Londres, 1979.
A noite fervilhava de vida. Se você fosse aos lugares certos, claro. Eu e minha galera estávamos no clube Roswell, um de nossos lugares preferidos. A ordem do dia era beber, cair e levantar.
Era isso que fazíamos todos os dias, mas isso não vem ao caso.
"Garçom, uma garrafa de seu pior uísque.", exigi. Se for para ficar mal, vamos fazer direito. Tirei do bolso um maço de camel e acendi um cigarro.
"Algum plano para hoje?", perguntou Lenny Simms, um amigo meu. O barman colocou 5 copos na mesa e encheu-os com uísque tão barato que acho até que a garrafa era de plástico
"Meu caro Lenny, hoje vamos ficar doidos.", disse, e virei o uísque numa única golada. Arranhou minha garganta e senti como se alguém andasse sobre meu túmulo.
"Ora, ora, vejam só quem está aqui.", ouvi uma voz dizer. Esta, pertencia à minha irmã, Lisa. Estava acompanhada pelo namorado, um escandinavo grandalhão chamado Vic.
"Lisa! O que está fazendo aqui?"
"O mesmo que você irmãozinho... Curtindo.", minha irmã e Vic eram góticos. Você sabe, esse pessoal que só se veste de preto e gosta de passar o tempo em cemitérios, lendo poesias e coisas do tipo.
Pessoal engraçado.
"Ah..."
"Como está você, Mich-ael?", perguntou-me Vic. Morava na Inglaterra havia uns nove meses, e seu inglês falado ainda era bem deficitário. E sempre pronunciava meu nome com uma enorme pausa entre as sílabas, quase como se fosse um nome composto.
"Bem, bem.", respondi, sem alongar o papo. Não ia com a cara de Vic. Por quê? Ora, o cara estava fodendo minha irmã, quer mais motivos do que esse?
"Bem, eu e o Vic vamos dar uma volta. Tente não se meter em encrencas, Mike.", ela me disse. Abri um sorriso sacana. "Certo, tente não se meter em muitas encrencas, tudo bem?", reformulou. Assenti com a cabeça, e ela e Vic logo sumiram no meio da multidão.
"Cara, sua irmã está gostosa pra caralho!", falou Gerry Lincoln, amigo meu e punheteiro de mão cheia.
"Cai fora, ela não é pro seu bico!"
Pouco depois, encontrei com Fran, uma amiga com quem tinha eventuais casos.
Como eu estava solteiro, fui nela pra ver qual era. Sabem como é, a rolinha precisa comer alpiste.
Minutos depois, estávamos transando no banheiro. Ela queria pica, eu queria boceta, assim nos entendemos e ficamos todos felizes. Não tem coisa mais bonita do que isso. Quid pro quo.
Com o pinto agora mais, calmo, era hora de voltar pro goró. Lá pelo quinto uísque, eu já estava algo bêbado. Gerry estava com a cabeça apoiada no balcão, totalmente derrotado pelo álcool. Lenny e Fred Holster ainda tinham pique para me acompanhar, mas o destino deles seria o mesmo de Gerry, mais cedo ou mais tarde. O que posso dizer? Fígado resistente, esse meu.
Mas às vezes dói um bocado.
De repente, o clube inteiro emudeceu. Até Gerry despertou do coma alcóolico e levantou a cabeça para ver o que acontecia.
Baldies.
Eram uma gangue de Brixton, os Brixton Baldies (daí seu apelido, 'baldies'), porradeiros profissionais. Raspavam o cabelo para que ele não atrapalhasse na hora da briga, atrapalhando a visão ou sendo agarrado pelo oponente.
Um grupo de oito deles havia entrado no clube. Reconheci alguns deles. Kirk Walton, Jerry Hollander, Marcus Barnes e o líder deles, Jeremy Sykes. Todos peritos em quebrar cabeças.
Após alguns segundos saboreando a dramática pausa na atmosfera do clube que sua entrada causara, Sykes perguntou a Barnes:
"Tem certeza de que aqui é um bom lugar para se divertir? Está cheio de..." Gesticulou teatralmente. "Escória."
"Ouvi dizer que aqui é bem bacana, Jeremy."
"Ah, que se foda... Já estamos aqui mesmo, vamos tomar alguma coisa."
Eles se sentaram numa das mesas e começaram a beber, e pouco a pouco as coisas foram voltando ao normal. Mas a tensão era tão forte que se podia quase cortar com uma faca.
"Puta que me pariu!", gritou Fred.
"O que foi?", perguntei.
"Olha quem está ali!"
Virei-me e vi Daniel Davis sentado junto com os baldies. Não estava apenas junto deles - usava a mesma vestimenta e, claro o mesmo corte de cabelo.
