Por algum problema com as liberações de voo interestaduais que eu não entendi bem, só consegui marcar para quatro dias depois. Fiz minha reserva num hotel cinco estrelas, situado no mesmo bairro daquele em que Annemarye estava. Decidi que, naquela mesma tarde, eu iria encontrá-la. Fiquei plantado num sofá lateral do saguão de seu hotel com um bonito buquê de rosas vermelhas em mãos. Já passava das dezoito horas quando ela, como sempre linda, deslumbrante, esbanjando um belo bronzeado, entrou caminhando rápido pelo saguão, sorrindo para o além. Me levantei decidido a tê-la em meus braços, mas aí vi um rapaz forte, moreno e tatuado, entrar correndo atrás dela e a pegar por trás, num abraço apaixonado e, pior ainda, sendo correspondido por ela, que se voltou e lhe beijou ardentemente a boca. Meu mundo caiu naquele momento…
Capítulo 13 - Tão perto… tão longe…
Voltei a me sentar ou, sei lá, caí sentado no sofá com a surpresa. O fato é que, quando me dei conta, estava sentado, boquiaberto, vendo Annemarye e aquele cara se devorarem com uma vontade fora do normal no saguão do hotel. Peguei uma revista próxima e, igual aqueles filmes de investigação policial, me escondi atrás, olhando-os disfarçadamente. Eles eram íntimos, muito mesmo e me doeu demais vê-la entregue aos caprichos de outro homem, talvez até dela própria. Depois de um tempo, eles foram em direção aos elevadores e os perdi de vista. Voltei derrotado, acabado para o meu próprio hotel, me senti o próprio corno, o traído da história.
Eu não sabia o que pensar sobre o que havia presenciado e passei a analisar friamente os fatos para não condená-la indevidamente. O fato é que eu havia errado, uma grande parcela da culpa era minha por não tê-la contatado com mais ênfase ou ido atrás mesmo, mas eu tinha uma justificativa e acredito que ela a aceitaria plenamente: fiquei para cuidar da minha mãe, uma pessoa que ela própria queria tão bem. Mas e ela, por que ela não me esperou um pouco, ou me cobrou uma resposta, ou será que ela achou que não terminei com a Márcia? Poxa! Estávamos tão perto e, ao mesmo tempo, tão longe. Minha mãe me ligou e não atendi. “Hoje, não, mãe! Por favor…”, pensei, silenciando meu aparelho. Foi uma das piores noites da minha vida. Praticamente a passei em claro.
No dia seguinte, acordei decidido em confrontá-la. “Ou vai, ou racha!”, pensei comigo, convicto em resolver essa situação de uma vez por todas. Fiquei próximo ao seu hotel e vi aquele mesmo moreno do dia anterior chegar num “buggy” vermelho, entrando para sair logo após acompanhado por ela. Ela me olhou de relance quando passavam ao meu lado, mas não parou e eu comecei a andar em direção ao meu hotel. Entretanto, alguns metros adiante, vi que ela se virou para trás, ficando de joelhos sobre o banco do “buggy”, olhando em direção de onde em estava, enquanto o carrinho seguia.
Eu não acreditava no que estava acontecendo, mas queria, eu precisava entender aquela situação para seguir com minha vida. Decidi, então, que iria segui-los para saber se aquele relacionamento era sério ou apenas uma curtição. Claro! Ela poderia só estar curtindo a companhia dele e isso eu acho que até conseguiria perdoar. Decidi alugar um veículo para me locomover com mais liberdade, pois, acontecesse novamente o mesmo de hoje, eu iria segui-los até o inferno para conseguir falar com ela.
No outro dia de manhã, quando eu me aproximava de seu hotel, de longe, a vi em pé em frente ao hotel. Uma verdadeira visão: linda, imponente, provavelmente esperando seu macho, mas já não aparentava estar tão feliz! Minhas pernas chegaram a tremer pela tensão. Decidi resolver de vez aquilo e apertei o passo, mas quando eu estava me aproximando, o carinha chegou, ela entrou novamente no “buggy” e saíram. Ao passarem do meu lado, ainda os encarei, mas, dessa vez, ela não olhou para os lados e seguiu em silêncio. Só tive tempo de alcançar meu SUV e saí atrás deles. Algum tempo depois, eles aportaram numa bela praia com águas calmas e poucos quiosques. O movimento de banhistas e turistas também ainda não era muito grande e eles se ajeitaram num sombreiro próximo. Acabei ficando sem jeito de abordá-la e o máximo que consegui fazer, foi ficar olhando de longe como um adolescente apaixonado, enquanto eles conversavam, bebiam, se beijavam, se curtiam… E me doeu demais novamente.
