Um aviso para o amigo Lael: roubei o nome de um personagem de seu conto.
EU ADOREI!
Quando tiver um, vou por esse nome. 🤣🤣🤣
Espero que não se importe.
Beijo,
Da Nanda.
[...]
Na manhã seguinte, me levaram ao Aeroporto de Guarulhos e não pude conter lágrimas ao ver os rostinhos tristes delas se despedindo de mim. Mark, para variar, se fez de forte para me dar o apoio que eu ainda precisava para não desistir de tudo. Para variar, ele carregava o peso do mundo nas costas para nos aliviar. Eu via que ele estava triste, mas também vi que estava orgulhoso de mim! Durante o embarque, no corredor de acesso, enquanto enxergá-los, fiz questão, até mesmo andando de costas. Dentro do avião, com o coração em pedaços, fiquei olhando para o prédio. Tentava vê-los porque sabia que eles tentavam me ver. Fechei meus olhos e busquei suas expressões mais felizes, mas só vi suas lágrimas de nossa despedida. Chorei enquanto o avião decolava. Eu tentava me convencer de que era para o bem de todos eles e depois de um tempo me resignei. Ainda assim, seria um mês terrível sem tê-los perto de mim.
[...]
Quando o avião decolou e eu nem sabia se era o avião da Nanda, as meninas desabaram num choro sentido. Miriam sempre foi mais emotiva e chorava à toa, eu até estava acostumado, mas quando a Maryeva começou a chorar de soluçar, eu me preocupei de fato. Ela sempre foi mais forte e comedida, parecia um Mark de saia, como Nanda dizia. Aquilo me cortou o coração e tive um trabalhão para acalmá-las. Por sorte uma mulher madura, vestida sobriamente com um tailleur, nos viu e se compadeceu delas. Isabel era seu nome. Ela era uma executiva de uma multinacional e começou a conversar com elas para distraí-las. Contou um pouco de sua vida e disse que, por trabalhar fora, podia proporcionar muitas facilidades para seus filhos. Disse também que como mãe, ela não os amava menos por ter que viajar, somente fazia isso porque era parte de seu trabalho:
- Mas o pai já paga todas as contas! - Miriam soltou, surpreendendo a todos.
- Ótimo! - Ela concordou: - Mas não seria melhor se sua mamãe o ajudasse? Talvez ele até pudesse trabalhar menos e ficar mais com vocês.
Miriam arregalou os olhos para ela e depois me encarou, sorridente. Pareceu ter gostado mesmo da ideia daquela mulher. Maryeva já não chorava tanto, mas seu semblante triste era de cortar o coração. A mulher a encarou e disse:
- E você, minha querida, não precisa ter vergonha de chorar. Isso alivia a alma. - Colocou sua mão sobre as dela e continuou: - Você me lembra a mim mesma quando eu era pequena. Sofri muito por guardar minhas dores para mim. Não faça isso.
- Não preciso chorar. Meu pai não chora. - Ela rebateu, inconformada.
- Ele está errado! Chorar não é motivo de vergonha para ninguém, nem mesmo para um homem. - Me encarou com olhar repreensivo e se voltou para ela: - Sabia que isso causa estresse e o estresse pode até matar. Não tenha medo de por pra fora e ensine seu pai a chorar também.
Elas se controlaram e logo Miriam começou a ver os demais aviões que decolavam. Maryeva acabou se distraindo junto da irmã. Tinha que agradecer aquela mulher:
- Obrigado pelas palavras. Ajudaram bastante.
- E você não vai pôr para fora, não é?
- Não tenho tempo para ficar triste. Elas precisam do meu apoio agora. - Rebati enquanto as olhava: - Depois eu me abro com meu travesseiro.
- Primeira vez que sua esposa viaja?
- Para tão longe, sim.
- Muito tempo?
- Quase um mês. É um treinamento para cargo de chefia.
- Entendo… - Colocou uma mão em meu ombro: - Não menti quando disse que guardar dor demais causa estresse e estresse coisa pior. Não precisa chorar comigo, mas chore. Quando fizer isso uma vez, verá como tudo parece melhorar ao seu redor.
- Terapia de choro.
- Mais ou menos isso… - Disse, rindo.
Nos despedimos dela e voltamos para casa. Durante a viagem Maryeva tocou num assunto que me passou desapercebido:
- Pai. Cê viu como aquela mulher te olhou?
- Que mulher, Morzinho?
- Aquela do aeroporto.
- Ela só estava preocupada com vocês. Não comigo.
- Sei não. Vi o jeito que ela passava as mãos na sua costa…
- Impressão sua. Só isso. Eu nem conheço ela…
Ela se resignou e voltou a ler seu livro. Sinceramente eu não havia notado nada de mais e acredito que fosse só impressão ou implicância da Maryeva. Foram poucas as palavras que trocamos e talvez um toque ou outro em meu ombro, nem me lembro dela ter me acariciado depois. Enfim, de qualquer forma, ela não significava nada para mim, nem teria a mínima chance de reencontrá-la.
Chegamos em nossa cidade e, pelo horário e também devido ao cansaço da viagem, decidi dispensar as meninas de irem para a escola. Fomos dar uma volta na chácara de meus pais para elas se distraírem um pouco mais. Minha mãe notou o clima de velório na hora e fez de tudo e mais um pouco para que as meninas não se lembrassem da tristeza. Meu pai veio se ocupar de mim e não poupou palavras de apoio e incentivo:
- Você não deveria estar triste. A Nanda está buscando trabalhar para melhorar ainda mais a vida de vocês. - Falou.
- Não estou triste por isso. Fiquei triste de ver as meninas chorarem quando ela se foi.
- E nem quis chorar um pouquinho?
- Pai, o senhor já é o segundo hoje a me falar que eu tenho que chorar. Já imaginou a cena se eu também tivesse chorado no aeroporto com as meninas? Elas precisavam de apoio, não de um coro.
- Bem, se quiser conversar sobre qualquer coisa, sabe que pode me procurar, não sabe?
- Sei, claro.
Nesse momento, minha mãe nos chamou para tomar um café com bolo de fubá, feito com um fubá caipira que meu pai ganhou de um amigo que tinha uma pequena moenda de pedra em casa. Delicioso! Não havia outra palavra para aquele bolinho ali. Dava vontade de comer de joelhos de tão bom. Decidimos passar a tarde no sítio, colocando a mão na terra, cuidando de animais, ajudando a limpar o terreiro, colhendo laranjas e tudo ajudou a melhorar o humor das meninas.
