— E o seu pai, Jaime? — perguntou a minha analista, fazendo algumas anotações em seu caderno de milhões.
— Bem, ele não me governa mais. Eu passei anos da minha vida achando que as opiniões dele estavam certas, porém, graças aos céus, eu pude me libertar. Estou em um relacionamento saudável, fiz diversos amigos nos últimos meses e, claro, a parte profissional também deu uma guinada. — contei.
— Estou muito feliz, Jaime. É notório a sua evolução. Acho que podemos diminuir o número de consultas. — ela garantiu.
— Sério?
— Sim, Jaime. Eu vou mandar para você o novo cronograma da terapia. — disse, cruzando as pernas e fazendo mais uma anotação.
O tempo voa. Eu nem acredito que namoro o Henrique há um ano e meio. Neste tempo, muitas coisas mudaram dentro e fora de mim. Eu passei a me exercitar mais, afinal, com um novinho sedento é difícil manter o pique. Outra coisa é que prestei concurso para uma vaga de professor de Filosofia na Universidade de São Paulo (USP). O resultado vai sair em breve e não consigo esconder o nervosismo.
Já faz um tempo que o Henrique veio morar comigo. No começo foi complicado, porque eu estava acostumado a viver só. O primeiro passo para um bom relacionamento com o meu namorado? Criar um espaço para ele. Fizemos uma reforma no antigo escritório do meu pai para o Henrique. Ele é um amor de pessoa, mas o jogo o faz muito competitivo e, logo, barulhento.
No início, a jogatina não me perturbava tanto, mas com o estudo e as aulas, eu precisava dormir mais cedo. Enfim, a gente dava um jeito de fazer tudo ser mais orgânico. Eu estava de férias da escola e fizemos uma viagem para a Europa. Graças ao Henrique, eu pude conhecer lugares novos e aproveitar mais a vida.
Durante uma visita ao Museu do Louvre, recebi a notícia que mudaria a minha vida. Após noites acordado e abdicando de muitas coisas para estudar, eu fui aprovado para lecionar Filosofia na USP. Celebrei com um beijo demorado no Henrique.
— Ei, o que foi isso? — perguntou Henrique, que estava lindo usando um cachecol verde e seu casaco preto.
— Eu passei. — respondi, mostrando o e-mail do corpo docente da USP.
— Mentira. — ele soltou ficando com olhos marejados. — Sério?
— Sim. Isso tudo graças a você. Que me incentivou. — o abracei e o beijei.
— Amor, você merece. Eu não tenho nada haver com isso. Você passou meses acordado e revisando os assuntos. É um mérito seu. — Henrique tocou no meu rosto e me beijou.
Nem preciso dizer que comemoramos de um jeito muito especial. Passamos dois dias trancados no quarto. Depois disso, seguimos para Itália e Grécia. Finalmente, eu estava visitando todos os lugares que os grandes pensadores pisaram.
Infelizmente, a realidade nos chamou e tivemos que retornar ao Brasil. Para celebrar o novo emprego, eu fiz uma festa com todas as pessoas especiais na minha vida. Nos últimos tempos, as minhas amizades tem se fortalecido, principalmente, com meus colegas de trabalho.
Fiz amizade com vários professores e passei a socializar mais com eles. Até a Pâmela, a mulher do Fábio, conseguiu uma vaga na secretaria da escola e sempre almoçávamos juntos, além dela passar a ser uma constante presença em casa. Será que o Fábio está feliz? Todos nós seguimos da melhor maneira possível.
Após uma ida ao mercado, cheguei em casa e me atrapalhei com as compras. Juntei tudo e olhei para a fachada da minha residência. Nem parece o mesmo lugar sem vida e que só trouxe dores. Eu peguei todos os sentimentos ruins e ressignifiquei para boas lembranças.
Logo na entrada, encontrei a Alessandra e o Diogo, irmão do Henrique, que se tornaram melhores amigos, principalmente, de baladas e rolês aleatórios. Eles ficaram responsáveis pela decoração, no caso, arrumar as mesas e cadeiras. Era uma festa simples, só para não passar em branco essa boa notícia.
A Lúcia e o Henrique estão na cozinha, que parece um lugar de chefs profissionais. Eles usam termos técnicos e trabalham com uma harmonia de dar inveja. Afinal, nem um miojo eu consigo fazer direito. Eu só preciso olhar e comentar, algumas vezes a Lúcia ralha comigo, mas o Henrique é bonzinho e me defende.
— A tua sogra vem? — questionou Lúcia, que fazia uma farofa de alho.