Não nego que era até excitante vê-la num biquíni mínimo. Seu corpo era realmente deslumbrante! Perfeito em todos os sentidos, alto, esguio, com seios médios e empinados, uma bunda linda e grande sem ser exagerada e um cinturinha de pilão. Se Márcia era um violino, Anne era um violão e que ainda cantava muito bem! Lembro, inclusive, que quando tivemos nosso “casinho” em Nova Iorque, numa noite em que fomos num “pub” de karaokê, ela arrasou cantando algumas músicas da nossa Bossa Nova, mas quando cantou uma muito conhecida de uma cantora local, o lugar veio abaixo. Foi até difícil curtir tamanho foi o assédio em cima dela naquele dia.
Entretanto, minha excitação, denunciada por uma ereção repentina, veio abaixo quando seu macho passou a abusar dos toques em seu lindo corpo, em especial quando espalhava um produto sobre sua pele. Tive uma ideia quase infantil e decidi ligar para seu celular. Se não conseguia falar pessoalmente com ela, talvez conseguisse à distância. O aparelho chamou numa bolsa que ela levava à mão e ela o pegou, fazendo uma expressão típica de não ter reconhecido meu número, mas ainda assim atendeu:
- Alô? - Ouvi sua deliciosa e rouca voz do outro lado da chamada e não tive coragem de falar nada, fazendo com que ela insistisse: - Alô! Quem fala?
Sem resposta, ela, prática como ela só, desligou na minha cara, conversando algo com seu acompanhante. Liguei novamente, agora decidido em conversar com ela que me atendeu, meio bravinha:
- Alô! Quem é que tá falando?
- Anne… É o Marcos.
- Alô? Oi!? Alô! A ligação está horrível. Não estou conseguindo te ouvir. - Me respondeu: - Alôôôu!...
- Sou eu, o Marcos. Tá me ouvindo?
Ela olhou para seu aparelho, reclamou de alguma coisa com seu companheiro, balançando negativamente a cabeça, e desligou novamente, guardando o aparelho na bolsa. Decidi não insistir mais, pelo menos não naquele momento e, algumas horas depois e várias águas de coco, já cansado de vê-los se beijar e ele quase a comer com as mãos, voltei para meu hotel. Naquela mesma noite, voltei a ligar para ela, mas seu celular estava desligado. “Porra! Como você pode ser complicada assim, Annemarye!?”, pensei e me recriminei: “Ela, complicada, e eu, um tonto, medroso, sem ação…”. Meu voo de retorno estava marcado para o dia seguinte após o almoço, então eu tinha uma escolha a fazer: falar com ela ou esquecê-la de vez. Decidi tentar uma última vez.
À noite, decidi ir até o Maceió Shopping. Eu precisava espairecer ou enlouqueceria preso àquela situação. Andei sem destino ou rumo e, a certa altura, já cansado, comprei um lanche e um chope e me sentei na praça de alimentação, vendo as pessoas passarem para lá e para cá, mas sem enxergar ninguém:
- Marcos!? Marcos é você?
Olhei em direção àquela voz e lá estava Annemarye, linda em um simples vestido floral rodado, pouco acima de seus joelhos, uma simples sandália e nenhuma maquiagem, a não ser um simples batom. Seus cabelos estavam soltos, mas adornados com uma tiara de flor na lateral. Seu sorriso, por fim, iluminava o ambiente:
- Annemarye! - Falei, surpreso com a coincidência inesperada.
- Oi! - Disse e veio me beijar o rosto: - Que surpresa te encontrar aqui.
- E não é?
Ficamos nos encarando sem saber o que falar e a convidei para se sentar, o que ela fez, ficando praticamente colada a mim. Ela sorria sem parar para mim e eu para ela, mas não sabíamos o que falar. Eu até sabia, só não conseguia. Quando ela parecia ter se decidido e ia dizer algo, seu companheiro se aproximou da mesa, trazendo um lanche para ela e, para marcar seu território, lhe deu um beijo na boca, não recusado por ela, mas que a deixou claramente constrangida à minha frente:
- Gêra, este é o Marcos. - Ela me apresentou e ele esticou sua mão que eu peguei, apertando-a: - Marcos, este é o Gêra...
- Namorado da Annemarye. - Ele completou, sem lhe dar chance de finalizar a frase, o que a fez encará-lo inconformada e ainda mais constrangida: - Cerveja ou refrigerante, Anne?
- Cerve... Refrigerante. - Ela respondeu e ele saiu, deixando-nos a sós.
