Torna-se muito importante você saber que esta é uma estória de ficção. Apenas um conto. Não é um relato. O que está escrito aqui não aconteceu na vida real. Qualquer semelhança com nomes, situações e desdobramentos terá sido mera coincidência.
Todos os textos que têm o mesmo título desta parte da série são dedicados a Lit.
Estava um dia no trabalho, à tarde, quando recebi uma mensagem intrigante de Joana:
"Qdo sair do trabalho vem direto pra casa. Temos que conversar. É serio"
Intrigante era apelido. Um frio percorreu minha espinha. Vinha encrenca por aí. Já estava habituado às convocações de Joana para conversar quando eu fazia merda, ou ela julgava que eu tinha feito merda.
Será que ela descobriu tudo? Será que Sandra contou? Ou será que algum vizinho futriqueiro ouviu os "escândalos" da Sandra no cio e contou pra Joana? Minha viola parecia que ia ficar em cacos. Me desconcertei totalmente. Pensei em todo tipo de desgraça. E agora? Será que me adianto e vou atrás de Joana pra acabar de vez com a angústia dessa dúvida? Ela ainda estava no trabalho. Isso era bom porque poderia significar que não era o que eu estava suspeitando, senão Joana viria totalmente fora de si até mim. Mas também poderia ser que ela estivesse encarando como uma suspeita e queria colocar a dúvida em pratos limpos. O que fazer? Olhei no contato de Sandra. Ela parecia estar off-line, não ia adiantar eu mandar mensagem. E o que ela me diria? Talvez não tivesse culpa de nada e ia acabar entrando no barulho. Pobre Sandra! Eu posso ter destruído a família inteira para sempre!
Não havia o que fazer a não ser esperar pra ver. Saí do trabalho e fui logo pra casa. Encontrei Joana no sofá da sala, mexendo no celular. Sentei-me. Meu coração parecia que ia explodir. Era a hora da verdade.
- Então? O que você queria falar comigo?
-Osmar, o que você fez com a Sandra? - disse com olhos inquisidores.
Gelei.
- Como assim? Em que sentido?
- Ela foi hoje lá no meu trabalho, antes de ir pra faculdade. Estava descontrolada. Tive até que providenciar um medicamento pra ela se acalmar. Pediu pra conversarmos e eu tive que levá-la a uma salinha pra gente poder falar.
- Tá… Mas, e aí?
- Ela caiu no choro e depois de um tempo me falou: "Mãe, eu posso te falar uma coisa? Você não vai ficar com raiva de mim?" Eu disse que não, que ela podia falar. E aí ela falou.
"Mãe, não fica brava comigo! Eu queria te falar… Você não vai ficar brava comigo se eu passar a chamar o Osmar de pai?"
Comecei a ficar aliviado, mas ainda podia dar merda. Joana continuou:
- Eu falei pra ela: Sandra! Precisava ficar nesse descontrole por isso? O que deu em você? E por que você resolveu fazer isso agora? Você nunca se interessou e ele nunca te pediu isso!
"É que… De repente… Eu fiquei reparando na Fernanda, minha colega, e ela é o maior carinho com o pai dela! Beija e abraça ele… Eles assistem tv juntos, saem juntos… Quem não conhece acha até que são namorados! E a Márcia, mãe dela, nem liga!... Aí eu pensei no Osmar, e tô morrendo de pena dele!" - e desabou no choro. - "Ele não tem quem faz isso com ele! Ele não tem um filho pra abraçar, beijar, fazer companhia!... E sou eu, né? Sou eu quem tem que fazer isso, né? Eu quero muito chamar ele de pai, dar esse reconhecimento pra ele, ser a filha dele, ainda que tarde demais…" - e chorava.
"A senhora não vai ficar brava comigo? Será que ele não vai ficar bravo comigo"?
- Sandra!... Às vezes acho que você não regula bem da cabeça!... Acho que ele não vai se importar. Quem não gosta de receber carinho? Acho que ele vai estranhar, mas se zangar?... Acho que não. Quer que fale com ele?
"Não. Não precisa." - disse enxugando os olhos - "Deixa que eu me entendo com ele. Eu queria saber se a senhora não ia achar ruim…"
- Por que?
"Ah… Sei lá… Entender mal."
- Agora que você me contou, não vou entender mal. Que bom que você gosta dele, filha, porque ele gosta muito de você também. E até age como um pai! Lembra daquela vez?... - Joana fez um olhar se referindo à perda da virgindade de Sandra - Ele ficou uma arara! Ele encarou como se tivessem feito mal à filhotinha dele! Até hoje, quando você sai para as suas gandaias, ele fecha a cara.
"É… Isso ele vai ter que entender. Porque certas coisas ele não vai poder me dar…"
- Vai pra faculdade, vai! Vai dar certo. Se ele disser ou fizer qualquer coisa que te magoar, me fale. Aí eu converso com ele. Tá bom?
"Tá, mãe. Desculpa. Tchau!" - e saiu.
Eu não entendia nada. Era um retrocesso? Era uma forma de Sandra dar um recado pra mim, através da mãe, de que estava arrependida do que fez e não queria fazer mais? Aí, passando a me chamar de pai, era como se dissesse:"ponha-se novamente em seu lugar." Oi seria um avanço? Sandra estaria anulando qualquer possível suspeita da mãe e partindo pra cima de mim, pra ser minha amante?
- Tá… E o que é que você quer que eu faça?... - eu perguntei ainda confuso e com medo da coisa piorar.
- Não tô mandando você fazer nada! Só tô te falando que ela me disse isso e, se ela passar a te chamar de pai, não a repreenda, seja compreensivo! Tá vendo o quanto ela gosta de você? Se ela chegou nesse ponto, é porque nutre um amor por você há muito tempo! Amor de filha.
Fiquei em silêncio.
- E você… Bravo com ela por coisas que são particulares dela, naturais da vida dela, de moça nova! Não misture as coisas, Osmar! Tá vendo que ela não mistura as coisas e te ama como pai?
- Tem razão… Eu tenho que me comportar como um pai compreensivo, não como um pai velho, rabugento e antiquado. Mas daquela vez, ela era muito nova! Por isso me importei! Agora… agora ela é uma mulher…
- Uma moça, você quer dizer. Uma jovem que está tentando se situar na vida e no mundo, e que ainda precisa muito de nós.
- Tá bom. Eu entendi. Eu devo falar com ela? Dizer que ela pode…
- Não! Não me ouviu dizer que ela não queria que eu falasse com você? Aja naturalmente. Só te contei pra você não ser grosso ou indiferente ao carinho dela.
- Nunca fui grosso com ela! Quando estou zangado ou aborrecido, fico no meu canto, justamente pra não ser mal-educado.
- Tá, mas de qualquer forma, seja receptivo a ela. Retribua o carinho e amor que ela te der. Tá bom?
- Pode deixar. Eu vou tratá-la bem. Fique sossegada.
- Vamos tomar um banho? (continua)