"Caralho! Não pode ser! Desde quando aquele merda é um baldie?"
"Não sei, mas acho que você devia cair fora daqui antes que ele te veja."
Daniel e eu nunca fomos amigos, mas transitávamos no mesmo círculo social, de modo que esbarrávamo-nos por aí mais do que algumas vezes. Tivemos algumas desavenças no passado. Alguns meses atrás, elas culminaram em uma violenta briga. Eu ganhei, ele perdeu - a luta e alguns dentes. Mas aquilo fora no verão passado, agora ele estava uns 10 centímetros mais alto, 20 quilos mais pesado e andando com os baldies. E se me visse ali, eles certamente iriam me bater até eu virar polpa.
Firme na ideia de não ter que voltar pra casa dentro de um balde, eu me levantei para cair fora dali o mais rápido possível. Mas, no caminho entre minha mesa e a relativa segurança da noite londrina, eu a vi. Dançava bem no meio da pista, sendo alvo de praticamente todos os olhares heteros do recinto. Pele branca como a neve, em contraste com os cabelos e olhos pretos. Era alta, devia ter quase um metro e setenta e cinco. No exato momento que a vi, esqueci de Daniel, dos baldies, da porra toda. Só tinha olhos para aquela beldade.
‘Tem que ser minha!’!, pensei. Fui me aproximando, ainda tomando coragem. Não que eu seja um cara tímido, muito pelo contrário. Não tenho vergonha nenhuma. Mas uma mulher daquelas é diferente das demais. Ela exala algo... Que não sei precisar. Faz com que o maior dos casanovas fique acanhado como um virgem em sua presença.
"Olá.", disse eu, quando estava próximo o bastante para ser ouvido.
"Olá!", ela respondeu, e de imediato percebi que era estrangeira.
"Meu nome é Michael, e o seu?"
"O meu não é!", gracejou ela. Embora falasse um inglês correto, o sotaque era bem forte. Francês, se não estivesse muito enganado.
"Ainda bem, você não tem cara de Michael!"
Ela riu.
"Meu nome é Annette."
Annette, é? Belo nome para uma bela mulher.
"Então, Annette, você está com alguém?"
"Estou com umas amigas daqui da Inglaterra."
"Importa-se se conversamos um pouco?"
"Mesmo?"
Não. Eu queria apertar-lhe e enfiar minha língua tão fundo em sua boca que sentiria uma coceira na nuca. Mas claro que não disse isso a ela.
"Sim."
Sentamos, eu e ela, a uma das mesas. O que foi bom, já que eu estava com uma nada tímida ereção e tinha medo que ela percebesse.
"Então, Annette, o que faz aqui no velho Reino Unido?"
"Intercâmbio."
"Ah. Onde está morando?"
"Limehouse."
"Fica longe daqui."
"Não tem problema, uma amiga está de carro."
Eu me ofereci para ir apanhar uma bebida. No caminho de volta, com as cervejas na mão, senti uma mão pesada cair sobre meu ombro.
"Mike! Amigão!"
Virei-me e vi Daniel Davis. Quando brigamos, éramos mais ou menos do mesmo tamanho. Agora, meus olhos batiam em seu queixo.
"Daniel!", disse eu, ainda sem saber o que fazer.
Ele pôs a mão no meu ombro. "Sabe, desde aquele dia que você me enfiou a porrada, tenho pensado em você. Em como seria ótimo me vingar."
"Olha cara, eu ficarei muito feliz em sair no braço com você e seus amigos baldies, mas hoje não. Escolhe um dia e um local e eu vou estar lá. Prometo."
Ele me olhou desconfiado. "Por quê?" Havia um pouco de decepção em sua voz.
"Estou com uma garota..."
Ele abriu um sorriso. "Ah, Mikey! Garotas não são motivo para se adiar uma briga! Pelo contrário! É a sua chance de impressioná-la!" A jovialidade em sua voz me fazia pensar sinceramente se ele não tinha, como dizemos por aqui, ficado louco como um chapeleiro.
"Não, cara.", eu disse.
"Onde pensa que vai?", disse ele, me puxando novamente. Antes que pudesse reagir, senti seu punho explodindo em meu estômago. As cervejas caíram no chão.
"Tem tempo que espero por esse dia, Mike. Quero saborear cada momento...", ele disse em meu ouvido, baixinho.
Eu estava ainda me contorcendo de dor, mas aproveitei a chance para acertar um soco no queixo de Daniel, que com o impacto foi jogado para trás.
"Ora, ora, ora!" disse Daniel. "Agora sim é o Mike que eu conheço!"