Assim que ele se afastou, ela me disse baixinho:
- Desculpa. Não somos namorados. Só estamos ficando.
- Fica tranquila, Anne. Você não me deve explicação alguma.
- Ah, para, Marcos. Não faz assim! Aliás, por que você está aqui?
- Vim resolver um assunto, mas parece que ele já estava resolvido.
- Marcos!? - Ela falou, surpresa, mas entendendo perfeitamente minha indireta: - Eu te esperei! Você não foi me procurar, não me ligou, não fez nada. Daí tive que vir para cá e acabei conhecendo ele. Você não queria que eu te esperasse pelo resto da minha vida, não é?
Como eu apenas a encarava, sem conseguir responder, ela me perguntou com uma voz sofrida:
- Afinal, o que você quer de mim, Marcos? - E como eu ainda não falava nada, ela insistiu: - Fala alguma coisa, por favor.
O tal do Gêra retornou com dois copos e se convidou para sentar a mesa, aliás, ele chegou e sentou, pouco me olhando e se virando diretamente para ela. Ela o olhou com um semblante chateado, não sei se por ele ter chegado ou por eu não a ter respondido. Eu não tive como proibi-lo de se sentar, porque ela própria não o fez. O clima estava horrível para ambos e a única solução que me ocorreu foi sair dali, deixando-os a sós. Dei uma desculpa qualquer, que não me lembro mais qual, embrulhei meu lanche, praticamente intocado, e me despedi deles. Antes de sair, falei, mais especificamente para ela:
- Respondendo sua pergunta, Anne, quero que você, aliás, vocês sejam muito felizes.
Seu olhar me doeu nesse momento. Uma mistura de surpresa, indignação e decepção tomou conta daqueles olhos, minguando seu brilho natural. Entretanto, por mais que me doesse, parecia ser a coisa certa a se fazer. Eu precisava liberá-la e também me liberar. O destino havia conspirado contra nós e decidi não desafiá-lo mais. Sai de lá sem olhar para trás.
Na manhã do dia seguinte, fiz o meu “check out” e de lá fui para o aeroporto, voltando para o Rio de Janeiro. Quando cheguei em casa, só de ver meu semblante, minha mãe entendeu que nada havia dado certo. Ela não me falou nada, nem perguntou, só se sentou ao meu lado e me abraçou. Não achei justo com ela e expliquei tudo o que eu havia visto:
- Mas Marcos, você não pode não pode culpá-la por viver. Ela é uma moça linda, inteligente, divertida, agradável, é óbvio pressupor que chamaria a atenção de alguém mais cedo ou mais tarde.
- Eu sei, mãe. Eu sei! - Respondi cabisbaixo: - O maior culpado nessa história toda sou eu! Eu tinha que ter assumido as rédeas da minha vida e corrido atrás dela, a pé se fosse necessário. Eu precisava ter sido mais macho mesmo e buscado a minha mulher. Não fui e outro a pegou.
Meu corpo doía e eu estava extremamente cansado, exausto. Ainda assim eu precisava falar ou explodiria e minha mãe era a única que me restou naquele momento:
- Ah, mãe, ela estava tão bonita, alegre, feliz mesmo, que eu não achei justo... - Suspirei fundo: - Eu até quis, quis mesmo, mas alguma coisa dentro de mim me disse que eu não tinha direito de atrapalhar a felicidade dela depois de tudo o que ela havia passado. Eu não achei justo.
- E é justo sacrificar a sua felicidade por um achismo, meu filho? - Ela me perguntou e, sem esperar resposta, continuou: - Você gosta dela, eu sei disso! Você deveria tentar conversar mais uma vez. Talvez o que você tenha visto seja só um “amor de verão”, uma “ficada” como os jovens dizem, algo sem importância.
- Talvez, mãe. Eu não sei… - Suspirei fundo: - Ou talvez o melhor seja ficar como está, ela com ele, eu com a Márcia. Sei lá…
Ela não disse mais nada. Acredito que tenha visto que meu cansaço, meu abatimento era grande demais e aquela conversa só iria me desgastar ainda mais, como se fosse possível piorar.
[...]
Sayuri ainda me encarava esperançosa por uma resposta positiva, mas eu continuava atônita com sua inusitada proposta. Não sabia o que responder, mas não tinha como negar que me despertava uma certa, digamos, curiosidade. Além disso, o fora que o Marcos havia me dado tinha acabado com qualquer esperança minha de ter um relacionamento mais serio, então, eu decidi que curtiria a vida, muito mesmo! Ainda assim, eu tinha o Gêra que marcava cerrado em mim e isso não é uma crítica, porque ele era muito legal mesmo e parecia realmente gostar da minha companhia. Eu também gostava muito de estar com ele e comecei a me sentir culpada em estar avaliando a possibilidade de aceitar a proposta da minha amiga. Me senti como uma traidora:
- Você está encucada com alguma coisa, Annemarye. Eu sei, estou vendo na sua cara! - Sayuri me chamou a atenção: - Pode me perguntar o que quiser. Estou aqui para te explicar qualquer coisa que quiser saber, desde que eu saiba, é óbvio.