Por volta das três e meia da tarde, Nanda nos fez uma chamada de vídeo para contar que havia chegado bem em Manaus. Após uma briga inicial entre as meninas para verem quem falaria com a mãe, Miriam ganhou uma disputa de par ou ímpar:
- Pai, ela me roubou! - Maryeva xingava, contrariada: - Essa filha da pu…
- Nããão! Não termina a frase. - A interrompi: - É rapidinho, Morzinho. Aguenta aí.
Na verdade a caçula havia roubado mesmo! A filha da mãe esperou o último segundo para mostrar seus dedos já prevendo o resultado. Não foi honesto, mas a esperteza dela chegava a me assustar, beirava quase a malandragem. Eu precisava inclusive conversar com a Nanda para corrigirmos ela antes que fosse tarde. Depois de uns dez minutos, impus que terminasse a ligação para Maryeva também conversar:
- Termina agora, Morzico. Sua irmã quer falar.
Ela se despediu e, com os olhos marejados, entregou o celular para Maryeva. Esta, por mais brava, pareceu até se compadecer da irmã e lhe deu um abraço que surpreendeu a todos nós na casa. Depois passou a conversar com a Nanda e ficaram papeando um tempo também. Maryeva, mais prática e menos sentimental, ou querendo se fazer de forte, logo terminou sua ligação e veio me entregar o celular, sem nem me olhar nos olhos, dizendo que iria brincar com os gatos no terreiro. Eu sabia que estava triste também, mas não queria assumir na frente de todos. Era minha vez de falar com minha morena:
- E aí, morena!? Demorou pra ligar.
- Cheguei agora há pouco. Não foi direto. Fizemos uma conexão em Brasília.
- E qual a primeira impressão do lugar?
- Você ia gostar e odiar. Tudo muito verde, bonito. Aliás, tudo remete a cultura indígena e você bisneto de índia iria se esbaldar por aqui.
- E por que eu iria odiar, então?
- É o calor do inferno, Mor! Tô derretendo aqui… - Resmungava, sorrindo: - E olha que estou no ar condicionado.
- Hoje você não vai ter treinamento, né!?
- Não. Só um jantar de boas vindas, mas nada formal. Pelo menos me disseram que não. Preciso confirmar isso depois…
- Meu pais estão te mandando um beijo. - Falei e mostrei os dois sentados na mesa que acenaram para ela.
- Manda outro para eles.
Nos despedimos logo depois. Ela naturalmente chorosa do outro lado do país, ainda me avisou que me ligaria mais à noite para conversarmos a sós. “Sexo! Até que enfim. Virtual, mas sexo…”, pensei comigo mesmo. Eu e as meninas voltamos no começo da noite para casa, já jantados de um delicioso franguinho caipira ensopado e polenta de fubá mimoso. Elas tomaram banho e foram assistir televisão. Até antes do horário de costume, vencidas pelo cansaço, foram se deitar. Pouco depois das onze e meia, Nanda me fez outra chamada de vídeo:
- Oi, Mor.
- Oi, Morena. Já está com saudades?
- Muita!
- Pensei que seu jantar fosse informal. - Falei ao vê-la maquiada.
- Não me impede de dar um tapa no “visu”, né!? - Respondeu.
Aproveitou e se mostrou toda para mim. Usava um vestido casual, florido, perfeito para a ocasião e local, cabelos presos apenas por uma espécie de tiara com uma grande flor lateral, sandália de meio salto:
- Está linda! - Falei: - Só falta saber se a lingerie combinou.
- Que lingerie? - Ela rebateu, sorrindo maliciosamente.
- Você não presta mesmo… - Respondi, rindo.
- E, ó… - Ergueu sua perna direita, mostrando estar sem sua tornozeleira e deu para ver quase seu útero pelo celular: - Aprontei mais uma e sem tornozeleira hoje.
- Meu Deus…
- O quê?
- Não era mais fácil ter abaixado o celular? Ou você queria fazer questão de me mostrar sua boceta?
Ela começou a rir da gafe e agora fez questão de tirar o vestido para se mostrar inteira para mim. Depois de se exibir, voltou a falar:
- Não era essa a intenção, mas já que você tocou no assunto, né…
- Mas, e aí? Aprontou o quê? Já andou pegando alguém daí?
- Não, né, Mor. Sou uma mulher casada, séria… - Começou a rir e rapidinho voltou a falar: - Então… Fomos ao jantar, uma espécie de luau, e pensei que só com funcionários da empresa, diretores, supervisores e o Paulo, mas nada. Chegamos lá e nos deram colares havaianos numa floresta amazônica, mas enfim... Para as mulheres ainda essa tiarinha com a flor. Eu, destra, coloquei a flor do lado direito, é lógico, não é!? - Me perguntou.
- É, uai! Por que?
- Porque na cultura havaiana, mulheres com a flor do lado esquerdo estão comprometidas e do lado direito estão “procurando”. Levei várias cantadas e já estava começando a ficar até chateada quando uma moça, contratada para o evento, me explicou o significado das flores na cabeça. Eu olhei encabulada para um grupo que estava me encarando, tirei a tiara e a virei para o lado esquerdo. - Completou gargalhando: - Cheguei até a ouvir um “Ahhhh!” de lamento do Paulo e do Gonzaga que passavam do meu lado. Aí fui obrigada a mostrar minha aliança e reafirmar que era casada. Daí por diante a paz reinou…
- Nanda sendo Nanda, não é? - Falei, rindo de sua história.
- Pois é… Eu sendo eu. - Gargalhava gostoso.
- Impressão minha ou você está triste. Uma carinha triste…
- Acho que estou cansada. - Ela tentou despistar mas se entregou: - Triste também. Estou longe de vocês. Não vai ser fácil aguentar…
- Aguentar de saudades ou de falta de sexo?
- De saudades, lógico! Sexo é só fazer isso. - Estalou os dedos: - E eu arrumo homem. Duvida!?
- Juízo, mulher! Aproveite bastante sua estada aí, mas cuidado para não se queimar na empresa.
- Eu sei, Mor. Estou brincando. - Falou, bocejando para mim: - E você, como está aí?
- A gente dá conta, Nanda!
- Não falei de vocês. Perguntei de você!
- Estou bem. Fica tranquila.
- Vai se guardar para mim?
Eu não gostei da pergunta e a encarei a sério. Não me parecia justo tê-la liberado, reafirmado diversas, até saber que ela já havia tido um encontro sem mim e ela agora querer me limitar. Estava pronto para confrontá-la sobre igualdade de direito, coisa que eu entendo bem, quando ela própria se adiantou:
- Estou brincando, bobo! Não sei como você faria aí, mas, se por acaso tiver chance, aproveite também. Só tome cuidado porque a língua do povo aí é feroz, né!?
