Gentil

Um conto erótico de T
Categoria: Homossexual
Contém 2931 palavras
Data: 01/10/2022 22:33:49

2018. Meu segundo ano na faculdade e na residência universitária.

Ano da formatura do Rodrigo.

Essa história é, em parte, sobre ele.

O único que criei alguma intimidade nesse tempo.

"Intimidade" é um exagero, claro. Mas ele foi único que em pouco tempo não tive a usual timidez de dizer coisas básicas como: um inocente olá, um oi, um bom dia.

Qualquer um que me conhecesse naquela época diria que eu era prepotente, que não falava com ninguém e que era chato.

Mas a razão do meu comportamento era, em sua maioria, por causa da minha timidez.

Timidez de homem virgem cheio de neuras, com problemas com a própria sexualidade e família.

Claro quê não posso negar que tinha um quê de prepotência também.

Minha falta de maturidade me fez pensar que por ser inteligente eu era melhor do que os outros.

Escrever isso agora dá até um pouco de vergonha.

Mas é a verdade. A minha pelo menos.

Nessa minha verdade, tímido não é o termo mais correto.

O certo era que se não fosse necessário falar frases completas eu era monossilábico em sala, na residência e, nesse período, até em casa.

Motivo(s): Ser gay. Que para mim era no mínimo algum tipo de castigo.

Felizmente, alguém me fez enxergar que não era.

Mas me fez entender que EU era o "castigo", o "pecado".

E não o fato de ser gay...

Que na verdade era e é só mais uma característica de um homem tímido, calado e que tentava passar despercebido mesmo tendo 190 cm de altura.

Rodrigo, a pessoa que me mostrou isso tudo, não fez por meio de uma frase motivacional, mas simplesmente por ser o único que me deixou confortável o suficiente para eu poder falar de quase tudo com ele.

Confortável para ser eu mesmo.

Até mesmo mostrar o pior lado desse eu.

[...]

Nessa minha verdade que escrevo aqui há vários pontos de exagero, porém uma coisa é uma certeza que você entenderia se o conhecesse.

Seu sorriso, por mais clichê e piegas que soe, foi o mais bonito que já vi.

Talvez eu já estava apaixonado na época, mas quando ele sorria era como se uma palavra se formasse ao lado do seu rosto.

Gentil.

Difícil ter uma tarde de conversa com ele e negar isso.

Ainda mais quando sua percepção já estava toda embaça por causa de tantos sentimentos.

Mas o sorriso não era a única característica que chamava atenção nele.

Quase 2 metros, um negro com sotaque do RJ. Um deus africano que tirava o suspiro de qualquer um.

Braços longos, mãos enormes e olhos que sorriam junto a sua gentileza.

A voz dele com aquele sotaque era uma perdição.

Talvez a visão embaçada me não me faça exagerar bem no conjunto.

Contudo se você o visse não teria como não dizer outra coisa além de: gentil e delicioso.

Com o tempo, nós já falávamos um com outro de quase tudo.

Muito sobre cozinhar, masterchef, comida e principalmente da nossa disciplina favorita: cálculo.

Horas falando sobre números.

Ele estudando física. Eu engenharia.

Às vezes tão próximo nas ideias,

Mas, na maioria, tão longe...

[...]

Nesses dois anos já era perceptível minha mudança até mesmo com os reles mortais.

A gentileza dele me contagiou.

Eu, um virgem neurótico, não tinha percebido ainda, mas era bem óbvio que quase-era-amor.

Mas não era.

Era um sentimento diferente.

Era uma mistura de agradecimento, gratidão. Um tesão absurdo e outros sentimentos mais que eu ainda não entendia.

Mesmo assim, sem saber o que era amar, eu sabia que não era amor.

A certeza vem da teimosia porque até hoje peno em saber se sou capaz de oferecê-lo a alguém.

Amor à parte.

Paixão não tão à parte assim.

Rodrigo era um homem gentil e bem perceptivo.

E mesmo que não fosse até um idiota teria notado.

Eu tive a coragem e cara de pau de chamar ele para beber. Só nós dois.

Para um encontro!

E nem beber eu bebia. E nem de onde a coragem veio para dizer eu sabia.

No fim, desconversei logo que a posposta saiu da minha boca. Porque era óbvio e absurdo.

Mas felizmente essa história é sobre esse óbvio-absurdo.

Que aconteceu em um belo dia,quase noite, de sábado e que hoje é a memória de um dia triste, que se veste com roupas felizes.

Feliz porque o Rodrigo se formou.

Triste porque ele iria embora.

Feliz porque ele estava feliz.

