Um sinal sonoro me acorda e isso me traz de volta à realidade. Era como se eu estivesse flutuando no ar e alguém jogasse um gancho em minha barriga, me puxando com força para o chão.
Quando olho ao redor, a princípio não reconheço onde estou. Ali não era meu quarto, ali não era a casa dos meus pais, e logo fui me lembrando onde estava. Sim, estava no presídio.
Em primeiro momento, recebemos o café da manhã. Tomamos e, em seguida, todos da cela foram levados para um pavilhão que era chamado de "bandinha". Naquele lugar, já não havia ar-condicionado nas salas e nem ventiladores nas celas. As paredes já não tinham mais uma pintura nova e sem manchas. O lugar tinha um aspecto de um prédio abandonado. As vozes dos detentos já davam para ouvir de onde eu estava; minha barriga gelava, era quase como se tivesse algo vivo dentro dela se mexendo. O desespero era real, mas uma vez recebemos roupa de cama, com uma qualidade bem suspeita (risos). Era um cobertor feito de flanela, até que grosso, um travesseiro de espuma coberto de manchas e fino, uma fronha fina e um lençol. Recebemos mais uma bermuda e mais uma blusa, sem cuecas.
Depois disso, o carcereiro falou que estávamos sendo distribuídos em celas de acolhimento ou triagem. Ali, seríamos observados para ver em que pavilhão seríamos colocados definitivamente.
Quando entrei, a luz do sol da parte da manhã invadia a cela, passando pelas grades que davam de frente para uma espécie de pequeno pátio.
Esse pavilhão era pequeno, com um conjunto de celas formando um quadrado. E, no meio, um pátio com terra e dois bancos.
De volta à cela, assim que eu entrava dava para sentir o cheiro; com certeza, o cheiro era a coisa mais marcante de toda essa experiência. Era uma mistura de umidade, mofo, merda e azedo.
A cela era um retângulo com duas portas, uma pela qual eu entrei e outra que dava no pátio. Tinha cerca de 20 camas beliche, 10 de um lado da sala e 10 do outro, totalizando 40 camas. Do lado esquerdo, onde se entrava, havia uma espécie de banheiro. Sem vaso, apenas um buraco no chão como uma latrina, e um box sem cortinas, com um cano que saía da parede sem chuveiro; a água vinha direto. Havia uma batente que ficava na altura da cintura, dividindo o "banheiro" do resto da cela. Sim! Dava para todo mundo te ver tomando banho e cagando.
Nas grades que davam para o corredor estavam cheias de garrafas PET, umas pequenas, dezenas delas. Aquelas garrafas os carcereiros enchiam de água para a gente beber.
Fui entrando devagar e os outros presos que estavam lá olhavam para nossa cara. Eu sentia que aquele ambiente era hostil, então, como uma manobra de defesa, fiquei para trás dos outros e vi o que rolava.
Os mais velhos que estavam na minha frente começaram a puxar conversa e foram trocando uma ideia, falando seus nomes e de onde eram. Os que já estavam na cela também começaram a falar sobre os crimes que cometeram. Percebi que todos ali estavam na primeira cadeia, e por isso estávamos na triagem ainda, pois estar na cela errada representava um risco para a nossa vida.
Não queria falar sobre isso, mas só querer não seria o suficiente. Quando achei que estava passando batido, um dos antigos falou:
- E você, menor, tá fazendo o que aqui dentro?
- Tráfico de drogas. - Falar isso para mim saiu quase como uma piada. - Me pegaram com quase 15 quilos de pasta base de coca na mochila que eu segurava dentro de um ônibus.
- Mano, pela cara dele não dava nada! E pra qual morro você estava levando? Qual facção?
- Nenhuma, eu estava segurando essa mochila para um rapaz, sou inocente! Ele jogou a culpa em mim!
- Todo mundo aqui é inocente!
- Tô aqui pagando por um crime que não cometi. Minha pena é de 5 anos, com possibilidade de condicional.
- Você sai em 2 ou 3 anos. - Minha barriga revirava.
3 malditos anos, 1.095 dias naquele lugar. Meu estômago revirava. A sensação de quando comecei a pensar nisso era como se eu tivesse tomado uma pedrada na cabeça e um soco na barriga. Corri para o banheiro e comecei a vomitar; meus ouvidos zumbiam. Botei todo o café da manhã para fora e fiquei tonto. Quando fui recuperando a consciência, só ouvi o rapaz gritando:
- Você vai ter que limpar isso!
- Já! - falei, fazendo um sinal de afirmativo com a mão.
