***CAPÍTULO OITO***
Entro naquela sala embaixo da escada e, ele está lá, encostado na mesa de sinuca, completamente nu, com seu olhar atento em mim. Estou como vim ao mundo, não me sinto envergonhado.
Seguro seu olhar e caminho em sua direção.
Ele é tão lindo, a perfeição em pessoa; um deus grego com o corpo bem esculpido. Deslizo a mão por seu peito, sentindo os músculos fortes.
— Anjo — sussurra, quase sem ar.
Não estou com medo, longe disso, quero tocá-lo em todos os lugares.
Ele coloca a mão direita na curva do meu pescoço e gruda nossos lábios em um beijo enlouquecedor, completamente insano.
Com um movimento rápido, me vira e me encosta na mesa, buscando alívio. Sem demora, ele abre minha bunda e se encaixa.
Como isso é gostoso!
Daniel agarra meu cabelo, puxando-o levemente, dando passagem para beijar meu pescoço. A outra mão desliza pelo meu corpo, vai descendo pela minha barriga, e continua descendo tortuosamente, até...
Acordo ofegante e desesperado, todo suado. Me sento na cama, tentando afastar o sonho; não, pesadelo, era um pesadelo. Mal consigo respirar.
Ouço batidas à porta, deve ser o que me acordou.
— Samuel?
Gabriel! Agora não, por favor...
— Oi — respondo, tentando controlar a respiração.
A porta se abre e um Gabriel bem vestido e todo alinhado com um terno preto aparece na minha frente. Pelo menos não está pelado.
O rubor se espalha pelo meu rosto.
Pare com isso, Samuel! As imagens do seu corpo nu encostado na mesa me vêm à mente.
— O que foi?
Deve ter percebido o meu desconcerto.
— Nada, apenas sonhos ruins.
Muito ruins.
— Sei, e isso não tem nada a ver com o beijo de ontem? — pergunta ele.
Que canalha!
— Não estamos falando sobre isso... — Levanto e entro no banheiro, porque não vou conseguir olhar pra ele depois desse sonho-pesadelo que tive. Tranco a porta e rezo para ele não ter a chave daqui também.
— Samuel?
Me afasto do batente e fico de frente para o espelho, vendo como meu rosto está avermelhado.
— Samuel... — Chama de novo.
— Vá embora!
Vejo a lágrima da vergonha escorrendo pelo meu rosto. Traí o Lucas. Não acredito que fui capaz de fazer isso.
— Vou ter que sair — diz ele. Como não respondo na mesma hora, ele sai. Sei disso porque ouço a porta do quarto se fechando com um baque.
Estou péssimo, mas não deveria, porque não escolhi isso. Não é minha culpa tudo o que aconteceu. A culpa é do Gabriel, ele me trouxe aqui e está mexendo com a minha cabeça.
Odeio esse homem!
Me agacho no canto do banheiro e choro. Choro por ser fraco, por trair Lucas e a minha família.
Meu coração está tão destruído, acho que nunca serei capaz de reconstruí-lo novamente.
***
Gabriel passou a noite fora. Quando chegou de manhã, ficou um pouco no escritório — como o local é proibido para mim, nem passei perto, não estava a fim de ver outra cena daquelas —, depois saiu de novo.
Estou morrendo de saudade dos meus pais, queria muito saber como eles estão nesse momento; entretanto, o meu maior desejo é ver o Lucas, dizer a ele que o amo e lhe pedir perdão. No lugar do meu coração tem um buraco, várias vezes me pego pensando em como Lucas está agora.
O que ele está pensando de mim? Será que me odeia?
A vontade de ficar encolhido na cama o dia inteiro está ficando cada vez mais forte. Decido, portanto, levantar e aguentar firme, não posso adoecer agora. Preciso comer alguma coisa, enfrentar tudo de cabeça erguida.
Estou com uma camiseta e o short do pijama, não é nada extravagante.
Como Gabriel não está em casa, vou até a cozinha.
Faço macarrão com molho vermelho, saboreio-o, depois me sento no sofá e ligo a televisão. Já que não está passando nada de interessante nessa merda, desligo.