- Estou tranquilo, Nanda. - Respondi até que surpreso: - Se surgir alguma coisa, eu te aviso e...
- Me avisar!? Não mesmo! Eu ainda não tenho essa segurança toda. - Me interrompeu, encarando a tela do celular e falando sério: - Se surgir e for seguro para você e nossa família, aproveite, mas não me conte nada. Nem sei se quero saber. Não sei! Vou pensar... Quando eu voltar, te falo se quero saber ou não.
- Você sabe que eu…
- Eu sei! - Me interrompeu novamente: - Eu sei que você gosta de ouvir, de ver, mas eu não sei se estou pronta para ouvir ainda. Quando a gente está junto, eu me envolvo e acaba sendo natural. Eu… Sei lá! Estou falando por mim! Quando eu voltar te conto o que aprontei, em detalhes.
Eu sorri com a confirmação, agora explícita, de que ela tinha aprontado. Ela continuou:
- Aliás, não sei se vou te contar. Só se fizer por merecer…
- Safada!
- Sou mesmo! Você que me deixou assim.
- Só me conta uma coisa. - Pedi encarando o celular: - Foi bom para você? Você aproveitou?
Ela se silenciou por um momento, me encarando pela tela do celular. Parecia escolher as palavras e soltou:
- Foi bom, gostoso, mas sinceramente você dá de dez a zero nele. Não sei se é por nosso tempo junto, mas você sabe onde pôr a mão e faz do jeitinho que eu gosto. Acho que valeu pela diversão...
Sorri pela massageada no meu ego. Ficamos papeando por mais algum tempo e depois nos despedimos com juras de amor. Não fizemos sexo virtual naquela noite porque ambos estavam cansados da correria e das emoções do dia. Sei que fui dormir quase a uma da madrugada e literalmente desmontei na cama.
[...]
Eu sabia que a viagem seria longa, mas nunca imaginei que fosse ficar mais de seis horas presa dentro do avião. Por ser classe econômica, era por demais apertado. Não que eu seja grande a ponto de ter ficado desconfortável, mas esticar as pernas era quase impossível. Por sorte, Aline também estava no mesmo voo que eu e me fez companhia. Aliás, graças a ela eu não fui chorando de São Paulo a Manaus. Quando ela me viu naquele estado lastimável, começou a conversar comigo e foi de grande ajuda, pois acabou me acalmando, me convencendo de que eu estava fazendo o melhor para eles.
Após quase duas horas de voo, descemos em Brasília. Sempre tive vontade de conhecer a capital nacional, mas nunca tive oportunidade. O Mark, certa vez, fez um concurso ali e disse que a cidade é linda, diferente de tudo o que ele já conheceu. Eu estava curiosa, mas infelizmente não teria chance, porque nem desceria do avião apesar de termos que ficar quase trinta minutos parados, cozinhando... Só pude vê-la ao chegar e ao sair, e quase não reconheci nada de minha posição. Enfim, essa visita ficaria para uma outra oportunidade.
Decolamos novamente e depois de pouco mais de três horas, cheguei ao meu destino. Manaus é uma cidade bastante diferente do que se espera. Eu imaginava encontrar árvores e mais árvores, lindos índios e micos por todos os lados. Que nada! Manaus deixou de ser pacata há muito tempo. Depois da criação da zona franca, ela passou por uma imensa urbanização. É uma cidade como todas as outras. Ok, ela tem mais árvores que as demais, mas já não tem aquele jeitão de cidade do interior. Um trânsito carregado e aparentando falta de planejamento viário custou um bom tempo do aeroporto até nosso hotel. Nem bem cheguei e liguei para o Mark, pois queria notícias dele e de minhas filhas. Conversamos um bom tempo e depois nos despedimos porque eu queria cochilar antes do jantar de boas vindas da empresa.
Acordei uma hora antes de nossa saída para o evento e liguei para Aline para confirmar nosso traje: informal. Ótimo! Tomei um refrescante banho e coloquei um vestido branco florido que acentua bem minhas curvas, mas não ofende a visão dos mais conservadores, pois possui um decote discreto e um tamanho aceitável para seus padrões, pouco acima dos joelhos. Fiz uma maquiagem leve e coloquei um sapato de meio salto. A calcinha matava minha produção, pois marcava demais. Tirei! Decidi ir com os cabelos soltos, apesar do calor, para me destacar levemente na multidão. Um brinco médio dourado e minha correntinha das meninas e lá fui eu para o saguão. Ivan, Irani e Verônica já estavam aguardando e me juntei a eles. Logo, Aline, Gonzaga chegaram e os demais vieram quase que em seguida. Todos presentes, entramos em vans e fomos ao local onde seria realizado o evento.
Eu esperava um jantar, mas, usando toda uma temática local, que mais me parecia havaiana, fizeram uma espécie de luau. Já na entrada recebemos colares de flores e as mulheres também tiaras com grandes flores na lateral. Eu coloquei a minha virada para a direita. Sou destra e achei supernatural isso. Algumas seguiram minha moda e outras à esquerda. Estranhei porque havia muito mais pessoas que aquelas que fizeram o treinamento em São Paulo. Depois fui saber que era um jantar temático e havia todo tipo de gente: turistas, locais, treineiros, etc. Havia uma imensa mesa com comidas, bebidas, batidinhas, tudo do bom e do melhor, bem como havia uma mesa reservada para nosso grupo, mas ninguém se sentou. Paulo nos reuniu num canto e fez uma saudação a todos, nos liberando para aproveitarmos a noite. Alguns grupos se formaram para circular pelo local. Eu comecei a andar por aqui e por ali com a Aline.
Ela estava belíssima num vestido também floral de estilo oriental que combinava muito com sua origem. Chamava a atenção de longe. Chamou até a minha e eu não sou lésbica. Pelo menos, acho que não… Não completamente, sei lá. Comecei a me sentir vigiada por onde passava. Logo, começamos, eu e Aline, a receber cantadas de diversos homens naquele evento. De algumas mulheres também, confesso. Estranhei aquilo. Fomos conversar com Verônica e Sandra, outra treineira, e elas confirmaram o mesmo. Eu não estava à caça, então aquilo me incomodou. Pessoalmente, também não vi nenhum homem bonito, salvo um turista alemão que não era exatamente bonito, mas diferente, ninguém me chamou a atenção. Depois de um tempo eu já pensava em ir embora, chateada com a perseguição, até que, num momento em que estava saindo do banheiro, uma moça bonita que trabalhava no evento me perguntou porque eu usava a flor do lado direito se era casada. Só então fui saber do significado das flores na cabeça. Olhei para o lado e um grupo me encarava claramente interessado em fazer “maldade”, mas foi só eu tirar a tiara e inverter o lado da flor para a paz reinar comigo pelo resto da noite.
