Ela riu e passamos a conversar amenidades enquanto ela preenchia alguns documentos referentes ao meu exame de Papanicolau e a receita que me entregou logo após:
- Hipoglós!? - Perguntei ao ver a receita.
- É! - Ela ria da minha cara.
- Mas isso é pomada para bebê, para assadura?
- Pois é… Você fez arte, vai ter que usar. - Começou a gargalhar de mim.
Cai numa gargalhada também e depois de conversarmos mais um pouco, nos despedimos. Não nego que voltei muito mais tranquila para meu apartamento. Eu ria de mim mesma enquanto dirigia meu carrinho pelas ruas e avenidas de São Paulo. Já em casa, pedi um lanche por um aplicativo e depois de comê-lo, fui dormir. Passei o outro dia descansando e besuntando minha “menininha” com hipoglós, afinal, foram orientações médicas.
Capítulo 16 - O cliente misterioso
No outro dia, voltei para o escritório e fui muitíssimo bem recebida por todos. Liliandra, a espalhafatosa, gritava mais que uma gralha, anunciando a todos meu retorno. O doutor Gregório precisou brigar com ela para que me deixasse respirar e depois me arrastou para a sala de reuniões, com ela atrás da gente, onde o doutor George já se encontrava. A porta foi trancada, as cortinas descerradas e um som ambiente ligado. Queriam mesmo impor sigilo e eu me assustei com tudo aquilo:
- Você foi perfeita, Annemarye. Gostaríamos de agradecê-la em nome do cliente. - Falou o doutor Gregório.
- Sim. Eu sempre disse que ela conseguiria. - Doutora Liliandra emendou: - Essa aí tem pimenta correndo nas veias.
- Gente, eu só fui buscar uns documentos. Trabalhei de “office girl” dessa vez.
- Sim e não, querida. Esses documentos são importantíssimos para a solução do cliente. - Contestou o doutor George: - E neste “pendrive”, está o nosso pagamento pelo caso.
- Cripto moeda? - Falei, concluindo pelo óbvio.
- Isso! Quer receber sua parte de que forma? Transfiro para sua conta aqui no Brasil, fora daqui ou prefere receber cripto também?
- Abre uma conta numa corretora internacional e transfere umas vinte bitcoins para ela, George. - Disse o doutor Gregório, sorrindo: - Assim, ela não paga imposto. Daí se ela quiser repatriar o dinheiro, ela dá seu jeito.
- A gente combinou que iria dividir em quatro. Por que vai diminuir a parte dela? Afinal, ela que foi lá e convenceu o judeu a entregar os documentos. - Liliandra contestou.
- Como assim convenceu? Não estava tudo combinado? - Perguntei, curiosa.
- Pois é. Sim e não. A reunião estava combinada, mas aquele homem disse que só entregaria os documentos se confiasse na pessoa que se apresentasse para recebê-los. - Disse o doutor Gregório, emendando ainda: - Então, você deve ter causado uma boa impressão. Ele deu trabalho?
- Uai, gente… Eu só o achei meio seco, arredio, um filho da pu… - Respirei fundo: - Um machista também. Aliás, na última vez que ele me tratou como inferior, eu subi um pouco o tom e mostrei que estava ali para cumprir uma missão. Não acho que tenha feito algo demais, não, sô!
- Fez sim. Fez sim! - Discordou o doutor Gregório: - Vamos cumprir o combinado, claro. Eu só estava brincando, Lili! George, abra uma conta para ela e deposite os cem que já tínhamos combinado. A minha parte, você deposita na minha conta e a da Liliandra, acho que o mesmo, não é, querida?
- Sim. Pode ser. - Ela confirmou.
- Gente! Cem bitcoins!? Mas… - Falei, fazendo um rápido cálculo mental que nem chegou a ser concluído.
- Sim, Anne. Uma pequena bolada. Acho que dá mais de um milhão de dólares hoje. - O doutor George confirmou.
- Quem é esse cliente? O que foi que ele fez para pagar mais de quatro milhões de dólares numa defesa? - Perguntei, curiosa.
- Então… No momento, você não vai saber, nem irá participar das defesas de. Conversamos melhor e, por enquanto, apenas eu cuidarie da parte criminal, Lili ficará com a parte administrativa. - Doutor Gregório falou e depois concluiu, dando-me uma piscadinha: - E o George irá conversar com alguns amigos de Brasília para tentar resolver tudo mais discretamente. Se é que você me entende…
- Então, ele não pagou só quatro milhões? - Insisti.