— Ai, que tédio!
Meu grito ecoa perante o apartamento vazio. Nessa hora meus olhos focam na porta embaixo da escada, está fechada. Caminho até ela.
Ele não está em casa, então não vai ter flagrante... Falo sozinho.
Na verdade, tento me convencer de que não estou fazendo nada de errado.
Ele disse que só o escritório é proibido, então não pode ser tão ruim assim. Se fosse proibido, estaria trancada. Abro a porta sem medo — nenhum som desavergonhado.
Não consigo controlar os meus pensamentos. Lembranças daquele dia voltam a minha mente, depois se misturam com o meu pesadelo.
Maldição!
Com um passo de cada vez, entro olhando a minha volta, explorando mais o lugar. Naquele dia não consegui ver nada além dos dois. No centro da sala, permanece a bendita mesa de sinuca. Sobre ela tem oito bolas numeradas e coloridas, organizadas em forma de triângulo. A mesa está tão limpa que parece nova. Às vezes nunca foi usada, não para jogar, visto que tem sido utilizada de outra forma.
Credo!
O arrepio que sinto é de repúdio, tem que ser.
Na parede à minha esquerda, há um painel com tacos distribuídos lado a lado. Do lado oposto, há um quadro gigante com a foto de uma praia e o pôr do sol. É perfeito!
Ao fundo, como no meu quarto, tem a janela de vidro do teto ao chão, além de uma visão de mais prédios como esse e alguns inferiores. Nem chego perto. Com a minha onda de sorte falhando, é bem capaz de eu cair lá embaixo.
Vou até os tacos e pego um deles na mão. Aliso a madeira, imaginando como se joga sinuca.
— Você é mesmo curioso, não? — A voz gélida de Gabriel atrás de mim me assusta.
Esse cara sempre aparece do nada, fazendo meu corpo agir de forma estranha. Possui uma calma na voz que chega a ser assustadora.
Ele com certeza é o Diabo, estou cada vez mais convencida disso.
— Nossa, que susto! — Me viro para ele ainda com o taco na mão. Se ele se aproximar, meto o cacete nele, mesmo que faça aquelas coisas do Jackie Chan.
— Não era a minha intenção te assustar. Se queria jogar era só ter falado.
Como se ele parasse em casa... (Não que eu queira jogar também.).
— Não sei jogar — admito, colocando o taco no lugar, mas fico perto caso precise.
Para sair da sala terei que passar por ele, então é melhor esperar para ver o que vai acontecer.
Lentamente ele abre os botões do terno, passa pelo ombro e o joga em cima de uma poltrona, a qual nem tinha reparado que estava ali perto da porta.
Limpo a garganta.
— O... O que está fazendo? — Minha respiração acelera.
— Vou te ensinar a jogar.
— Não! — falo rápido demais. — Não gosto.
Ele ri.
— Você já jogou? — Nego com a cabeça. — Como diz que não gosta?
Gabriel se aproxima dos tacos enquanto dou um passo para trás, forçando um sorriso.
— Melhor eu voltar para o quarto.
— Está com medo? — Ele franze o canto dos olhos, tentando entender a minha reação.
— Não — rebato, mentindo mais uma vez.
— É só um jogo.
É só um jogo... Será?
Não posso confiar nele, mas por que dou um passo à frente e pego de volta o taco?
— Então me ensine.
Droga, Samuel! Gabriel deve ter algum tipo de poder que derrete cérebros.
Nada disso sairá bem.
Me posiciono onde ele fala, pego o taco da forma que pega.
— Faça desse jeito, vou acertar a bola vermelha — avisa.
Ele se inclina na mesa e demonstra como fazer. Bate com o taco na bola branca e acerta a vermelha, esta cai dentro do buraco. Não parece difícil.
Tento, e descubro que sou péssimo. Ele ri da minha irritação por não conseguir pegar o taco certo.
Merda, é só um taco, como não consigo fazer direito?
— Assim. — Gabriel se posiciona atrás de mim, demonstrando.