Procurei as meninas e expliquei a história das flores, mas a única comprometida éramos eu e Cíntia, outra treineira. Verônica ainda me perguntou porque eu havia invertido a flor de posição, já que, em São Paulo, havia sido paquerada pelo “moreno bonitão do shopping”:
- Aff, Nanda! Que homem era aquele? Você pegou, não pegou? Se não quiser, passa pra mim! - Falou e caiu na risada, já alterada por várias batidinhas bebidas naquela noite.
- Para, Verônica. Ele é só um amigo. - Respondi.
- Pau amigo, você quer dizer, né!?
Fiquei vermelha e saí de perto para não continuar com aquela conversa. Ela já estava pra lá de Bagdá e eu não queria me comprometer ainda mais. Por volta das dez e meia, alguns começaram a demonstrar sinais de cansaço, inclusive eu. Combinamos de voltar mais cedo e usamos uma das vans.
Já no hotel, liguei para o Mark e ficamos conversando um tempão. Contei inclusive de minha peripécia com as flores e ele riu pra valer. Nem querendo parecer séria, eu conseguia. Ficamos mais de hora no telefone e descontando uma leve exibida que dei para ele, não rolou nada de sexual. Acho, aliás, sei que estávamos ambos cansados pela correria e emoções do dia. Depois de um tempo, nos despedimos, reafirmando nosso amor e fui tomar um banho para me deitar. Mesmo com o ar condicionado ligado, estava quente e decidi dormir nua. “Pelo menos, não tem pernilongo.”, pensei, enquanto olhava tudo ao meu redor.
De repente me lembrei que nem havia me despedido do Rick e achei errado da minha parte depois de tudo o que havia acontecido entre nós. Mandei algumas mensagens para o ZAP dele:
Eu - “Oi, Rick.”
Eu - “Desculpa não ter me despedido de você ontem, mas estava perdida com o risco da minha família me flagrar com outro.”
Eu - “Ainda assim, não fui justa com você.”
Eu - “Juro que não foi minha intenção te magoar.”
Eu - “Espero que possa me perdoar.”
Eu - “Fica bem.”
Eu - “💋💋!!”
A mensagem foi entregue no ato, mas ele não a visualizou. Coloquei meu celular para carregar no criado e me deitei na cama. Logo, o som de notificação de mensagem começou a bipar em meu celular. Olhei para a tela e Rick estava me enviando várias. Pelo horário, decidi não ver, nem responder. Silenciei meu celular e me entreguei a uma merecida noite de sono.
[...]
No outro dia de manhã, minha filha acordou com o barulho do despertador do celular que estava ao meu lado e que eu não ouvi. O cansaço havia me nocauteado mesmo! Me levantei, chamado por ela, e preparei o café da manhã delas. Depois de tomá-lo, nos arrumarmos e as levei para a escola. Encontrei com Laura e ela partiu para um ataque direto contra minhas posições:
- Poxa, Mark. Nanda não tá aí, mas… - Dizia, simulando estar constrangida: - Mas a gente tá, né!?
- É. Nós claramente estamos, Laura. - Falei e indiquei uma posição atrás dela, falando baixo: - Nós e várias mães de alunos nos olhando.
Ela deu uma olhadela por sobre o ombro e confirmou minhas palavras. Então, mudou seus trejeitos e, engrossando o tom da voz, falou:
- Pois, então, doutor Mark. Posso passar ainda hoje no seu escritório?
Pego de surpresa com sua mudança de postura, minha vontade foi de rir de seu jeito, mas me contive e segurei firme a risada. Ela me olhava querendo rir também. Respondi naturalmente:
- Será um prazer atendê-la, Laura, mas infelizmente não estarei disponível hoje, nem amanhã. Ligue para minha secretária e ela agendará um horário para você, ok?
- Ligo, sim. - Respondeu, fazendo um bico de inconformidade com minha resposta, mas se inclinando em minha direção, cochichou: - Quero dar pra você, caralho!
- Eu sei! - Respondi, simulando seriedade: - Por isso precisamos conversar com muita calma depois. É um assunto muito sério.
- Tudo bem, doutor. Eu te procuro. - Disse e me estendeu a mão.
Apertei sua mão e nos despedimos à distância, como dois “manos”. Fui para o escritório, rindo sozinho no carro. O dia transcorreu sem nenhuma novidade. Nanda nos ligava sempre à noite para matar as saudades das meninas. Depois bem mais tarde me ligava para namorarmos à distância. Fez isso todos os dias da semana e na quarta-feira, a indaguei:
- Não parece muito interessada em aproveitar, se é que me entende… - Pisquei um olho para ela: - A sua estada aí, Nanda.
- Ah, Mor, estou focada. Quero só fazer meu treinamento e voltar logo para casa.
- Ora, ora, ora… Mas que mulher mais prendada, querendo voltar para sua família.
- Tô mesmo! Cê não imagina o tamanho da saudade que tá no meu peito. - Disse e tirou a parte de cima de seu babydoll, apontando para o meio dos seios: - Ó! Bem aqui, sabe…
Fizemos um sexo virtual bem safado. Ela havia comprado, não sei onde, um consolo de tamanho normal, bem próximo do de meu pau e se acabou com ele na ligação para eu assistir. Até no cuzinho ela o enfiou. Depois nos despedimos porque ela queria descansar para o dia seguinte e fiquei na cama pensando o porquê dela não querer aproveitar a liberdade e as chances que ela estava tendo. Acabei não chegando a conclusão alguma, mas, se para ela estava bem assim, quem seria eu para criticá-la.
No outro dia de manhã, tudo normal novamente, café da manhã, escola, trabalho, almoço, escola, trabalho e, no final da tarde, após buscar minhas filhas, fomos juntos ao supermercado comprar alguns mantimentos que haviam acabado. Minhas filhas haviam saído para pegar um refrigerante e salgadinho, enquanto eu fiquei comparando os preços do arroz. Nesse momento, comigo distraído, duas mãos tamparam meus olhos:
- Adivinha quem sou eu? - Uma voz feminina falou.