- Não. Ele pagou seis. Só que reservamos dois para pagar as “despesas extras” na capital. - Ele confirmou.
- Vou abrir sua conta e depois que fizer a transferência, te mando os comprovantes. - Doutor George me falou: - Meus parabéns, Anne. Já pode comemorar: você já é uma milionária!
- Ah, obrigada. Eu acho… - Respondi, ainda tomada por uma imensa curiosidade: - Vocês não vão mesmo me contar quem é o cliente?
- Por enquanto, não, menina. - Insistiu o doutor Gregório: - Relaxa e vai curtir seu dinheiro.
Terminamos a reunião e fui para minha sala. No final da tarde daquele mesmo dia, o doutor George me trouxe os comprovantes e senha para eu acessar os bitcoins da minha conta. Era verdade! Uma bolada estava depositada em meu nome na corretora de um banco de um certo paraíso fiscal. Antes dele sair, o indaguei:
- E aquela outra questão da fusão ou incorporação?
- O gato subiu no telhado… - Me respondeu, rindo.
- Ah, sério!? Poxa!
- Fica tranquila. Assuma seus processos novamente e se tiver alguma mudança, você é a primeira, aliás, a mais capacitada no escritório para cuidar disso. Eu vou te avisando.
Reassumi meus processos com facilidade e decidi que, após a minha excêntrica experiência com o atleta quase americano, daria um tempo para mim mesma. Aliás, ter sido usada por ele como fui me deixou confusa por um bom tempo, porque um misto de raiva, inconformismo e tesão dominava meu corpo quando as lembranças daquele dia me vinha à mente.
Minha rotina passou a se restringir ao trabalho, meu doutorado, apartamento, algumas vezes baladas, shopping e cinema. Eu decidi me fechar e criei um muro ao meu redor. Entretanto, o Erick, com uma ajuda providencial da minha amiga Sayuri, acabou conseguindo meu telefone e, mesmo com uma boa resistência de minha parte que durou vários dias, eu diria até semanas, ele me convenceu a tomar um chope e um cineminha. Sempre cavalheiro, nada mais que aquele convite aconteceu e eu gostei de ter sido respeitada, embora tivesse sentido falta de algo mais.
A insistência dele foi marcante e, em pouco tempo, estávamos saindo para jantar, bares, baladas e, naturalmente, cama. Nossa primeira transa não foi nada de mais. Ele foi bastante respeitador e soube fazer o que era necessário, do jeito certo e me fez gozar gostoso. Infelizmente, apenas uma única fez e isso me desapontou ao ponto de não querer encontrá-lo novamente.
Entretanto, ele mantinha marcação cerrada e em pouco tempo me convenceu a ir novamente ao motel com ele. Nesse dia, ele se superou. Fez um oral que só posso definir como divino e não me soltou até eu gozar duas vezes e implorar por uma trégua:
- Poxa, Erick. Por que? - Perguntei quase sem voz pela falta do ar.
- Por que o quê, Anne? - Perguntou, rindo, já deitado ao meu lado.
- Por que fazer isso comigo? Quer me matar, seu desgraçado? - Respondi, rindo.
- Ué!? Se não curtiu, não faço mais.
- Não! - Ri ainda mais alto: - Curti muito. Só não estava esperando isso porque…
- Não fui bem na primeira vez, não é? - Me interrompeu, constatando o óbvio e fiquei grata, porque só depois vi que estava falando demais: - Acho que estava afobado. Peço desculpas, Anne. Vou te recompensar.
- Já recompensou! Fica tranquilo. - Respondi, dando um profundo suspiro: - Mas se ainda quiser me fazer gozar mais uma vez, não vou achar ruim, não.
- Mas e você? Não quer trabalhar um pouquinho, não? - Disse, balançando seu pau duro com a mão e depois brincou: - Afinal, já tá dois a zero, né?
Espreguicei-me manhosamente na cama e depois o olhei com uma carinha safada, só pra criar um clima de maior intimidade e me virei, ficando boca a boca com ele que beijei em seguida. Ele me abraçou forte e eu passei, então, a punhetá-lo lentamente enquanto curtia aquele beijo gostoso. Depois separei-me dele e fui descendo por seu peito, sempre o encarando nos olhos, até alcançar seu pau. Um cheirinho almiscarado típico tomou minhas narinas, me deixando mais excitada e passei a dar-lhe pequenos beijinhos na cabeça, alternando com lambidinhas. Ele me olhava curioso, mas começou a dar sinais de que eu estava no caminho certo, denunciado por um leve espasmo que teve quando abocanhei seu pau e passei minha língua nele por dentro da minha boca:
- Ui! Que arrepiada gostosa, Erick. - Ri e ele mais ainda.
