[...]
Passamos praticamente por cima do Marcos a caminho do banheiro. Ele apenas nos olhou pelo canto do olho, sorrindo feito um bobo, certamente satisfeito com as emoções inesperadas de uma manhã de segunda.
Fechei a porta do banheiro atrás da gente porque aquele momento era nosso. Nanda juntou os dois seios com as mãos, ainda cobertos com a porra do Marcos, e me encarou:
- Quer dar uma mamadinha na mamãe, papai? - Falou, me piscando um olho.
- Sabe que eu não curto isso, Nanda. - Falei, me esquivando.
- Poxa. Pra um cara liberal, você é bastante travado às vezes… - Resmungou, mas rindo, porque sabia que eu não curtia mesmo: - Mas eu posso cair de boca na xerecona da Laura, não é!?
- Eu não me lembro disso, não. Lembro dela te pegando, não o contrário. - Retruquei.
- É… - Disse, olhando para cima e colocando um dedo na boca: - Mas quem sabe um dia, né?
A peguei pela cintura e a abracei forte, lhe dando um beijo cheio de tesão e amor, e logo meu pau começou a dar sinais de vida outra vez. Só aí me toquei da besteira que tinha feito: ela ainda estava coberta da porra do Marcos e quando a abracei aquilo tudo grudou forte nos pelos do meu peito. Olhei para ela que caiu na gargalhada na hora:
- Vai, espertão! Você é todo autocontrole isso, autocontrole aquilo, mas na hora “h” não sabe se controlar e dá nisso. - Falou e gargalhou da minha cara, e eu acabei rindo junto.
Fui para o chuveiro e comecei a me ensaboar e ela logo me acompanhou, também se lavando. Ela me olhava e eu a ela. Sorríamos iguais dois bobos um para o outro. Depois de retirarmos aquele “grude” de nosso anfitrião, voltamos a nos abraçar embaixo da ducha, agora sim para aproveitar nosso contato. Ainda assim ela me interrompeu:
- “Mor”, espera um pouquinho. Deixa eu falar. Ai. Para.
- O que foi?
- Você não ficou brava de eu ter masturbado o Marcos, não, né? - Perguntou agora séria, me olhando nos olhos: - É que eu falei para você confiar, mas vi que você duvidou…
- Nanda é difícil saber o que se passa na sua cabeça quando você está no pico da excitação…
- “Pica”, você quer dizer. - Ela me interrompeu, brincando.
- Também: pica e pico. Quando você falou aquilo, eu não sabia o que esperar. Sei lá, me deu um certo medo, sim. - Fui sincero e continuei: - E ainda piorou quando você pediu para ele passar lubrificante. Aí pensei que você fosse querer transar com ele, quebrando a PRIMEIRA REGRA novamente.
- Mas eu disse que ele ia ser só um “voyeur”. - Insistiu.
- Quando você o tocou, ele deixou de ser um “voyeur” e já passou a ser um parceiro. Daí para ele encaçapar o buraco, estava a menos de meio metro.
- Desculpa. Acho que vou ter que melhorar nossa comunicação, ser mais direta com você. - Falou, resignada.
- Talvez. - Concordei, mas também me resignei: - Ou talvez eu precise confiar mais em você. Afinal só nós sabemos o que já passamos e eu acredito que, como eu, você tenha aprendido a se controlar melhor.
Ela me olhava, mas ainda parecia ter dúvida se eu não havia me incomodado com o que ela acabara de fazer:
- Fica tranquila, coração. Curti bastante, tudo mesmo, inclusive o trabalho manual que você fez nele. - Falei e lhe beijei novamente, fazendo com que entendesse estar tudo bem entre a gente.
Nos enxugamos e saímos enrolados nas toalhas e o Marcos já não estava mais no quarto. Vestimos nossas roupas e arrumamos, da melhor maneira possível, a bagunça feita no quarto há pouco. Então, saímos para a sala e o Marcos estava lavando algumas louças e talheres na pia. Nanda me olhou, quase suplicando para falar alguma coisa e eu cochichei no ouvido dela para ir ajudá-lo a lavar a louça e sondar o terreno. Enquanto isso fui para a sala, me sentando no sofá de uma posição em que pudesse vê-los.
Nanda se aproximou dele e colocou sua mão em seu ombro. Ele a olhou e lhe deu um sorriso estranho, não parecia de felicidade. Depois ela me contou que ele ainda estava constrangido com todo o acontecido, não sabia como se portar. Ela se pôs do lado dele e o ajudou com o resto da louça, sem trocarem uma única palavra. Quando terminaram, ele enxugou sua mão e lhe passou o pano para que ela fizesse o mesmo:
- Viu? Ser meu amigo tem suas vantagens: eu te ajudo na cozinha. Ser amigo do meu marido tem outras vantagens, ele me deixa te ajudar no quarto. - Falou e lhe deu dois tapinhas no peito: - Aprende e quem sabe, um dia, a gente não brinca pra valer.
Ele sorriu para ela e a agradeceu pela ajuda. Pediu licença para tomar um banho, dizendo que voltaria logo para nos levar de volta para cidade da Bia. Nanda voltou e se sentou do meu lado:
- Que carinho mais fajuto esse, Nanda! Pensei que você fosse, pelo menos, fazer uma chupeta, dar uma carga na bateria dele. - Falei, rindo, sem olhar para ela.
- Tá. Sei. Eu te conheço, doutor Mark. Se eu fizesse isso, você não iria olhar na minha cara por um bom tempo. - Falou enquanto cruzava os braços, simulando “raivinha”.
- Claro que estou brincando. - Disse e a abracei: - Você foi perfeita! Equilibrada, justa… Perfeita! Essa é a palavra mesmo, nem adianta buscar outra.
Ela me sorriu e ficamos ali abraçados aguardando o retorno do Marcos, que retornou em cerca de trinta minutos, perguntando:
- Vamos então, casal?
- Ele não gostou, Nanda. Já tá pondo a gente pra fora… - Falei, brincando.
- Não, gente. Não é isso, não. Por mim vocês podem passar a semana. Eu ia adorar. - Respondeu, sorrindo agora.
- Ia, né? Aposto que ia… - Respondeu Nanda às risadas: - Vamos mesmo, “Mor”. A gente ainda tem que voltar pra casa, buscar as meninas: a vida não para!
- Vamos, sim. - Falei e me voltei para o Marcos: - Marcos você não precisa nos levar. Se não for pedir muito, é só deixar a gente na rodoviária que nós pegamos um ônibus. Sem nenhum problema.
- Mas porque vocês fariam isso? - Perguntou e já se justificou: - Eu vou voltar pra lá mesmo. Ainda tenho uns quinze dias de férias. Só depois retorno ao trabalho.
- Bem, se você vai mesmo voltar para lá, a gente aceita a carona, então. - Falei e me levantei, trazendo Nanda comigo.
Saímos então e pegamos o elevador. Ele ficou à nossa esquerda, Nanda no meio e eu à direita. Ela estava de braços dados comigo. Havia um silêncio incômodo no ambiente. Então, ela pegou no braço dele também, fazendo com que ele a olhasse:
- Fica assim, não. A primeira vez é sempre estranha. A gente acaba não sabendo como agir, mas se tem algo que aprendi nesse “meio” é que todos são gente como a gente. Então, o melhor que se pode fazer é agir naturalmente, entendeu? Como agora: somos bons amigos que aproveitaram um momento legal juntos.
Ele sorriu para ela e depois me encarando, disse:
- Que mulher você arrumou, Mark. Que mulher!