- Não é nada, Sá… Olha só. - Respirei fundo para explicar algo que realmente eu sentia: - Acho que toda mulher tem curiosidade de ficar com mais de um cara ao mesmo tempo. Eu também sou assim, afinal, nosso corpo oferece possibilidades…
- Pelo menos cinco! - Ela me interrompeu.
- Oi!? Como assim cinco? - Perguntei, curiosa: - Eu, pelo menos, só tenho três buracos…
- Ora! Boca, buceta, cu, duas mãos… - Ela começou a rir: - E sem contar que ainda sobram dois peitos e duas orelhas.
- Putz! Mãos e seios eu até entendo, mas as orelhas… - A encarei, incrédula: - Tô me sentindo quase uma freira perto de você.
Ela gargalhou alto da minha cara, mas agora minha curiosidade falava mais alto:
- Cê tá de palhaçada! Você já pegou cinco de uma vez?
- Não! Claro que não! Você tá pensando que eu sou o quê, uma vadia? - Ela me respondeu, ainda rindo: - Três, já! Cinco ainda não…
- Então, mas não era nisso que eu estava pensando, não. Tem o Gêra que todo o dia vem atrás de mim. Mesmo que eu tope, e não estou dizendo que vou, que desculpa eu daria para ele. - Mas aí me toquei de algo que não havia considerado ainda e perguntei até meio brava por poder estar sendo enganada: - Ele também é liberal? Ele tá no meio dessa história? Ele tá armando pra cima de mim?
- Não! Ele não tá e que eu saiba, ele não é liberal. Só se for muito discreto, mas do meu grupo, ele não é.
- Então… Você entendeu? Fica complicado por causa dele também.
- Fica nada! É só você dizer para ele que nós vamos ter uma noite do clube da calcinha. Só mulheres para tricotar, rir, assistir filme de romance, beber, etc. e tal. Daí se ele duvidar, pede para ele me ligar que eu confirmo. Tenho até mais duas amigas que podem confirmar também…
- Gente, não tô acreditando nisso! Você tem até um esquema armado.
- Claro, né, Anne! Nossa vida particular não precisa ficar pública, oras. O que fazemos entre quatro paredes é problema nosso, não dos outros.
- Olha, Sayuri… Tá! Eu preciso pensar. Tô meio chocada com tudo isso ainda. Eu acho que, se eu topar, vai ser só pra jantar, conversar e talvez, muito hipoteticamente, se eu não ficar muito constrangida, assistir vocês, mas nem isso eu sei se dou conta.
- Então, faz assim do seu jeito! - Me falou alegre, já comemorando: - Quer escolher as companhias?
- Eu não sei se vou jantar ainda, menina. Vai com calma!
- Poxa, Anne, relaxa! Sei que vai curtir. Deixa então que eu escolho um carinha da minha confiança e agrado. A gente janta, conversa, ri, se diverte e daí, se rolar, rolou, se não, valeu pela noite agradável.
- E em que dia seria isso?
- Faço hoje, amanhã, o dia que você quiser! - Pensou melhor e se corrigiu: - Não! Melhor amanhã ou depois. Hoje, ficaria muito em cima.
Analítica, comecei a calcular todas as variáveis em minha mente, mas a curiosidade e o tesão que a proposta me proporcionaram, prejudicaram minha análise. Ainda assim achei que os possíveis benefícios justificariam os riscos e decidi aceitar:
- Tá. Eu topo. Marca para amanhã porque o Gêra falou que teria um evento de família, acho que um aniversário de algum parente, ou sei lá o quê, e eu já não estava mesmo a fim de ir para não dar uma falsa impressão para ele. Daí vou usar sua desculpa e qualquer coisa peço para ele te ligar. Aliás, peço nada! Não estou namorando ele e não tenho que dar satisfação alguma da minha vida.
- Joia! Vou combinar com todo mundo e depois te ligo, passando os detalhes.
- Onde vai ser esse “jantar”?
- No meu apartamento. Pode ficar tranquila. Segurança e discrição garantidos.
- Olha lá onde você está me metendo, Sá…
- Querida, não é onde estou TE metendo, mas onde eles querem SE meter. - Falou, frisando as palavras, e me deu uma piscadinha.
