EPÍLOGO – 5 ANOS DEPOIS
*** JOÃO PEDRO GOVÊA ***
− ANA SANTOS... - A voz potente e encorpada do mestre cerimônias chama o primeiro nome da lista e eu olho para o palco com o coração acelerado, como se fosse eu, prestes a subir ali. A plateia aplaude a mulher que se dirige até a extensa mesa e passa cumprimentando uma a uma as pessoas sentadas nela. O auditório está lotado, mas fiz questão de garantir que nada me impediria de ter uma visão perfeita do palco.
− Beatriz Augusto! -Aplaudo e um grupo se levanta, abrindo uma faixa, gritando e assobiando.
− Carla Andrade! -Mais aplausos, gritos e assobios.
− Eduardo Govêa! -É a minha vez de me levantar, em um pulo estou de pé, aplaudindo, gritando, assobiando, vendo aquele homem lindo, o meu homem, porra! Desfilando pelo palco, usando beca e capelo, recebendo o canudo, e sorrindo! Sorrindo tanto que não consigo segurar. Uma lágrima molha o meu rosto, porque eu sei o quanto isso significa para ele, o quanto ele desejou e esperou por isso. Ao meu lado, meus pais aplaudem igualmente felizes, e, dona Marilia chora, sem conseguir se conter ao ver o filho se formar.
Eduardo nunca contou para ela toda a verdade. Escolheu poupar sua mãe da dor que ele sentiu e de todas as dificuldades pelas quais passou. Para Dona Marília, Eduardo demorou a se formar porque mudou de ideia sobre que curso fazer, mas isso não diminui em nada as felicidade e orgulho que sente do filho que, sozinho, conseguiu vencer na cidade grande.
Os nomes continuam sendo chamados, um a um, até chegar à letra z. E quando a entrega de diplomas é encerrada, o mestre de cerimônias anuncia o discurso da oradora da turma de formandos do curso de Publicidade da USP de 2028. Eduardo Govêa. Não me contenho, levanto, novamente, aplaudo, assobio e grito tudo de novo e de novo, precisando que o mundo saiba que é o meu homem ali! O orador da turma, o melhor alun da classe, se formando com honras, é a minha esposa, porra!
− Boa noite. -Sua voz soa firme e impostada no microfone, seus ombros retos e postura altiva não lembram em nada o menino frágil que conheci anos atrás, embora, na nossa casa, na nossa intimidade, muitas vezes, eu ainda consiga vê-lo.
− É uma honra imensa estar aqui esta noite representando essa turma, essa família, que formamos ao longo dos últimos quatro anos. Pensei muito sobre o que dizer, porque não importava qual fosse o tema, nenhum deles parecia fazer justiça a esse grande momento. Então, decidi focar nisso, no momento, na verdade, no tempo.
Primeiro, pensei em falar sobre o futuro, mas ele é tão incerto... Passei, então, para o passado, pensei em falar sobre tudo pelo que passamos, sobre tudo aquilo de que abrimos mão para que pudéssemos chegar a esse momento, mas decidi, que, apesar de rico e muito especial, o passado não é mais importante do que o presente. Nada é. E é sobre ele que falarei, sobre o hoje, sobre o agora, sobre este segundo.
Como todos os meus colegas sentados aqui atrás, eu esperei por esse momento por toda a minha vida. Travei minhas batalhas, algumas maiores do que outras, perdi muitas, venci tantas, e cheguei, mas até que eu chegasse, aprendi coisas que foram capazes de tornar esse momento ainda mais especial.
Há alguns anos atrás, tive o privilégio de aprender o que é o amor. E, baseado nas minhas experiências e nas minhas próprias interações com esse sentimento tão contraditório, naquela época, em minha mente, o defini como uma sucessão de saltos do abismo. Mas, desde então, percebi que eu estava errado quando o defini dessa forma, porque o amor não é uma sucessão de saltos do abismo, a vida que é.