Oh, Senhor, me ajude!
Põe a mão na minha cintura, depois desliza os braços em volta, e segura o taco por cima da minha mão, posicionando-o da forma certa.
— Se incline — sussurra nos meus cabelos, perto do meu ouvido.
Me curvo sobre a mesa no automático, mal consigo pensar direito com a sua proximidade. Sinto sua respiração no pescoço e vergonhosamente ofego, trêmulo.
Ele recua com um grunhido. Não me mexo, fico da mesma forma que me deixou.
— Olhe pra mim — ordena.
Levanto devagar e me viro, ficando de frente a ele.
Seus olhos estão negros, sombrios, intimidantes. Um frio se instala na boca do estômago, e um pensamento se forma: quero ser beijado outra vez.
Mordo os lábios de modo involuntário.
De repente ele me agarra e me coloca em cima da mesa. Estamos frente a frente, como no meu sonho.
Não consigo dizer nada, pensar em nada. Ele se aproxima, se encaixando entre as minhas pernas. Alisa meu rosto, desenhando meu lábio inferior com o polegar.
— O que está fazendo comigo? — Uma sensação de formigamento toma meu corpo. A minha pele arrepia, se espalhando feito eletricidade.
Seus lábios tocam o meu queixo, desce para o meu pescoço só para subir de volta.
Espalma as mãos nas minhas coxas e me puxa para beirada da mesa, agarrando firme.
— Você precisa sair daqui. — Ofega. — Saia, agora mesmo. — Ele usa a autoridade que tem.
Inspiro fundo umas três vezes, tentando buscar a razão.
Isso não está certo. Não posso realmente estar interessado.
Toda aquela sensação de prazer se dissolve com a raiva que cresce dentro de mim, raiva de mim mesmo. Empurro-o, pulando da mesa.
— Fique longe de mim! — grito.
Corro para o quarto e me tranco, sei que não adiantaria, mas por hoje está valendo.
Entro no banheiro, ligo o chuveiro e deixo a água levar todo o peso das minhas costas; o cheiro do Gabriel da minha pele, junto com as lágrimas de culpa que escorrem dos meus olhos.
***
Dormir foi difícil — quase impossível — na noite anterior, tanto que hoje estou parecendo um zumbi. Sai do quarto apenas para comer.
Não vi o Gabriel o dia todo e nem à noite, porque acabei dormindo cedo, praticamente desmaiei.
Pelo jeito, ele está se mantendo distante. Prefiro assim, não quero sentir as coisas que sinto quando estou perto dele. Não houve mais incidentes com mulheres nuas, talvez passe as noites com elas em outro lugar.
Melhor assim!
Nesta manhã apareceu uma mulher, o nome dela é Vera. Mediu o meu tamanho, e me fez escolher algumas roupas que trouxe consigo. Agora não terei só algumas peças para colocar. Ela disse que o restante das roupas chegará amanhã de manhã.
Tomo um banho e vou até a cozinha, estou morrendo de fome. Sempre estou com fome!
Me estico, tentando pegar uma caixa de cereal no alto do armário, quando sinto Gabriel aparecer atrás de mim. Ele alcança a caixa facilmente e me entrega, mas não se afasta.
— O que acha de jantarmos fora hoje? — pergunta ele, cheirando o meu cabelo.
— Não, prefiro comer aqui. — Me afasto.
Vou até a geladeira e volto com uma caixa de leite, colocando-a sobre a pia.
— É um ótimo lugar para usar a roupa que você fez. — Ele tenta me convencer.
— Não, nem ficou tão bom assim. — Dou de ombros, colocando o cereal na tigela e depois derramo o leite.
— Samuel, estou tentando. Acho que é a sua vez de colaborar. — Sua voz é gentil. — Quer conversar sobre os acontecidos?
Não!
Reviro os olhos. Se essa realmente for a minha vida, então talvez seja melhor nos darmos bem e esquecer o que de fato foi um erro.
— Tudo bem! Onde fica o restaurante? — Ignoro sua pergunta, deixando claro que não vamos falar sobre nada.