Nos despedimos e voltei para meu hotel. Horas depois, o Gêra me ligou e saímos para curtir uma baladinha. Nessa noite, fomos para seu apartamento e transamos novamente. Eu pessoalmente não consegui curtir muito bem porque fiquei preocupada, ansiosa, nervosa com o dia seguinte. Quando eu estava para sair, ele me convidou para pernoitar lá e acabei aceitando, dormindo em seu peito a noite toda. No dia seguinte, informei do convite para a noite do clube da calcinha e ele ficou injuriado, pois imaginava que eu o acompanharia no evento de sua família. Educadamente, frisei que não éramos namorados e que não queria que ele confundisse nosso “status”. Mesmo chateado, ele entendeu a mensagem e se resignou.
Na tarde do dia seguinte, Sayuri me ligou e, depois de saber que poderíamos conversar em paz, perguntou se eu tinha preferência de cor ou se poderia ser um caboclinho ou mesmo um negro. Claro que não tinha preferência alguma nesse sentido e frisei que somente fazia questão de um cara calmo, controlado e respeitador:
- Mas respeitador até quanto, exatamente? - Ela me perguntou, rindo.
- Sá, já te falei que não sei se vai rolar coisa alguma comigo. Então, quero um cara que saiba me respeitar como mulher, como uma pessoa. Se rolar alguma coisa, daí a gente vai ajeitando os limites, entendeu?
- Entendi, entendi… Deixa comigo. Acho que já sei bem quem eu vou levar. Pode ser pauzudo?
- Desde que saiba usar com carinho, acho que pode. - Daí a recriminei novamente: - Sayuri! Eu já falei que não sei se vai rolar algo. Então, desde que fique dentro das calças, pode ser até o Kid Bengala.
- Esse eu não tive o prazer ainda, mas se conhecesse, eu convidava! - Riu debochada agora: - Oito da noite lá em casa, então, ok?
- Joia! Só me manda o endereço. - Quis agora tirar uma dúvida: - Sayuri, tenho uma pergunta.
- Diga.
- Esses caras que você vai convidar… Eles são do meio e já sabem que eu posso negar tudo, não é?
- Claro que serão do meio e é claro que vão saber de tudo. O não é a coisa mais normal de se ouvir de alguém que vai pela primeira vez! Eu ainda não os convidei, mas é claro que vou avisar que você é iniciante e que só vai rolar algo se eles conseguirem conquistar “a confiança da mocinha inocente do interior”. - Zombou de mim entre risadas: - Oito horas, então, hein!? Já estou te mandando o endereço.
- Certo. A gente se encontra.
- Beijo, gostosa.
- Beijo, sua louca.
Desligamos e fui me preparar. Tomei um delicioso banho, fiz uma higiene íntima mais apurada, em especial atrás, porque se rolasse, eu não queria passar um “carão”. Fiz uma maquiagem mais marcante, mas não muito biscate, tanto que usei um batom vermelho terroso. Decidi que iria sem sutiã, mas não sabia se iria sem calcinha, pois seria um convite a mais para eles se sentirem no direito de avançar o sinal. Então, pus uma bem pequenininha, preta também e rendada na frente. Coloquei um vestidinho preto curto, básico e bem justo, com um decote bonito, mas não vulgar. Subi num salto agulha preto, me deixando com mais de um metro e oitenta e, por fim, coloquei algumas sem joias. Na frente do espelho, vi que a calcinha, embora pequena, marcava um pouco o vestido, mas assim seria até melhor para eles verem que eu estava usando.
Pedi um Uber e fui para o apartamento da Sayuri, chegando coisa de trinta minutos depois. Ele ficava no penúltimo andar de um prédio num dos melhores e mais caros bairros de Maceió. Anunciada na portaria, minha chegada já era esperada e fui autorizada a entrar. Subi no elevador tremendo e cheguei à porta de seu apartamento rapidinho, onde aquela bela nissei me atendeu toda sorridente e feliz. Ela também estava deslumbrante, usando um vestido justo típico das orientais, com um coque baixo preso por dois palitos enfeitados parecidos com “hashis” e salto alto. Usava também uma maquiagem que marcava ainda mais os traços de seus olhos e um batom de um vermelho bem forte. Me puxou para dentro e foi novamente me apresentar ao seu namorado ou namorido, Guilherme. Este me recebeu com dois beijinhos no rosto e me tratou da melhor forma possível, não poupando esforços para que eu ficasse à vontade. Não tocou no assunto sexo sequer uma única vez e isso foi ótimo!