Triste porque não deveria haver outro sentimento para mim além da tristeza.

Mas havia.

Se eu só sentisse tristeza, estaria feliz.

E tenho para mim que ele sabia qual era todos esses outros sentimentos.

Antes mesmo desse dia.

E até hoje não sei o porquê.

Talvez ele não era tão gentil assim, mas essa história não é sobre isso.

É sobre o dia antes dele ir embora.

[...]

Naquele sábado, nossa intimidade chegou ao seu máximo, ficou grande o suficiente para ele me perguntar. Sobre o que ele nunca tinha antes.

Confrontar-me com aquele óbvio.

Na verdade, com várias obviedades:

Se eu ainda era virgem;

Se eu já tinha beijado;

Se eu estava gostando da monitoria;

Se eu sentiria falta;

Se eu era interessado em alguém;

Se eu finamente estava gostando da residência;

Se eu era apaixonado por ele.

E eu disse sim para as 7.

Um(+6) simples sim(ns) e mais nada.

Ele foi bastante gentil, mas eu sabia uma obviedade sobre ele também.

Ele não era apaixonado por mim.

E eu sabia por quem ele era apaixonado.

Mas não era sobre isso.

Não era sobre ele.

Naquele momento se EU pudesse mensurar meu EUgoismo, em uma escala, seria provavelmente o valor recorde da minha existência.

Porque não importava para mim se era mútuo ou não, o que eu sentia por ele.

Ele não importava.

A gentileza dele não importava.

Apenas o meu sentimento por ele.

Sim, não estou exagerando.

É sobre isso.

Eu estava orgulhoso por estar apaixonado por alguém.

Por me sentir levemente mais humano por ter esse sentimento.

Na mesma medida que eu tirava a melhor nota da turma.

Mas não contava a ninguém porque o prazer não era mostrar para os outros.

Era ser o melhor da turma.

Todos saberem isso e eu nunca precisar dizer. Ou responder perguntas do professor.

Ou demonstrar inteligência.

Ou me mostrar de alguma forma.

O prazer existia no meu próprio mundo silencioso e só nele.

Além disso, eu estava orgulhoso também por saber que aquele sentimento não chegava a ser amor. Poque se fosse não seria recíproco.

E na minha hipótese sobre amor, seres humanos e outros coisas não existia amor platônico.

Se o amor existir ele tem que ser recíproco.

É uma condição necessária da existência do amor.

Eu estava feliz porque na minha cabeça isso tinha se provado.

Que não era amor.

E não era.

E não foi.

No fim, não era sobre ele,

Nem o amor.

Nem o Rodrigo,

mas sobre a autofelação do meus próprios sentimentos.

Difícil explicar sem soar como um total idiota, mas esse era o eu daquela época.

Que estava extremamente feliz por ter dito para alguém seus sentimentos.

Que era gay;

Que finalmente estava gostando da residência;

Que gostava dele. Do homem gentil;

Que estava adorando a monitoria;

Que nunca tinha beijado;

Que era virgem;

E que agradeceria se ele fizesse o grandíssimo favor de me foder.

Até hoje não sei como eu tive coragem de dizer isso.

Mas eu disse.

Sim! Exatamente dessa forma e nessa ordem.

Um sábado quase poético que eu acabei pelo meu desespero para contar tudo antes dele ir.

Aliás, eu não senti um sentimento de alívio por finalmente contar a verdade.

Foi um sentimento bem mais malicioso e mais complexo do que isso.

Foi a expurgação de um sentimento híbrido entre o orgulho, a malícia e o egoismo que ainda não tem nome na língua humana ou em qualquer outra.

Foi a malícia-orgulho-egoismo por simplesmente ter a capacidade de ter esses sentimentos.

E não é um exagero, afinal com a maturidade que tenho hoje não foi sobre o sexo, a final éramos e somos dois homens adultos.

Sexo entre homens já não é novidade.

O problema não foi como eu falei também.

Foder já era uma palavra tão usada.

O problema foi o subentendido.

Minha cara na hora era uma mistura de satisfação e malícia que imploravam por realizar esse desejo.

O homem gentil poderia não ter aceitado.

Mas ele aceitou.

Eu sabia que ele estava curioso.

Afinal, eu não preciso ser modesto.

Eu era delicioso à minha maneira.

Nem chegava perto do deus africano.

Mas minha timidez com pitadas de malícia era o meu charme.

Eu tinha um sorriso contido. Como se nunca precisasse sorrir totalmente.

O complemento do meu riso sempre estava na minha mente.

No meu mundo secreto.