- Com uma boca dessas, você queria o quê? - Brincou.
Passei então a lambê-lo do saco até a cabeça do pau e vi que se ficasse ali ele gozaria rápido, mas ele, mais rápido ainda, fugiu de mim, puxando-se para trás com a desculpa de buscar uma camisinha. “Camisinha. Sei!...”, pensei, sorrindo para ele. Ele voltou logo depois já encapando o pau e me pediu para ficar de quatro. Aceitei e ele, mais que rapidamente, se alojou atrás de mim. A penetração foi rápida e gostosa. Seu pau não era tão grande, nem tão grosso, mas era o suficiente para não me deixar na mão. Ele começou bombando lentamente, mas depois aumentando a velocidade e, em pouco tempo, já começou a arfar. Eu estava começando a gostar e sentindo aqueles arrepios que a gente tem antes do orgasmo, então teria que dar um jeito dele aguentar mais um pouquinho:
- Deita, Erick! Deixa eu te cavalgar? - Pedi e ele concordou, saindo de trás e se deitando ao meu lado.
Antes de encaixá-lo dentro de mim, dei literalmente um “apertão” em seu pau para fazê-lo perder um pouco daquele embalo. Ele me olhou assustado e, para não broxá-lo, olhei maliciosamente para ele e brinquei:
- Meu! Hoje ele é meu.
Ouvi uma risada gostosa e então subi em cima dele, encaixando-o em mim. Passei a me movimentar para a frente e para trás, pois assim teria um contato maior de meu clítoris em sua púbis. Deu certo e, em pouco tempo, meus arrepios se acentuaram e com ele minha velocidade. O Erick já gemia alto com minha desenvoltura e, alguns minutos depois, começou a arfar e gemer:
- Ai, caralho! Anne, você é muito gostosa. Safada do caralho! Rebola, vai, sua putinha danada. Fode gostoso, fode. Vai! Ah, ah, ah, ahhhhhhhh. Porra!
Eu ainda não havia gozado e não aceitei a ideia de ficar na mão, pois estava bem pertinho. Então, passei a me esfregar ainda mais acintosamente em seu pau até explodir em um gozo gostoso. Fiquei tremendo, gemendo e arfando em cima dele:
- Ah, ah, ahhhhhhh! Ai, ai! Ahhhhh. Ai, Marcos. Ô, delícia…
Ele se calou enquanto eu relaxava e depois tentei beijá-lo, mas o beijo dele agora veio frio, distante. Estranhei e saí de cima dele, me deitando ao seu lado. Eu não entendia mesmo. Estávamos tão bem e de repente, ele passou a me tratar com uma frieza:
- O que foi? Não gostou? - Perguntei, encarando-o.
- Eu adorei! Foi uma das melhores noites da minha vida. - Respondeu-me e eu sorri: - Mas meu nome é Erick.
- Eu sei. - Respondi, confusa.
- Então, por que me chamou de Marcos?
- Chamei!? Não chamei, chamei? Acho que não. De onde você tirou isso?
- Você acabou de me chamar de Marcos quando estava gozando, Annemarye.
- Poxa! Desculpa. Juro que não por querer.
- Eu acredito. Fica tranquila. - Respondeu, me abraçando: - Quem é esse? Algum ex namorado?
- É… - Preferi não responder o que eu própria não sabia: - Complicado. Vamos deixar esse assunto para lá. Pode ser?
Acabamos transando mais uma vez nessa noite e, como um pedido moral de desculpas para mim, deixei que comesse o meu cu. Ele gozou rápido e acabei não aproveitando nada. Nos dois meses seguintes, Erick ficou ainda mais próximo, mas deixei bem claro que não estava interessada em relacionamento naquele momento da minha vida, mas disse que ele poderia ser meu “pau amigo” se quisesse e ele topou. Passamos a transar duas ou três vezes na semana e não posso negar que sua companhia estava me fazendo bem.
Além disso, com o dinheiro que eu havia ganhado com o misterioso cliente do escritório, passei a me permitir aproveitar um pouco certas regalias e uma delas foi assistir o carnaval do Rio de Janeiro do camarote de uma famosa marca de cerveja. Não foi barato, mas valeu a pena. O Erick lamentou não poder me acompanhar, mas disse ter alguns compromissos para resolver no Mato Grosso do Sul. Viajei e me hospedei sozinha.