Ficamos conversando diversos assuntos enquanto ele terminava uma batidinha de morango com vinho num barzinho próximo que eu, pessoalmente, adoro. Enquanto isso, eu e a Sá ficamos sentadas numa mesa de jantar redonda que tinha outra mesinha giratória no centro próxima ao bar. Depois de pronta, Guilherme nos serviu a bebida em taças muito bem enfeitadas e foi ele próprio se servir de uma boa dose de whisky, com três pedrinhas de gelo, justificando não gostar de bebida doce. Fiquei tentada em pedir um copo com gelo para mim, pois eu adoro aquele barulhinho, tilintando. Ah, como adoro…
A conversa estava agradável demais e eu sentia ainda um cheirinho de assado vindo da cozinha. Aproximadamente, uns trinta minutos depois, ouvimos a campainha de seu apartamento tocar e me arrepiei, pois certamente era seu convidado chegando. Na mosca! Ela foi atender e voltou pouco depois acompanhada pelo Botina. Ele veio me cumprimentar e ao Guilherme, sendo reapresentado para mim pelo seu nome, Benício. Ele foi se servir de uma boa dose de whisky também e depois se sentou ao meu lado. Sayuri saiu atrás do Guilherme, para ajudá-lo com o preparo do jantar:
- Mas e aí, mineira? Não sabia que você era do meio? - Benício me provocou: - Mas fiquei super animado de saber.
- Então, na verdade eu não sou, Boti… Benício. Não sei como te chamo?
- Chama do jeito que quiser, gatinha: Botina, Benício, Bê, Negão, Meu Amor… Você escolhe. - Disse e riu de si mesmo: - Pode chamar até de filho da puta se estiver de quatro para mim.
Eu o encarei com olhos arregalados, séria e ele viu que tinha me assustado:
- Desculpa! Foi só brincadeira, uma piadinha para descontrair.
- Certo. Botina, então, tá? - Ele assentiu com a cabeça: - Então… Como eu dizia, eu não sou. Eu não sabia sequer que a Sayuri era até ontem à tarde quando ela me falou, contou mais um monte de coisa e me convidou para jantar.
Ele agora me ouvia e tomava seu whisky, passando também a roçar seus dedos compridos de uma mão enorme, ásperos, de um bom exemplar de um macho alfa sobre minha mão, enquanto eu falava. Achei necessário deixar bem claro que eu não havia decidido nada, ainda:
- Ela me disse que não sou obrigada a nada e disse que iria avisar. Você está sabendo, não é?
- Ah, claro! Sexo bom é aquele em que todos estão de acordo, Anne. Nunca te obrigaria a nada. Pode ficar tranquila. Antes de qualquer coisa, quero sua amizade. Depois, o que rolar é lucro.
- Obrigada! Assim eu fico mais tranquila. - Disse e tomei uma boa golada de meu drink: - Deixa eu te perguntar uma coisa?
- Oxi! Claro.
- Você não fica chateado de estar colocando um chifre na cabeça do seu amigo? Afinal, você é amigo do Gêra, não é?
Ele me encarou em silêncio por um tempinho, talvez pensando no que responder ou como não me assustar ainda mais:
- A Sayuri me disse que vocês não estavam namorando ou estão? - Perguntou.
- Não. Não estamos… Nós estamos apenas nos curtindo. Só isso. - Respondi e tomei mais um pouco daquele drink docinho: - Sabe… Eu não tô querendo criar vínculo com ninguém. Vamos dizer que eu tenha tido uns problemas no passado e não esteja a fim de nada sério. Pelo menos, por enquanto.
- Então… Tua resposta está aí mesmo, Anne. Somos duas pessoas descomprometidas que estão se conhecendo para curtir um jantar legal, na companhia de bons amigos e, quem sabe, - Frisou bastante o “quem sabe”, duas vezes: - Quem sabe, rolar uma intimidade depois, talvez até um sexo gostoso.
Eu o encarei curiosa, até meio desconfiada e ia indagá-lo novamente, quando a campainha do apartamento voltou a tocar, me assustando e fazendo encará-lo de olhos arregalados. Sayuri apareceu correndo, vestida com um avental por cima do vestido e sorriu maliciosamente para mim ao ver que o Botina alisava minha mão sobre a mesa:
- Juízo vocês dois aí, hein!? A gente não jantou ainda. - Disse enquanto passava do nosso lado, rindo alto.
- Uai! Tem mais gente? - Perguntei para o Benício.
- Sei não. Ela só me convidou para uma festinha, sem nem dizer quem vinha. - Respondeu, bebendo um bom gole de seu whisky.
