14 de junho de 1969. O dia em que mudaria a vida de Teresa.
Ela acompanhou a chegada da Kombi na fazenda do seu pai, em São Sebastião do Rio Branco, interior de São Paulo. As cores vivas do veículo atiçaram a sua curiosidade lá do estábulo onde ela estava. Quando todos saíram, sua curiosidade virou atenção.
De lá de dentro saltaram 5 homens e 3 mulheres, Teresa se surpreendera com o tanto de gente, mas mais do que isso, com a forma como se vestiam, o jeito que os longos cabelos, incluindo o dos homens, balançavam ao vento, e de como todas as mulheres pareciam tão despojadas, de um jeito que ela nunca se permitiu ser.
A turma que chegava vinha do Rio de Janeiro. Seu Aloísio, pai de Teresa, alugava a antiga senzala de sua centenária fazenda para pessoas que vinham passar os feriados ali desde 1956. Era uma forma de complementar a renda, que já estava bem apertada com sua plantação de café. Teresa já estava acostumada com essas visitas, mas daquela vez eles pareciam tão diferentes.
Diferente de sua filha, Seu Aloísio não ficou curioso com a chegada dos novos hóspedes. Para ele, era apenas mais um grupo qualquer de pessoas que iam e vinham. Mas apesar disso, a aparência despojada deles chamara sua atenção. Depois que os cumprimentou e os levou até as estalagens, caminhou até o estábulo e falou com sua filha.
– Teresinha, quando acabar aí com os cavalos, pega um pouco de lenha e leva até os nossos hóspedes. Mas cuidado, não dê muito papo para eles. Eles parecem ser doidos de pedra. Bicho-grilos da pior espécie.
Assim fez sua filha, obediente como sempre. Pegou o máximo de lenha que seus braços podiam carregar e levou até a estalagem. Ao bater a porta, foi recebida por todos, que pareciam bem animados, mas não deram muita atenção a ela, pois estavam retirando suas malas. Teresa reparou na grande quantidade de malas que traziam, e em algumas delas haviam alguns aparelhos que nunca havia visto antes. Fios, microfones, câmeras. Tudo aquilo chamou a sua atenção, mas não tanto quanto uma das garotas.
Ela estava de pé, encostada na porta fumando um cigarro. Usava um short jeans e uma camisa listrada amarela e vermelha. Tinha os cabelos ruivos, um pouco desgrenhados. Suas sobrancelhas eram ralas, mas seu olhar era chamativo de uma forma mística. Seus lábios carnudos e curvilíneos, de forma que naturalmente exibia para o mundo o seus dentes da frente, levemente separados. Seu corpo era magro, de pernas longas e cintura fina, e seus seios, apesar de pequenos eram bonitos, e fizeram Teresa se espantar ao perceber seus mamilos embaixo da camisa que ela usava.
Toda essa beleza exótica da garota chamou a atenção de Teresa, e por um segundo elas trocaram olhares. Quando ela saiu, percebeu que não lembrava de nenhum rosto de toda aquela gente além do dela.
A curiosidade de Teresa a acompanhou durante todo o dia, que os observava de longe, ora no estábulo, ora cuidando dos bezerros no pasto. Teresa os percebeu caminhando de longe pela fazenda, notou um dos caras segurando uma câmera, parecendo filmar todos os lugares por onde passava. Eles se meteram no mato que havia atrás da fazenda por volta das duas da tarde, e retornaram quando já estava anoitecendo.
Seu pai comentou novamente sobre eles na mesa de jantar, junto se sua mãe, Dona Maria, e seu irmão recém-nascido, Isaque.
– Aqueles caras lá parecem bem esquisitos. Aposto que são desviados do caminho do senhor. Cada vez mais tem essa gente por aí. Esses, esses... Caras imundos e essas mulheres promíscuas. A gente não devia ter aceitado eles aqui. – Reclamou Seu Aloísio à mesa de jantar.
– Querido, se acalme um pouco. É só um final de semana. Eles já vão embora. Além disso, a gente precisa do dinheiro para um trator novo, não é mesmo.
Seu Aloísio resmungou enquanto espetava a galinha ao molho pardo em seu prato. Ele segurava o garfo com o punho cerrado e falava de boca cheia, com toda a brutalidade de um homem do campo.
– Eu só queria que toda essa gente sumisse. Falaram pra gente que com os militares lá no poder, eles iam sumir, que iam livrar o Brasil desses indecentes, mas cada vez mais parece que tem mais deles por aqui!
Teresa ouvia tudo aquilo calada. Embora o descontentamento de seu pai parecia razoável, a curiosidade dela por eles parecia cada vez mais intensa. Ela se perguntava o que eles vinham fazer aqui. Para Teresa, São Sebastião do Rio Branco não havia nada de bom, nem mesmo o Queijo São Sebastião, especialidade da cidade. Para ela, tudo parecia tão monótono e sem vida naquele lugar. E pela primeira vez ela viu pessoas coloridas, alegres e diferentes.
À noite, após sua tradicional oração, Teresa deitou-se em sua cama, mas não conseguiu dormir. Pensava apenas naquele grupo que estava do outro lado da fazenda. Ela olhou pela janela do seu quarto e viu que as luzes da cabana ainda estavam acesas. Então, decidiu ir até lá para observar mais de perto. Caminhando silenciosamente pela casa, tentando ao máximo não acordar o seu pai, que roncava deitado em sua cadeira na sala. A TV estava ligada, mas não passava mais nenhum canal. Apenas o clássico chiado que ninava Seu Aloísio toda noite.