No primeiro dia do desfile das Escolas do Grupo Especial, me produzi com capricho, uma maquiagem marcante, mas não tão “biscate”. Usei um short justo, preto e brilhante e a camisa do camarote que customizei de forma a ficar sempre com um ombro à mostra. Naturalmente não usei sutiã, apenas uns adesivos para garantir que não “pagaria peitinho”. Por fim, um confortável tênis, garantiram que eu abafaria, sem me expor excessivamente. Abafei mesmo, pois, na chegada, vários fotógrafos e repórteres vieram fotografar uma certa novata, bela, exuberante e morena que despontava entre as mais belas da noite. Sim, euzinha! Acho que acabei me expondo sem querer, porque a Liliandra me ligou altas horas da madrugada para dizer que tinha me visto na televisão.
Ali, acabei conhecendo muitas pessoas, inclusive atores e atrizes conhecidos, vários interessantes, alguns interessados, outros desinteressantes de tudo. Tive inclusive que me desvencilhar de uma conhecida atriz que queria me conhecer mais a fundo, durante o desfile da Beija Flor de Nilópolis. O assédio foi tanto que precisei quase discutir para ela entender que eu não curtia mulher. Depois, quando já estava no meio do desfile da Mocidade Independente de Padre Miguel, passei a ser assediada por um conhecido ator que não escondia de ninguém um costume nojento de cornear sua esposa. Eu já estava pensando seriamente em ir embora quando alguém, provavelmente a última pessoa que eu imaginava encontrar ali, me salvou daquele chato:
- E aí, Anne? - Lelinho me cumprimentou, beijando minha face e fiz questão de lhe dar uma atenção que o ator não estava conseguindo tirar de mim.
- Mermão, ela tá acompanhada! Não tá vendo? - Disse o ator, querendo se impor.
Aurélio o encarou e depois a mim. Eu, a fim de fugir do mala que me cercava, abracei o Lelinho meio de lado, dando a entender que o esperava e ainda falei:
- Só não entendi porque você demorou tanto para chegar. Eu já tava pensando que não viria mais.
- Foi mal, gatinha. - Ele disse e me apertou em seus braços, dando um beijo de leve no meu pescoço: - Eu vou te recompensar. Prometo!
O atorzinho pareceu ter caído ou fingiu ter acreditado, sei lá, mas saiu de fininho, deixando-nos a sós:
- Obrigada. Eu já não estava mais aguentando aquele cara. - Falei.
- De boa! Agora deixa eu curtir o desfile com a minha namorada. - Me respondeu, sorrindo.
- Tranquilo. Vai lá e se diverte.
- Pronto, cheguei! Desculpa o atraso, querida. - Começou a rir e entendi a brincadeira, rindo também.
Acabamos assistindo juntos esse desfile e os outros que se seguiram também. Bebemos, conversamos e acabei descobrindo que o Lelinho era realmente uma companhia bastante divertida. Ele, diferente do Marcos, parecia ser muito mais descolado e brincalhão. Acredito que fosse do tipo que “perde uma amizade, mas não a piada!”. Ainda assim, algo nele não me agradava e preferi não deixar que ficasse muito íntimo de mim. Além de bebermos juntos, dele ter me dado algumas encoxadas discretas e alguns beijos no pescoço, que fiz de conta não ter percebido, nada mais rolou:
- Vamos esticar a noitada, Anne? - Me perguntou na saída do sambódromo.
- Não! Só vou para o hotel. Estou precisando dormir. - Recusei, elegantemente.
- Poxa! Não vai nem rolar uns beijinhos?
- Já rolou. Meu pescoço que o diga, né, Lelinho!?
- Pô, cara… Um lanche, então!? Vamos comer um podrão?
- Uai! Se for um podrão mesmo, eu até topo. - Sorri com a possibilidade: - Só não me venha com McDonald’s, Burguer King e esses lanchinhos pré fabricados, porque não curto esses aí, não.
- Joia! Então vem comigo que vou te levar numa lanchonete muito irada. Rola um rock até altas horas e eles fazem um lanche gourmet de primeira.
