Era a manhã de domingo. Eu havia passado o sábado inteiro percorrendo túneis subterrâneos, e à noite havia conhecido a história do meu amigo médico, casado em segredo com uma bela mulher de outra realidade.
Tomei meu café da manhã e depois decidi refazer todo o trajeto que fiz quando me encontrei com a belíssima jovem vestida com um traje que lembrava o de uma freira, no entanto com uma cor púrpura, que eu nunca havia visto antes.
Felizmente, era uma manhã mais fresca. Minha cidade tem destas coisas: um dia faz um calor infernal, em outro a temperatura chega a 14 graus de manhã.
Enquanto eu caminhava, refletia sobre tudo o que havia acontecido. A porta secreta no muro, os túneis subterrâneos que conectavam vários lugares da cidade, o corredor escuro com uma criatura feroz.
Parecia que havia um mundo diferente por baixo da metrópole, e que as pessoas comuns, que levavam suas vidas rotineiramente, sequer imaginavam existir.
Lembrei-me que, há muito tempo, antes de começar esta história, um colega de trabalho havia feito um comentário sobre a possibilidade da existência de realidades paralelas. Ele falou a respeito das “Linhas de Ley” e da “Anomalia Magnética do Atlântico Sul”, algo que eu desconhecia. Ele falou que a tal Anomalia Magnética ficava sobre as regiões Sul e Sudeste do Brasil, e que pelo menos três linhas de Ley conhecidas passariam pelo nosso Estado. E também: a Anomalia Magnética estaria formando novas “Linhas de Ley” nessas regiões.
Estes dois fenômenos estariam associados a portais que levariam a outros mundos, realidades paralelas. Mas ele era o tipo “bicho-grilo” e começou a falar sobre duendes, fadas, criaturas da mitologia brasileira, e não levei muito a sério. Até o momento em que passou a fazer sentido.
- Você está daquele jeito de novo, Roberto.
A voz dela me causou um sobressalto. Era Alethea! Vestida da mesma maneira, com as vestes púrpuras. Ela enlaçou seu braço no meu, como na primeira vez. E senti aquele arrepio estranho.
- Assustei você?
- Fui pego de surpresa. Eu estava justamente pensando em você, e já deve ter percebido que vim fazer este trajeto por sua causa. Não consegui passar pela porta naquele dia, demorei para tirar a roupa antes que se fechasse. Voltei lá outras vezes, sem sucesso. Então resolvi refazer este trajeto.
- Então o acaso nos favoreceu. Pensei que talvez pudesse passar por aqui. É domingo, e você não tem que trabalhar.
- Ontem também não trabalhei. Você veio?
Ela me olhou nos olhos, sabia o que eu estava querendo insinuar.
- Ontem você não esteve aqui, ficou passeando pelos túneis.
- Foi você que afastou a fera? Estava me observando?
- Não fique achando que é tão importante assim. Não fiquei procurando você do jeito que pode estar pensando.
- Mas eu fiquei procurando você. Muito. E creio que acabei descobrindo algumas coisas. Falei com a esposa do médico, você deve saber a respeito dele.
Eu evitava citar nomes, poderia haver mais alguém ouvindo. Ela então falou:
- Acho que devemos conversar, Roberto.
Era óbvio que precisávamos ter uma conversa séria. Porém eu não queria afastá-la ou dar a impressão que eu a estaria assediando de alguma maneira. A linda moça certamente estava interessada em mim, e eu cada vez mais apaixonado por ela. Se ela sentia o mesmo, não deixava transparecer claramente. Eu poderia ser apenas objeto de sua curiosidade. Talvez ela me encarasse como um exemplar de uma espécie diferente, algo a ser estudado.
Contudo, o relacionamento entre Arthur e Anthea me dava esperanças.
- Você não disse nada. Talvez não queira ter essa conversa.
- Desculpe, Alethea. Eu tenho tantas coisas para dizer a você, que não sei por onde começar. E há muitas perguntas... de onde exatamente você vem?
- Aqui não é o melhor lugar para dialogarmos.
- Podemos ir à minha casa. Meu carro está estacionado aqui perto, eu moro em um bairro tranquilo.
- Impossível. Não posso me afastar desta região.
- Da rede de túneis, você quer dizer. Ou das linhas de Ley.
- Não entendo o que está dizendo.
- As linhas de energia que nortearam a construção dos túneis.
Ela fez novamente “aquilo”. Ficou com o rosto quase colado ao meu, e colocou um dedo na frente dos meus lábios. Entendi claramente que não deveria falar mais a respeito daquele assunto. Mas a vontade de beijar aqueles lábios aumentou quando senti sua respiração em minha face. Ela exalava um perfume inebriante.