Ela foi então até a porta e eu puxei minha mão debaixo da dele. Ele não se chateou, apenas sorriu e me deu uma piscadinha:
- Fica tranquila e curta. Apenas se permita a possibilidade de experimentar um momento, mas dentro dos seus limites. É prazer certo! - Disse e me deu um tapinha de leve sobre a coxa.
Fomos distraídos pelo grito efusivo da Sayuri:
- Caralho! Quando eu soube que você estava aqui, soube na hora que você não ia deixar de vir. Como você está, meu amigo? - Ela falou.
- Bem demais e melhor agora em te rever, minha japinha gostosa. - Respondeu uma voz máscula, num tom mais que amigável: - Cadê o Gui? Ele tá aí, né?
- Tá sim! - Ela respondeu toda alegre: - Ele tá lá na cozinha, finalizando o assado para jantarmos.
- Quero dar um abraço nele. - Ele falou enquanto ela o puxava para dentro do apartamento e, depois de fechada a porta, em direção a nós: - Cê tá cada vez mais gostosa, hein, Sá! Tá depiladinha daquele jeito que eu gosto?
Nesse momento, ela o encarou e cochichou alguma coisa no seu ouvido. Pela forma como falava e me olhava, imaginei que fosse sobre mim. Talvez dissesse para ele medir as palavras para não me assustar. Ele então me olhou por sobre seus ombros e sorriu, assentindo com a cabeça. Logo, depois ela se aproximou da gente, trazendo-o pela mão e me apresentou:
- Annemarye, deixa eu te apresentar o Erick, um grande e muito querido amigo lá de São Paulo.
Me levantei para cumprimentá-lo e, naturalmente, fiquei um pouco mais alta que ele, surpreendendo-o. Ele, ao contrário do que eu esperava, me olhou apenas nos olhos e rasgou um elogio:
- Nossa que mulher alta, Sayuri! - Brincou e riu: - Alta e belíssima, linda, deslumbrante mesmo! Quando a Sayuri me disse que uma amiga viria hoje, eu imaginava apenas uma amiga, não encontrar uma… uma… - Parou e suspirou, sempre me olhando no fundo dos olhos: - Poxa! Eu não consigo definir a perfeição numa palavra só! Acho que nem Michelângelo ou Botticelli seriam tão capazes de reproduzir uma beleza como a sua. Espero ter a chance de cumprimentar seus pais um dia.
Que mulher não gosta de receber elogios? Ainda mais tão caprichados como aqueles. Instintivamente, abri um sorrisão e o cumprimentei com dois beijinhos no rosto:
- É um prazer, Erick. - Brinquei, repetindo toda a formalidade usada pela Sayuri para nos apresentar: - Não sei por que a Sayuri foi tão fresca assim. Eu, se puderem, prefiro que me chamem só de Anne ou Annemarye
- Será um prazer, Annemarye. Adorei seu nome! Achei chique demais. - Ele me respondeu, agora dando um beijo em minha mão e se voltando para o Botina: - E o que você está fazendo aqui, negão, filho da puta!?
- Qual é, branquelo? - Botina rebateu: - Vai encarar?
Começaram a rir e depois se abraçaram como amigos de longa data. Eu fiquei os encarando curiosa, enquanto Sayuri nos olhava os três, mas certamente analisando cada uma de minhas reações. Assim que se deram por satisfeitos e se soltaram, o Botina me explicou:
- Acredita que eu trabalho para esse almofadinha, Anne? É o melhor de dois mundos, não faço nada e ainda ganho bem!
- Você só não faz nada porque nunca precisou, né, negão? - Ele falou e, me encarando, disse: - É que ele é meu segurança.
- Uai! Mas um segurança não tem que andar junto com seu protegido, justamente para protegê-lo? O Botina já estava aqui quando você chegou. - Brinquei mas falando o óbvio.
Eles pararam por um momento e depois se olharam, curiosos. Depois, o Botina se voltou para mim e brincou:
- Porra, Anne, precisava escancarar? O loirinho aqui não tinha se tocado até hoje. Aí cê me fode, mulher!
- Tá de aviso prévio, negão! Vou arrumar outro. - O Erick brincou: - Vou arrumar um advogado para providenciar a papelada. Sayuri estou te contratando!
- Nem precisa, Erick. A Anne é advogada e das melhores que eu conheço. Nós estudamos juntas. - Ela respondeu.
- Ah… Então, você já era, negão. Duas contra um, você não vai dar conta.
- Porra, Anne! Cê me fudeu legal. - Falou, gargalhando: - Já vou avisando que se você der pra mim, eu vou descontar!