Fomos até a tal lanchonete. Realmente rolava um show de rock com uma banda amadora, mas eles tocavam bem e o local estava cheio de gente de preto, mesmo em época de carnaval, o que me surpreendeu bastante e positivamente. Naturalmente, além de alta, eu estava colorida e não tive como não chamar a atenção. Não estávamos conseguindo uma mesa, mas o Aurélio resolveu rapidinho, dando uma generosa gorjeta para um atendente. Sentados pedimos um lanche cada e o meu parecia um monstro pronto para me engolir de tão grande. Eu estava tão deslumbrada que cheguei a me abaixar para olhá-lo bem de perto:
- Que tamanho de lanche, sô! - Falei, sorrindo: - Vou ter que levar mais da metade embora.
- Fica a vontade, gata. - Retrucou já dando uma mordida no dele e me pedindo em seguida: - Deixa eu tirar uma foto sua do lado dele e postar no meu Instagram?
Levantei o lanche com ambas as mãos e posei como se fosse comê-lo. Na verdade, ele estava tão bonito e suculento que mordi mesmo e ele fotografou o momento exato, me mostrando o resultado depois:
- Quer que eu te marque? - Me perguntou.
- Pode ser. Procura “annecbbravo” e me marca lá.
- Deixa eu tirar uma nossa, mordendo os lanches?
- Não, Lelinho. Não quero causar um mal entendido.
- Cê ainda tá na do Marcos, né?
- Impressão sua! Nunca estive na dele, nem na de ninguém. - Neguei, afundando-me no meu lanche.
- Então, você também não quer saber que ele ficou noivo, né?
- Parabéns para ele! - Falei e tomei um belo gole de um chope: - Espero que seja muito feliz.
O assunto me incomodou e ele deve ter percebido, porque não insistiu mais. Passamos a curtir o show, enquanto comíamos e ele se mostrou conhecedor de rock. Quando me dei por satisfeita, pedi para embrulhar o restante e o avisei que iria embora:
- Espera aí que eu te levo. - Pediu: - Só me deixa terminar esse “tequinho” aqui.
- Não precisa. Eu pego um Uber.
- Sem essa! Aqui não é a roça, não, moça. Tá cheio de bandido por aí. Deixa que eu te levo, de boa, sem estresse e na moral. Falô?
- “Falô”, mermão! - Ironizei seu jeito de falar.
Assim que ele terminou, nos levantamos e saímos. Minutos depois, chegávamos ao meu hotel. Me despedia dele com um beijo no rosto, mas o safado virou de última hora e levou um selinho inesperado, pelo menos para mim. Ele até tentou segurar minha cabeça e sugerir com sua língua um beijo mais íntimo, mas não funcionou, pois fechei minha boca, fazendo-o desistir:
- Pô, Aurélio. Qual é? - Resmunguei, empurrando-o para trás.
- Pelo menos, um beijinho eu ganhei. - Riu da minha cara de indignação: - Mas eu ainda fiquei com gostinho de quero mais.
- Ah, vá à merda, cara! - Falei e saí brava do carro, indo para o hotel, pisando alto.
- Poxa, Anne. Foi só um beijinho. Não acredito que vai ficar brava!?
Virei para ele com a testa franzida e mandei dois belos dedos médios em riste como resposta, fazendo-o rir ainda mais alto:
- Amanhã eu passo para te pegar pro desfile outra vez, falô?
Não respondi, dando-lhe as costas e entrei quente no hotel. Eram quase cinco horas da manhã. Tomei uma ducha rápida e me deitei como vim ao mundo na cama, enrolando-me no lençol e apagando na hora. Só aí me dei conta de que, ao descer correndo do carro do Aurélio, havia esquecido meu lanche lá dentro. “Filho da puta!”, pensei e me corrigi: “Puta, não! A dona Eugênia é uma santa, mas esse aí…”.
Na manhã do dia seguinte, aliás, do mesmo dia, fui acordada com o telefone do meu quarto urrando em meu ouvido. A cerveja não havia caído bem, ou o lanche, sei lá, e eu estava com uma baita dor de cabeça. Atendi e a recepcionista me informou que meu namorado havia chegado e perguntava se podia subir para meu quarto:
- Hã!?… - Resmunguei e achei que tivesse ouvido errado: - Quem você disse que está aí?
- Seu namorado. - Ela insistiu e perguntou o nome: - Aurélio… Lelinho, foi o que ele disse…
- Ele não é meu namorado, não, moça! Fala que eu vou descer daqui a pouco, por favor? - Pedi e desliguei o telefone, brava com o abuso dele.
Vesti uma blusa de alcinha com um decote generoso, sem sutiã, e coloquei um short que ficou mais curto do que eu imaginava quando me olhei no espelho:
- Caramba! Acho que tô engordando. - Resmunguei para mim mesma.