- Vamos continuar caminhando. Por que tanto interesse na minha pessoa? Só nos vimos uma vez.
- Já ouviu falar em amor à primeira vista?
- Você deve estar se referindo à atração que duas pessoas sentem quando se veem pela primeira vez, mas não conseguem explicar de uma maneira racional.
- Não é apenas atração. Pelo menos no meu caso.
- Então você acredita que me ama, mesmo tendo me visto apenas uma vez.
- Duas. E hoje estou ainda mais apaixonado.
Ela continuava com a braço em volta do meu. Segurei em sua mão. Alguma coisa fluiu, talvez fosse a eletricidade estática, como o Doutor Arthur havia cogitado. Mas não, não era aquilo. Era algum tipo de energia que me fazia sentir diferente. Ela contestou o que eu havia dito:
- Veja...há uma diferença entre atração, amor e paixão. E também há o magnetismo sexual.
- Não posso negar que me senti atraído sexualmente, Alethea. Qual o homem que deixaria de sentir algo assim?
- Não sei. Eu já havia visto alguns homens em sua cidade, mas todos me evitavam quando me viam, passavam para o outro lado da rua. Achei que havia algo que os repelia. Você foi o primeiro que não se desviou.
- Difícil acreditar nisso. Uma linda moça como você?
- Creio que meus trajes são muito estranhos para vocês.
- Mas quando você tirou, lá em frente ao muro, pude ver você inteirinha...
- Nua. Você se sentiu mais atraído por causa disso?
- Não. Lembre-se que eu disse que queria conhecê-la melhor bem antes disso.
- Isso é verdade.
Lembrei que a entrada da viela onde estivéramos antes estava em obras.
- Não sei se poderemos ir ao mesmo lugar de antes, a Prefeitura estava fazendo reparos no calçamento e havia muitos funcionários circulando.
- Hoje é domingo, não é dia de trabalho. Você não pensou nisso antes, ou achou que todas as entradas dariam acesso ao mesmo lugar...o que não é algo muito racional.
- Tem razão.
Embora a manhã estivesse com uma temperatura amena, notei que ela parecia cansada, um pouco enfraquecida.
- Você está bem, Alethea?
- Acho que fiquei muito tempo esperando...
Ela ficou ruborizada. Percebi que não queria ter dito aquilo. Havia ficado esperando por mim naquele trajeto. E isso era uma prova de que ela estava muito interessada em mim.
- Não precisa ficar envergonhada de dizer que esperou para me encontrar. É tão difícil assim dizer que queria me ver, tanto quanto eu a você?
- Eu...realmente...não estou...bem.
Parecia que ela ia desmaiar. Não pensei duas vezes, peguei-a no colo e fui andando rapidamente até a viela onde havia o portal.
- Alethea! Há algo que eu possa fazer ?
Ela não respondeu, parecia estar entrando em uma espécie de torpor.
- Ai Meu Deus! Se acontecer algo com você, eu nunca vou me perdoar!
Felizmente, ela era leve. Deveria ter algo a ver com a gravidade do mundo dela, pelo menos foi o que eu havia entendido pelo que Anthea havia dito, lá na casa do Dr. Arthur.
Cheguei à viela. Perto da esquina, ainda havia um veículo da Prefeitura, mas nenhum funcionário à vista. Fui até o muro. Rapidamente, fui tirando minha roupa. Eu não podia arriscar desta vez. Fiquei pelado e, em seguida, fiz o mesmo com as roupas dela, depois tirei suas jóias , como ela havia feito.
Quando eu estava pressionando os tijolos da maneira que eu havia feito antes, me pareceu ouvir um ruído de passos. A porta começou a se abrir. Joguei as roupas e jóias dela para dentro, depois as minhas. Então ouvi a voz:
- O que você está fazendo? Ela está desmaiada! Vou chamar a polícia!
Peguei Alethea no colo, e rezei para que desse certo. Felizmente, entramos pelo portal, e tudo ficou escuro quando a porta se fechou atrás de nós.
Estávamos naquele corredor, a escuridão era total, e lembrei que mesmo a minha lanterna especial de nada adiantaria. Sentei-me no chão, ainda com ela em meu colo. Encostei meu rosto no dela, para ver se estava respirando. Sem querer, nossos lábios se tocaram. Ela se moveu.
- Roberto... você conseguiu...abrir o portal.
- Graças a Deus! Anthea me disse que vocês não podiam ficar muito tempo do “nosso lado”.
- Anthea. Ela é a companheira do médico.
- Isso. Agora vamos andando, se você estiver se sentindo melhor.