A realidade bateu, e bateu forte. Tudo o que eu pensava para ter forças era que tinha que ser forte. Minha primeira atitude foi limpar o que sujei. Perguntei em que cama poderia ficar. Fiquei perto dos banheiros, na beliche de cima. Com o tempo passando ao longo do dia, vi que era o pior lugar que poderia estar. O cheiro era horrível e o calor, péssimo. Durante 11:00 da manhã até 15:00, o calor era infernal. Era janeiro, então o verão estava muito, muito quente.
O cobertor quente fazia sentido ser grosso, pois ele funcionava como um colchão nas camas de concreto, já que à noite ainda era quente para dormir de cobertor. Recebemos quentinhas para o almoço e um copo de suco que só tinha cor; não havia refeitório como nos presídios americanos, como eu acreditava. Pensei que, já que era quentinha, era menos pior. Peguei minha quentinha, sentei em uma cama vazia e abri a comida. Estava praticamente revirada e acredito que meu feijão estava azedo.
Na hora que vi, foi como um chute na moral. Botei a quentinha de lado e pensei na comida da minha mãe; nossa, era deliciosa. Foi ela quem me ensinou a cozinhar.
"Cesar, seja forte!" Abri meus olhos, peguei a quentinha e voltei a comer. Tentei separar tudo que tinha um cheiro aceitável; não queria passar mal e ficar vulnerável ali dentro.
De tarde, começaram a abrir as portas do pavilhão para o pátio. Minha cela pegava o horário das 17:00 às 18:00, o horário mais fresco.
Quando deu por volta de umas 20:00, as luzes foram desligadas e somente a luz da noite clareava a cela. Nessa noite, orei tanto. Não queria morrer, só queria passar por isso.
Acordei de madrugada, assustado. Estava ouvindo alguma coisa; eram passos do meu lado, passando na frente da minha cama, em direção ao banheiro. Entendi que alguém estava indo ao banheiro. Tinha que estar alerta, não sabia quem eram aquelas pessoas... Em seguida, ouvi alguém atrás; então havia duas pessoas no banheiro. Fiquei parado, fingindo que estava dormindo com os olhos cerrados, tentando ouvir e ver o que estava rolando. Ouvi sussurros, pés se arrastando, e em seguida, ouvi um gemido abafado e pensei que alguém podia estar sendo morto na região do banheiro. Nessa hora, comecei a me tremer todo de cima a baixo.
A dor de barriga voltou. Na hora, ouvi um gemido final, um:
- Ahhhhrr. - Isso não parecia som de alguém que estava sendo morto.
Fiquei parado. Em seguida, ouvi o som de passos; passou a primeira silhueta e se deitou, depois a segunda. Não era um assassinato, e sim a porra de um boquete! Não sei se fiquei excitado com a ideia ou assustado.
Os dias foram passando, e no quarto dia que estava ali os carcereiros me avisaram que tinha visita, do meu advogado.
Fui conduzido pelos corredores, passei por vários portões e entrei em uma sala iluminada com luz artificial e ar-condicionado. Nessa hora, senti um alívio para o calor infernal que era. Tinha água gelada na sala em um bebedouro e duas cadeiras. Quando entrei, nem falei com meu advogado, só bebi água gelada, uns 10 copos, que eu devo ter bebido. Depois, sentei e ouvi o que ele tinha para falar.
- Cesar, espero que esteja bem!
- Bem não estou, mas não é pior do que eu imaginava. Ainda estou em uma cela provisória antes de ser mandado para um pavilhão.
- Ótimo. Quanto ao seu processo, vamos recorrer, mas só depois que o jovem que foi preso com você for julgado também.
- Ok.
- Gostaria que eu falasse alguma coisa com seus pais?
- Sim! Não quero que nenhum deles venha me visitar, nunca! Não quero que me vejam aqui.
- Posso passar o recado, mas acredito que, no caso da sua mãe, isso não vai acontecer.
- Esse lugar é vergonhoso, não quero eles aqui.
- Vou tentar convencê-los.
Ficamos conversando mais um pouco e meu advogado me deu as seguintes dicas:
- Você é baixo, não muito forte, não veio de nenhuma favela e não é envolvido com facções criminosas. Fique fora do radar deles e use suas armas, como carisma e educação, para ser respeitado. Não demonstre fraquezas.
- Sim, senhor!
Minha visita acabou. Bebi mais uns copos de água e saí. Enquanto eu voltava, pensava que em breve seria transferido. Logo tinha que pensar em tudo o que meu advogado falou para eu fazer: ficar fora do radar e ser respeitado. Isso era importante porque a cadeia de verdade iria começar.