Já sabia que não era da minha cidade. Aqui costumamos falar “Adivinha quem é?”. Coloquei minhas mãos sobre as dela e senti duas mãos suaves, com dedos longos e unhas compridas. Usava alguns anéis discretos:
- Poxa. Tá difícil! Dá uma pista? - Pedi.
- A gente não se vê há uns quinze anos, mas parece que foi ontem… - Praticamente sussurrou no meu ouvido.
Me arrepiei na hora e reconheci uma voz que nunca mais imaginei que iria ouvir:
- Iara!?
Ela me soltou e se colocou à minha frente, comemorando:
- Oi, Má. Que bom que não me esqueceu!
Me abraçou forte pelo pescoço e eu, sem reação, a abracei e dei dois tapinhas nas costas, bem “mano” mesmo. A surpresa me causou um baque. Iara estava ainda mais bonita. Morena da pele cor de jambo, ela foi minha penúltima namorada antes de Nanda ocupar todos os espaços em minha vida. Estava mais madura, é verdade, mas seu sorriso e seus longos cabelos cacheados se mantinham os mesmos. Ela usava sapatos de salto alto, fazendo com que ficasse ainda mais alta que eu:
- Há quanto tempo, Má? - Se corrigiu na sequência, rindo e fingindo ajeitar minha gravata: - Doutor Mark, desculpa. Ai, que chique!
- Já faz um tempinho, né, Iara.
- Credo! Iara?
- Você mudou de nome?
Ela sorriu, me cobrando com o olhar o nome carinhoso pelo qual eu a chamava em nosso namoro, mas me mantive sério, principalmente porque minhas filhas estavam se aproximando:
- Olha pai. - Miriam me mostrava um pacotão de salgadinho que imitava pururuca quase do tamanho dela: - Posso levar? Vai dar pro mês.
- Ahã! - Respondi, sem nem pensar.
Maryeva se aproximava também com dois refrigerantes na mão e os mesmos olhos inquisidores da Nanda. “Fica mais parecida com a mãe a cada dia!”, pensei e sorri para mim:
- Meninas, esta aqui é a Iara, uma grande amiga do papai. - Falei, tentando minimizar eventuais danos.
- Oi, gatinha, quem é você? - Perguntou para a Miriam.
- Oi, moça. Sou a Miriam. Que cabelão cê tem, hein? Deve gastar xampu pra caramba…
- Cê nem imagina, meu amor. - Respondeu Iara, sorrindo e lhe fazendo um afago para logo depois se virar para Maryeva: - E essa moça bonita. Quem é?
Maryeva a fuzilou com o olhar. Depois a olhou de baixo a cima, me olhou por um segundo, espremendo os olhos e só depois respondeu:
- Sou a Maryeva! - E se virou para mim: - Pai, já tá tarde. Vamos embora?
Era a Nanda! Eu vi a Nanda na minha filha naquele momento. O mesmo bico inconformado, o mesmo olhar de raivinha, os mesmos trejeitos de ciúme. Acabei colocando a mão sobre a boca, surpreso e sorri para mim mesmo frente aquele xerox da minha digníssima. Iara ficou meio constrangida pelo gelo que a Maryeva lhe deu, mas deve ter imaginado ser ciúmes do pai:
- Meninas, que tal uma pizza também? Podem escolher. - Falei.
Miriam adorou. Maryeva me encarava ainda com um olhar “nandiano”, mas acabou se rendendo aos apelos da irmã para irem escolher o sabor:
- Vamos pegar duas! - Maryeva decretou: - Hoje eu quero me afogar no queijo!
Dito isso, se foram. Comecei a rir de sua última frase e Iara me encarava sem nada entender. Eu as olhava enquanto se afastavam, Iara as olhava também e falou em seguida:
- Nossa! Que menina brava.
- Puxou a mãe. - Respondi de imediato e me corrigi: - Mas extremamente justa.
- Claro! - Me encarando, agora se insinuou: - E eu estou convidada para a noite da pizza?
- Iara, minha esposa está viajando, senão seria um prazer convidá-la, mas hoje acho que…
- Já entendi, Má. Hoje é papai e filhinhas! Não precisa se justificar. - Me interrompeu, sorrindo enquanto olhava uma prateleira, mas se voltou rapidamente em minha direção: - Você disse que sua esposa está viajando?
- Viagem de trabalho.
- Mesmo!? Chato isso, né? Depois de um tempo, a gente acaba ficando tão carente, não fica? - Falou me encarando de uma forma nada pudica.
Sorri, meio encabulado para ela. Peguei o primeiro pacote de arroz que minha mão alcançou e coloquei no carrinho de compras. Nesse momento, os tios da Iara se aproximaram. Marquinhos era meu primo e um grande amigo apesar de morar longe. Já sua esposa, Maria, era uma mulher madura que, por coincidência, havia nascido no mesmo dia e mês que eu, então sempre nos demos super bem, tanto que eu cheguei a confidenciar alguns segredos no passado. Ficamos conversando algumas amenidades e Iara fazia questão de sempre estar ao meu lado, me tocando no braço ou ombro, marcando terreno. Maria notou e me deu um sorriso cúmplice depois de olhar para a sobrinha. Depois de um tempo, minhas filhas voltaram trazendo duas pizzas Jumbo, imensas nas mãos:
- Mas o que é isso!? Vocês estão loucas? - Perguntei assombrado com o tamanho das pizzas: - Isso é comida para um batalhão!
Elas riram e me ignoraram, indo colocá-las no carrinho. Apresentei minhas filhas para Maria e Marquinhos, aliás, reapresentei porque eles já as conheciam e Maria fez questão de falar com a Iara, dando uma baita indireta:
- Que meninas lindas, não acha, Iara? Não são a cara do pai?
- São sim, tia.
- Que família mais linda, Mark! - Falou comigo e depois novamente olhou para a Iara: - Feliz quem não tem medo de assumir suas escolhas, não é!?
Iara a olhou inconformada, mas em silêncio. Agora, acompanhados dos tios, eu até poderia convidar todos eles para a noite da pizza e assim fiz por educação, mas eles agradeceram e recusaram o convite, mesmo Iara lhes lançando um olhar de súplica:
- Hoje não, Iara. Mamãe está em casa e prometemos fazer lasanha para ela. Lembra? - Maria a encarou, cobrando.
- Lembro, tia! - Iara falou, contrariada.
Depois de um tempo, nos despedimos e fomos cada qual para um lado do supermercado. Paguei nossos produtos e voltamos para casa. Depois de descarregarmos as compras e Miriam entrar para o banho, Maryeva metralhou:
- Por que aquela safada tava te paquerando?