— Claro. Eu preciso agradar os meus sogrinhos. — brinquei, sentando em uma cadeira e vendo os amores da minha vida cozinhar.
— Você nem fica mais nervoso, né? Eu achava uma graça você bobão falando com a mamãe. — disse Henrique, cortando a carne para o churrasco.
— Dois anos, uai. Eu não podia ficar envergonhado para sempre. — soltei. — Eu vou conectar a caixa de som. A festa precisa de música. O pessoal vai chegar por volta das 12h. Se apressem.
— Folgado! — exclamaram Henrique e Lúcia.
É errado ser tão feliz? Sabe, em alguns momentos eu me pego pensando em toda a felicidade que tive nos últimos anos. Às vezes, eu tentei fugir dela, mas é como diz o ditado: o que é nosso está guardado.
Instalei o sistema de som. A Alessandra correu e colocou sua playlist. Segundo a minha sobrinha, o seu gosto musical era superior. Eu não protestei, porque é a pura verdade. Deixei os jovens tomarem de conta da parte musical da festa.
Subi para o quarto e deitei na cama. Eu mudei muitas coisas na decoração, claro que com a ajuda do Henrique. Ele trouxe todos os seus brinquedos e bugigangas de nerd. A vida é louca. Eu só consigo pensar nisso.
Senti um corpo ao meu lado. Nem precisei abrir os olhos para adivinhar que era o Henrique. Na verdade, o cheiro de legumes entregou o meu namorado. Ele me beijou e se alinhou ao meu lado.
— Você é feliz? — ele perguntou.
— Oxi. Claro que sou. — virei em sua direção e não escondi a preocupação. — Aconteceu algo? Você, você quer terminar?
— Não, amor. Eu demorei muito tempo para conquistar esse coração. — ele justificou, mas isso não me satisfez.
— E qual o motivo da pergunta? Olha, se você quiser terminar eu vou entender e...
— Jaime. — colocando o dedo indicador nos meus lábios. — Ei, para com isso. Eu te amo. Você é o homem que eu escolhi. É que eu tenho medo de te perder. Só isso. Eu sei que é bobagem, mas sempre vai ter um novinho no teu pé. Ainda mais agora com a faculdade e tudo mais.
— Você está com ciúmes?
— Claro. Esses jovens de hoje são safados demais. Eu vou te pegar todas as noites na faculdade. Tô nem aí. — ele disse me fazendo sorrir.
— Eu te amo, seu bocó. — o beijei. — Tudo bem, eu te amo, mas vamos tomar um banho? Esse cheiro de cebola tá horrível.
— Eu pensei que você gostasse de um homem rústico. — brincou o Henrique subindo em cima de mim. — Cheira o teu homem das cavernas, Jay.
Não deu para transar. O nosso banho foi apressado. Colocamos roupas confortáveis. A sugestão foi da Alessandra, que separou as peças. Nem preciso dizer que estávamos combinando. Usando os mesmos padrões na camisa e bermudas parecidas. Eu já me acostumei em viver com o Henrique. Ele é espaçoso e nada silencioso. É a desvantagem de se ter um namorado, eu acho.
Os convidados foram chegando aos poucos. O Jardim é espaçoso e colocamos mesas espalhadas para acomodar a todos. Acho que foi a primeira grande festa que a casa recebeu. Como eu já falei, os meus pais não gostavam de pessoas.
Convidamos alguns professores e a diretora da escola, a família do Henrique, os amigos do Henrique e, claro, a Lúcia e Alessandra com o seu novo namorado. O meu namorado comandou a churrasqueira e a mesa estava cheia de delícias.
Nem preciso dizer que as músicas de Alessandro e Diogo agradaram ao público jovem. O pai do Henrique ficou olhando com espanto as pessoas dançando, principalmente, com o frio que estava fazendo em SP. Eu tive que fingir costume com a presença da Julia em minha casa. A Lúcia fez inveja para todas as amigas.
— E ai, galego. — Lúcia me assustou, pois eu estava refletindo sobre a vida. — Tá feliz?
— Sim. — respondi e suspirei fundo. — Eu nunca imaginei que seria tão feliz, Lú. Eu, finalmente, fiz as pazes com o meu passado. Eu me sinto muito feliz por ter nascido gay. A felicidade demorou, mas chegou e, pela primeira vez, eu não vou fugir dela.
— Isso mesmo, macho. A vida pode ser meiga que nem coice de cavalo, mas temos que enfrentá-la de cabeça erguida. — aconselhou a Lúcia. — Inclusive, você está falando com uma nova empresária.