— É surpresa. — Começo a me arrepender de ter aceitado o convite. — Fique pronto às 19h.
Chato, irritante e insuportável.
***
Almoço sozinho como sempre, limpo a pia e me deito no sofá.
A campainha toca. Permaneço sentado, esperando Gabriel vir atender, não sei se estou autorizado a abrir.
Ele sai do escritório e vai em direção à porta, mas quando me vê, para no meio do caminho.
— Você está aqui? — pergunta ele, surpreso.
— Se quiser posso voltar para o quarto e te dar privacidade — digo irônico.
Ele ri, continuando o percurso.
Assim que abre a porta, aquele ruivo — galinha — entra. Ao ver que ele está tentando beijá-lo, Gabriel se afasta.
— Trouxe o que pedi, Vinícius? — Sua voz é fria, não dando qualquer liberdade a ele.
— Sim — responde, sem graça.
— Venha. — Ele segue para o escritório, onde é proibido para mim, mas não para ele.
Quando passa por mim, ele dá um tchauzinho, que faz meu sangue ferver de raiva. Sei que é infantil, mas mostro o dedo do meio.
Não consigo parar de pensar no que poderiam estar fazendo lá dentro, então volto para o quarto. Preciso ocupar a minha cabeça, pois não me interessa o que estão fazendo.
Decido escolher uma roupa para passar o tempo. Recuso-me a usar aquela que customizei para este jantar.
Vinte minutos depois, Gabriel bate à porta do meu quarto.
— Entre — afirmo, sabendo que ele vai entrar do mesmo jeito. — Mas já? — levanto a sobrancelha, indicando que ele não dura muito tempo.
Ousado, Samuel, parabéns! Quando foi que fiquei atrevido desse jeito? Esse homem está fazendo muito mal a minha cabeça.
— Está me provocando, Samuel? Porque você sabe: quem brinca com fogo, pode se queimar. — Ele ameaça, me calando.
— Não disse nada, apenas pensei que seu amigo fosse ficar por mais tempo. — Minto.
— Não precisa ter ciúmes. Vinícius ainda não sabe qual é o lugar dele.
Ciúmes? Eu? Não. Claro que não!
— O que veio fazer aqui, Gabriel?
Um leve sorriso se forma em seus lábios.
— Lembrar você do nosso jantar.
— Não preciso de lembretes, já estou vendo o que vestir. — Aponto para os vestidos jogados na cama.
— Não vai usar o sua roupa? — Gabriel franze o cenho.
— Não quero usá-lo.
Na verdade, até usaria, mas nesse momento não quero. Não quero fazer sua vontade, não quero fazer seu gosto, não quero fazer nada. Sou teimoso e não abro mão.
— Ok, não se atrase. — Assim que termina de falar, ele fecha a porta.
— “Não se atrase” — Imito seu jeito.
Volto para as roupas, ainda estou indeciso.
Coloco uma camisa polo azul, do estoque da Vera. Uma calça bege. Não é vulgar nem muito discreto.
Um sapato preto social.
Me olho no espelho e mais uma vez me sinto lindo. Esta roupa me faz sentir mais confortável, ou seja, se parece mais com a minha personalidade do que aquela vermelha. Penteei o cabelos e deixei solto.
Fico pronto às 19h, como ordenou.
Acho estranho Gabriel não bater à porta. Saio do quarto e, do alto da escada, vejo-o lá embaixo, distraído com a gravata. Está lindo como sempre, num terno cinza.
Como um homem pode ficar tão lindo usando terno?
Enquanto desço os degraus, abro um meio sorriso. Como se sentisse a minha presença, ele olha pra mim. Abre a boca para falar, mas não sai nada, apenas fica me observando.
— Fico feliz que não tenha colocado a outra roupa — diz ele, quando me aproximo. — Está perfeito.
— Você também está bonito.
Desequilibrado, é isso que estou me tornando, uma pessoa sem freio.
Não penso como deveria pensar. Ele faz isso comigo.
— Nossa, recebi um elogio.