- O que é isso, Morzinho!? - Falei, rindo de sua cara.
- Não me enrola, pai! Eu vi a cara dela.
- Se ela estava me paquerando, nem notei. - Tentei tranquilizá-la: - Ela é só uma amiga antiga.
- Amiga. Tá! Sei… - Respondeu ainda brava, mas indo até o sofá se sentar.
Sua zanga só foi passar ao comer dois ou três belos pedaços de uma das pizzas. Logo depois Nanda ligou e, por sorte minha, não comentaram nada com ela. No final da noite, em nossa sessão privé, Nanda, cobra criada, perguntou:
- Por que a Maryeva estava invocada?
- Impressão sua…
- Maaaark! - Frisou bem meu nome e o arrepio foi inevitável: - O que você andou aprontando?
- Nada, Nanda! Só encontrei, aliás, fui encontrado por uma antiga conhecida e a Maryeva invocou com ela.
- Sei… - Ela respondeu, me encarando pelo celular como se quisesse enxergar minha alma: - Quem? Eu conheço?
- Você não conhece.
- Quem?
Eu engoli seco porque sabia que uma discussão iria se iniciar, mas como nunca fui adepto de mentiras, respondi:
- A Iara, Nanda. - Respondi, baixinho.
- Iara. Iara… Que Iara? - Ela começou a pensar com o dedo indicador na boca e, arregalando os olhos em seguida, gritou: - A Iara! Sua ex?
- É.
- Mas o que essa biscate tá fazendo aí? Ela não mora em São Paulo?
- Que eu saiba sim. Acho que está passando uns dias na chácara do Marquinhos e da Maria. Eles também estavam lá.
- Puta que pariu, Mor! E eu tô aqui no cu do mundo sem poder me defender?
- Nanda, a gente só se encontrou no supermercado. Não tem nada com que se preocupar. Além disso, estava lá com as meninas e estou com elas aqui agora…
Ela pareceu aceitar minha explicação e ficou mais calma. Um pouco mais calma, mas ainda assim quis me punir, não brincando no virtual comigo:
- Poxa, Nanda! Não fiz nada. - Tentei me justificar.
- Pois é… Eu sei. Você é um amor, Mark. Inocente, tímido, sério… - Bocejou em seguida: - Bem, deixa pra lá. Eu estou mesmo precisando dormir.
Dito isso, começou a tirar a camisolinha curta que usava para exigir uma linda lingerie transparente, falando em seguida:
- Tá muito quente aqui. Acho que vou dormir pelada hoje.
Tirou sua lingerie e se espreguiçou toda manhosa na frente do celular para se exibir para o tonto aqui:
- Ah, Nanda! Poxa… Brincar!? Só um pouquinho… - Implorei.
- Amanhã a gente brinca, Mor. Tchau, tchau. - Disse, mandando um beijo e desligando o aparelho.
“Filha da puta! Cobra, traiçoeira!”, comecei a xingá-la, rindo de toda a situação. Acho que eu ria de nervoso, pois estava com o pau em riste, louco para bater umazinha em homenagem àquela mulher, mas queria que fosse às suas vistas. Logo, ouvi o som de uma notificação:
Ela - “Isso é para aprender a não fazer arte longe de mim!”
Ela - “😜”
Ela - “Eu te amo, seu bobo!”
Ela - “😁”
Eu estava bravo. Excitado também, mas bravo. Decidi mandar uma foto do meu pau duro para ela e uma mensagem em seguida:
Eu - “Olha isso, sua covarde!”
Ela - “🤤😜”
Ela - “Adoro!”
Me mandou em seguida três fotos da própria boceta: uma dela apenas, outra já a abrindo e outra dando a entender que alisava o clítoris. Ficamos nessa de nos desafiar e mandar fotos por um bom tempo. Ao final, gozei e lhe mostrei o que estava perdendo. Ela, por sua vez, mandou outra dela toda melada, dando a entender que tinha gozado também. Continuamos nos desafiando:
Eu - “Teimosa!”
Ela - “Cabeçudo!”
Eu - “Chata!”
Ela - “Bobo!”
Eu - “Safada!”
Ela - “Chifrudo!”
A última mensagem me pegou de surpresa, porque fui pego desprevenido. Fiquei um tempo sem responder e ela mesmo tomou a iniciativa, me ligando:
- Mor? Desculpa.
- Porra, Nanda! É isso que você pensa de mim?
Na verdade, eu quis me fazer de vítima. Naturalmente não me importava com isso, porque eu sabia que não havia traição no consentimento, mas ainda assim quis judiar um pouco dela:
- Ah, Mor, claro que não. Nem sei porque eu disse isso. Me desculpa!
- Você andou aprontando de novo?
- Não! Nada mesmo. Me perdoa, vai?
- Sou chifrudo, não é? Fica tranquila. Vou empatar o placar.
- Mor, por favor…
- Por favor, o quê? - A interrompi.
- Poxa… Pelo amor de Deus, me desculpa! Não falei por mal. Eu sei, e você também, que você não é corno. Não faz assim… - Começou a choramingar.
Fiquei em silêncio curtindo minha vingancinha contra a Nanda e ela voltou a insistir:
- Mor!? Fala comigo.
- Estou brincando com você, sua boba! - Comecei a gargalhar.
Nem sei quanto tempo fiquei rindo, mas ela se calou do outro lado da ligação e só voltou a falar quando eu me controlei:
- Palhaço! - Começou a rir também.
- Sério agora. - Falei: - Cuidado com as palavras! Eu não me considero chifrudo ou corno, mas dependendo da sua entonação, daria a entender que a intenção era me ofender e aí a situação poderia mesmo ficar chata.
- Eu sei, Mor. Desculpa.
- Tá tudo bem. Relaxa.
Acabamos nos entendendo e depois de conversar mais um pouco, nos despedimos aos beijos e juras de amor. Fui dormir em seguida na esperança de que os dias passassem rápido para eu ter minha esposa novamente ao meu lado.
[...]
- Filha da puta! - Xinguei alto em meu quarto para quem quisesse ouvir: - O que essa biscate foi fazer na minha cidade? Será que não tem homem em São Paulo pra comer essa piranha!?