— Como assim? — questionei, deixando o meu copo na mesa e prestando atenção na Lúcia.
— Eu vou abrir a "Delícias da Luh". Vou fazer doces e salgados especiais para as clientes. — ela anunciou mostrando um cartão, que foi feito pelo Henrique.
— Maravilhoso! — exclamei ao ler o cartão. — Eu vou ser o seu cliente número um. E pode cobrar o dobro.
— Pode deixar. Ainda mais agora que a Alessandra tá pensando em casar e vamos mudar de casa. — brincou a Lúcia, pegando o meu copo e dando um gole.
Sabe qual a melhor parte do meu bairro? Temos uma bela vista do pôr do sol. Aos poucos, a luz alaranjada foi tomando conta da fachada da minha casa. De repente, o Henrique gritou e pediu para fazer um discurso. A louca da Alessandra já estava animada e me levou para perto do meu namorado.
— O que significa isso? — perguntei, um pouco sem graça e olhando para todos presentes, que também não sabem o que está acontecendo.
— Jaime, eu te amo. Eu quero muito te parabenizar pela sua conquista. Eu fico muito feliz por você está realizando os seus sonhos. Eu te conheço há muito anos, né? — segurando a minha mão e se emocionando. — Parte deste tempo, a nossa relação foi impossível por motivos óbvios. A gente ficou uns anos distantes, você sem ter ideia de que eu te amava, mas eu nunca desisti. A primeira oportunidade que tive apostei todas as minhas fichas e cá estamos nós. E, hoje, aqui na frente todas essas pessoas que nos amam, eu quero te fazer uma pergunta. — ficando de joelho no chão e tirando uma aliança do bolso. — Quer casar comigo?
Isso está mesmo acontecendo? Eu fico sem reação com o pedido do Henrique. A Lúcia não segura as lágrimas e a Alessandra grita abraçada ao Diogo. Eu lembro de todas as palavras ditas pelo meu pai e como ele estava errado sobre tudo. Eu posso ser feliz. Eu tenho alguém que me ama.
— Jai, essa é a deixa para você responder. — O Henrique diz desesperado.
— Aceito. — respondo tão baixo que nem eu consigo escutar, então forço mais a voz. — Aceito. — a palavra sai tremida, mas dá para o gasto. — Eu aceito. — ajudando o Henrique a levantar.
— Eu te amo. — colocando o anel em meu dedo. — Eu vou te fazer muito feliz. — ele se aproxima de mim e me beija.
— Você já me faz feliz, Henry. Obrigado por nunca me deixar desistir. — agradeci, enquanto enxugava suas lágrimas.
— Eu sou insistente. Eu te esperaria o tempo que fosse necessário. — me beijando.
— Viu, mãe! — gritou Alessandra para a Lúcia que estava se acabando de chorar. — A senhora deveria seguir o exemplo do padrinho. Ainda dá tempo para amar! — ela aproveitou o momento para tirar uma foto nossa.
***
ESPERO QUE TENHA CURTIDO A JORNADA DE JAIME E HENRIQUE. A MINHA PRÓXIMA HISTÓRIA SERÁ "UM VENEZUELANO EM MINHA VIDA". CONFIRA A SINOPSE:
O que você faz para ser feliz? Às vezes, a felicidade pode estar mais perto do que você imaginou. Veja como exemplo, o jovem Enzo Gabriel, que acabou de completar 25 anos. Ele é finalista do curso de programação da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), e junto ao seus amigos decidiu abrir uma empresa de tecnologia, a Tech Land.
A vida dele deveria ser feliz, né? Afinal, quem não deseja todo esse amadurecimento profissional. Bem, lá no fundo, Enzo se sente frustrado por nunca ter encontrado o amor ou não ter tempo para encontrar uma pessoa que faça o seu coração bater mais forte.
Já para o venezuelano, Noslen Fuerte a felicidade está nas pequenas coisas, mesmo ele não lembrando do seu passado, pois é sobrevivente de um acidente automobilístico. Vivendo com pouco, Noslen passou a dar valor à vida e sonha em reencontrar a família.
Será que os nossos protagonistas vão encontrar a tão sonhada felicidade?
"Um Venezuelano na minha vida" é um prato cheio para aqueles que gostaram de "Amor de Peso" e "Entre Todas as Chances". Inclusive, personagens dessas histórias darão a cara e ajudarão Enzo e Noslen nesta difícil missão que é se apaixonar.