Tentou me atingir novamente, mas me esquivei e comecei uma frenética corrida em direção à porta do clube. Até Jeremy Sykes aparecer em meu caminho. Eu abaixei a cabeça e o atingi com o máximo de força que consegui, mas foi como acertar um muro de tijolos. Caí sentado, a cabeça girando e o pescoço doendo horrores.
"Indo embora sem se despedir?" disse Daniel, me levantando pelos cabelos. "Mas que coisa feia!"
Ele se preparou para dar-me um soco que muito provavelmente mandaria alguns dentes meu para a Irlanda, sem escalas, mas antes que pudesse desferi-lo, uma mão pousou em seu ombro.
"Quem—", vociferou, até ver minha irmã atrás de si. "Lisa!"
"Deixe meu irmão em paz.", disse ela. Daniel, que sempre tivera uma queda por ela, hesitou.
"Eu... Ele..."
"Por favor..."
Daniel pareceu conferenciar consigo mesmo. E até que demorou bastante, para um cara que devia ter menos neurônios que dedos.
"Certo.", disse ele, finalmente. "Mas não quero te ver por aqui. Entendido, Mike?"
Balancei a cabeça. Ser defendido pela irmã era algo humilhante.
Daniel me largou, e caí sentado. Lisa abaixou-se próxima a mim e sussurrou em meu ouvido:
"Vai ficar me devendo essa.", ela falou, e vi em seus lábios um sorriso de perversa satisfação.
Com meu orgulho no chão – e algum sangue na camisa – eu me levantei e procurei me recompor da melhor forma possível. Ora, apanhar dos baldies não era nada de mais. Todos ali dentro já deveriam ter tomando um pé na bunda deles pelo menos uma vez. Na verdade, era quase como um ritual de passagem.
Fui me deitar às sete da manhã, e ao meio-dia minha mãe veio me acordar. O almoço estava pronto.
Quando desci, meu pai estava sentado na poltrona, vendo TV.
Desde que ele perdera o emprego, passava todo o tempo livre bebendo e reclamando do governo. Ou seja, era quase um punk. Mas, a despeito dessas semelhanças, ele odiava punks. E, por uma puta ironia do destino, o filho dele virou um. E não foi só para irritá-lo que virei punk, acreditem.
Palavra de escoteiro. Não acreditam em mim?
Passei o resto do dia ouvindo meus discos. Buzzcocks, The Damned, Motörhead, Clash... E, é claro, os Pistols.
Veio à noite, e com ela o animal que dorme dentro de mim despertou.
Já que eu estava impedido por motivos de força maior de ir ao Roswell, marquei com a galera no Marquee Moon. Quando cheguei, apenas Lenny estava lá.
"Cara, você não vai querer entrar aí.", ele disse.
"Por quê?"
"Os baldies estão aí."
"Os putos! Porra, é muito azar!"
"Gerry e Fred foram pro Roswell, eu fiquei aqui pra te dar as más notícias. Então, vamos pra lá?"
"E tenho escolha? Eu—"
"Mike, amigão!", ouvi dizer, e não precisei pensar muito para deduzir quem era.
"Olha cara, eu estou caindo fora já, então você não precisa—", eu dizia, quando a mão dele mostrou à minha cara que, de fato, dois
corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo. Maldita Física.
"Dessa vez sua irmãzinha não está aqui para salvar seu rabo punk, não é?"
Ele se preparava para me socar novamente, mas eu ergui as mãos.
"Espera um segundo, Daniel. Antes de você continuar, posso te fazer uma pergunta?"
Ele pareceu confuso. "Hm... Pode, acho"
"Ouvi dizer que vocês raspam a cabeça pra ficar mais fácil de enfiá-la uns nos rabos dos outros. É verdade?"
Vi os olhos de Lenny ficarem do tamanho de pires. 'Mas que merda está fazendo? Quer morrer?', eles transmitiam. Não apenas Daniel, mas seus amigos baldies ficaram pasmos. Aproveitando a deixa, eu me levantei.
"Daniel, Daniel, Daniel... Eu já não imaginava que os baldies exigiam teste de QI para novos membros, mas a sua entrada mostra que o nível é bem baixo."
"Ele me chamou de burro?", ele perguntou pra um amigo baldie.
Este deu de ombros.
"Burro? Dannyboy, se seu cérebro fosse dinamite, não seria o suficiente para explodir seu nariz.", falei.
"Por que diabos esse bostinha ficou tão confiante de repente?", um dos baldies comentou com outro.
"Só precisa olhar pra trás pra descobrir, colega."