Eu estava irada. Não podia culpar o Mark, é óbvio. Entretanto, não podia deixar de sentir uma raiva imensa por ela estar na minha cidade e eu não poder estar lá para defender o que é meu! O meu, meu, meu homem! O fato de eu deixá-lo solto, não queria dizer que ele poderia colocar o pau em qualquer buraco. Quando o Mark me contou que ela estava lá, minha vontade foi de dizer um imenso e sonoro “Não!” para ele. Não queria mesmo que ele sequer cogitasse a possibilidade de transar com sua ex namorada, mas me controlei porque não queria passar a imagem de imatura, de ciumenta:
- Sou ciumenta, sim! Desgraça de mulher. - Gritei novamente para ninguém.
Eu realmente não conhecia essa tal Iara, mas minha sogra, certa vez comentou que ela era uma mulher linda, alta e com a pele da cor do pecado que o Mark tanto admira. Eu andava de um lado para o outro no quarto, inconformada com isso, mas não podia fazer nada a não ser confiar no meu marido:
- Ele me ama! Ele não faria isso comigo, né!? Claro que não!
Eu tremia de raiva ou medo e decidi tomar um banho gelado para tentar me acalmar. Não adiantou. Além de brava, agora estava com frio. Deitei na cama e ela parecia uma esteira de pregos me perfurando a alma. Voltei a andar pelo quarto e decidi tomar algo para tentar relaxar. "Funciona nos filmes!", tentei me convencer. No frigobar só havia água, refrigerante, cerveja e umas garrafinhas de uísque e vodka:
- Mark diz que uísque lhe dá “apagão”, então vou de vodka. - Olhei para a garrafinha: - Melhor uísque para já ir esquecendo do meu quase futuro chifre.
Abri uma garrafinha e virei num copo e do copo, de uma vez, para minha goela:
- Putz! Que coisa ruim! Não sei como ele consegue beber isso.
Ainda inconformada, voltei a andar pelo quarto e depois de um tempo minha linhas retas começaram a fazer umas curvas. Acho que a bebida começou a fazer efeito. Aliás, subiu forte e rápida, me fazendo sentar na beirada da cama. Não aconselho ninguém a beber para se acalmar, mas até que funciona. Pouco depois, me deitei mais confortavelmente e me senti mais confiante que nunca. De alguma forma, minhas ideias se aclararam e vi que não tinha motivo algum para duvidar do amor do Mark por mim. Passamos por tantas coisas e mesmo assim ele sempre esteve ao meu lado, me apoiando, me amando, me protegendo... Eu não precisava temer nada, nem ninguém! Decidi mostrar isso para ele:
Eu - “Mor, se você achar que não tem risco algum de ter uma queda pela Iara, eu deixo você ficar com ela.”
Eu - “Aliás, direitos iguais, né!? Se você me liberou de pedir ou avisar, você também pode.”
Eu - “Promete só que volta pra mim?”
Eu - “EU TE AMO DEMAIS!!!”
Eu - “💋💋💋💋💋”
Eu - “💖💖💖💖💖”
Imaginei que fosse receber aquela declaração de amor tão bonita que só ele sabe fazer. Já me imaginava no paraíso cercada por lindas palavras que, mais que o coração, tocam a alma. Meu Mark é mestre nisso! Quando quer, escreve os textos mais lindos. Em nossa época de namoro e noivado, até poesias escrevia para mim! Não sei porquê não as publicou até hoje. Preciso conversar sobre isso com ele. As mensagens foram enviadas e recebidas, mas não foram lidas. Mandei outras:
Eu - “Grosso!”
Eu - “Nem pra me responder…”
Eu - “😁”
Eu - “Durma bem, meu amor!”
Com a sensação de dever cumprido, me deitei e apaguei em minutos, segundos acredito. Dormi o verdadeiro sono dos justos, tranquilo, leve, despreocupado. No dia seguinte, acordei cedo e me preparei para mais um dia de intensos treinamentos. Antes de descer para meu café da manhã, dei uma olhada no celular e comecei a rir das mensagens que troquei com o Mark. Quando cheguei nas últimas e vi o que eu havia escrito, comecei a me xingar de idiota para pior. Não acreditei que eu mesma havia lhe mandando aquela autorização expressa para ele ficar com sua ex:
- Burra! Burra! Burra! - Falava sem parar.
No final da conversa, ele já havia lido e respondido:
Ele - “🙄”
Ele - “🤔💭”
Ele - “A gente só se encontrou, e sem querer, no supermercado.”
Ele - “Não sei se tem chance de alguma coisa acontecer.”
Ele - “Se eventualmente acontecer alguma coisa, e não estou dizendo que vai, não terá nenhum sentimento envolvido.”
Ele - “Se eu quisesse ter ficado com a Iara, eu teria.”
Ele - “Não quis antes, não quero agora.”
Ele - “Aliás, no meu coração só tem espaço para uma e já está ocupado por uma morena espaçosa que se esparramou de pernas e braços abertos!”
Ele - “😉”
Ele - “Para de ser boba: EU TE AMO!”
Ele - “Beijão!”
Ele - “Agora… VAI TRABALHAR!”
Ele - “🤣🤣🤣”
Comecei a rir de nervoso pela minha liberação meio inconsciente e xinguei aquela garrafinha de uísque. "Traidora! Era para eu ter esquecido da dor, não autorizá-la a prestação.", xinguei mentalmente. Depois fiquei feliz pela declaração dele pra mim. Desci para o restaurante do hotel para tomar meu café e estranhamente nenhum de meus colegas havia chegado. Olhei no celular e eu é que havia me adiantado:
- Melhor assim! Posso discutir melhor com meus botões. - Falei para mim mesma, atraindo a atenção de uma atendente do hotel que sorriu timidamente para mim.
Aliás, que moreninha bonita! Com traços indígenas que lembravam algumas primas do Mark. Tinha a típica pele naturalmente mais escura, olhos puxadinhos, cabelos pretos e lisos. “Mark ia adorar ela!”, pensei enquanto olhava suas curvas parcialmente escondidas pelo uniforme do hotel. Comecei a tomar meu café com torradas e uma fatia de um bolo qualquer enquanto ainda olhava minha conversa com o Mark. Depois de um tempo, acabei me distraindo com aquela moreninha novamente que ia e vinha arrumando o buffet do café. “Delicinha mesmo…”, pensei comigo.
“Delicinha, Nanda!?”, me repreendi na mesma hora porque sempre me imaginei hétero. Aliás, eu sou! O que rolou com a Laura e a Denise foi só uma exceção. Repetida, mas exceção. Duas vezes com a Denise, mas exceção. “Caralho! Tô precisando trabalhar mesmo!”, comecei a rir para mim mesma, com medo de meus próprios pensamentos. Nesse momento, fui interrompida pela Verônica:
- Alguém viu um passarinho verde de noite e nem me chamou pra eu admirar junto…”
- Oi!? - Perguntei, sem entender.