Como se eu soubesse tudo...

Eu não sabia nem sei de nada, mas verdade seja dita, meu gosto e paixão pelo que eu estudava era cativante.

E, no geral, alguém com gosto mediano facilmente diria que sou bonito.

E ele estava interessado também.

Mas não da mesma forma.

Não depois do jeito que eu disse que queria ser fodido por ele.

Para mim ficou claro a leve decepção quando ele ouviu aquilo.

E eu queria que ele se fodesse e me fodesse junto com aquele julgamento.

Na minha cabeça, hoje, realmente, pareceu como se eu tivesse me ajoelhado e implorado para ser fodido por ele, caso contrário não seríamos mais amigos.

Eu não disse tudo isso ao pé da letra, claro.

Mas se você tivesse vivenciado essa experiência naquele fim de sábado,

chegaria a mesma conclusão.

[...]

Depois daquela conversa percebemos algo que estava óbvio ao ambiente. Estávamos sozinhos e nossa usual companhia e conversa nos fez esquecer que estávamos de férias e com quase ninguém na residência.

No fim, ainda tínhamos que preparar nossa janta, já que decidimos não sair.

Preparamos e comemos em total silêncio uma moqueca que passamos o semestre todo aperfeiçoando e comentando sobre.

Uma diversão só nossa em avaliar o prato um do outro.

Depois de desastres memoráveis na cozinha finamente eu tinha feito um prato comível de moqueca.

Cozinhar aliás era outro tópico que falávamos constantemente, mas era óbvio e injusto o quão melhor cozinheiro ele era.

[...]

Depois de comer passamos o resto do dia em uma espécie de silêncio monossilábico.

Que era bastante nostálgico para mim.

Eu estava com um sorriso de satisfação,

Já ele não se via o sorriso gentil habitual.

Ele finamente tinha visto quem eu era.

Que eu não era uma boa pessoa.

E que o que nós faríamos naquela noite acabaria com nossa amizade.

Eu sabia que acabaria.

Mas eu fiz.

Por curiosidade, malícia e desejo.

Não era curiosidade pelo sexo.

Pelo beijo.

Eu queria saber todas as medidas do seu pau.

E era sobre isso.

Eu era apaixonado por ele.

Mas todos esses anos fermentado esses desejos de ter alguém na minha boca

me tornou um cara totalmente desesperado.

Soa estranho escrever isso agora.

Mas esse era eu.

Eu era apaixonado pelo homem gentil.

Mas não chegava a ser amor.

Mas era paixão.

Fruto de uma amizade intensa de apenas 2 anos.

Eu não o amava.

Essa é a minha verdade.

Verdade que está mais próxima de uma mentira do que a realidade dos fatos.

Mas não é sobre a verdade.

Essa história é sobre aquela noite.

[...]

Para dar espaço a ele tentei ler algum livro na sala de estudos.

Fique no celular jogando um jogo qualquer.

Não deu para ler nada.

Uma parte racional minha queria evitar tudo é ir dormir logo.

Afinal ele já iria viajar no outro dia.

A minha malícia, por outro lado, queria entrar no quarto e chupar ele.

Eu parecia outra pessoa.

Ou melhor eu estava sendo mais sincero com os meus próprios desejos.

Naquela hora eu pensei: "O Rodrigo mal sabia que fazendo aquelas perguntas tinha libertado um puto e todos os seus desejos".

A clichê caixa de pandora de um gay virgem com mais de 20 anos...

[...]

Ao entrar no quarto, ele já estava deitado.

Vi aquele corpo delicioso na cama. Diferente das outras vezes, estava quase todo coberto.

O que era incomum porque o tanto de vezes que eu tinha visto a ereção matinal dele naqueles dois anos...

No fim, deliguei a luz e me deitei.

Tentávamos dormir em um beliche.

Na cama de baixo, eu apenas ouvia uma leve respiração e movimentos contidos, tipico de quando não se

não consegue dormir, mas não quer incomodar ninguém.

Enquanto ele parecia silenciosamente impaciente.

Eu tentava não respirar.

O quarto era um total breu.

E eu já não me importava com mais nada naquela hora.

Pudor.

Gentileza.

Vergonha.

Amizade.

E até mesmo consentimento.

Se ele tivesse me dado uma surra naquela noite eu estaria contando aqui o quão exitado eu teria ficado por ter sido socado por aquelas mãos deliciosas e por aqueles dedos enormes.

Mas ele não fez.

Ele só disse "Leo, não faz isso".

Mas eu fiz.

Me arrependo?

Talvez.

Mas bem pouco.

