ser flagrado o deixou ainda mais excitado.

O corpo inteiro se arrepiou, o prazer era imensurável quando gozou na boca do semi desconhecido.

Foi virado de costas pelo homem, que deitou o seu peito sobre a mesa fria de ferro, empinando a sua bunda. Ajoelhou ficando em direção dela, beijando e lambendo sentindo a maciez daquela pele lisa.

Sentiu um tapa estalar nas suas nádegas. "Ele me bateu! Que ousadia!" Leandro adorou, rebolando para provocar ainda mais o parceiro.

Foi penetrado por completo, a mesa rangia e ele teve a boca tampada para abafar os gemidos.

Os corpos estavam quentes e suados, embalados na mesma sintonia do movimento dos seus quadris.

Leandro sentia a respiração quente em seu rosto e a barba do homem roçar em sua nuca, o tesão ia a mil. Aaaah como precisava daquilo!

_ Puta que pariu! Que rabo gostoso você tem!

_ Tá gostando, safado? Mete tudo no meu cuzinho, vai! Mete tudo!

O homem sentia as pernas bambas, devorando aquele rabo delicioso. Quanto mais metia, mais queria.

Ao sentir o líquido quente dentro dele, escorrendo pelas suas pernas, Leandro também gozou pela segunda vez.

O homem o virou para si e o beijou.

O som da chuva e do vento o acalmava naquela noite de inverno. Enquanto lia o livro sentado numa poltrona macia, enquanto saboreava uma taça de vinho suave, comendo cubinhos de queijo, salames fatiados e azeitonas pretas.

A paz reinava no apartamento e também no coração de Leandro. Estava leve. O sexo o fizera muito bem.

Interrompeu a leitura, pondo o livro nas pernas. Estava enrolado numa manta xadrez para se aquecer daquele friozinho gostoso.

Para relaxar ainda mais, pôs Chopin como trilha sonora.

Mordeu os lábios ao pensar no que fizera aquela tarde. Imaginou Valéria pulando de alegria ao tomar conhecimento.

Era a primeira vez que transou. Das outras vezes fizera amor, sentia algo pelos parceiros, se entregava e só se preocupava com o prazer deles. Agora era consigo que se importava. Amou proporcionar prazer ao próprio corpo, foi gentil consigo.

Quis repetir a dose mais vezes, mas não com o mesmo homem. Ansiava por corpos distintos, momentos inusitados e deliciosos.

Deslizou a mão sobre o seu corpo, descendo até o membro rígido, fechou os olhos, se deixando guiar pelos desejos libidinosos.

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Comentários

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Fiquei indignada com essas perseguições que o Leandro sofreu e com medo dele ter uma crise nervosa, faltou bem pouco. Ele perdeu mesmo o emprego? Fiquei triste com isso...

Apesar desses momentos de tensão, o capítulo foi muito bom 😉

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Deu pena de Júlio nesse capitulo n acho q seja ele perseguindo o marido. Julio poderia se arrepender e mudar e Leandro perdoar ele. Eles são casados, tem filha, podem ficar juntos e começar uma nova história, e agora Leandro poderia ser o traidor e dominador e Júlio o corno, seria um bom desfecho

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