- Não. Não é como se faz. Vamos ficar aqui.
- Como assim?
- Esse foi o seu erro daquela vez. Mas não havia como você saber.
- Saber o que?
- Devemos esperar até clarear.
- Clarear, como?
- Não tente entender. Em algum momento, o corredor terá luz suficiente para podermos caminhar e sair para o outro lado.
- Então temos que ficar aqui, esperando.
- Isso mesmo.
- E se der vontade de ir... ao banheiro?
- Hahah, você é engraçado.
- Achou engraçado? E se eu tiver vontade?
- Você espera, heheh.
- É bom ver que você melhorou. Está sorrindo.
Alethea colocou os braços em volta do meu pescoço e me beijou.
- Senti quando nossos lábios se tocaram. Foi muito bom.
Era um momento mágico. Nós dois, nus, ela no meu colo, na escuridão total. Nossas línguas se entrelaçaram. Primeiro timidamente, depois de forma mais ousada. Ficamos nos beijando por um bom tempo.
- Isto é muito bom... mas tem alguma coisa dura me espetando.
- Desculpe, não consigo evitar.
Meu cacete estava cutucando a bundinha dela. Mas eu não queria apressar as coisas. Se era para haver algo entre nós, que fosse no momento certo.
- Vamos vestir as roupas, Alethea.
- Ainda não dá, aqui não.
- Só depois que clarear?
- Isso.
- Aí fica difícil, não sei se vou conseguir me controlar.
- Fica quietinho. E vê se faz essa coisa amolecer.
- Hahaha!!!
Desta vez fui eu quem começou a rir.
- Vamos conversar, Roberto. Você já viu que não sou do seu mundo. Este portal leva a uma realidade diferente da sua. O que Anthea lhe contou?
- Pouca coisa. Que a atmosfera e a gravidade são diferentes, e que eu e você não poderíamos ficar o tempo todo juntos.
- É isso... mas existem alguns pontos intermediários, onde podemos ficar por mais tempo.
- Como aqui?
- Como no porão da casa do médico.
- Então, se eu conseguisse uma casa sobre um portal, poderíamos viver juntos.
- Você é muito apressado, quem disse que quero morar junto com alguém?
- Admita que você também gosta de mim. Se não gostasse, não teria se arriscado para ficar me esperando lá naquela rua. E se você passasse mal, e eu não estivesse por perto?
- Eu me distraí conversando com você. Se estivesse sozinha, teria vindo muito antes.
- Você não dá o braço a torcer, hem?
- Por que você iria quer torcer o meu braço?
- É uma gíria antiga, Alethea. Eu quis dizer que você não admite que está atraída por mim, tanto quanto eu por você.
- Agora você falou em atração, antes era amor.
- É tudo junto. Amor, atração, paixão, tesão...
- Tesão? O que é tesão?
- Aquilo que você chamou de “magnetismo sexual”. Não sabia mesmo o que era tesão?
- Não. Eu só ...tenho...conhecimento teórico.
- Ai meu Deus! Você nunca fez sexo?
Fiquei sem ter onde enfiar a cabeça. Se não estivesse escuro, ela veria minha cara vermelha como um pimentão.
- Alethea... desculpe... nem sei o que dizer.
- Não precisa dizer nada. Eu admito que fiquei esperando porque gosto muito de você, eu senti algo muito forte quando o encontrei. Mas não sei como lidar com isso. Estive poucas vezes do “seu lado”, fui avisada que poderia encontrar alguém e me interessar, mas que os riscos poderiam ser grandes.
O susto fez meu cacete amolecer. Eu não podia imaginar que ela era totalmente inexperiente naquela idade. Embora eu não fizesse ideia, ela deveria ter vinte e dois, vinte e três anos no máximo. Lembrei de algo, e perguntei:
- E a fera?
- Que fera?
- Quando estive no outro corredor, ouvi rugidos e rosnados, e senti uma língua lamber minhas costas. Depois ouvi um ruído que me pareceu uma pancada, e uma voz me dizendo para correr e voltar para o portal. Achei que era você.
Ela não disse nada, ficou em silêncio.
- O que foi ? Não era você?
- Vamos falar sobre isso depois. Está clareando.
E era verdade, o corredor começou a ficar fracamente iluminado. A luz foi aumentando devagar, e Alethea saiu do meu colo. Pegou suas roupas, e suas jóias. Mas não se vestiu, continuou completamente pelada.
- Podemos ir. Venha comigo.
Ela me estendeu a mão.
Também peguei minhas roupas, e caminhamos de braços dados. Fiquei pensando em que tipo de enrascada eu estaria me metendo.
CONTINUA.