- É sim, sem igual! - Falei olhando para ela e ganhei um sorriso sincero: - Mas é minha! Entenda bem isso.
- Ai, gente. Que delícia ser adorada assim! - Nanda brincou espontaneamente, mas quis remendar na sequência me encarando com cara de pidona: - Adorada por vários sim; mas amor só pro meu carequinha.
Chegamos à garagem do prédio, entramos em seu carro e, em poucos minutos, já pegamos a rodovia sentido Minas Gerais. Marcos começou a se soltar e já papeávamos assuntos diversos, com Nanda tentando nos divertir com brincadeiras sutis, outras mais apimentadas, mas a viagem seguia tranquila. À certa altura ela se calou, sem que percebêssemos, mas depois o silêncio vindo de trás começou a incomodar. Marcos a encarou pelo retrovisor e perguntou se estava tudo bem, me fazendo virar para trás. Ela estava quieta e aparentemente tensa:
- Marcos, tem algum posto de gasolina por perto? - Ela perguntou.
- Posto? - Ele quis entender.
- É! Posto, lanchonete, restaurante, qualquer coisa. - Falou e mordeu os lábios: - Preciso usar um banheiro.
Eu comecei a rir, a gargalhar na verdade. Ela viu que eu tinha entendido, mas o Marcos aparentemente ainda não, pois nos olhava curioso:
- Tem um posto com tudo que você pediu a uns cinco quilômetros. Dá para esperar até lá? - Perguntou, com um sorriso cínico no rosto.
- Dá sim. Mas pisa no acelerador, por favor. - Ela pediu.
Chegamos no posto, ele estacionou e nem havia desligado o motor, ela desceu e foi caminhando rápido para dentro do restaurante. O convidei para tomarmos um café enquanto a esperávamos e ele aceitou. Pedi três expressos e nos sentamos numa mesa para esperá-la:
- Eu não tô entendendo nada. - Ele falou.
- Quando eu gozo dentro da Nanda durante o sexo anal… - Falei e comecei a rir: - Ela diz que depois de um tempo dá uma dor de barriga tremenda. Só que eu nem me toquei que a gente ia viajar, senão nem teria feito isso com ela. Foi na inocência mesmo.
- Sério isso!? - Perguntou, mas ao mesmo tempo começou a rir também.
Logo depois a Nanda chegava na mesa com uma cara emburrada e, pela forma como a olhávamos, já tinha sacado que eu havia contado o porquê de sua indisposição:
- Ha-ha-ha pra vocês, seus tontos! - Disse, mas também não aguentou e sorriu na sequência.
Ficamos ali mais um pouco papeando enquanto tomávamos nosso café e logo já pegamos a rodovia novamente. A viagem foi tranquila e pouco antes de chegarmos na cidade dos pais da Bia, paramos no shopping para almoçar:
- Tenho boas lembranças desse lugar. - Disse o Marcos enquanto comíamos: - Conheci uma pessoa incrível aqui.
Nanda o olhou com um torresmo na boca, depois para mim e, por fim, tocou seu rosto com as costas da mão num carinho simples, de amigo mesmo. Depois de engolir a iguaria, disse:
- Espero que esteja falando de mim, senão pego meu carinho de volta.
- É claro que é de você, Fernanda! E quanto mais os conheço, mais entendo o porquê do Mark ser tão cuidadoso com você. Ele está certo: eu faria o mesmo, talvez até mais.
- Não preciso de mais, só preciso do que o Mark me dá. - Falou e encostou sua cabeça em meu ombro: - Por favor, Marcos, não confunda nada comigo: só sua amizade me interessa. Sou casada, muito bem casada e quero continuar casada com este homem aqui.
- Já entendi, Fernanda. Já entendi. - Disse, aparentemente resignado, porque já brincou na sequência: - Você não teria uma irmã solteira, divorciada ou não tão fiel como você, não, né?
Caí na risada ao ouvir a pergunta e Nanda me acompanhou. Assim que se controlou, respondeu:
- Não tenho, Marcos. Minha mãe caprichou tanto em mim que não sobrou material para uma irmã ou irmão. - Brincou, fazendo-nos rir novamente.
- Filha única, ainda? - Perguntou, assombrado.
- Melhor parte, Marcos. Não tenho cunhado para me encher. - Essa eu fiz questão de responder.
Depois de almoçarmos, demos uma volta rápida pelo shopping com a Nanda grudada em mim e ele ao nosso lado. Depois voltamos ao caminho e logo ele estacionava na frente do prédio dos pais da Bia. Descemos e nos despedimos dele. Fomos até a portaria nos anunciar e o porteiro nos disse que eles haviam saído. Marcos ainda esperava no carro e nos aproximamos dele, informando-o. Nanda então buscou o telefone da mãe da Bia e não achou no celular. Ligou para a Bia e depois de longos vinte minutos de conversa variada, desligou e viu que a encarávamos:
- O quê? - Perguntou, levantando os ombrinhos.
- Nada não, Nanda! Vinte minutos para conseguir um telefone? Eficiência zero, hein, senhora administradora! - Falei.
- A gente só estava conversando sobre o Bernardo, “Mor”. - Tentou se justificar: - E acabou perdendo a noção do tempo.
- É!? Não brinca! Quase não notei. - Insisti na ironia e depois perguntei: - Pelo menos conseguiu o telefone?
- Consegui! Já vou ligar. Calma! Que estresse… - Disse, contrariada.
Olhei para o Marcos e ele sorriu da situação, balançando negativamente a cabeça. Nanda tentou uma, duas, três vezes e nada deles atenderem. Me olhou sem saber o que fazer:
- Não tem o que fazer, Nanda. Vamos achar uma padaria ou qualquer coisa do tipo e esperar. Depois você tenta novamente. Precisamos deles para pegar o carro. - Falei.
- Porque vocês não vem para o meu “apart”? - Convidou o Marcos, completando: - Depois vocês tentam ligar novamente.
- Hummm. Pro seu “apart” é? - Falou, Nanda toda insinuante: - Sabe que não é má ideia?
- Sem essa, Nanda. A gente tem que ir embora. Já estou perdendo dia de trabalho! - Falei, acho que até meio bravo e sem razão.
- Estou brincando, Mark! Ô homem estressado, viu!... - Rebateu Nanda.
- Gente, na boa: meu “apart” deve ficar a uns cinco, dez minutos no máximo. A gente vai e volta assim que vocês conseguirem falar com eles. Eu trago vocês. Só acho que lá será melhor que ficar esperando aqui na rua ou numa padaria. - Insistiu e havia razão em suas palavras.
Acabamos aceitando. Fomos e ele nos serviu um refrigerante enquanto conversávamos. Nanda tentava contato a cada trinta minutos. Depois de umas três horas, seu celular tocou: era a mãe da Bia que Nanda atendeu no viva voz:
- Nanda de Deus! O que aconteceu, menina? Porque tenho dez ligações suas no meu celular. O Bernardo está bem? A Bia está bem? - Perguntou preocupada.
- Calma, dona Débora, calma: todos eles estão bem. Eu liguei porque passei no seu apartamento para pegar meu carro e não os encontrei. Desculpa se insisti demais. - Nanda explicou.
- Ah bom, filha… Eu é que te peço desculpas, acabei esquecendo meu celular aqui em casa. Se você quiser vir buscar seu carro, não vamos sair mais - Falou.
- Já estamos a caminho, dona Débora. Daqui uns dez minutos, mais ou menos, chegaremos aí. Tchau.