Eu fiz o que eu iria fazer por mais dois anos com outros homens, tentando suprir algum tipo de vazio existencial com o sexo.

Sem fazer nenhum som, o que parecia impossível para aquela móvel velho em que dormíamos me levantei e fiquei próximo

a cama dele, em pé.

Não sei como meu rosto estava, mas me imagino com uma serenidade quase divina. Meu usual meio sorriso e timidez maliciosa.

Sem falar nada eu contemplei o corpo dele.

Imaginei rapidamente o que desejava

e sem pressa executei o pensamento.

Tirei a coberta de cima dele e o chupei.

Ele estava com sua usual samba canção que me custou bons sonhos molhados.

Mas naquela noite não foi um sonho porque o toque era real.

O gosto e o cheiro eram reais e hipnotizantes.

O tamanho e a grossura do pau eram perfeitos.

A cabeça reluzia e latejava.

E a ideia fixa que eu pensei durante muito tempo

estava se realizando bem ali na minha frente.

Qual seria a sensação de ter um pau na boca?

O gosto.

O contato com a língua.

Com a garganta.

Quão divertido e prazeroso seria explorar cada parte.

O máximo que posso traduzir com palavras aqui é que a sensação de ter a língua tocando naquela cabeça enorme

foi como se todo o calor envolvido no ato se tornasse um correnteza de sensações.

O toque é rugoso, macio, cheio de gosto e cheiro.

Mágico, no máximo que o mundo mundano pode te oferecer.

[...]

Aquela noite de sábado poderia ter sido apenas uma memorável recusa da minha confissão.

Ele poderia ter me rejeitado.

Mas ele não fez.

Gostando ou não ele fez até o fim.

Foi gentil até o fim.

Ele saiu da cama.

E depois disso não falamos mais nada.

Tiramos a roupa e iniciamos uma dança desajeitada de um filme pornô antigo.

Banal, mas por ser sem som e em preto e branco

ganha ares retrô, chique e sofisticado.

Até hoje deve ter sido minha melhor performance no sexo.

Sendo minha primeira me faz constatar que sou bem ruim..

Mas não é sobre isso .

É sobre o que estava acontecendo naquele quarto que tenho que descrever.

Mágico, um extremo do mundano...

Para mim, pelo menos.

Para o homem gentil...

O máximo que posso dizer, afinal não tem como ter certeza dos sentimentos dele,

é que ele estava afastado.

Ele estava numa performance para ele mesmo sem olhar nos meus olhos.

Eu estava em transe com a bela dança que aquele corpo perfeito fazia.

Já ele estava em transe, no automático, porque ele não parecia querer dançar.

Mas ele era tão bom naquele ritmo que não se importou de terminar o espetáculo.

Eeu sabia de tudo isso, mas não dei importância.

Ridículo dizer que aquele homem, um ano mais velho do que eu, de quase 2 metros, foi violentado de alguma forma por mim,

mas esse era o sentimento que um resquício do meu eu racional me dizia.

Sentimento esse que eu não dei a mínima na hora.

Eu estava completamente nu.

Mas no campo das ideias e sentimentos estava totalmente vestido com uma roupa feita de piche, insuportável de usar.

Cheia de malícia-desejo-orgulho.

Que só queria que ele me fodesse.

E assim ele o fez.

Parece mentira e talvez seja porque minha percepção de tempo já estava fudida também.

Mas o que aconteceu, real ou não,

fruto da minha imaginação ou não, foi que no fim perdi todas as minhas virgindades com ele na aquela noite de sábado onírica tirada de um filme pornô em preto e branco.

Daqueles em fita cassete que o enredo é tão cativante que você nem se masturba vendo e só se dá conta quando a grande dança final termina.

Quando, finalmente, em letras bem trabalhadas, nos créditos, o título do filme é mostrado pela última vez:

Gentil.

Se eu pudesse voltar no tempo, rebobinaria aquela fita e assistia mais uma vez.

O conteúdo dela não poderia ser alterado nem mesmo voltando no tempo porque é fruto da minha verdade.

Uma realidade que não esta contida totalmente na dimensão temporal.

Que só é completa naquela fita velha de memória.

Que não mostra só a minha primeira vez.

Ou só sobre o homem gentil.

Ou só sobre o que eu me tornei.

Mas também como eu me permiti chorar depois de tantos anos quando vi a pessoa mais gentil que conheci indo embora.

E também sobre esse sentimento de que "foi melhor assim".

"Que ele merece pessoa melhor".

E sobre a gentileza que eu não veria mais.

Nem no título.

Nem na vida.

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