Então, Daniel e seus amigos baldies se provaram completos idiotas, olhando para trás e caindo no truque mais velho do mundo. Quando se perceberam enganados, eu já tinha sumido. Chamem-me de covarde, se quiserem. Mas eu sou realmente avesso à dor física.
"Cara, aquilo foi demais! – disse Lenny, enquanto corríamos por nossas vidas.
"Andou brigando de novo?", me perguntou Lisa. Estávamos agora de volta ao Marquee.
"‘Apanhando’ seria o termo mais correto.", disse;
"Ah. Não adianta te pedir para ficar longe de encrencas, né?"
"Dessa vez a encrenca veio até mim. Sou inocente, juro!", disse, e então procurei dar às minhas palavras alguma credibilidade: "Não foi, Lenny?".
Lenny, que estava perdido no decote insinuante de minha irmã, levantou a cabeça quando ouviu seu nome ser citado.
"É verdade, é verdade.", ele confirmou, e aposto que sequer sabia o que acabava de corroborar.
Minha irmã cruzou os braços por sobre o decote, o que arrancou suspiros de frustração não só de Lenny, como de Gerry e Fred.
"Mesmo assim. Você sabe que me preocupo com você. Afinal, você é meu irmãozinho.", ela falou. Desde que nosso irmão mais velho, Niles, fora explodido por um norte-irlandês cuzão em Londonderry em 76, ela tinha ficado superprotetora comigo. "Promete que vai se cuidar?"
"..."
"Promete?"
"Tá bem, prometo!"
E a lua é feita de queijo.
Impossibilitado de ir aos meus dois locais favoritos, devido a motivos de força maior (e careca), eu acabei indo parar na avenida Kensington, ou, como era conhecida nas ruas, pequena Jamaica.
Eu não tenho nada contra o reggae. De verdade. Até consigo achar legal, se a quantidade de toxinas inebriantes em minha veia estiver alta. E, como eu estava dançando ao som de Jimmy Cliff ('Bongo man has come'), faça as contas.
Eu estava MUITO doido.
Boggs, um dos jamaicanos, me passou o baseado. Eu fiz minha parte, e então passei adiante. Aquilo era uma merda, mas era uma merda da boa.
O resto da madrugada (e o começo do dia) seguiu assim. Álcool, drogas & reggae. E tenho quase certeza de que fiz sexo com alguma das garotas presentes.
Peguei o ônibus de volta pra casa. Sentado de frente pra mim, havia um velho, que me encarava fixamente.
"Quê foi? Nunca fez algo louco em sua vida, vovô?", disse, e sorri mostrando bem os dentes.
"Na verdade, fiz sexo com uma lata de lixo uma vez, e estava pensando que você talvez seja meu filho..."
Certo, certo. Pode rir. Foi engraçado, eu admito. O coroa acabou comigo, e merece meu respeito. Mas mesmo assim peguei o chapéu dele e joguei pela janela.
Sou mau perdedor, o que posso fazer?
Dormi durante todo o dia, e não fosse a ligação de Gerry, provavelmente só teria acordado no dia seguinte. Ele me disse que ia ter uma festa na casa de um conhecido nosso. E lá ia eu de novo.
Passei na casa do Gerry, onde fizemos o aquecimento: ele havia 'emprestado' uma garrafa de Jameson de um tio.
"Puta merda! É ela!"
"Quem?"
"A francesinha!"
"Oi."
"Mike! O que aconteceu com você, aquele dia? Você sumiu!"
"Eu tive uns problemas com os baldies."
Ela me olhou, curiosa.
"Você sabe, aqueles carecas."
"Baaawwdiies.", ela repetiu, com sotaque, e sorriu.
"Sim. São uns carecas escrotos."
Ela riu. "Uau Mike, você é muito corajoso!"
"Hã? Por quê?"
"Ora, tem que ser, para falar mal dos baaawwdiies na frente deles!"
Oh, não.
Eu me virei e vi a carranca de Marcus Barnes há poucos centímetros de mim. Havia um sorriso homicida em seu rosto.
"Você vai morrer.", ele disse.
Juntando toda a minha força, apliquei um soco no nariz de Barnes, e ele foi ao chão.
"Merda, merda, merda! Certo, certo. Sem pânico."
Agarrei a pessoa mais próxima.
"Você tem uma caneta?"
"Vai se foder!"
"Eu tenho uma.", disse Annette.
"Pode me emprestar por um minuto?"
"Claro."
Barnes começava a recobrar a consciência lentamente.
"Olha, eu terei que sair daqui bem rápido nos próximos segundos, mas antes gostaria de pegar seu telefone, endereço, qualquer coisa."