- Esse sorrisinho malicioso no seu rosto. Conheço bem…
Nem dei bola e me voltei para meu celular, naturalmente sorrindo dela ou para ela, não sei. Ela se foi para o buffet e logo voltou para a mesa. Pouco depois, Aline se juntou a nós:
- Fala pra mim… Transou ontem, não transou, Nanda? - Verônica insistiu: - Mulher que inveja eu tenho de você…
- E gozei tão gostoso, Vê… - Falei, rindo da cara que ela fez: - Dei uma tão boa com meu marido ontem que nem te conto.
- Mas teu marido não tá em São Paulo? - Aline perguntou, sem entender nada.
- Minas! Não, São Paulo. - Rebati.
- Mas então?... - Aline insistiu.
- Gente, que é isso? Celular, vídeo chamada… Eu e ele… Ele e eu… - Respondi, gesticulando o óbvio.
- Ah, mas aí não vale! - Verônica contestou: - Gostoso é pele com pele. No mínimo, com camisinha.
- É. - Concordei: - Mas quando não se tem a carne, se usa o sentimento e a imaginação.
Aline nos ouvia sem tirar um bolinho da boca que se parecia bastante com um "trem" lá de Minas, uma broa de fubá pau-a-pique, para ser exato. Depois nos contou que era um bolinho de macaxeira. Curiosa, pedi um pedaço e provei. Realmente uma delícia, bem macio e suculento. Fiz uma nota em meu celular para procurar a receita, pois tinha certeza que Mark e as meninas adorariam. Passamos a conversar outros assuntos, inclusive relacionados ao treinamento e, depois de finalizarmos o café, voltamos a nossos quartos. Arrumados, fomos para a sede da empresa.
Outro dia maçante de treinamento, almoço, treinamento, café, treinamento. Terminei o dia com uma baita dor de cabeça e decidi que iria ficar quietinha no meu quarto. Depois de tomar um analgésico, quando estava me preparando para ligar para minha família, batem na porta do meu quarto:
- Oi, Nanda! - Disseram, quase ao mesmo tempo, Aline, Verônica e Cíntia, outra treineira.
- Oi, meninas. Por que estão aqui? - Perguntei sem papas na língua, por ainda estar com dor de cabeça.
- Vai sair com a gente, Nanda. - Aline decretou.
- “Hoje é sexta-feiraaaa / Chega de canseira” - Cantou Verônica, desafinada, ao seu lado.
- Gente, eu estou com uma baita dor de cabeça. - Resmunguei.
- Nada disso! Toma um remédio e sai com a gente. Shopping, gente diferente, paquera, trepada… - Insistiu Verônica: - E amanhã a gente tá de folga mesmo. Vem com a gente, vai!
- Nanda, eu não vou ficar até muito tarde também. Então se quiser voltar comigo, rachamos o táxi. - Me falou Cíntia, a outra casada do grupo: - Só estou indo porque elas me infernizaram por meia hora e vão infernizar você também.
- Para com isso, Cíntia. Animação, mulher! - Verônica a pegou pelos braços, chacoalhando.
- Eu nem liguei para minha família ainda… - Tentei cortá-las.
- Liga agora, Nanda! - Aline soltou.
- Até tu, Aline!? - Perguntei para ela, até então a mais tímida da turma, fazendo as demais rirem: - Gente, eu não vou sem falar com minha família!
- Liga! Liga! Liga! - Verônica tentou puxar um coro, mas foi deixada no vácuo pelas demais: - Então, liga pro gostosão do teu marido.
Nessa hora encarei Verônica séria e acho que todas entenderam que com minha família eu não aceitava nenhum tipo de brincadeira. Aline lhe deu um cutucão na costela e ela me pediu desculpas na mesma hora:
- Tá. Então, silêncio enquanto falo com eles. - Disse já pegando meu celular.
Fiz uma chamada de vídeo e após o celular do Mark tocar duas vezes, ele me atendeu, sorridente:
- Oi, moça bonita.
- Oi, Mor.
Na hora vi que ele não estava em casa. Parecia ser a casa de meus sogros e isso foi confirmado quando vi minha sogra surgir por trás dele e me dar um “tchauzinho”:
- Jantando fora? - Perguntei.
- Meu pai resolveu queimar uma carninha aqui e como já vinha trazer as meninas para dormirem na chácara, acabei ficando.
- Sacanagem, né! Quando estou aí, ninguém faz churrasco. - Resmunguei, brincando obviamente: - Vai dormir aí?
- Não. Vou embora mais tarde.
- Cadê as meni…
Nem terminei de falar e minha caçula pulou no colo dele, sorrindo para mim:
- Mãe o gato quase caiu na churrasqueira! - Começou a contar sua novidade e a história durou mais uns dez minutos.
Antes que Miriam terminasse, Maryeva se aproximou e se sentou ao lado do pai. Depois que a baixinha terminou, Maryeva começou a conversar comigo, sempre séria, compenetrada e de poucas palavras. Até parecia meio chateada. “Mas é o xerox do pai mesmo!”, pensei enquanto conversávamos. Depois de um tempo, ela passou o celular para o Mark e ambas ficaram com ele até saírem correndo e gritando atrás dos gatos da chácara. Mark ria da desenvoltura delas tentando pegar os “gatíneos” e virou seu celular na direção delas para me mostrar suas peripécias.
Nesse virar de celular, não pude deixar de notar que havia mais pessoas no ambiente. Meu cunhado, irmão do Mark, e sua família, o que já era esperado naturalmente, mas o que me surpreendeu foi ver o primo dele, Marquinhos, sua esposa, uma outra senhora idosa e uma morena espetacularmente bonita. Depois que ele seguiu um pouco as meninas enquanto “caçavam” um dos gatos, voltou o celular para si:
- Elas vão passar a noite correndo atrás desses bichos. O Mocorongo foge da Miriam como o diabo da cruz. - Falou sorrindo: - E a Elke subiu no telhado de tarde e não desceu mais…
Inconscientemente fechei a cara para ele e fiquei em silêncio. Meu marido sacou na hora o óbvio, tanto que vi que ele saiu de perto das demais pessoas para continuarmos nossa conversa:
- Você viu, não viu? - Se adiantou e, vendo minha cara emburrada e como eu ainda me mantinha em silêncio, continuou: - Sim. É a Iara. Estou na casa de meus pais. Não tenho como escolher quem eles convidam.