Todos os dias, ao acordar, nós fazemos uma escolha: pular, ou permanecer parado no mesmo lugar. Não somos obrigados a avançar, tampouco a retroceder, apenas a decidir se pularemos ou não. Mas,
Independentemente do que decidimos, os desafios vêm.
A diferença é que quando escolhemos pular, podemos passar por eles tendo certeza de que fizemos o nosso melhor para vencê-los, não nos permitimos sermos paralisados pelo medo ou pelas incertezas que são constantemente lançados sobre nós, e, se eu tiver que dizer algo hoje, queridos colegas, familiares e amigos, eu digo que pulem.
Pulem, porque a vida é uma só.
Pulem, porque viver o presente sem se movimentar, é jamais alcançar o futuro.
Pulem, porque ainda que exista uma enorme possibilidade de você se esborrachar no chão, essa é só uma possibilidade, enquanto a adrenalina da queda é uma garantia. Assim como seus aprendizados, o prazer, e a experiência em si.
Pulem, porque o melhor momento da sua vida não acontecerá amanhã, daqui a uma semana, ou daqui a um mês, ele é agora.
Pular, senhoras e senhores, significa não passar a vida esperando por uma oportunidade. Pular significa que você sabe que essa é a sua oportunidade. Meu desejo para nós esta noite, quando encerramos um ciclo e iniciamos outro, é que jamais sejamos pessoas que passam a vida querendo descobrir qual é a sua missão, qual é o seu objetivo, sem jamais entender que o maior objetivo da vida, é viver, e, por isso, perdem a sua grande chance, aquela que nos é dada repetidamente, todos os dias.
Eu levei meu tempo para aprender isso, e, foi graças a um grupo incrível de pessoas que eu consegui, então, com a permissão de vocês, quero tirar alguns minutos para agradecê-las por isso.
Obrigado, mãe. Por ter me dado a oportunidade de aprender a pular.
Obrigado, Joana e Norma, minhas amigas de uma vida inteira, ainda que a segunda eu conheça há menos de uma década. Obrigado por nunca terem me empurrado, e, por muitas vezes, terem me esperado na borda, enquanto eu decidia se ia ou ficava. - Seus olhos me encontram na multidão e o mundo ao nosso redor deixa de existir naquele instante. Somos só nós. Só nós dois quando ele olha para mim e, com lágrimas escorrendo em seu rosto, diz meu nome.
− João. Meu amigo, meu marido, meu amor. -Eduardo toma uma respiração profunda, espelhando meu descontrole: − Obrigado por ter me ensinado que não precisamos só cair, mas que quando aceitamos a jornada, podemos voar. Obrigado.... -Inspira e expira, eu faço o mesmo, com os olhos já transbordando de emoção e louco para me colocar de pé, para correr até ele e abraçá-lo, beijá-lo, dizer que foi ele quem me ensinou a pular, não o contrário. Foi ele quem me ensinou que meu propósito era ser feliz, era fazê-lo feliz.
− Obrigado, porque, agora, eu nunca mais vou pular sozinho. Seremos sempre, eu, você. -Meu coração para de bater. Pisco, apertando os olhos antes de voltar a abri-los. Eduardo caminha pelo corredor entre as poltronas da plateia, vindo em minha direção, e eu finalmente volto a me mover, saio da fileira, esbarrando nas pessoas ao meu lado sem me importar em pedir licença ou desculpas.
Depois do que pareceu ser a eternidade, chego à ponta, e corro. Corro em sua direção, ele aperta o passo também. São segundos, mas parecem anos até que eu finalmente envolva seu rosto em minhas mãos, procuro pelas palavras na minha cabeça.
− Eu te amo! Eu te amo! Eu te amo! Eu te amo...-Colo minha testa na sua, beijando suas bochechas molhadas pelos rastros de lágrimas, seus olhos marejados, seus lábios, beijando-o inteiro, porque, puta que pariu! Eu sou o homem mais feliz do mundo!