- Tchau, querida.
Marcos nos levou novamente e novamente nos despedimos dele. Dessa vez, anunciados, nos deixaram entrar e ainda acenamos dando “adeus” para ele. Subimos até o apartamento deles, que novamente nos receberam muito bem e curiosos de notícias. Contamos tudo o que sabíamos, Nanda algumas coisas a mais por ter conversado com Bia ainda há pouco, e eles ficaram muito felizes. Nos convidaram para ficar para o jantar, mas recusamos, pois precisávamos realmente voltar para casa e para nossas filhas. Nos despedimos e chegamos em nossa cidade aproximadamente uma hora depois. Fomos até meus pais, recebidos com euforia pela caçula e zanga pela mais velha (pré adolescência tem disso!), e novamente tivemos que explicar tudo o que aconteceu. Pelo horário, acabamos jantando por lá mesmo. Depois voltamos para casa, banho, televisão e, por fim, cama para as meninas.
Já em nossa suíte, eu deitado lendo notícias no celular, Nanda pulou só de calcinha e soutien na cama, me encarando:
- “Mor”, posso te perguntar uma coisa? - Perguntou.
- Já perguntou. - Falei sem olhar para ela.
- Oi? - Ela disse sem entender nada.
- Agora já foram duas. - Falei novamente sem olhar para ela.
Ela parou um momento, tentando entender o que eu havia dito e, se tocando, falou:
- Ah, vá! - Disse, rindo: - Estou falando sério! Na verdade, não muito…
- O que foi, Nanda? Manda… - Falei, agora olhando para ela.
- Isso que aconteceu lá em Sâo Paulo, já contou como a vez para o Marcos? - Falou, me encarando, mas meio envergonhada da pergunta.
Eu não tinha parado para pensar nisso. Realmente havíamos combinado uma regra de não repetir parceiros. Fiquei olhando para ela, enquanto analisava os fatos:
- Olha, Nanda. Foi sexo! Masturbação é sexo. Só não foi exatamente uma trepada. Então, ao pé da letra da nossa regra, foi a vez dele. - Falei e ela não se incomodou com a resposta, então contemporizei: - Mas, entretanto, contudo, porém, também acho que, se ele se comportar direitinho, nada impede que possa rolar alguma coisa no futuro. Vamos aguardar, amadurecer um pouco mais a ideia.
Ela olhou para mim, se levantou e foi buscar seu celular num móvel próximo. Abriu seu WhatsApp e se sentou do meu lado, mostrando um cumprimento do Marcos e uma mensagem:
Ele - “Oi, Nanda. Manda um “oi” pro Mark também. Espero que tenham chegado bem e em segurança na casa de vocês. Queria agradecer pelos ótimos momentos que passamos juntos e perguntar se não gostariam de criar um grupo para conversarmos os três juntos. Assim, evitamos outros mal entendidos. O que acham?”
- O que você acha, “Mor”? - Disse Nanda: - Talvez o que estivesse faltando para ele entender o seu lugar fosse justamente o “chacoalhão” que levou da gente.
- Pode ser, Nanda… - Falei ao vento, tentando antecipar os movimentos dele nesse tabuleiro que agora estava sobre a mesa de nosso mundo.
- “Pode ser”, o quê? Criar o grupo ou o chacoalhão? - Ela tentava entender.
- Os dois, Nanda. OsRespondi e a encarei: - Passa o meu número para ele e fala para ele criar o grupo. Vamos ver no que isso vai dar.
E assim ela fez. Quase na sequência, recebi a notificação de um novo grupo de mensagem. Cumprimentei a todos e já desejei boa noite pelo adiantado da hora. Nanda ainda teclou poucas mensagens com ele e depois veio me contar o que teclaram, mas eu disse que agora não era necessário porque eu também estava lá. Ela riu de si mesma e se deitou ao meu lado.
Nessa noite, acabamos fazendo um amorzinho gostoso, sem nenhuma estripulia, apenas o tradicional “papai e mamãe”, afinal, estávamos em casa com as filhas dormindo no quarto ao lado. Mas foi muito bom! Eu adorei sua maturidade ao lidar com a situação e ainda me sentia muito orgulhoso dela. Então, achei que ela merecia não sexo, mas amor e carinho. Nem sei o tempo que durou, mas foi o suficiente para nos satisfazer e nos fazer dormir agarradinhos e tranquilos.
No dia seguinte, a vida seguiu: café da manhã em família, Nanda em casa, eu no escritório e tudo seguia bem. Quase na hora do almoço, recebo uma mensagem no grupo de WhatsApp criado pelo Marcos:
Ele - “Bom dia, Mark. Tá podendo teclar?”
Eu - “Bom dia, amigo. Posso sim. Em que posso te ajudar?”
Ele - “Na verdade é uma questão profissional. Você quer teclar aqui mesmo, ou prefere que eu crie um grupo só nosso?”
“Profissional?”, estranhei, claro! Afinal, a Nanda havia me dito que ele era juiz da Vara de Recuperações Judiciais e Falência. Mas resolvi dar corda e ver o que ele queria:
Eu - “Cria um novo grupo, Marcos. Assim, não incomodamos a Nanda.”
Ela - “Se quiserem falar por aqui, não tem problema algum. Pelo menos, eu fiscalizo vocês dois! Vai que vocês inventam de fazer alguma coisa sem mim…”
Ele - “Oi. Bom dia, Fernanda.”
Ela - “Bom dia, Marcos. Acho que você já ganhou o direito de me chamar de Nanda. Eu prefiro.”
Ele - “Tá bom, Nanda. Anotado.”
Ela - “Eu disse que ele falava esquisito igual você, “Mor”.”
Eu - “Nanda, a ética jurídica impõe sigilo advogado-cliente. Vamos criar outro grupo para não te incomodar e para deixá-lo mais à vontade também.”
Ele - “Mark, não tem problema. O que eu tenho para pedir, ela pode saber.”
Eu - “Não, Marcos. Eu não trabalho assim. Não gosto de misturar vida pessoal com profissional. Se você precisa do Mark advogado, você vai seguir minhas orientações.”
Ele - “Sim, senhor, doutor. Então, desculpa Nanda…”
Ela - “Tá bem, então. Homem chato que eu fui arrumar. Depois me acerto com você, Mark!”
Eu - “Também te amo, Nanda.”
Ela - “Chato! Te amo. Mas é chato…”
Ele - “Tchau, Nanda.”
Ela - “Tchau, Marcos. Beijão.”
Pouco tempo depois, meu celular envia a notificação de uma nova mensagem do Marcos:
Ele - “Mark?”
Eu - “Diga.”
Ele - “Você trabalha na vara de família, com divórcios?”
Eu - “Sim.”
Ele - “Eu cheguei a comentar com vocês sobre minha ex-esposa. Então, estamos nos divorciando e eu preciso do auxílio de um advogado. Você não gostaria de cuidar disso para mim?”
Eu - “Uai! Eu posso, mas considerando a distância entre nós, não sei se seria viável economicamente você me contratar. Além disso, aposto que deve haver uma penca de advogados aí que ficaria feliz em fazer um favor desses para um juiz de direito.”
Ele - “Exatamente isso que eu não quero: ficar devendo favor para advogado oportunista! Não é falar mal da tua profissão, eu também já advoguei, mas tem uma turma que dá nojo.”
“Filho da puta! Até nisso é parecido comigo.”, pensei e ri sozinho:
Eu - “Bem... Então, posso ir direto, sem rodeios: em que fase está o seu divórcio? Você ainda tem contato com sua ex? Se dão bem? Conversam? Ou nem se olham mais? Onde exatamente eu estou indo lenhar, Marcos?”