Coloquei uma sandália rasteirinha e desci até o saguão. Realmente ele estava lá e veio todo animado para cima de mim:
- Encosta em mim sem a minha permissão e vou te apresentar meu cordão azul! - Falei de cara, fazendo-o recuar.
Olhei para o relógio da recepção e ele já marcava quase dez horas. Dirigi-me até a recepcionista, dando-lhe minhas costas:
- Será que ainda tem café da manhã?
Ela me encarou com uma expressão de quem diz “mais uma retardada que dormiu demais” e ligou no restaurante, me informando que eles ainda estava servindo normalmente. Fui para lá e Aurélio veio atrás de mim:
- Anne! Vai me deixar no vácuo? Que história é essa de cordão?
- Você ainda está aqui, Aurélio!? - Falei sem sequer o encarar: - Cordão azul é a minha classe na capoeira.
- Pô, cara! Sério que ainda está brava comigo só por conta daquele beijinho? - Como eu o encarei realmente irada, acho que ele se tocou: - Desculpa, então, cara. Foi mal aí.
- Foi. Foi mesmo! Não gostei e se fizer de novo, o bicho vai pegar.
- Vamos ficar de boa, então? Amiguinhos!? - Disse e me esticou o mindinho como uma criança.
Eu encarei seu dedinho, depois a ele próprio e balancei negativamente a cabeça, rindo:
- Eu vou tomar café, Aurélio. Estou com uma puta dor de cabeça. Se quiser, pode vir comigo, mas não me enche o saco. “Falô”?
Ele veio e ficou na mesa comigo, enquanto eu pegava um café preto sem açúcar para tentar acordar meu fígado à força e três mini pãezinhos com um pouco de requeijão. Minha paz não durou sequer um minuto e ele passou a conversar comigo enquanto eu comia:
- E a sua mãe, como ela está? - Perguntei a certa altura.
- Tudo bem. Ela já se recuperou cem por cento da cirurgia. - Respondeu, enquanto roubava um dos meus pãezinhos: - Ela falou até que estava sentindo sua falta dias desses…
Eu ainda estava meio sonolenta e, com a dor de cabeça ainda me martelando, pensei não ter ouvido direito:
- Cirurgia!? Você falou cirurgia? - Perguntei.
- É, ué! Cê não sabia? Ela quase infartou um tempinho atrás…
- Que história é essa, Lelinho? Não fiquei sabendo de nada. - Falei sem me tocar que eu não era da família e ninguém me devia satisfação.
- Foi! Teve um mal súbito e parou no hospital. Teve que colocar uns negócios… - Passou a buscar a palavra na mente enquanto pegava um dos meus pãeszinhos: - “Stent”. Acho que é isso…
Fiquei assustada com aquela triste notícia e, instintivamente, arregalei meus olhos e engoli a seco. Ele notou minha preocupação e falou:
- Fica tranquila. Ela já está boa. Novinha em folha. Já tá fazendo arte em casa, dando ordem em tudo e mandando em todos. Enfim, dona Gegê, já voltou a ser a dona Gegê.
- Poxa, cara! Eu preciso fazer uma visita para ela. Ela foi muito legal comigo.
- Que tal hoje? Que tal agora? Te levo lá!
- Não. Agora não tô legal. Passa o telefone dela para mim, por favor, e eu ligo depois para marcar algo. - Pedi e ele pegou um guardanapo para anotar dois telefones.
- O dela é o de cima. O de baixo é o galã que vos fala. - E depois me encarou, arriscando um olhar sedutor: - Nós vamos sair hoje, não vamos?
- Nós quem, cara pálida!? - Brinquei ao me lembrar da minha ascendência indígena.
- Nós, eu e você, ué! Por que não!?
- Ó! Eu vou sair se melhorar, mas não vou combinar nada com você. Não quero assumir compromisso com ninguém!
- Pô, que mineira difícil do caralho! - Resmungou, sorrindo: - Toda mineira é assim?
- Só as melhores, Lelinho! Só as melhores… - Respondi e sorri.
OS NOMES UTILIZADOS NESTE CONTO E OS FATOS MENCIONADOS SÃO TOTALMENTE FICTÍCIOS E EVENTUAIS SEMELHANÇAS COM A VIDA REAL É MERA COINCIDÊNCIA.
FICA PROIBIDA A CÓPIA, REPRODUÇÃO E/OU EXIBIÇÃO FORA DO “CASA DOS CONTOS” SEM A EXPRESSA PERMISSÃO DO AUTOR, SOB AS PENAS DA LEI.