- O que é isso, negão!? - Erick começou a gargalhar: - Olha o jeito que você fala com a moça. Daqui a pouco, ela vai achar que somos um bando de tarados e sai correndo da gente ou pior, pula pela sacada.
Todos começamos a rir da piada e o clima que já estava bom foi ficando mais e mais agradável. Entrei no clima e também soltei uma:
- Você só tem tamanho, Botina. Fique sabendo que sou cordão azul na capoeira e se você vier para cima é bem capaz de eu te dar uma surra ainda.
Não é que ele veio para cima mesmo! Fechou a cara e veio para cima de mim, me assustando no momento e inviabilizando qualquer reação. Então, me abraçou forte, imobilizando meus braços e ainda com a cara fechada, mas logo depois começou a rir e me deu um beijo no rosto, soltando-me e nos virando para os demais:
- Essa é das minhas! Já vi que adora uma brincadeira. - Falou e me deu outro beijo no rosto: - Você é uma peça, mineira.
Guilherme chegou nesse momento, usando um avental rosa com motivos florais e trazendo uma travessa com um belo assado que, pelo aroma, estava coberto por um molho madeira, colocando-o sobre a mesa. O Erick foi cumprimentá-lo em seguida com um forte abraço, mas depois se afastou um pouco e, naturalmente, tirou um sarro:
- Porra, que empregadinha mais bonitinha que você arrumou, Sayuri. - Disse, enquanto alisava o avental do amigo: - Essa aqui dá a bundinha também ou só fica no boquetinho?
- Ah, não sei, viu! Vou deixar para vocês, meninos, descobrirem se a “empregadinha” é completinha. - Respondeu e riu.
- Ô! Vai se fuder, Erick! - Guilherme respondeu, fingindo estar chateado: - Era o único que tinha na cozinha.
- Ihhh, Sá, acho que se o Botina pegar a sua “empregadinha”, não vai sobrar muita coisa, não. - Falei, no embalo das brincadeiras.
O Botina me encarou com um sorriso malicioso e soltou uma baita pérola:
- E como a senhorita sabe disso, hein!? Andou me analisando, foi? - Perguntou, dando uma alisada de leve sobre sua ferramenta que já parecia estar a meio mastro.
Eu o encarei e sorri maliciosamente, mas respondi à altura:
- Que nada, Botina. Reza a lenda que homem de pé grande tem pau grande e você tem um pezão, né? - Falei e ainda dei uma olhada nos pés dos outros dois, completando: - Acho que a Sayuri consegue responder essa pra gente, né não, Sá?
Sayuri deu uma gostosa gargalhada e depois encarou o marido e o Erick, balançando negativamente a cabeça:
- Gui, Erick, desculpa, mas o do negão é maior que o de vocês mesmo. A lenda é verdadeira, Anne! O negão tem um que ó. - Gargalhou e mostrou um tamanho entre as mãos que dava uns quase trinta centímetros, me fazendo arregalar os olhos.
- Acho que não tem tudo isso, não, Anne. Deve ter mais ou menos o meu palmo. - Botina abriu então aquela manzorra e a colocou entre as mãos da Sayuri para depois contemporizar: - Oxi! Não é que quase dá esse tamanho mesmo.
- Eu sei que dá, seu desgraçado. Cê quase me arrebentou aquela vez e… - Ela começou a xingar, mas se calou, me encarando, talvez com medo de me assustar e ainda tentou consertar: - Ah, desculpa, Anne, mas ele é muito carinhoso.
Todos me olharam curiosos com o que eu iria falar e me desencostei do Botina, sorrindo e o encarando meio de soslaio:
- Gente, acho melhor a gente comer essa carne, porque vocês não vão me comer não, principalmente você, Botina! Sai de perto de mim, seu jegue. - Falei, rindo.
A gargalhada foi geral. O Botina fez uma cara de abandonado e começou a balançar negativamente a cabeça, olhando para a Sayuri, enquanto o Gui e o Erick foram para a cozinha buscar outros pratos. A Sayuri foi atrás, mas não antes sem ouvir outra do Botina:
- Se a Anne fugir de mim é você que vai ter que dar conta, visse!?
OS NOMES UTILIZADOS NESTE CONTO E OS FATOS MENCIONADOS SÃO TOTALMENTE FICTÍCIOS E EVENTUAIS SEMELHANÇAS COM A VIDA REAL É MERA COINCIDÊNCIA.
FICA PROIBIDA A CÓPIA, REPRODUÇÃO E/OU EXIBIÇÃO FORA DO “CASA DOS CONTOS” SEM A EXPRESSA PERMISSÃO DO AUTOR, SOB AS PENAS DA LEI.