Ele - “Até obrigado por convencer a Nanda sobre abrirmos um grupo específico para isso: eu não ia mesmo ficar à vontade para conversar certos assuntos. Então… A gente não conversa mais porque eu não quero. Ela até tentou e tenta ainda uma aproximação, mas aconteceram umas coisas e eu fiquei magoado pra caramba. O divórcio está saindo mais por mim que por ela.”
Eu - “Marcos, você vai ter que se abrir para eu entender o que aconteceu e te orientar. Não posso ser pego de surpresa em meio a uma ação. Você é do meio jurídico, sabe do que estou falando.”
Ele - “Sei. Eu tô enrolando. É o seguinte, vou ser bem objetivo: eu saí umas vezes com uma estagiária e ela descobriu.”
“Putz! Que burro.”, pensei, mas deixei que desabafasse:
Ele - “Daí aquela filha da puta, para se vingar, começou a se insinuar, sem que eu soubesse, para um desembargador que havia me “apadrinhado” aqui no TJ. Resultado: acabaram saindo algumas vezes.”
“Chifre trocado não dói! Ele poderia perdoar ela e seguir, se engolisse o orgulho de macho ferido.”, pensei, mas antes de dizer algo, deixei que terminasse:
Ele - “Então, não sei como, alguém do TJ descobriu e a história vazou. Ficou um climão chato pra caramba pra mim. Desde isso, eu nunca mais voltei lá na sede e nem sei se tenho cara de voltar. Quando ela soube do vazamento, veio chorando me pedir desculpas, justificando que me traiu porque estava irada, mas que nunca imaginou que isso fosse vazar. Eu saí de casa e ela me ligou várias e várias vezes. Até ontem tinha uma ligação dela, mas eu não consigo falar com ela.”
Eu - “Poxa vida, hein! Que situação, Marcos.”
A situação era mais complicada do que eu imaginava. Não se tratava apenas de uma traição na intimidade do casal, havia vazado e os efeitos danosos respingavam na carreira dele. Nessa hora, eu desconstruí completamente aquela pose de machão poderoso Alfa que tinha dele e vi que era somente um homem com problemas tão simples e ao mesmo tempo grandes como os que qualquer um tem:
Ele - “Pois é… Você não quer resolver isso pra mim? Divórcio mesmo, você faz tudo e eu assino. É só me falar quanto vai custar e que documentos precisa que eu te envio.”
Eu - “Marcos, independentemente de eu pegar o seu caso ou não, eu quero te ajudar. Como nós já temos uma certa amizade, eu queria te propor algo que sei que será muito bom para você superar essa dor e esse sentimento de impotência que está te afligindo. Há algum tempo atrás, eu e a Nanda passamos por um problema muito sério, não vou te contar o que é, mas foi sério o suficiente para necessitar da intervenção de um psicanalista. Ele é um senhor maduro e uma pessoa espetacular e é daí, da cidade em que você está hospedado. Eu queria te apresentar a ele para você conversar, não para você perdoar sua esposa, se isso acontecer seria ótimo, mas para você entender melhor todo o conjunto e conseguir superar o que passou.”
Ele - “Poxa, Mark. Eu procuro um advogado e você me manda pro divã!? Eu não sei. Não era bem isso o que eu estava querendo…”
Eu - “Faça o seguinte: pense hoje e me retorne mais tarde, ou amanhã, o que preferir. Se concordar, vou até aí e te apresento a ele. De qualquer forma, prometo que vou te ajudar, inclusive com o divórcio, se for o caso.”
Ele - “Tá. Eu vou pensar e te retorno depois.”
Eu - “Fica tranquilo. Pense e voltamos a conversar. E fica tranquilo que não vou comentar com a Nanda.”
Ele - “Obrigado. Eu não conseguiria olhar na cara dela se ela soubesse disso.”
Eu - “Fica tranquilo.”
Ele - “Até mais, então.”
Eu - “Até mais.”
Fui almoçar e a Nanda me aguardava curiosa para saber o que havíamos conversado:
- Não vou falar! - Disse, sem que ela tivesse perguntado nada.
- Mas eu não perguntei nada… - Retrucou me encarando, mas não aguentou: - Nem do que se trata?
- Não é sobre você.
- Eu não conto pra ninguém. Juro.
- Eu sei que não, mas não vou te falar. Se ele quiser, ele te contará um dia. Eu não. - Finalizei e me sentei num banco da ilha, aguardando o almoço ficar pronto.
Por sorte, nossas filhas logo se juntaram a nós e o assunto ficou bloqueado. Ela ainda me olhava com cara curiosa e insatisfeita com minha negativa. Que inferno é ter uma mulher curiosa e ansiosa. Nos servimos e às meninas, e ela se sentou de frente para mim, em silêncio. A cada garfada que dava, me encarava, cobrando uma resposta. Eu conheço aquele olhar: enquanto eu não falasse alguma coisa, ela não iria me deixar em paz.
Covardemente, acabei usando nossas filhas como um escudo durante o almoço, não dando chance dela insistir na pergunta. Eu vi que a curiosidade já a estava corroendo. Eu confio nela, poderia ter falado que ela seria discreta, mas havia me comprometido com o Marcos e não podia voltar atrás. Na saída para levar as meninas para a escola, ela as beijou e enquanto entravam no carro, me pediu um beijo. Inocentemente eu fui e ela me pegou pelo colarinho:
- Fala… alguma… coisa! - Pediu, mandando.
- Não vou e a gente vai discutir se você insistir. - Falei, calmamente.
- Ah, você me paga… Deixa. Tá tudo bem. Vou dar pro primeiro que passar na rua. - Me ameaçou.
- Sem problemas. Só não esquece de lavar direitinho depois. Lavou tá novo, coração! - Respondi, porque sabia que sua ameaça não era verdadeira.
Ela começou a pular como criança emburrada na porta de casa e as meninas começaram a gargalhar dentro do carro:
- E parem vocês duas também! - Brincou de choramingar, rindo para elas.
Saí e as deixei na escola, indo para o cartório de registro de imóveis pegar uma certidão encomendada por um cliente e voltei para o escritório. Não gastei mais que trinta minutos nesse trajeto. Qual não foi minha surpresa ao entrar na minha sala e encontrar Nanda sentada em minha cadeira. Dei um passo para trás e olhei para minha secretária que me disse, rindo: “Ela disse que era uma surpresa, doutor.” e foi, realmente. Entrei e pedi que se levantasse da minha cadeira. Ela o fez, me encarando fundo nos olhos, parecia querer ler minha mente. Balancei negativamente a cabeça. Ela foi até a porta de minha sala, a fechou e se sentou de frente para mim, estalando os ossos dos dedos:
- Nanda, para com isso! Eu tenho que trabalhar. - Pedi, já incomodado.
Ela se debruçou na minha mesa e falou com uma voz suave e sensual que só ela sabe reproduzir quando quer me convencer a fazer algo que não quero:
- Conta pra mim… o que vocês dois… conversaram!! - Disse e desmontou novamente: - Fala, “Mor”. É sobre mim? É uma surpresa? Fala alguma coisa!
- Não é sobre você. - Falei e ela ainda me encarava, claramente dando sinais de que não iria arredar o pé dali: - Não vou entrar em detalhes, até mesmo porque ainda não sei de tudo, mas vou te falar que ele quer me contratar para cuidar do divórcio dele.