Apenas de pijama, Teresa saiu no frio de 9 graus, típico do inverno de São José do Rio Branco, e caminhou até a cabana. Ela parou na frente, ouvia alguns barulhos do lado de fora, mas não sabia identificar o que era. Ela se aproximou um pouco mais da janela ao lado da porta, porém o sereno e o calor da cabana embaçaram o vidro. Ela tentou se aproximar mais, mas de repente ouviu um barulho de galho se quebrando.
– Posso ajudar?
A voz surgiu ao lado dela, nas sombras. Primeiro ela viu apenas uma ponta de luz. Quando ela deu dois passos à frente, Teresa percebeu que a ponta de luz era um cigarro aceso na boca da garota ruiva, que olhava para Teresa com indiferença.
– N-nada. E-eu só vim ver se vocês precisavam de alguma coisa. – Respondeu Teresa, gaguejando de nervosa.
– É mesmo? Pois parece que você tava tentando espiar. – Disse a ruiva, dando uma risada de canto de boca e uma tragada em seu cigarro.
Um silêncio tomou conta do momento por alguns segundos, até Teresa falar novamente.
– Eu vi vocês filmando umas coisas de manhã. Vocês vieram filmar um filme?
A ruiva deu uma risada, mas Teresa não entendeu o porquê.
– Sim, a gente veio filmar um filme.
– Então... Você é uma atriz.
– Bem, pode se dizer que sim. Prazer, Nicole Stefanini. Quer um autógrafo?
– Não obrigada. – Disse Teresa, sem perceber a ironia. – m-mas que tipo de filme vocês vieram filmar? É algum filme de época?
Nicole deu um sorriso ambíguo para Teresa, mais uma tragada no cigarro e falou se aproximando de Teresa.
– Não, é um estilo de filme novo, vem fazendo muito sucesso. E é beeeem divertido de se filmar. – Disse Nicole, quase suspirando.
Teresa corou suas bochechas e tentou desviar o olhar dos olhos hipnóticos de Nicole.
– C-como assim divertido? – Perguntou Teresa.
– Por que não olha você mesmo?
Nicole segurou no ombro de Teresa e a levou direto até a janela. Teresa enfiou o seu rosto para que pudesse ver a cena que a deixaria em choque.
Dentro da casa, o restante da turma filmava uma cena. Um homem alto, vestindo uma calça jeans e camisa de botão, estava sentado em uma cadeira ao lado de outro, de cabelos longos e bigode e um óculos de grau quadrado que segurava uma câmera filmando a cena. Atrás deles se prostra uma menina de cabelos morenos lisos, segurando um microfone que ia por cima deles até a cena em que filmavam.
Na cena, havia dois homens, um branco de cabelos longos e costeletas, e outro negro com um cabelo black power e peito cabeludo, além de uma mulher loira. Os três estavam pelados, sentados no sofá da sala da cabana. A mulher que tinha seios fartos e lábios grossos, estava deitada, chupando o pau do homem negro, que era com certeza a maior rola que Teresa já havia visto na vida, enquanto o homem branco a comia no outro canto do sofá. Teresa conseguia ver com perfeição a boceta cabeluda da mulher e o pau batendo com vontade nela. Do vidro ela conseguia ouvir também o gemido dos homens, que aproveitavam ao máximo o afago da mulher.
Teresa se espantou com tamanha obscenidade e deu um pulo para trás, mas parou em Nicole, que estava há dois passos dela. Ela estava sem palavras, seu queixo estava no chão. Nunca havia visto algo como aquilo.
– Q-q-que tipo de filme é esse? – Perguntou Teresa, catatônica.
– É um filme sobre sexo, meu bem. Chama-se pornô. Está fazendo muito sucesso hoje em dia.
– M-m-mas por quê? P-por que alguém iria ver algo tão o-obsceno a-assim? E p-p-por que vocês filmam algo assim?
Nicole empurrou de leve Teresa até encostá-la na parede. Ela era uns 5 centímetros mais alta que Teresa, então precisou abaixar sua cabeça para falar com ela.
– Porque as pessoas amam fazer sexo. E elas amam consumor sexo. Então a gente tá dando para as pessoas o que elas amam. É por isso que faz tanto sucesso. Vem cá, por que você não fica com a gente assistindo a filmagem? Quem sabe até te dá vonta...
- Não! – Gritou Teresa, espantada, empurrando Nicole para que ela saísse do seu caminho e começou a correr em direção à casa.
Nicole observou de longe Teresa correr até a casa principal enquanto terminava o seu cigarro e jogou a guimba no chão. Teresa chegou esbaforida na varada, puxando todo o ar que podia para seus pulmões. Assustada, ela não entendia como algo assim tão pecaminoso estava ocorrendo a poucos metros de sua casa. Ela também não entendia como a imagem que ela vira não saía de sua cabeça a noite inteira, repetindo sem parar o movimento do pau do homem branco batendo na boceta da mulher, sincronizado com o vai-e-vem de sua boca na rola do outro homem.
Quando finalmente conseguiu dormir, Teresa teve o sonho mais intenso de sua vida. Ela se viu naquele mesmo quarto. Mas agora ela era a atriz principal. Usava apenas um pijama branco translúcido e todos eles estavam à sua volta. Até que um homem começou a apertar os seus seios, tocar em seu sexo e a despi-la. Depois, Nicole chegou ao seu lado, também lhe tocando, e quando ela ia lhe beijar, Teresa acordou dando um grito em seu quarto, ao som do galo que cantava no raiar do dia. Por um segundo, Teresa pensou que toda a noite havia sido um mero sonho, mas foi só olhar pela janela que ela percebeu que havia sido real. E mais do que isso, ela não parava de pensar naquilo.