"Sykes!", gritou Barnes, a voz comicamente anasalada devido à pancada que levara no nariz.
"Claro! Posso anotar pra você?"
"Ei, Sykes! O merdinha está aqui!", continuava gritando Barnes, ainda sentado no chão.
"Sim, sim.", eu disse, e dei-lhe a caneta. Era até melhor que ela mesma escrevesse. Eu provavelmente iria esquecer de devolver a caneta antes de correr, e odiaria encerrar meu segundo 'encontro' com a francesinha roubando algo dela. Eu geralmente só começava a roubar coisas lá pelo quinto ou sexto.
Puxei a manga da minha surrada jaqueta jeans, e ela escreveu em meu antebraço. Ao fundo, podia ouvir a comoção causada pela procissão de baldies liderada pelo 'reverendo' Sykes, abrindo caminho pela multidão.
"Pronto!", ela disse.
Barnes, já devidamente recomposto, começava a se levantar, mas eu o chutei e ele desabou novamente.
"Posso te ligar amanhã?" Se ainda estivesse vivo, eu quis dizer.
"Claro!"
"Então, nos vemos por aí.", eu disse, e me virei para começar a fuga. Mas me detive. Virei-me e dei um beijo em Annette.
E mais um chute em Barnes. Covardia? Não creio. Era apenas um ataque preventivo.
Corri.
E corri.
E corri.
Eventualmente, acabei fazendo algum curva errada, pois logo me vi em um beco sem saída.
Bem, menos mal que devo tê-los despistado.
"Ei Sykes, ele tá aqui!"
Lei de Murphy, você é uma vadia.
Eles avançavam vagarosamente. Alguém poderia pensar que isso se devesse ao cansaço pela corrida, mas eu sei que não. Apenas queriam saborear meu medo. Pessoal divertido, não?
Então, lá estava eu, o destemido herói, encurralado entre duas paredes. A de tijolos, às minhas costas, e a de baldies, avançando em minha direção. Conseguirei escapar? Semana que vem, no mesmo bat-horário, no mesmo bat-canal.
Sykes e os outros agora já estavam sobre mim.
"'Anarquia no Reino Unido' né, Mike?"
Seu punho explodiu em meu estômago como uma locomotiva, e eu caí de joelhos.
"Calma, calma. Não desmaie ainda, garoto."
Sykes me levantou e me empurrou.
"Ele é seu, Dan. Faça valer a pena."
Daniel abriu caminho por entre os outros baldies.
"Oh, Mikey, estão tocando a nossa música."
Outro punho-locomotiva explodiu em meu ventre, e novamente dobrei-me em agonia. Mas Daniel não era tão carinhoso quanto Sykes. De forma alguma. Acertou-me novamente, dessa vez com um cruzado no maxilar.
Não achem que eu estava apanhando à toa, eu tinha um plano. Deixaria eles me baterem até cansarem, e fim de história.
Certo, o que VOCÊ faria no meu lugar, super herói?
Uma joelhada bem colocada entre minhas virilhas me fez ver mais estrelas que a maldita calçada da fama em Hollywood. Daniel se abaixou, e cochichou em meu ouvido.
"Sabe Mike, eu tenho pensado... Sobre sua irmã. O que você acharia se eu a amarrasse numa cama e chupasse aquela boceta gótica dela?", disse, e colocou a língua para fora, balançando-a a poucos centímetros de mim. Eu acertei-lhe um gancho no queixo. Daniel se levantou, assustado. Por uns instantes, ele ficou apenas parado ali, com sangue escorrendo pelo queixo, e alternando olhares para mim, seus colegas baldies, e o pedaço rosado de língua que jazia placidamente no imundo chão do beco. Os outros baldies se entreolhavam, perplexos. Quando finalmente seu cérebro processou o que tinha acontecido, Daniel gritou. E como gritava alto, aquele puto. Ele apanhou o pedaço de língua do chão e saiu correndo. Os outros baldies deram uma última olhada em mim, pasmos, e correram atrás do companheiro.
Deus, e apenas Ele sabe como consegui chegar em casa. Já estava amanhecendo, e tentei ser o mais silencioso possível. Após um desentendimento entre a fechadura e a chave, consegui entrar. Ouvi alguns barulhos. Com a sorte que eu estava, devia ser um ladrão. Ou pior, meu pai. Acendi a luz. Vic estava deitado no sofá, com minha irmã sentada sobre ele, ambos pelados e me encarando com olhares surpresos no rosto. Nesse ponto, o
meus joelhos resolveram ceder, e vi o chão ficando mais e mais próximo.
E depois, trevas.
'There's no future for you'
- God Save the Queen, The Sex Pistols, 1977
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