- Uai. Mas contratar você? Daqui? - Quis entender.
- Pois é. Ele disse que não quer ficar devendo “favores” para advogado de lá e que prefere me pagar para resolver a questão. Só isso. - Falei e depois frisei: - Ele não queria que eu comentasse com você para não ficar sem jeito. Então, você não está sabendo de nada, entendeu?
- Tá bom. Entendi. E vai dar uma grana legal? Vou ganhar meus gêmeos? - Disse, rindo e insinuando seus seios em minha direção: - Já imaginou? Grandões pra você brincar!
- Não sei, Nanda. Ainda não fechamos nada, criatura. Pode ser, não sei mesmo… - Respondi, rindo da insinuação dela.
- Então, vamos tomar um café. Daí você já me deixa em casa. - Falou.
- Eu acabei de chegar, Nanda. Não vou sair agora. Eu tenho que trabalhar. - Retruquei.
- Você vai me deixar ir embora a pé? Sozinha na rua? E se eu for atacada? - Perguntou.
- Você veio a pé, sozinha na rua e ninguém te atacou. Pega o mesmo caminho. - Falei, sorrindo.
Ela me encarou, sorriu e deu a volta na mesa para me beijar. Acabou fazendo mais e se sentou no meu colo. Logo depois se levantou, se despediu e saiu porta fora. Consegui, enfim, me concentrar e trabalhei até o final da tarde. Na hora de sair, cadê as chaves do meu carro? Não estavam onde eu as costumo guardar, saí fazendo o mesmo caminho que entrei e não o encontrei na vaga em que costumo estacionar. Já pensei o pior. Antes de ligar na polícia, me ocorreu que alguém pudesse tê-lo emprestado sorrateiramente. Voltei e liguei para a Nanda:
- Oi, “Mor”!
- Nanda, você pegou meu carro?
- Eeeeu!? Que mau juízo você faz de mim…
- Nanda. - Falei, já meio alterado: - Se não foi você, alguém o roubou e tenho que ligar na polícia para fazer um BO.
Ela começou a gargalhar do outro lado da ligação. “Filha da puta!”, pensei:
- Nanda!
- Oi, “Mor”, ele tá comigo. Raptei seu carrinho. - Disse, ainda rindo.
- Pô, Nanda. Eu tenho que pegar as meninas. - Resmunguei: - E ninguém rapta ou sequestra um carro. Ele só pode ser roubado ou furtado.
- Pode deixar que eu busco as meninas. Quanto aos termos jurídicos, senhor doutor, tô nem aí! - Ria de se acabar do outro lado da ligação.
- Então vai, pega elas e depois passa aqui pra me buscar.
- Na-na-ni-na-não! Você vem a pé.
- Você tá de brincadeira comigo!? Fernanda Mariana, traz o meu carro aqui, agora!
- Ai, tá bravinho, tá? Não fica o resto do cabelo vai embora. - Dizia e ria: - Ah, desculpa. Tenho que desligar agora porque vou buscar minhas filhas na escola. Tchau, moço.
- Nanda, espera…
Desligou na minha cara. Eu não sabia se ria ou se chorava de raiva. No final, acabei aceitando a derrota nessa batalha e fui a pé para casa. Não era longe. Coisa de uns minutos de caminhada e eu chegaria lá, mas o desaforo foi grande e eu ia me vingar.
Cheguei e tive que interfonar porque as minhas chaves de casa ficam dentro do meu carro que estava dentro da garagem. Não sei se por coincidência ou caso pensado, demorou uns dez minutos para me atender. A campainha já estava ficando rouca quando ela abriu a porta:
- Shiiiiiu! Estou no telefone com a Bia. - Falou, baixinho.
- Abre o portão, caralho! - Falei.
Ela o abriu e, enfim, entrei. Ela me encarava e não me dava as costas, já imaginando que eu lhe daria um tapa daqueles na bunda. Foi voltando “de fasto”, como falamos no interior, até se proteger do outro lado da ilha da cozinha. Então, me fez sinal para esperar:
- Espera aí, Bia. O Mark chegou. Vou colocar no viva voz. - Disse.
Nesse momento estranhei e pensei que tivesse acontecido alguma coisa com o Bernardo:
- Oi, Mark. Tudo bem? - Disse Bia.
- Tudo joia, Bia, e você? Aliás, vocês? - Falei.
- Estamos bem. O Bernardo estava perguntando de você mesmo.
- Pergunta pra esse bunda mole quando ele vai poder bater uma bolinha de novo. - Pedi.
- Eu tô te ouvindo, viado! Ela tá conversando no viva voz. - Respondeu o Bernardo.
Caímos na risada do lado de cá e eles do lado de lá. Ficamos batendo um papo e minha raiva até diminuiu. Soubemos que ele estava se recuperando bem e que logo poderia ser transferido e completar sua recuperação em casa, o demandaria ainda um bom tempo, mas que não atrapalharia os planos do casamento. Isso nos alegrou bastante e, depois de um bom papo, nos despedimos e desligamos. Nem bem desligou, Nanda saiu correndo em direção ao quarto e quase atropelou nossa caçula:
- A comida está no forno! - Gritou Nanda do quarto.
Olhei e vi uma lasanha coberta com plástico filme e um bilhete em cima:
“Fiz pra você, “Mor”, do jeitinho que você gosta e com todo o meu amor!
Não fica bravinho comigo, não, tá?
TE AMO!”.
“Filha da puta, apelona!”, pensei e ri. Minha caçula já chegou bisbilhotando a cozinha e viu a lasanha no forno:
- Quero só lasanha, sem arroz! - Falou e saiu em direção ao sofá.
- Lasanha? - Perguntou a mais velha e, quando confirmei, disse: - Quero com arroz.
Em casa é assim: uma o avesso da outra. Se dão bem, brincam, brigam, combinam, descombinam, se enfrentam, quase se matam, mas se amam. Dormem até hoje no mesmo quarto, apesar da mais velha já estar pedindo um quarto próprio, “defeitos” da adolescência que se aproxima. Algum tempo depois, Nanda ponta a cara na porta que separa a área social da reservada:
- Tá melhor, “Mor”? - Me perguntou com aquela cara sapeca.
Coincidentemente, eu esfregava as palmas da minha mão nesse momento e ela viu e mordeu o lábio superior. Não aguentei e caí na risada. Ela entendeu como uma “deixa” e entrou no recinto, rindo também:
- O que foi? - Perguntou.
- Nada.
- O que foi!? - Insistiu.
- Sua cara. Tô rindo da cara que você fez, encrenca de mulher!
Ela começou a rir também , sem entender muito bem o porquê. Perguntou se tinha vinho e fui buscar um em nossa reserva, colocando-o para gelar no freezer. Ela tirou o plástico filme com o bilhete e o colocou na minha frente:
- Viu que bonitinho? Também sei ser romântica! - Falou e ligou o forno para esquentar a lasanha.
- Você não presta. - Falei.
- E você adora que eu sei. - Retrucou e riu.
Fui para nossa suíte tomar um banho enquanto a lasanha esquentava. Já nem pensava mais na vingança. Aliás, pensava sim, mas deixaria para quando ela menos esperasse. Um casamento feliz se faz assim, de dores e amores, amores e dores, e surpresas, boas surpresas. Depois do banho, voltei para a sala e a lasanha já estava saindo do forno. Nos sentamos, comemos, bebemos um bom vinho tinto suave, Nanda não gosta do seco, e depois nos sentamos no sofá da sala para assistir um programa qualquer. A história que o Marcos havia me contado começou a martelar minha cabeça e me fez perder o foco na televisão. Nanda notou:
- O que essa cabecinha está pensando? - Me perguntou.