— Não se sinta demais, Gabriel.
— Acho que gosto do som do meu nome em seus lábios.
Olho seriamente para ele, tentando esconder o quanto isso mexe comigo.
***
O restaurante é luxuoso, cheio de lustres e tapetes ao redor. Garçons andando de um lado para o outro, conversas baixas. Somente pessoas da alta sociedade frequentam o lugar.
— Qual mesa, senhor? — Um homem muito bem vestido vem nos receber.
— Vinte.
A mesa vinte fica perto da janela de vidro fumê, um lugar bem reservado, num canto com a luz baixa.
— O que você tem contra a claridade? — questiono, assim que o homem nos deixa sozinhos.
— Gosto mais do escuro, dá para fazer muitas coisas sem chamar a atenção — diz, malicioso.
— Pensei que as pessoas viessem ao restaurante apenas para comer — respondo, inocentemente.
— E vem. — Sorri, provocativo, insinuando um segundo sentido nas minhas palavras.
— Ai, meu Deus! Que nojo.
Ele ri da minha cara de indignação.
— O cardápio, senhor. — Uma garçonete muito bonita, praticamente se joga em cima dele.
— Obrigado. — Ele pega o cardápio e sorri para a moça, que sai toda, toda.
Bufo de raiva, e Gabriel prende o maxilar, segurando o riso. Maldito!
— Não sei o que acontece com as pessoas ao seu lado — afirmo sem conseguir segurar a língua.
— Eu causo esse efeito.
Convencido.
— Menos em mim.
— Vou levar isso como um desafio. — Ele abre aquele sorriso diabólico. Combina com ele, e o deixa sexy.
Não! Está cada vez pior. Meu cérebro está entrando em curto.
— O que vai comer? — pergunto, olhando para o cardápio que ele me passou. Como não responde, observo-o.
Gabriel me encara por um tempo, sustentando meu olhar, fazendo meu rosto queimar de vergonha.
A garçonete volta, me impedindo de sair correndo daquele lugar ou me esconder em um banheiro mais próximo. Ela traz numa bandeja duas taças com um líquido que parece água, mas seria o cúmulo do absurdo servir água em taças. Deve ser alguma bebida com álcool, tenho certeza.
— Vai fazer o pedido, senhor? — Ela se inclina de uma forma que deixa o seu decote mais exposto.
— Quero uma garrafa de vinho da melhor safra e o prato 32.
Os pratos são designados por numerações e tem uns nomes bem esquisitos. Não entendo nada, seria muito mais fácil se especificassem o que vem na composição. Como vou saber? Fico perdido sem saber o que pedir, com isso acho mais seguro pedir o mesmo prato.
— Pode ser o mesmo para mim — digo, tomando um gole da taça com líquido transparente. E não é que é água mesmo? Não sei para que tanta frescura para colocar água.
Estou ficando nervoso.
Gabriel me observa a todo instante. Assim que a garçonete anota o pedido e sai para trazer o jantar, ele se inclina na mesa.
— Você está lindo.
— O que você quer com tudo isso, Gabriel? — questiono, irritado.
— Nada, apenas quero sair um pouco com você. Esqueceu que será meu homem?
A última parte me deu um arrepio.
— Não tem como esquecer. Você está me obrigando a isso.
Seu sorriso some.
— Sim, por isso quero deixar as coisas mais agradáveis entre nós, já que vamos morar juntos — afirma, refletindo. Pelo menos me parece sincero.
— E onde vamos morar?
— Em São Paulo.
O quê?
— Tão longe dos meus pais? Não! — Ignoro, exclamando mais alto do que deveria, inclusive chamando a atenção de algumas pessoas próximas.
— Abaixe o tom — Sua voz é gélida, seu olhar escurece. — Será melhor assim, e não irá vê-los de qualquer forma.
Sabia que ele não deixaria ver os meus pais, sabia quais eram as condições desde o começo, mas a simples lembrança, a simples menção da minha família, diante de sua própria vontade em me dizer coisas ruins, fez o meu coração se entristecer um pouco além do que eu estava imaginando.