- Nada, não. Assuntos do escritório apenas.
- Algum problema? Alguma coisa que eu possa te ajudar? - Insistiu.
- Problemas sempre, Nanda. Eu trabalho para solucionar problemas dos outros. - Falei e a tranquilizei: - Mas não é nada mesmo. Relaxa.
Na hora de costume, as meninas foram dormir. Ficamos eu e ela na sala que logo deu um jeito de deitar no meu colo, assistindo um programa qualquer de reforma de imóveis. Aliás, Nanda é uma arquiteta frustrada: por falta de orientação, acabou cursando administração de empresas e deixando seu grande sonho de lado. Mas enfim…
Por volta das 22:00, meu celular “bipa”. Pego e vejo uma mensagem do Marcos em nossa conversa privada:
Ele - “Mark, tá podendo falar?”
Eu - “Posso.”
Por uma falha de comunicação, respondi concordando com o verbo “falar” e não “teclar”. Daí, o nobre juiz me mandou um arquivo de áudio e eu, já elevado pelo vinho consumido, ativei o arquivo na presença da Nanda:
Ele - “MENSAGEM DE ÁUDIO - Pensei bastante em tudo o que você me falou e eu te agradeço, mas no momento só gostaria de cuidar do divórcio com a Denise mesmo. Depois, mais para a frente, caso eu me convença da necessidade de uma terapia, procuro seu psicanalista.”
Meio bêbado e ainda ignorando que a Nanda já me olhava curiosa de baixo, mandei um arquivo de áudio para ele:
Eu - “MENSAGEM DE ÁUDIO - Tudo bem, Marcos. Foi só um conselho de amigo. Me manda uma relação de seu patrimônio com sua sugestão de valores, cópia da certidão de casamento, de nascimento de filhos, sua DIRPF, ocupação da sua esposa, digo ex-esposa, e vou dar uma analisada sobre a questão da partilha, pensão e uma prévia dos honorários também.”
Nessa hora, olhei para baixo e vi dois olhinhos arregalados me encarando, sedentos e vi o tamanho da besteira que tinha feito. Trocamos mais alguns áudios e ele disse ter pensado melhor e me autorizou a contar a história para ela, na esperança de obter compreensão e algum bom conselho feminino. Nos despedimos e agora, certamente, ela não iria me deixar em paz mesmo. Então, me resignei e contei resumidamente toda a conversa que teve comigo: superficialmente sobre sua traição com a estagiária, depois a da esposa com o desembargador, terminando no “bá-fá-fá” dentro do TJ. Nanda ouvia tudo com atenção, boquiaberta, surpresa mesmo, e a primeira acalentadora frase que saiu de sua boca foi:
- Mas que filho da puta é esse Marcos! Faz aquela pose de bom homem, responsável, respeitador, e no final é um traíra sem vergonha. - Respirou e continuou: - E a mulher dele também: que biscate! Sair com o superior dele e ainda deixar vazar a história? Nisso dá até dó dele.
- Por isso, eu não queria te contar. - Falei, tentando acalmá-la continuei: - Não julgue só por esses fatos. Eu também ainda não sei tudo. Talvez exista algum motivo que fez os dois chegarem a esse ponto. Vai com calma, ok?
- Nossa, se você fizer isso comigo, eu juro que corto teu saco. - Falou ainda brava.
- Deixando o pau funcionando, o saco eu costuro outro. - Respondi, brincando.
Pra quê fui fazer isso? A mulher ficou uma fera. Começou a xingar, brigar, dizer que eu já estava pensando em fazer isso, fazer aquilo, que eu deveria estar querendo mesmo por uma galhada nela, etc, etc, etc. Fiquei quieto, calado, ouvindo tudo sem responder nada. Ela surtou e foi pisando alto para o quarto. Olhei no celular e aguardei. Cinco minutos depois, ela voltou choramingando e pedindo desculpas, dizendo ter sido injusta, que eu não era desse tipo, sabia que era fiel, que me amava, que devia estar na TPM e mais algumas coisas:
- Você me desculpa? - Perguntou, com olhinhos úmidos.
- Você é louca! - Falei e sorri: - Mas é a minha louquinha.
Fomos dormir e ainda ganhei um boquete caprichado de desculpas, mas poderia ter sido melhor. Ela realmente não devia estar num bom dia. No dia seguinte, nossas atividades cotidianas ocorriam normalmente. Eu já estava no escritório quando recebo novamente aquele maldito: “Oi” no meu WhatsApp. Respondi um “Bom dia. Pois não?” no mesmo momento e outra vez nada da conversa prosseguir. Aquilo já estava me incomodando e tomei a atitude de ligar para o Palhares. Talvez ele pudesse quebrar mais um galho e descobrir quem era o filho da puta que me infernizava. Infelizmente, ele havia saído em diligência, estava de campana atrás de um meliante qualquer e não poderia ser contatado tão brevemente.
Voltei a me ocupar com meus afazeres e logo meu WhatsApp começou a bipar ininterruptamente. Pensei que fosse aquele número e em carga total para me azucrinar, mas não: era o Marcos despejando vários anexos referentes aos documentos e informações que eu havia solicitado. Baixei todos os arquivos em meu computador e lhe cumprimentei, dizendo que retornaria depois.
Comecei a analisar a documentação e me deparei com uma foto da esposa, uma loira de olhos azuis, pele branquinha e lábios finos, mas muito elegantes e condizentes com seu rosto. Literalmente, o tipo de mulher que nenhum homem pensaria em trair, tampouco ela aparentava ser do tipo que se vingaria na mesma moeda do homem traidor. Mas enfim… Já era quase hora do almoço e fui para casa. Almoçamos com as meninas e, na hora de costume, as levei para a escola, voltando para meu escritório.
Depois de terminar a análise de toda a documentação, chamei o Marcos pelo aplicativo. Expus minha análise, situação documental, trabalho envolvido, riscos quase inexistente de pensionamento para ela, mas somente para o filho em comum, e apresentei meus honorários e eventuais despesas diversas (viagens, certidões, etc.). Fechamos o trabalho e já peguei o contato de sua esposa. Ele não queria vê-la nem pintada de ouro. Pouco depois recebi um anexo comprovando a transferência do valor combinado: “Ô Beleza! Parece que Nanda vai ganhar os gêmeos que tanto quer”, pensei. Como valor contrato era bastante considerável e já fora pago à vista, liguei para a esposa:
- Alô? - Uma voz sedosa me atendeu do outro lado da ligação.
- Boa tarde. Por favor, dona Denise? - Perguntei da forma mais profissional possível.
- Sou eu. Pois não? Quem fala? - Respondeu.
Bom, enfim… Me apresentei, justifiquei o motivo de meu contato e perguntei se ela gostaria de tratar diretamente comigo ou se preferia que eu entrasse em contato com o advogado dela, caso ela já tivesse algum representante. A princípio, ela não negou meu contato, mas disse que gostaria de conversar com o Marcos primeiramente. Eu disse que não poderia proibi-la, mas que ele me deixou bem claro que não queria contato e que eu deveria assumir a frente de tudo. Ela então me perguntou onde ficava meu escritório porque não gostaria de tratar daquele assunto por telefone, o que achei muito justo, mas quando lhe informei minha cidade, ela disse ser inviável seu deslocamento. Me propus em ir ao seu encontro, bastando que ela me disse quando e onde. Marcamos para a próxima quinta-feira, na sua própria casa, por volta das 14:00.
Expliquei a situação para o Marcos que concordou com as decisões tomadas até então. À tarde, em minha casa, avisei a Nanda de minha viagem e ela não concordou muito num primeiro momento, mas quando lhe mostrei o comprovante de depósito em nossa conta bancária, sua opinião milagrosamente mudou da água para o vinho. Ela disse que, apesar de tudo o que aconteceu, era triste ver um casal tão novo se separando, com o que concordei. Por um motivo idiota, acabei mostrando a foto da esposa do Marcos para ela. Seu semblante, também milagrosamente, voltou do vinho para a água:
- Você não vai? - Falou.
- Não vou o quê, Nanda? - Perguntei.
- Você não vai se encontrar com essa loira. Olha pra ela! Parece uma boneca, uma barbie turbinada. - Falou encostando o indicador na tela do meu celular.
- Você tá de brincadeira, né!? Tá com ciúme da parte contrária da minha ação? - Perguntei, incrédulo e já rindo dela.
Para que nós homens temos o costume de viver de riscos? Fui rir da minha patroa e ela se vestiu com a capa do capeta, o ódio saltava de seus olhos e chegava a espumar de ira de minha inocente risada. Saiu pisando alto novamente para nossa suíte, só que dessa vez não voltou cinco minutos depois. Esperei mais cinco, dez, trinta minutos e nada. Vendo que a situação era mais séria do que eu havia avaliado, respirei fundo e fui encontrar a fera:
- Vai com Deus! - Disse Maryeva, me olhando por cima de seu celular e com o mesmo sorriso cínico que eu já vi várias vezes no rosto da Nanda.
A porta de nossa suíte estava fechada. Bati e ela não respondeu. Virei a fechadura e vi que não estava travada. “E lá vamos nós!”, pensei:
- Nanda? - Perguntei.
As luzes estavam apagadas, mas vi o contorno de seu corpo debaixo do edredom. Acendi as luzes, entrei e fechei a porta atrás de mim. Fui até o lado dela e me sentei na beirada da cama:
- Tá mais calma? - Insisti.
Ela tirou o edredom de cima de sua cabeça e me olhou com a expressão de uma onça prestes a dar o bote numa vítima indefesa. Eu a olhei, agora segurando uma risada novamente, mas não deixei transparecer:
- O que foi aquilo? - Insisti uma vez mais.
- Ah, Mark. Poxa! Ela é um mulherão, linda, perfeita, gostosa, safada, e você vai lá se encontrar com ela, sozinho? - Falou e puxou o edredom sobre a cabeça, de novo.
Ciúmes! Nessa altura de nossas vidas e depois de tudo o que já havíamos enfrentado juntos, ela ainda tinha ciúmes de mim! Respirei fundo, escolhendo bem as palavras:
- Nanda é só o meu trabalho. Ela não é minha cliente. Deve ser o primeiro e único contato que terei com ela. - Expliquei e pedi: - Para de besteira, criatura.
Pra que fui usar a palavra “besteira”? Nanda começou a despejar suas inseguranças, medos, ciúmes e toda uma gama de outros “motivos” que, em sua cabeça, me fariam comer aquela loira durante aquele encontro. Tive que usar toda a minha “verve” para convencê-la do contrário e não foi fácil, mas acabei conseguindo, principalmente porque no final da conversa a lembrei que os honorários recebidos iriam garantir a adoção dos "gêmeos" que ela tanto queria:
- Só vou deixar porque o motivo é nobre, viu? Mas olha lá, hein, doutor Mark: juízo com essa periguete desbotada! - Me advertiu e acabei rindo novamente, mas desta vez ela me acompanhou.
- Quer saber, porque você não vem com as meninas passear em São Paulo? Eu deixo vocês no shopping, vou até a reunião com a Denise e depois me encontro com vocês. - Propus para acabar com qualquer dúvida, além de ser uma oportunidade para tirar as meninas de casa para um passeio.
Ela parou de chorar na hora, gostou da ideia. Foi até a sala e logo as três voltaram para a suíte, animadas com a novidade. Ficamos combinados e assim a paz voltou a reinar.
No dia seguinte, voltei a entrar em contato com a Denise e confirmamos o encontro para o próximo dia. Aprontei toda a documentação que precisaria levar para conversar com ela, deixei tudo no carro e no dia seguinte saímos todos rumo a “capitar”. Depois de uma viagem tranquila, a primeira impressão da Maryeva me motivou ainda mais a continuar morando em nossa cidadezinha:
- Credo! Então, São Paulo é isso? - Resmungou: - Espero que, pelo menos, o shopping seja legal.
- É feia mesmo, pai. Não tem cor. - Retrucou Mirian.
- É uma cidade grande, diferente, tem seus atrativos, fiquem tranquilas. - Respondi e Nanda me encarou também desolada e perguntei: - O quê?
Ela só balançou a cabeça negativamente e as levei ao Morumbi Shopping. Eu não sei se é o melhor da cidade, mas era um que eu já conhecia. As deixei lá e Nanda ainda ficou com meu cartão de crédito, dando-me calafrios. Pedi que deixassem os celulares ligados para, quando eu terminasse minha reunião, pudesse encontrá-las. Me despedi e fui ao encontro da Denise. Cheguei em seu prédio de apartamentos quase trinta minutos depois, me identificando na portaria e sendo autorizado a entrar e a subir até o nono andar, onde fui recebido pela própria. Aliás, que mulher linda! Alta, quase da minha altura e isso usando rasteirinha, falsa magra com curvas justas e bem definidas, pele branquinha e um semblante que não negava sua ascendência européia. Eu a pegaria fácil numa balada, se já não tivesse uma rainha reinando em meu coração. Agora, se a Nanda permitisse, eu superaria esse impasse e a pegaria com gosto:
- Boa tarde. Como vai, dona Denise? - A cumprimentei, depois de me recuperar da boníssima primeira impressão, e me apresentei formalmente, entregando-lhe meu cartão de visitas e exibindo minha carteira da OAB.
- Vou bem, obrigada, doutor. Queira entrar. - Me convidou e, lá dentro, me conduziu até uma mesa na sala de jantar.
Gentilmente me perguntou se eu aceitaria um café. Logo, para mim, um mineiro, ela veio perguntar se aceitava um café. Claro que aceitei e me arrependi na alma: cafezinho ruim demais, fraco, sonso, insípido. Tomei por educação, mas não foi fácil. Minha sorte foi ela ter começado a conversar amenidades e isso diminuiu minha frustração com o quitute.
Comecei a explicar para ela sobre os procedimentos jurídicos e sobre a proposta de partilha acordada com o Marcos previamente, muito justa por sinal, porque ele literalmente dividia tudo meio a meio, além de garantir uma boa pensão para o filho. Ela me ouvia tudo com olhos bastante tristes, chegaram a ficar marejados com o sentimento da perda iminente.
Ela me pediu licença para retocar a maquiagem e saiu em direção à área reservada do apartamento. Fiquei sentado na mesa torcendo para que ela tivesse compreendido o bom negócio que estava fazendo e assim eu resolveria o divórcio de forma rápida e menos indolor para todos. Ela logo voltou e se sentou novamente próxima de mim:
- Ele te contou como chegamos a esse ponto, doutor? - Me perguntou.
- Ele me fez um resumo dos acontecimentos, dona Denise…
- Por favor, só Denise, sem dona, isso me envelhece demais. - Me interrompeu: - Contou, inclusive, que ele começou tudo isso?
- Sim. Ele me disse que teve um envolvimento com uma pessoa…
- Na minha cama. - Ela me interrompeu: - Ele te contou que estava fingindo trabalhar com a estagiária na minha casa enquanto eu ia numa consulta pó-parto e que, no meu retorno, o flagrei transando com aquela, aquelazinha na minha cama?
- Não, isso ele não me contou. Ele apenas disse que teve esse caso e que a senhora… - Eu me interrompi: - Desculpe! Que você descobriu, e que, a partir daí, você também teve um envolvimento com um superior dele, que por sinal se dizia muito amigo dele, um padrinho no meio profissional, e esse seu envolvimento acabou vazando no TJ.
- Eu não queria que nada disso tivesse acontecido, doutor. Não queria. - Falou e se apoiou com os dois braços na mesa: - O Marcos não foi leal comigo. Eu havia acabado de ter o Ben quando ele se envolveu com aquela biscate… Desculpa! Com aquela moça. Ele não podia ter feito isso comigo, não podia! A gente sempre se deu bem. Eu só precisava de um tempo para me recuperar do parto…
Comecei a me apiedar daquela mulher e a duvidar das motivações, mesmo das boas intenções do Marcos nessa história toda. Inclusive, isso, de certa forma, afetava meu conceito geral dele também, a ponto de inviabilizar qualquer novo encontro com a Nanda. Ela continuou:
- Eu errei também, não quero me eximir de culpa, mas eu nunca quis que isso vazasse ou o prejudicasse. Foi num momento de raiva e o Antunes, me oferecendo amparo, conselho, amizade, me levou a acreditar que seus braços seriam uma justa retribuição pela traição que eu recebi de meu marido. - Disse e enxugou uma lágrima.
Eu ouvia tudo sem tecer comentários ou opiniões sobre culpas e responsabilidades. Eles já tinham as deles e eu não precisava dar razão a nenhum dos dois. Mas acabei não aguentando e perguntei:
- A senhora ainda sente algum sentimento pelo Marcos? - Ela me encarou nesse momento, surpresa: - Existe espaço no seu coração para perdão e, talvez, tentarem prosseguir juntos, em nome da família, do filho?
Penso que a surpresa tenha sido tanta que ela ficou sem palavras por um momento. Assim que se recobrou, disse:
- Não posso dizer que eu não sinta mais nada por ele. - Disse e, suspirou fundo: - Mas desde que me abandonou… o Antunes… Eu não sei… - Interrompeu-se com a mão na boca.
- A senhora ainda continua com esse Antunes? - Perguntei, no automático, só depois me dando conta da inconveniência, fazendo ela apenas assentir com a cabeça.
- Não. Às vezes a gente se encontra, mas… Não, não temos mais nada. - Me falou, claramente constrangida e não convencendo.
Me encostei na cadeira e fiquei sem reação. Vi que aquela mulher ainda amava o marido e se arrependia na alma de ter feito o que fez. Acredito até que tenha se entregado ao tal Antunes num momento de fraqueza, ou até mesmo por alguma artimanha dele. Talvez se o Marcos se dispusesse a conversar com ela, ouvi-la, tentar entender o que ela passou, os dois pudessem se perdoar e reatar. Mas eu não teria como descobrir isso naquele momento:
- Doutor, o senhor parece ser uma boa pessoa. Deve estar horrorizado comigo. - Concluiu sobre si mesma.
- Denise, já advogo há um bom tempo e te garanto que a sua história não é, nem de longe, a pior que já ouvi. Pessoalmente, acredito que se vocês tivessem a oportunidade de conversar francamente, sem agressões mútuas e sem procurar culpados, haveria uma chance de reatarem. - Falei.
Ela me olhou feliz com aquelas palavras, mas não parecia haver tanta esperança em seu coração:
- Eu gostaria muito de falar com ele, doutor, me explicar, pedir desculpas por tudo, mas ele não me ouve. Ele não quer conversar comigo. Só vem visitar o Ben, me cumprimenta e sai sem trocar nenhuma outra palavra. Praticamente me ignora.
- Talvez o que tenha potencializado a dor do Marcos seja o vazamento do seu… - Procurei a melhor palavra, mas não achei outra: - Seu “envolvimento”, me desculpe a palavra. Esse fato me deu a impressão de tê-lo abalado demais.
Ela olhava cabisbaixa, mas concordou com a cabeça. Depois suspirou fundo novamente e disse:
- Eu agradeço suas palavras, doutor, e agradeço mais ainda por ter me ouvido. Se esse for o nosso destino, que assim seja. Nem irei procurar outro advogado. Se o senhor puder nos representar em conjunto, eu assinarei qualquer documento que fizer. Confio no senhor.
Agradeci sua confiança e disse que prepararia toda a documentação para o quanto antes. Na saída de seu apartamento, fiz-lhe uma última pergunta:
- A senhora gostaria que eu tentasse convencer o Marcos a ter uma conversa, antes de assinar o acordo de divórcio?
- O senhor faria isso? - Perguntou, novamente surpresa.
- Se for da sua vontade, eu farei. - Respondi e perguntei: - Mas e esse tal Antunes? Ele pode ser um problema?
- Se o Marcos me perdoar, não há Antunes algum que nos impeça de reatar. Isso lhe garanto!
Sorri e prometi tentar um encontro entre os dois. Se necessário, usaria o argumento de que é uma exigência dela para se divorciarem amigavelmente. Ela concordou, me agradecendo com um abraço apertado e um beijo na face, impregnando meu terno com um cheiro adocicado de mulher. Despedimo-nos uma última vez e voltei para meu carro, e nele rumei ao shopping. Liguei para a Nanda e ela me disse que estavam na praça de alimentação, lanchando.
Mirian, minha caçula olhos de água, apesar da pouca estatura, me viu ao longe e veio correndo me buscar. Fui até elas e nem tinha fome. Maryeva se distraía com um livro de terror. Aliás, leitura é um hábito que ensinamos para elas desde cedo. Sempre que viajávamos ou passeávamos em shoppings, ao invés de brinquedos, elas ganham livros, o que hoje rendeu uma boa biblioteca em nossa casa. Nanda, como toda “femme fatale”, sentiu o cheiro da concorrência, que nem era concorrência alguma, de longe:
- Que cheiro de perfume barato é esse? - Perguntou, me encarando.
- Cheiro!? Que cheiro? - Falei, sem me atentar que eu já havia me acostumado com o perfume da Denise no meu terno.
- Esse cheiro! - Disse Nanda quase se encostando em meu pescoço, com os olhos já faiscando.
- Nanda, não entra em neura. A história é mais complicada do que você imagina. - Respondi e pela serenidade e seriedade de minhas palavras, ela se acalmou: - Deve ser o perfume da Denise quando se despediu de mim.
- O que aconteceu? - Perguntou, agora séria, até mesmo preocupada.
- Agora não dá para conversarmos, mas eu acho que vou precisar da sua opinião feminina e talvez até da sua capacidade de convencimento. - Daí olhei para as meninas e falei: - Depois a gente conversa em casa.
Passeamos mais um pouco pelo shopping e até assistimos um filme com as meninas num Cine 3D. Depois voltamos para casa, chegando quase por volta da meia noite. Nem tomaram banho naquele dia e se recolheram. Nanda queria conversar, mas eu estava cansado e precisava dormir. No dia seguinte, eu contaria tudo e esse tudo poderia nem ser o começo.